domingo, 29 de julho de 2012

Breves razões para não usar óleo diesel com teor de enxofre superior a 50ppm em veículos Euro-5/Proconve P7

  • Acidificação excessiva dos gases de escapamento, o que é particularmente crítico nos motores equipados com o dispositivo EGR. Os compostos de enxofre formados na combustão, ao recircularem pela câmara de combustão, desencadeiam processos de corrosão, assim danificando componentes internos do motor. Há ainda um risco maior de contaminação do óleo lubrificante;
  • Danos ao revestimento anticorrosivo em tanques feitos de chapa de aço estampada: é comum o uso de uma resina impermeabilizante para proteger o interior do depósito de combustível, evitando a corrosão do mesmo e o eventual entupimento de filtros e linhas de combustível com partículas de metal oxidado. No entanto, altos teores de enxofre e contaminação do óleo diesel com água promovem uma reação que dissolve a referida resina, de modo que a mesma pode também entupir filtros, além de anular a proteção anticorrosiva. Mesmo em veículos que façam uso do sistema SCR, é recomendável evitar óleo diesel com altos teores de enxofre;
  • Por mais bizarro que possa parecer à primeira vista, é melhor usar óleos vegetais ou até mesmo o etanol numa situação emergencial, visto que são isentos de enxofre e funcionam satisfatoriamente em motores do ciclo Diesel.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Uma reflexão sobre as normas Euro-5 e a redução no consumo de combustível em veículos utilitários

Com a efetivação das normas de controle de emissão de poluentes Euro-5 no mercado brasileiro, além de dúvidas a respeito do Diesel S-50, uma questão polêmica envolve a questão do consumo de combustível nos veículos com motor Diesel produzidos a partir de 1º de janeiro de 2012 para atender à demanda local.
Empresas como a Volare, fabricante de microônibus, alegam que os veículos novos estão oferecendo um consumo mais baixo em comparação com versões anteriores, mas ainda há dúvidas sobre a real influência de dispositivos adotados em virtude das normas Euro-5 nesses resultados...
Um recurso muito controverso é o DPF, que promove a retenção de material particulado e tornou-se obrigatório em todos os veículos com motor Diesel destinados ao mercado local: ausente em veículos anteriores devido ao alto teor de cinzas no óleo diesel de especificação antiga (entre S-500 e S-1800), acaba ocultando alguns efeitos de um débito excessivo da injeção, o que por conseguinte acarreta um aumento do consumo de combustível.
Em veículos pesados, nos quais o ciclo Diesel permanece como a melhor alternativa em nome da rentabilidade operacional, vale ressaltar que o método de controle de emissões de óxidos de nitrogênio mais usado para cumprir a Euro-5 é o SCR, baseado apenas no pós-tratamento dos gases de escapamento e portanto não exercendo impacto no processo de combustão que justificasse qualquer incremento à eficiência.

Já nos veículos leves, a predominância vem sendo do EGR que, apesar de dispensar o uso da solução aquosa de uréia (Arla32/DEF/AdBlue), tem uma série de desvantagens e interfere no processo de combustão como um todo, ao readmitir parte dos gases de escapamento após serem filtrados e refrigerados, reduzindo a temperatura na câmara de combustão e até favorecendo a formação de material particulado, denotando prejuízos à eficiência. A operação com combustíveis alternativos também fica comprometida pelo EGR...

É conveniente destacar que o sistema EGR foi desenvolvido para atender a necessidades de motores com ignição por faísca, de acordo com características técnicas específicas dessa configuração...

Na prática, pode-se deduzir que as melhorias no consumo de combustível em motores Diesel devem-se basicamente ao aperfeiçoamento dos sistemas de injeção, com pressões operacionais mais altas promovendo uma atomização mais intensa e aumentando a superfície de contato entre o ar aquecido pela compressão e o combustível, bem como o mapeamento das injeções eletrônicas aumentando a precisão do controle da detonação.

sábado, 14 de julho de 2012

Uma reflexão sobre a atual geração de motores bicombustível, ou "flex"

A espantosa popularidade que veículos bicombustível movidos a etanol e gasolina, popularmente conhecidos como "flex", hoje apreciam no mercado brasileiro, teve início em 2003 com o Volkswagen Gol, um dos modelos mais bem-sucedidos comercialmente e pioneiro na adoção desse sistema a nível local. Porém, é baseado na ignição por faísca, contando com ajustes precários para atingir características apenas intermediárias entre o etanol e a gasolina e por conseguinte sacrifica a eficiência ao usar combustíveis com características tão distintas em estado puro, razão pela qual muitos profissionais e entusiastas do automobilismo abdicam da "flexibilidade" para otimizar o funcionamento do motor num único combustível...

A bem da verdade, convém destacar que a "flexibilidade" entre gasolina e etanol é muito antiga, remontando a 1908 com a introdução do Ford Modelo T (o popular "Ford Bigode"), no qual um carburador de difusor variável permitia uma dosagem mais adequada dos combustíveis enquanto o controle manual do avanço de ignição, essencial para manter a segurança do procedimento de partida do motor, também facilitava ajustes para adequar a centelha à velocidade de propagação da chama, notadamente mais lenta no etanol. Existem rumores de que a intenção de Henry Ford, eventualmente citado como vegetariano, era fazer o Modelo T funcionar apenas a etanol, o que seria difícil em função da disponibilidade muito limitada do combustível vegetal, obrigando-o a adotar uma taxa de compressão mais modesta que permitia o uso da gasolina com uma miserável octanagem (resistência à pré-ignição) da época às custas de uma eficiência mais limitada e da impossibilidade em se obter um desempenho consistentemente mais elevado mediante o uso do etanol. Permaneceu em produção até 1927, quando foi substituído pelo Ford Modelo A (popularmente conhecido como "Ford 29", "baratinha" ou "chimbica"), no qual a "flexibilidade" sequer é mencionada, num reflexo da Lei Seca que dificultou ainda mais a obtenção do etanol...

Durante os anos 70, em função do cenário agitado das constantes crises do petróleo fomentadas pelo espírito revanchista de membros da OPEP após humilhantes derrotas nas guerras contra Israel, o álcool combustível ganhava posição de destaque na matriz energética brasileira já a partir de 1973, com a introdução de misturas obrigatórias de álcool etílico (etanol) na gasolina brasileira, conversões de automóveis a gasolina para rodar com o combustível alternativo, e culminando em 1979 com a introdução do primeiro veículo a sair de fábrica dedicado a operar com etanol, uma versão do Fiat 147 que logo recebeu a alcunha de "cachacinha" e se valia de uma taxa de compressão mais elevada que o similar movido a gasolina para explorar melhor a maior resistência do etanol à pré-ignição e os conseqüentes benefícios ao desempenho. Com incentivos fiscais tanto no preço do combustível quanto dos veículos 0km, o carro a álcool foi um grande sucesso no mercado brasileiro durante a década de 80, mas que tornou-se o "patinho feio" já a partir de 1989 em função de uma crise de abastecimento de etanol que se arrastou até 1990 devido ao maior interesse dos usineiros em atender à exportação do açúcar que se mostrava mais lucrativa, levando até mesmo alguns veículos a serem convertidos para operar com gasolina. No exterior, teve uma projeção mais intensa como combustível alternativo o álcool metílico, ou metanol, que sempre gozou de alguma popularidade nas competições de kart.

Mas foi apenas em 1992, 65 anos após o fim da produção do Modelo T, que a "flexibilidade" voltou a despertar grande interesse comercial com a Chevrolet Lumina APV, enfatizando a possibilidade de se usar metanol. Pesquisas com modelos dedicados ao metanol já eram feitas desde a década de 80, mas a disponibilidade limitada inviabilizava tal opção. E novamente os projetistas se viam obrigados a adotar uma taxa de compressão um tanto conservadora, levando em conta que mesmo com gerenciamento eletrônico de injeção e ignição promovendo uma auto-adaptatividade às condições de uso com gasolina pura, metanol, ou ambos misturados em qualquer proporção, não era um sistema tão arrojado a ponto de compensar a menor octanagem da gasolina sem provocar as desagradáveis "batidas de pino" (ou "griladas") nem muita aspereza e irregularidade na aceleração.

Curiosamente, o ciclo Diesel tem grandes virtudes que até mesmo podem inspirar otimizações na tecnologia "flex". Em especial a injeção direta, sempre presente nos motores Scania, que possibilita temporizar a injeção de modo a controlar a detonação com maior precisão e usar uma mistura ar/combustível mais pobre, garantindo um melhor aproveitamento do combustível e redução nas emissões.
Curiosamente, enquanto no ciclo Diesel normalmente são usadas taxas de compressão um pouco mais comedidas ao se utilizar a injeção direta, dificilmente passando dos 18:1 quando com injeção indireta é comum chegar nos 21:1, no ciclo Otto explora-se justamente a vantagem de poder controlar a pré-ignição da gasolina mesmo sob compressões mais recomendadas num motor movido exclusivamente a etanol. Esse expediente vem sendo largamente explorado pela Audi em modelos como o TT.

Também demonstra grande utilidade para o aperfeiçoamento dos motores "flex" o atual progresso da tecnologia do turbocompressor, que se hoje é a grande estrela do fenômeno do downsizing teve na aplicação em motores Diesel uma excelente plataforma para desenvolvimentos...
Métodos modernos de gerenciamento permitem ao turbo um funcionamento mais consistente desde as baixas rotações habituais em motores Diesel para aplicações pesadas até faixas de alto giro mais comuns em veículos leves. Pode-se até mesmo estabelecer diferentes limites para a pressão fornecida de acordo com o combustível em uso, o que seria particularmente útil à operação com etanol quando uma pressão de turbo momentaneamente mais alta possibilitaria um incremento na eficiência de forma próxima ao que aconteceria com algum sistema que viabilizasse uma taxa de compressão variável...

No fim das contas, pode-se dizer sem medo de errar que a atual geração de motores bicombustível não se mostra tão versátil quanto o ciclo Diesel, notadamente o mais adaptável a combustíveis alternativos...

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Euro-5 e combustíveis alternativos: alguns aspectos a considerar

Com a implementação das normas de controle de emissões Conama P7, equivalentes à Euro-5, foram tomadas algumas medidas que, ironicamente, provocam mais restrições ao cenário dos combustíveis alternativos. Para controlar as emissões de óxidos de nitrogênio, consideradas o calcanhar-de-Aquiles do óleo diesel e de substitutivos como o biodiesel e óleos vegetais, ganharam evidência os métodos EGR (Recirculação de Gases de Escapamento) e SCR (Redução Catalítica Seletiva), cada um com vícios e virtudes específicos.

Com o EGR, com viabilidade restrita aos motores de injeção direta, e mais comum em veículos leves, o maior problema envolve a redução da temperatura na câmara de combustão proporcionada pela readmissão de uma porção de gases inertes e refrigerados do escapamento, incrementando a formação de material particulado (e por conseguinte consumindo mais combustível) e dificultando a combustão correta da glicerina ao usar óleos vegetais, induzindo à polimerização e deposição de resíduos nas camisas de cilindro, válvulas, sedes de válvula, pistões e anéis de segmento, além do risco de contaminação do óleo lubrificante, podendo acarretar danos mais severos ao motor. Assim, o uso de óleos vegetais puros, que poderia ser uma boa alternativa em localidades mais afastadas dos grandes centros onde a glicerina seria melhor aproveitada em aplicações industriais diversas, acaba cada vez mais marginalizado. Convém recordar que outros fatores também vinham contribuindo para uma menor aceitação do óleo vegetal puro como combustível, entre os quais pode-se destacar a atual prevalência da injeção direta sobre a indireta. No entanto, a injeção direta demonstra-se mais facilmente adaptável à operação com o etanol e outros combustíveis leves (mais restritos a uma aplicação em caráter emergencial). Nota-se também que o EGR, inicialmente direcionado a aplicações com ignição por faísca, é a opção adotada em motores do ciclo Diesel aptos à operação com etanol, como os oferecidos pela Scania em alguns modelos de caminhões e, principalmente, chassis para ônibus.

Num contraponto, o SCR foi desenvolvido especificamente para o ciclo Diesel e, como qualquer outro sistema de catalisador, baseia-se somente no pós-tratamento dos gases de escapamento, mediante injeção de uma solução aquosa de uréia conhecida comercialmente como Arla32, AdBlue ou DEF direto na carcaça do filtro de material particulado (DPF) para converter os óxidos de nitrogênio presentes em vapor d'água e nitrogênio livre. Os maiores inconvenientes são a disponibilidade ainda limitada da solução aquosa de uréia, que demanda reposição esporádica, bem como a necessidade de um reservatório específico a ser acrescentado ao veículo, e um eventual congelamento ou intensificação das perdas por evaporação em função da temperatura ambiente. Porém, oferece maior adaptabilidade a diferentes sistemas de injeção (direta ou indireta, mecânica ou eletrônica), não necessita reforços no sistema de refrigeração, apresenta resultados eficientes até mesmo nos motores Diesel refrigerados a ar, e não provoca aumento do consumo de combustível nem prejuízos significativos ao desempenho do veículo como o EGR. Apesar de não ter resultados tão significativos quando opera-se com etanol, constitui a solução mais adequada para conciliar o rigor da Euro-5 com a aptidão para o uso de uma maior variedade de combustíveis alternativos.

De um modo geral, uma flexibilização das normas Euro-5 para dispensar tanto o EGR quanto o SCR durante operação com combustíveis alternativos seria bem-vinda, considerando os benefícios ambientais já proporcionados pelos mesmos em comparação com o "petrodiesel"...

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Adaptação de motores Diesel em motos: esclarecendo algumas dúvidas

Não há, em termos absolutos, algum impedimento técnico para a adaptação de motores Diesel em motocicletas, apesar das absurdas restrições jurídicas ainda hoje em vigor no mercado brasileiro. No entanto, algumas dificuldades podem ser observadas, e servir como justificativa para a limitada participação do Diesel no segmento motociclístico...
O ponto mais crítico acaba sendo a limitação do espaço disponível no quadro para a montagem do motor. Considerando ainda a predominância de motores com um único cilindro nas motocicletas com cilindrada entre 125 e 400cc, as mais vendidas a nível mundial em função do baixo custo, é difícil encontrar motores Diesel com essas características que sejam minimamente adequados ao uso veicular, viabilizando a manutenção de uma velocidade compatível com a segurança no tráfego urbano e eventuais percursos rodoviários, visto que acabam mais direcionados a aplicações estacionárias/industriais e um motor de ignição por faísca apesar das desvantagens ainda tem custo de aquisição inferior, mesmo demandando manutenção mais constante (e por conseguinte mais onerosa).
Outra dificuldade é a carcaça do câmbio geralmente ser incorporada ao bloco do motor na maioria das motocicletas modernas, com poucas exceções como as Harley-Davidson, que em função do público-alvo muito apegado a tradições ainda preservam características técnicas mais rústicas.
Vale destacar que, por terem uma concepção mais pesada e fugirem ao conceito hoje usual de alta potência específica em faixas de rotação elevadas que predomina nas motos modernas, incluindo muitas concorrentes de origem japonesa que tentam imitar seu visual clássico, as Harley-Davidson seriam as motos mais indicadas para se adaptar um motor Diesel.

Ainda assim, as grandes vantagens do ciclo Diesel no segmento de viaturas militares justificaram até mesmo o investimento para que fosse desenvolvido um motor motociclístico de ciclo Diesel, com a carcaça do câmbio integrada ao cárter como na maioria das motos hoje disponíveis no mercado mundial. Hoje, apesar de todas as qualidades, permanece mais restrita aos Marines americanos...
Mas torno a ressaltar que, de um modo geral, não há impedimento técnico para motocicletas mais populares serem equipadas com motor Diesel. Para superar a limitação de espaço que prejudicaria a adaptação de um novo câmbio, pode-se recorrer até mesmo ao expediente usado na lendária Mobylette, cuja polia da embreagem centrífuga já fazia as vezes de um câmbio CVT com baixo custo e um layout compacto e bastante leve...

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Conversões clandestinas: um mecânico abre o jogo


Em meio às restrições ao uso de motores Diesel em alguns veículos de acordo com capacidade de carga e/ou tração, alguns motoristas insistem nas conversões ilegais para rodar com óleo diesel. O mecânico G.M., residente em Valparaíso de Goiás e com alguns anos de experiência nesse serviço, comenta o polêmico assunto nesta entrevista inédita...


Antonio: Como foi que se deu a decisão de fazer essas adaptações?

G.: No dia que um amigo meu que tinha uma Rural Willys 4X2 com motor de Opala 6 canecos me procurou, sabendo da minha experiência com motor de caminhão, querendo adaptar o cabeçote do Mercedes-Benz 1113 para poder rodar com óleo diesel sem ter que trocar o motor inteiro nem adaptar tração 4X4 [Nota do editor: adaptar tração 4X4 num veículo 4X2 ou reforçar para aumentar a capacidade de carga não são mais critérios aceitos para permitir a conversão para Diesel]. Eu já tinha visto essa gambiarra antes numas pick-ups antigas da Chevrolet e numa Caravan de funerária, mas nunca me interessei tanto, sempre preferi os motores Perkins do que essas gambiarras conhecidas como “motor misto-quente” e que costumavam dar muito problema com vazamento de óleo. Daí que eu comecei a me interessar mais, tentar resolver os problemas que iam aparecendo, mas foi quando eu comecei a usar aquelas juntas líquidas à base de silicone para lacrar focos de vazamento que eu peguei gosto pelo “misto-quente” e comecei a fazer mais vezes, mas nunca parei de mexer com motores que vinham de fábrica para rodar com Diesel. Na época eu já estava trabalhando na concessionária de uma marca japonesa que eu prefiro não citar o nome para não acabar expondo gente que tem medo de falar abertamente sobre esse assunto, mas de vez em quando aparecia algumas viaturas de embaixada com motor Diesel para fazer manutenção de rotina e entre os mecânicos mesmo nós ficávamos pensando em converter carros de brasileiro para o Diesel.


Antonio: Já fez alguma conversão dentro da concessionária?

G.: Já fiz algumas, mas sempre foi meio difícil. Antes de começar essa onda de injeção eletrônica os japoneses ainda faziam mais motores Diesel para aplicações leves com injeção indireta do que com injeção direta, que se por um lado são menos barulhentos e tem até quem diga que dão menos tremedeira por outro tem o consumo mais alto e a partida a frio mais sofrida. A uns meses atrás eu cheguei a encontrar um cliente antigo que ainda estava usando o mesmo carro que eu adaptei motor de uma caminhonete quando ainda era 0km a pelo menos uns 15 anos e até hoje é só alegria.


Antonio: Qual é a maior complicação associada às conversões de um carro pequeno da gasolina para o Diesel?

G.: Tirando algum problema com os sensores eletrônicos e o módulo do painel nos carros modernos a única complicação mesmo é a lei, já que é proibido. Se você reparar bem nos carros que tem hoje para venda, quase tudo já tem versão a diesel lá fora, então o serviço já fica mais fácil por já estar previsto no projeto os pontos de montagem dos coxins do motor. Mesmo se tiver que trocar tudo quanto é acessório se os originais não funcionarem direito, tem como botar tudo em ordem nem que seja na base de gambiarra. Sempre tem uma hora que o jeitinho brasileiro precisa entrar em ação...


Antonio: Que tipo de gambiarra é esse?

G.: Se tiver que trocar os relógios de fábrica por uns que funcionem sem aquela placa eletrônica e ligar as luzes do painel direto na “cebolinha” (interruptor), nós fazemos. De vez em quando tem que trocar alternador, bomba de direção hidráulica e em alguns modelos até o ar condicionado inteiro se for aqueles com controle digital. Mas agora com os simuladores usados em conversão para gás dá para mandar um sinal falso para a centralina da injeção e fazer ela ler como se o motor original estivesse mandando o sinal de que está funcionando em ordem. Fora isso, a coisa só aperta mais se tiver câmbio automático. Teve uma vez que eu precisei botar até câmbio automático de Chevette numa BMW velha daquelas que pagodeiro gosta...


Antonio: Câmbio automático atrapalha a conversão?

G.: O problema não é o câmbio, é o conversor de torque. Esse treco é como se tivesse duas hélices dentro de um pote redondo, lacrado e cheio de óleo dentro. Uma hélice é presa no virabrequim e a outra no eixo-piloto do câmbio. Quanto mais acelerar, a do motor vai dando pressão no óleo e empurra a outra com essa pressão. Só que como o motor a diesel gira mais devagar o conversor de torque tem que ser diferente e pegar a pressão antes. E nos câmbios novos com corpo de válvula eletrônico tem que mudar a programação e antecipar a troca de marcha. Os mais velhos de vez em quando acham que não dá por causa dos motores antigos que só desligavam no “estrangulador” (mecanismo para cortar a passagem do combustível na bomba injetora) ou matando na embreagem se der algum problema.


Antonio: Mesmo assim, compensa fazer tudo isso? Um kit GNV completo e montado num carro pequeno pode sair até 4 vezes mais barato que só o motor Diesel sem contar mão-de-obra e outras peças que precisa na adaptação...

G.: Compensa. Pesando os pró e os contra, o gás é uma pegadinha. Fica com um peso morto dentro do carro, que atrapalha mais do que ajuda. E quanto maior o carro, maior o cilindro para ter uma autonomia boa com o GNV. Não é nem tanto dono de carro pequeno que faz a adaptação, eu sou mais procurado por donos de carros médios que o povo justamente recomenda o gás como é o caso do Vectra e de uns importados velhos que compra o carrão pela pose por um preço menor que um popular 0km. Quanto maior e mais pesado, mais evidente a vantagem do Diesel. A economia que se faz com gás se gasta retificando motor e trocando suspensão e lona de freio mais cedo, e ainda tem a ignição elétrica que precisa de manutenção. Fora que o motor fica mais fraco mesmo se usar aqueles kits mais caros com um injetor por cilindro.


Antonio: Muita gente ainda tem preconceito com motor Diesel por causa da potência específica mais baixa...

G.: Na prática, o povão precisa mais do torque, e é aí que o Diesel dá um banho. Como já sai mais forte desde faixas de giro mais baixas, o Diesel muitas vezes dá umas puxadas melhor mesmo com menos potência. E como não tem aquele trambolhão lá atrás é aí que vai melhor mesmo...


Antonio: Como escolher o motor mais adequado para ser adaptado num determinado carro?

G.: Tem que ver o peso do carro e qual tamanho de motor era previsto no projeto original. No geral eu prefiro trabalhar só com motor de injeção direta e sem gerenciamento eletrônico, já que são mais fáceis de fazer os ajustes para passar no teste do Inmetro e às vezes se for necessário para ligar os sensores e dar sinal na centralina original se for o único jeito para manter a parte elétrica original funcionando sem erros. Eu uso mais motores da Volkswagen por terem força suficiente para a maioria dos carros que são proibidos de usar Diesel pela lei brasileira e ser fácil de montar um “misto-quente”, mas em carros maiores eu uso motor de alguma van. Geralmente o motor da Renault Master antiga com injeção mecânica fica perfeito, não é muito potente mas se dá conta de puxar uma nave daquelas tira leite de pedra num carro mais leve e mais aeróbico...


Antonio: Não seria “aerodinâmico”?

G.: É isso aí mesmo que eu quis dizer mas confundi a palavra. Mas na prática um sedan do tamanho do Omega consegue chegar perto dos 200km/h com esse motor sem ficar beberrão demais. Outro que fica um foguete é o Marea, um cliente meu tinha comprado um de leilão e na hora que viu que o motor original tinha sido todo esculhambado achou melhor trocar por um motor de Ducato. E diz ele que 200km/h na BR-101 indo visitar a parentada no Paraná é suave...


Antonio: Beleza então... Conversão feita, rodando no diesel, mas e agora? Como passar numa inspeção veicular ou não chamar a atenção da polícia numa blitz?

G.: Daí depende. Tem quem contrata algum despachante que já conhece os esquemas da corrupção no Detran, registra em outro estado onde a fiscalização é mais frouxa e depois tenta transferir, tem doido até que entra na justiça pedindo liminar. Eu prefiro fazer por outros esquemas que não envolvem tanta pilantragem, mas é melhor deixar quieto senão vão tentar achar um jeito de me pedir propina...


Antonio: Já pagou propina alguma vez?

G.: Não, graças a Deus. Eu não sou corrupto, faço o meu trabalho limpo sem atrapalhar ninguém, e tento não fazer alarde que é para os corruptos não ficarem de olho grande em cima. Até já chegaram a me pedir propina para liberar documentação de carro de cliente, mas eu prefiro gastar mais montando um esquema técnico do que dar dinheiro para um filho da puta que não faz por merecer.


Antonio: Mas é fácil esse truque para registrar sem problemas?

G.: Depende do humor do funcionário que fizer a vistoria. O motor ainda vai fazer barulho, então chama atenção mesmo. Eu já tive que explicar algumas vezes que o barulho era o mesmo de um motor de ignição por faísca “batendo pino” (apresentando pré-ignição, quando o combustível não resiste à compressão e inflama antes da centelha ser gerada na vela), mas às vezes se o sujeito dormiu no sofá ou teve que levar a sogra na missa fica mais difícil, eles ficam procurando pelo em ovo para não liberar o documento, que não vai constar Diesel como combustível mas o importante é o número do motor ficar vinculado ao veículo. O importante na hora é manter a calma, não falar demais e se for o caso deixar as explicações por conta do mecânico responsável pela adaptação, ou então o despachante que se entenda com os corruptos...


Antonio: Mas alguma dica em especial?

G.: Tem que ser o mais discreto possível, não pode dar muita bandeira para não se encrencar. Tem que sempre manter o motor bem regulado tanto no dia do teste no Inmetro quanto rodando normalmente na rua, sem soltar aquela fumaceira preta que chama atenção logo de cara e na prática é desperdício de combustível. E não pode esquecer o óbvio, que é não deixar nenhum sinal muito descarado que o motor é a diesel. Logotipos como aqueles TDI da Volkswagen, TDCi da Ford, HDi da Peugeot tem que ser tirados daquelas capas plásticas que tem ido por cima da tampa de válvula nos motores novos. Mas teve uma vez que eu vi um doido chegar na oficina credenciada do Inmetro com um motor MWM Sprint 4.07 TCA de S10 sem tirar os emblemas e esfregar na cara do fiscal um catálogo antigo e raro mostrando que a MWM fez motor a álcool para justificar a adaptação numa minivan importada que eu não lembro o modelo agora. Só que esses motores a álcool da MWM eram da série 229 e não tinham nada a ver com o da S10.


Antonio: Deseja fazer alguma consideração final?

G.: Mandar um recado para os políticos. É hora de pensar um pouco no povo e acabar com essa proibição. Hoje tem o Diesel S-50 que é mais limpo que a gasolina, tem o biodiesel, até etanol já tem doido usando em caminhão nas fazendas de cana. Parar por falta de combustível eu acho difícil que pudesse acontecer com o Diesel liberado, já que na hora do aperto teria como recorrer a outras alternativas como óleo de cozinha velho, óleo lubrificante de motor usado, álcool, querosene, e por aí vai. Mas enquanto não liberam, vai ter quem faça, do mesmo jeito que hoje tem quem venda maconha e crack mesmo sendo proibido. O que me incomoda é que eu sou tratado como bandido se eu aparecer publicamente, me enquadrariam em crime contra a economia popular por causa da arrecadação menor de imposto por conta do uso de um combustível mais barato e que ainda rende mais, enquanto o tráfico de drogas e o jogo do bicho que não pagam 1 centavo de imposto não interferem tanto no caixa 1 são tratados com vista grossa e seguem enchendo o caixa 2 de muitos políticos. Não é difícil achar deputado que vem para Brasília desfilar de terno e gravata durante a semana mas sempre que tem um tempinho está enrolando cigarro de maconha junto com puta e com travesti na base eleitoral ou então recolhendo arrego em banca de jogo do bicho.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Dia do Bombeiro

Aproveitando a celebração do Dia Nacional do Bombeiro, vale destacar a importância dos motores Diesel nas viaturas. Se na época em que esse caminhão Mulag foi produzido na Alemanha o peso ainda era um problema que limitava a aplicação desse tipo de propulsor mesmo em alguns veículos pesados, levando o modelo a adotar originalmente um 3-cilindros de ciclo Otto, hoje o Diesel predomina nessa atividade...

É importante que uma viatura tenha condições de enfrentar algumas condições ambientais mais severas, onde o Magirus-Deutz da foto acima se destaca pela tração 4X4, e também em função do motor refrigerado a ar.
Outro fator relevante é o peso total de um veículo de combate a incêndios, sobretudo pela grande quantidade de água (ou eventualmente espuma) transportada, enquanto num veículo de resgate a grande quantidade de ferramentas é outro fator que contribui para um aumento do peso, como no Mercedes-Benz L911 abaixo, e consequentemente um torque elevado característico do ciclo Diesel é bastante apreciado tanto para ter uma resposta mais rápida quanto para vencer aclives com mais facilidade. Vale destacar que, quanto maior a faixa de peso, mais evidente a vantagem do Diesel ao equacionar desempenho e eficiência energética...

Também é interessante destacar o aspecto da segurança: pelo fato do óleo diesel ser menos volátil, não gerando uma atmosfera explosiva nem entrando em ignição com uma simples faísca, permite uma aproximação mais segura junto ao foco de incêndio, facilitando o combate e o rescaldo.
Também é conveniente notar a natureza militar das corporações de bombeiros brasileiras. Nada mais lógico, portanto, que a padronização do Diesel que abrange diferentes viaturas militares seja extensiva aos bombeiros, principalmente ao se recordar dos riscos envolvidos no combate a incêndios...
O fato de em algumas localidades o Corpo de Bombeiros também operar com ambulâncias é outro aspecto a se lembrar, considerando as vantagens específicas do Diesel nessa aplicação particularmente crítica...

domingo, 1 de julho de 2012

Diesel em automóveis de luxo: nobre economia...

Não é de hoje que o ciclo Diesel vem demonstrado incontestáveis vantagens nos mais variados segmentos do mercado automobilístico mundial, e naturalmente isso acaba incluindo também os modelos de maior prestígio.

Conquistando opiniões favoráveis inicialmente em utilitários, como os Land Rover Range Rover, constituindo uma excelente alternativa para reduzir o exagerado consumo nessa classe de veículos habitualmente mais pesados que um automóvel de concepção tradicional, hoje o ciclo Diesel atingiu níveis de refinamento que diminuíram a desvantagem no NVH (Noise, Vibration and Harshness - ou Ruído, Vibração e Aspereza) a ponto de competir de igual para igual com a ignição por faísca a nível de conforto. Considerando também a sensível melhoria na densidade de potência e torque, cada vez mais se apresentam como uma alternativa mais inteligente a sistemas híbridos como o usado em algumas versões do Lexus RX, sem sacrifícios ao espaço do habitáculo nem à capacidade de carga.

Um caso bastante peculiar é o das limousines: devido a todo o peso agregado às mesmas, tanto o motor quanto a transmissão são exigidos com mais intensidade. Não é de causar espanto que muitos veículos dessa categoria adotem motores com farta disponibilidade de torque...
Observando especificamente o caso do Lincoln Town Car, onde o motor Triton V8 de 4.6L mesmo com 239hp, quase 20% a mais do que os 203hp de um Cummins MaxPower de 3.9L usado nas últimas versões brasileiras da Ford F250, tem um torque aproximadamente 40% inferior ao Cummins, e deslocado a faixas de rotação mais elevadas. Considerando a possibilidade de usar uma relação de diferencial levemente mais longa, é possível compensar a diferença na potência sem sacrificar a capacidade de transposição de aclive devido ao torque mais amplo e disponibilizado já a baixos giros. Vale lembrar que um turbodiesel de 4 cilindros moderno, como o MaxPower, tem um nível de ruído bastante próximo ao dos atuais V8 a gasolina.

De um modo geral, o consumidor europeu sempre se mostrou mais aberto às possibilidades oferecidas pelo Diesel que o americano, o que pode ser observado pela grande tradição que a Mercedes-Benz consolidou e hoje a coloca em evidência como uma das mais importantes fabricantes de motores Diesel leves no mundo. Dos sedans com versões simplificadas para atender ao serviço de táxi, logo a opção por motores Diesel passou a atender plenamente a particulares ávidos por manter um bom nível de conforto sem abrir mão da economia. Em seguida, com o auxílio do turbocompressor, teve início o processo de evolução que vem culminando com as vantagens no desempenho hoje obtidas com o Diesel...

Um exemplo interessante dessa grande importância da Mercedes-Benz é o motor OM616 de 4 cilindros, 2.4L e injeção indireta, que ainda conquista admiradores em função da aptidão ao uso de óleos vegetais como combustível, e mesmo nas versões mais antigas com modestos 64cv apresentava-se suficiente para mover dignamente um elegante sedan como o 240D, e em versões posteriores com 72cv era uma opção confiável para veículos utilitários como o MB-180D, outrora popular no exigente segmento de ambulâncias.

Na prática, por mais que algumas idéias equivocadas ainda sejam tomadas por alguns como verdade, o ciclo Diesel mostra-se uma opção bastante acertada mesmo para consumidores que não dispensam o melhor em elegância e sofisticação.