quarta-feira, 18 de abril de 2018

6 alternativas mais coerentes que restrições ao Diesel e um eventual sucateamento de veículos com esse tipo de motor

Já não é de hoje que o Diesel conquistou seu espaço nos principais mercados automobilísticos mundo afora, sobretudo pela robustez e eficiência que o tornaram desejável não só nas aplicações utilitárias mas também em automóveis. Naturalmente, em mais de 60 anos de evolução, a rusticidade da época do Mercedes-Benz 190D "Ponton" W121 deu espaço a uma predominância de recursos como o turbo, a injeção direta e o gerenciamento eletrônico que alçaram o Diesel de uma imagem de lentidão menos inadequada a um trator ou a um táxi, a ponto de hoje ocupar lugar de destaque devido ao desempenho que já não fica tão desfavorecido diante dos motores de ignição por faísca em modelos de luxo mais modernos como o Mercedes-Benz GLE 350d. Também foram agregados alguns dispositivos para o controle das emissões poluentes, desde o EGR e o SCR até o filtro de material particulado (DPF) que também contribuem para que constituam uma opção mais "sustentável" em aspectos gerais. Porém, há algumas articulações políticas com interesses obscuros visando tornar o Diesel menos competitivo, o que não apenas vai contra a preferência do consumidor em diversos segmentos dos mercados de países como Espanha e Portugal mas também contraria o bom-senso. Afinal, a maior adaptabilidade ao uso de combustíveis alternativos ainda tem seu valor para que uma conciliação entre desempenho, economia de combustível e preservação ambiental se mantenha presente.
Em meio a planos tão absurdos como os que estão sendo propostos em nome de premissas falsamente "ecológicas" com um viés meramente socialista não só em cidades como Madri, Paris e Londres mas também em São Paulo (por iniciativa de um adepto do mesmo partido que espoliou a Petrobras) para restringir a circulação de veículos com motor Diesel, é possível apontar ao menos 6 alternativas mais coerentes não só no tocante à hoje tão falada "sustentabilidade" mas também pelo respeito à liberdade de escolha que deve caber aos usuários de veículos e equipamentos especiais, considerando ainda os graus de adequação a diferentes estágios tecnológicos a serem observados na frota circulante.
Biodiesel e uso direto de óleos vegetais como combustível veicular: com os devidos cuidados para não sofrer com interferências indesejáveis no funcionamento de dispositivos de controle de emissões, é fundamental que o combustível alternativo a ser escolhido seja adequado às características. Pode-se tomar como referência as furgonetas Citroën C15 e Berlingo (1ª geração), tendo em vista que ambas usaram ao menos um motor em comum que foi o Peugeot DW8 de 1.9L naturalmente aspirado e com injeção indireta, perfeitamente adequado a conversões para operar com óleos vegetais brutos como combustível alternativo. Homologado nas normas Euro-3, o motor DW8 foi oferecido no mercado europeu desde o ano 2000 até 2007, e já enfrenta restrições à circulação ao menos em Paris, enquanto o plano em vias de ser efetivado em Madrid é restringir a partir de 2025 circulação de veículos com motor Diesel produzidos antes de 2006 e os a gasolina anteriores ao ano 2000 já faria com que o C15 produzido até 2005 em Vigo seja arbitrariamente forçado a um sucateamento. Já no caso do Berlingo, que contou também com motores já dotados de turbocompressor e injeção eletrônica common-rail das séries DV e DW ainda hoje em uso combinados a diferentes configurações de dispositivos de controle de emissões, seria até tentador usar o biodiesel ao menos em versões que não tenham sido dotadas do filtro de material particulado que pode apresentar problemas com a vaporização do combustível durante o processo de autolimpeza (ou "regeneração") quando se usa o biodiesel ao menos misturado em grandes proporções ao óleo diesel convencional. Portanto, uma restrição arbitrária baseada tão somente na idade do veículo e certificação de emissões pode colocar a perder uma excelente opção não apenas para reduzir a dependência por combustíveis fósseis provenientes de regiões conflagradas mas também para promover a estabilização biológica mediante o fechamento dos ciclos do carbono e do nitrogênio resultantes do uso de biocombustíveis...
Upgrades nos motores originais quando se fizer necessária uma retífica: nesse caso, como alguns motores tem o mesmo projeto básico mantido em diferentes gerações do mesmo veículo a exemplo do DV6 usado na Citroën Berlingo, é possível recorrer desde a substituição de componentes como o cabeçote, o turbo e o resfriador de ar (quando aplicáveis) até ajustes eletrônicos no módulo de gerenciamento do motor. Ao menos na Espanha, que tem uma frota com idade média de 12 anos e portanto já abrangida por uma obrigatoriedade do gerenciamento eletrônico dos motores de automóveis e utilitários que levou à proliferação do sistema common-rail, já seria de se esperar que tal medida se torne efetiva, especialmente no tocante à redução dos óxidos de nitrogênio (NOx) cuja emissão é historicamente uma das deficiências inerentes ao ciclo Diesel junto com a emissão de material particulado. Naturalmente, para não ser apenas mais uma despesa sem perspectiva de retorno do investimento, faria mais sentido que tais procedimentos fossem efetuados somente quando algum serviço mais complexo como uma retífica de motor se fizesse efetivamente necessário.

Integração de resíduos subaproveitados à cadeia produtiva de biocombustíveis: se hoje ainda é pouco explorado o uso direto do óleo saturado de frituras descartado dos food-trucks em substituição ao óleo diesel, assim como o potencial dos resíduos do abate de animais de corte e do beneficiamento industrial de carnes ou o lixo orgânico e os dejetos extraídos das fossas sépticas durante a limpeza das mesmas que poderiam servir para a produção do biogás/biometano, não deixam de ser opções viáveis para promover não apenas uma menor dependência pelo óleo diesel convencional mas também para agregar valor a subprodutos cujo valor comercial pode ser considerado desprezível em alguns casos. Levando em conta ainda as perspectivas de redução nas emissões tanto de NOx quanto de material particulado que teoricamente serviriam de pretexto para os ecologistas-melancia estrangeiros fazerem o cerco ao Diesel, além das deficiências brasileiras no saneamento básico que de certa forma revelam um potencial energético subaproveitado, faz muito mais sentido que se fomente uma suplementação da demanda por óleo diesel convencional em veículos diretamente envolvidos nessas atividades cada vez mais imprescindíveis para garantir a qualidade de vida nas metrópoles modernas ao invés de simplesmente impedir o acesso ao Diesel em outros segmentos onde não haja tanta facilidade para levar adiante uma efetiva substituição do combustível mais tradicional.

Downsizing: tanto no tamanho do motor como na Ford F-350 Euro-5 quanto no tamanho e peso dos veículos exemplificado pelas vans Mercedes-Benz Sprinter blindadas que a empresa de transporte de valores Brink's usa ao invés de um carro-forte tradicional em algumas operações, há diversos fatores que podem levar a incrementos na eficiência geral do veículo. Por mais que no caso dos motores ainda persistam questionamentos em torno de efeitos que tanto o downsizing quanto o downrevving possam proporcionar desde a dirigibilidade em condições de terreno irregulares até uma eventual facilidade para implementar certos métodos de controle de emissões com um impacto reduzido sobre a capacidade de carga, quando se toma por referência veículos com um porte mais contido observa-se uma maior facilidade para manobrar em espaços menores e uma menor inércia a ser vencida durante as frequentes acelerações no anda-e-para do trânsito urbano, de certa forma favorecendo a economia de combustível.
Diminuir a permanência dos veículos com o motor ligado na marcha-lenta: esse é um aspecto que pode ser muito crítico em operações como o transporte de valores no qual a prontidão para sair de um local conflagrado é primordial, como se observa pela permanência do motor ligado durante todo o tempo que o veículo esteja em efetiva operação. Nesse caso, uma eventual transição para o sistema elétrico de 48 volts que poderia substituir tanto os de 12 volts usados em automóveis quanto o de 24 volts frequentemente usado em caminhões, ônibus e alguns veículos especiais seria um bom pretexto para incorporar algumas características de veículos híbridos que permitam ao menos um desligamento do motor durante as paradas, que não apenas reduziria uma parte considerável das emissões nesse serviço mas também poderia valer-se da frenagem regenerativa para intensificar o freio-motor e prolongar a durabilidade dos freios de serviço.

Acionamento elétrico ou eletro-hidráulico de implementos em substituição ao uso de tomada de força (PTO - power takeoff) mecânica ou hidráulica: outro recurso que poderia ser beneficiado por um uso do sistema elétrico de 48 volts que ainda vem sendo proposto no segmento de veículos leves, que seria refletida tanto em menores emissões poluentes quanto por um funcionamento mais silencioso, tendo em vista que o acionamento de dispositivos como rampas em guinchos ou compactadores em caminhões coleta de lixo poderia ocorrer sem a necessidade de ficar acelerando o motor com o veículo parado apenas para que uma tomada de força (hoje mais frequentemente montada no câmbio) seja acionada. Naturalmente, caso a(s) bateria(s) estivesse(m) com carga baixa, aí sim seria inevitável que o motor se mantivesse em marcha-lenta ou numa "marcha-lenta alta" (high-idling), mas ainda seria menos frequente e com menor intensidade que o habitual hoje para uso de implementos 100% mecânicos ou hidráulicos.

sábado, 14 de abril de 2018

Uma rápida reflexão sobre as novas metas de redução de emissões propostas na mais recente reunião da Organização Marítima Internacional

Após 10 dias de reunião, esse mês os 173 países-membros e 3 associados da Organização Marítima Internacional (IMO - International Maritime Organization) definiu metas para redução de emissões de carbono do transporte marítimo até 2050 para um valor 50% abaixo do observado em 2008, quando registrou-se um recorde histórico de emissões no transporte comercial marítimo. O tratado, que vale para todo o transporte de cargas e passageiros com peso superior a 5000 toneladas, exclui apenas embarcações militares. Alinhada também às metas estabelecidas pelo Acordo de Paris em 2015, prevê a eliminação das emissões provenientes do uso de combustíveis fósseis até o fim do século, abrindo espaço não só para algumas tecnologias hoje pouco exploradas mas também para os biocombustíveis.

Embora a proposta inicialmente apresentada fosse zerar as emissões até 2050, países como o Brasil e Argentina, Panamá, Índia e até a Arábia Saudita propuseram um prazo maior para adequação. É de se esperar que os países subdesenvolvidos/em desenvolvimento como é exatamente o caso brasileiro, e outros que dependem da exportação de commodities energéticas a exemplo da Arábia Saudita, não tenham o mesmo domínio tecnológico sobre algumas fontes de energia alternativas tratadas como "limpas", bem como uma aplicabilidade das mesmas para fins de mobilidade que se observa na Europa com relação à eletricidade. Naturalmente, convém levar em consideração outros aspectos como a severidade do ambiente marinho e o impacto sobre a durabilidade de certos equipamentos quando expostos à névoa salina por exemplo, e o impacto que uma densidade energética limitada de alguns tipos de bateria possa acarretar sobre a capacidade de carga paga, além de uma eventual ineficiência de alguns métodos de geração de energia elétrica que seriam mais adequados a aplicações estacionárias em terra firme.

Dentre as motorizações normalmente usadas em navios modernos, se destacam os motores do ciclo Diesel 2-tempos e as turbinas a gás, cada qual com seus respectivos desafios no tocante à eficiência térmica e adaptabilidade a combustíveis alternativos. Nesse sentido, cabe destacar os motores com pistões opostos cujos principais desenvolvimentos são muito antigos mas que ainda hoje são muito usados em embarcações militares americanas, inclusive servindo como unidade de força alternativa em submarinos nucleares. Um exemplo destacado desse tipo de motor é o Fairbanks-Morse Model 38 8-1/8 que, além de se manter numa posição de liderança em aplicações militares, no uso civil chegou a ser adaptado com sucesso para funcionar com gás natural junto ao óleo diesel convencional ou aos outros óleos combustíveis pesados aplicáveis. Naturalmente, o eventual uso de combustíveis gasosos em embarcações ainda é um tema controverso, embora navios de transporte de gás natural liquefeito não deixem de consumir uma parte do produto que seria perdida por evaporação e ventilada por meio de respiros diretamente na atmosfera. Caberia ainda valer-se de uma integração com outras possíveis fontes de energia como o biogás/biometano, que em navios de cruzeiro poderia ser extraído das águas servidas antes que sejam lançadas ao mar, o que viria a reduzir o risco de contaminações por espécies de microorganismos estranhos a determinadas áreas pelos mares e oceanos afora.

A bem da verdade, por mais que os motores Diesel 2-tempos de um modo geral sejam considerados obsoletos na maioria das aplicações, estão encontrando um ressurgimento em diversos segmentos, até mesmo na aviação leve, devido à relação potência/peso mais elevada. No caso específico dos motores com pistões opostos, a menor área para perda de energia por irradiação de calor proporciona notáveis ganhos na eficiência geral, não apenas em comparação aos outros Diesel 2-tempos mas também aos Diesel 4-tempos que até tem algum uso mesmo em grandes navios. Embora a emissão de material particulado tenha sido historicamente mais crítica nos Diesel 2-tempos por uma combinação entre a qualidade inferior dos combustíveis disponíveis e o processo de combustão mais rápido que às vezes não possibilitava uma queima mais completa, novos desenvolvimentos no tocante ao gerenciamento dos motores e outros aperfeiçoamentos nos fluxos de escapamento e preenchimento dos cilindros com ar fresco (scavenging) tendem a diminuir tal problema, principalmente caso venham a estar integrados ao uso de combustíveis mais limpos e eventualmente destacando-se os renováveis. Como nos grandes navios é habitual o uso de um óleo combustível pesado que requer aquecimento para se manter numa viscosidade adequada, já não seria um grande empecilho recorrer por exemplo aos óleos vegetais brutos ou mesmo a sebo de origem animal como combustíveis alternativos.

No âmbito das turbinas a gás, que apesar do nome funcionam também com combustíveis líquidos, há uma vantagem no tocante à recuperação de energia por vapor que pode se tornar um suprimento de força motriz para geradores de eletricidade a bordo, de certa forma compensando a eficiência térmica inferior à de motores convencionais a pistão, ou mesmo suprindo com o calor necessário para aquecer previamente um óleo combustível pesado. Porém, nesse caso seria necessário usar um combustível mais leve para a partida, o que não deixa de guardar certa semelhança com os carros antigos movidos exclusivamente a etanol e os primeiros "flex" que ainda traziam um tanquinho auxiliar para partida a frio. De qualquer modo, além do tamanho, outra possível vantagem das turbinas a gás para uso em grandes embarcações seria uma relativa simplicidade. Cabe salientar que, além do(s) compressor(es) e da(s) turbina(s) poderem guardar alguma semelhança com os que se usam num turbocompressor, as câmaras de combustão numa turbina a gás não tem peças móveis, portanto apesar da exposição das mesmas e da(s) turbina(s) a altas temperaturas acabou-se favorecendo a impressão de que a manutenção não seria tão complexa mesmo nas turbinas a gás com compressor axial que são mais comuns hoje em comparação às que ainda recorriam a compressores centrífugos (mais parecidos com o de um turbo comum).

É natural que se busque por uma solução para a questão das emissões provenientes do transporte marítimo, que representam 2% do total de carbono lançado na atmosfera e equivaleriam a uma hipotética 6ª posição caso toda a frota mundial de navios correspondesse às emissões de um único país. No entanto, é evidente que a navegação constitui uma grande força para a economia mundial e que há uma grande dependência do intercâmbio comercial por esse modal de transporte em função do custo menor em comparação ao frete por via aérea. Portanto, ao invés de tentar implementar medidas um tanto mirabolantes e que dificilmente se tornariam economicamente viáveis para reduzir a atual dependência pelo serviço de armadores estrangeiros por parte dos países com uma marinha mercante sucateada, vale mais a pena considerar alternativas adequadas ao atual cenário tecnológico dos sistemas de propulsão naval.

quarta-feira, 11 de abril de 2018

Sistemas elétricos de 48 volts: uma nova perspectiva para assegurar a viabilidade futura do Diesel

Veículos de gerações mais recentes tem apresentado uma maior demanda por energia para atender aos inúmeros acessórios de conforto e conectividade que vem sendo incorporados, e de certa forma ainda há de se considerar a maior complexidade inerente a sistemas de gerenciamento eletrônico de motor e transmissão mesmo quando não exista qualquer auxílio elétrico para a tração. O desafio não é apenas no âmbito da comodidade, tendo em vista também metas de redução de consumo de combustível e as regulamentações de emissão cada vez mais restritivas, e nesse contexto qualquer carga sobre o motor e/ou periféricos acionados pelo mesmo como é o caso do alternador tornam-se críticas, bem como se lançam olhares sobre as eventuais melhorias que possam ser feitas no âmbito da eficiência. Assim, os sistemas elétricos de 48 volts passaram a ganhar relevância já a partir do fim de 2001 após anúncio da Toyota de que uma versão "mild hybrid" do sedan full-size Crown seria o primeiro modelo produzido em série a lançar mão desse recurso a partir do ano seguinte.

Apesar de não ter feito muito sucesso inicialmente, talvez pela expectativa que já se começava a criar em torno dos híbridos no tocante à possibilidade de contar com a tração somente elétrica em algumas situações, não se pode ignorar que o sistema elétrico de 48 volts tenha continuado a apresentar boas perspectivas para ganhar espaço no mercado automobilístico mundial por diversos fatores, inclusive o custo de implementação menor e a facilidade de integrar a plataformas com pouco espaço para incluir uma bancada de baterias tracionárias. A maior proporção entre a potência elétrica por peso e volume do gerador (geralmente uma unidade integrada composta por motor de arranque e alternador) torna-se um atrativo a mais, permitindo suprir de forma mais eficiente dispositivos com uma maior demanda de energia como compressores de ar condicionado, direção com assistência elétrica e eventualmente até compressores de ar elétricos a serem incorporados para suprir um fluxo de ar mais constante aos motores dotados de turbocompressor durante a partida ou acelerações súbitas visando mitigar mais rapidamente o "turbo-lag" que antes parecia simplesmente impossível de contornar. No caso das novas gerações de motores Diesel veiculares, para as quais seria simplesmente impossível cumprir as normas de emissões sem o auxílio da indução forçada, uma eliminação do turbo-lag é desejável até mesmo para que se possa manter um controle mais preciso das emissões de óxidos de nitrogênio (NOx), tendo em vista que também disponibiliza mais cedo um maior fluxo de gases de escape que possa ser suprido para recirculação através do sistema EGR. Não se pode esquecer que, durante uma aceleração mais intensa, um overboosting momentâneo por meio do compressor elétrico facilita uma combustão mais completa, com menos fuligem que possa vir a ser retida nos filtros de material particulado (DPF - Diesel Particulate Filter), e portanto a frequência dos ciclos de "regeneração" pode ser diminuída. A aposta tanto de empresas como a Audi que apresentou em 2016 o protótipo RS5 TDI Concept que incorpora o "turbo elétrico" (que na verdade é só um compressor, tendo em vista que não é acionado por uma turbina como o turbocompressor convencional) quanto de sistemistas e consultorias de engenharia como a FEV Europe GmbH levam a crer que o futuro é promissor...

O uso mais frequente desses sistemas ainda tem sido em veículos com motor de ignição por faísca, com destaque para modelos de algumas divisões da General Motors como o Chevrolet Malibu e a 2ª geração do Saturn Vue que era idêntica à Chevrolet Captiva Sport mexicana, embora só em versões apresentadas como híbridas por recorrerem ao sistema BAS-Hybrid com um conjunto de alternador e motor-de-arranque que podia não só gerar energia mas também auxiliar na movimentação do veículo e hoje é tratado pela empresa como eAssist. Para quem teme uma eventual dificuldade para encontrar acessórios compatíveis com os sistemas elétricos de 12 volts hoje predominantes nos veículos, cabe lembrar que com os sistemas de 48 volts ainda há um inversor e uma bateria de 12 volts para suprir outros itens como rádios e centrais multimídia, luzes, tomadas de 12 volts antigamente usadas como acendedor de cigarros e outros componentes compatíveis com modelos já em produção. Portanto, ainda que seja um ilustre desconhecido para grande parte dos consumidores e possa vir a exigir uma atualização por parte de profissionais de manutenção automotiva, o sistema elétrico de 48 volts não deixa de oferecer boas perspectivas futuras também para o Diesel.

sexta-feira, 6 de abril de 2018

Observações sobre o gás natural e os motores de ignição por faísca com injeção direta

A chegada de motores de ignição por faísca com injeção direta ao mercado brasileiro em segmentos tão diversos como os subcompactos e os sport-utilities traz novos desafios na conversão para gás natural. Como se não bastassem alguns desleixos ao fazer esse serviço em motores mais simples equipados com injeção eletrônica multiponto sequencial, permanece frequente a instalação de sistemas incompatíveis com a tecnologia original do veículo a ser adaptado, desde a instalação de kits gerenciados eletronicamente mas monoponto até o uso dos kits não-gerenciados que mesmo em veículos produzidos a partir de '97. Nesses casos pode haver problemas como discrepâncias na de mistura ar/combustível entre os cilindros ou o congelamento do coletor de admissão (acontecia muito no Toyota Corolla AE102 que um tio meu teve, com kit não-gerenciado), mas em motores de injeção direta podem haver outras consequências igualmente indesejáveis não só em âmbito técnico mas também político.

Em veículos equipados com catalisador, que tornou-se obrigatório a partir de '97 e teria sido um dos motivos para a Chevrolet encerrar a produção do Monza ainda em '96, até as mínimas irregularidades na mistura ar/combustível podem interferir no correto funcionamento desse dispositivo. Não apenas a relação inversamente proporcional entre um enriquecimento da mistura e a temperatura dos gases de escapamento, de modo que uma maior demora para aquecer o catalisador devido à mistura demasiado rica prolonga a chamada "fase fria" imediatamente após a partida quando os índices de emissões de gases como o venenoso monóxido de carbono (CO) e os óxidos de nitrogênio (NOx) são superiores ao encontrado em operação normal após a estabilização da temperatura operacional, ou mesmo danos que o superaquecimento por mistura muito pobre possa causar no catalisador, é importante levar em conta ainda os inconvenientes que uma emissão excessiva de hidrocarbonetos crus podem causar. Não se pode desconsiderar os riscos de uma queima atrasada desses restos de combustível ocorrer no catalisador quando este já tenha acumulado temperatura suficiente devido aos ciclos de combustão anteriores, não apenas sacrificando a eficiência desse dispositivo de controle de emissões mas ainda podendo trazer desconforto aos passageiros e danificar bagagens devido à irradiação anormal de calor proveniente do catalisador superaquecido (já passei por uma situação semelhante em um carro que não era convertido para gás, um Corsa sedan 2001, em função de uma falha na bobina de ignição que deixou de mandar centelha para 1 cilindro e o injetor do mesmo não parou de debitar a gasolina). Portanto, o ideal em carros com catalisador é recorrer ao kit multiponto (popularmente conhecido como "pressão positiva"), que em conversões aprovadas pela General Motors do Brasil durante a década de '90 chegou a ser usado ainda na 3ª geração até em modelos originalmente equipados com injeção eletrônica monoponto para o combustível líquido original (gasolina ou etanol). Lembrando que para os veículos "flex", o kit de 5ª geração é o mais indicado.

Já nos motores de injeção direta, há outros aspectos a se considerar mesmo quando for usado o kit de 5ª geração, que tem os bicos injetores do gás geralmente instalados no coletor de admissão. Algumas convertedoras no Rio de Janeiro, atendendo à demanda pelo serviço em função não apenas dos preços da gasolina mas principalmente do desconto no IPVA, fazem frequentemente essa gambiarra mesmo com a desvantagem de ainda necessitar da injeção de uma pequena quantidade do combustível original (entre 15 e 25% do que seria normalmente usado) para os bicos injetores originais manterem-se refrigerados. Na prática, o cliente não vê toda a economia que seria de se esperar pelo uso de um combustível mais barato. Considerando ainda o cruzamento de válvulas entre a fase de escape e a admissão para o ciclo subsequente, que interfere na refrigeração das válvulas e respectivas sedes e também do cabeçote como um todo, a passagem de mistura ar/combustível quando se usa um kit de conversão para gás natural de 5ª geração num motor com injeção direta retira uma quantidade maior de calor que o ar sem mistura com o gás natural, e acaba diminuindo portanto a energia térmica disponível para auxiliar na adequada vaporização da gasolina e/ou no etanol que ainda sejam injetados. Logo, deixa de ser tão efetiva a possibilidade de mitigar a aproximação que vinha ocorrendo entre as emissões de material particulado dos motores de injeção direta com ignição por faísca e os Diesel, que sempre foram historicamente desfavorecidos nesse aspecto.

Infelizmente, até mesmo alguns dos mais tradicionais fornecedores de kits de conversão para gás natural ainda anunciam uma gambiarra parecida como sendo efetivamente de 6ª geração pelo simples fato do sistema suplementar de injeção do gás natural integrar-se ao módulo de controle eletrônico original do motor a ser adaptado. Embora o gás natural seja injetado sempre na fase de vapor, o que pode dificultar que se use os mesmos injetores destinados ao combustível líquido, ao menos desde 2008 a Volkswagen vinha trabalhando em motores movidos tanto a gasolina quanto gás natural com injeção direta para ambos os combustíveis, culminando na linha TGI já disponível em alguns países europeus para modelos como o Polo e o Golf, além de similares de outras marcas do grupo como a SEAT também contarem com a opção. Outro caso que merece destaque é o da Opel, que desde a época que ainda era uma divisão da GM já desenvolvia soluções voltadas ao gás natural, contemplando ainda o biogás/biometano que é bastante difundido na Alemanha, e hoje recorre à injeção direta para usar o gás natural no motor GM SGE de 1.4L dotado de turbocompressor na atual geração do Opel Astra (K), recorrendo a um tanque de gasolina menor que o das versões normais apenas para emergências ou até chegar a um posto com o gás natural ou biogás/biometano. Vale lembrar que o mesmo motor usado no Astra a gás europeu também equipa a atual geração do Chevrolet Cruze comercializado no Brasil, embora para os brasileiros ainda reste apenas fazer gambiarra ao invés de contar com uma solução efetiva e mais de acordo com os interesses e necessidades dos usuários.

Recorrer a um combustível líquido para ser usado junto ao gás natural é mais frequente quando se trata da adaptação em veículos com motor Diesel, sendo no entanto vista por alguns potenciais usuários como uma deficiência por não substituir completamente o combustível original do veículo. Mas apesar desse eventual empecilho, ainda pode firmar-se como uma boa opção para reduzir a atual dependência pelo óleo diesel convencional (ou substitutivos como o biodiesel) em serviços como a coleta de lixo e nos caminhões limpa-fossa, com vistas à possibilidade de usar o biogás/biometano a ser extraído de resíduos orgânicos, bem como o abastecimento dos veículos nas estações de transbordo das cargas caso sejam integradas a usinas de biogás/biometano. Mas quando se trata de veículos leves com motor de ignição por faísca, para os quais o consumidor brasileiro já foi condicionado a encarar o gás natural não como complemento mas efetivamente como substitutivo tanto por motivações ecológicas quanto financeiras, é bastante lógico que ocorra uma rejeição a essa gambiarra por parte de um público mais generalista que eventualmente já tenha desconfianças quanto à segurança das instalações de gás natural não-homologadas pelos fabricantes dos veículos.

Considerando que em outros momentos no Brasil mesmo tanto Volkswagen quanto GM/Chevrolet já chegaram a oferecer veículos homologados para conversão a gás natural e os entregavam aos clientes já com o sistema de combustível alternativo instalado por convertedoras credenciadas mantendo a garantia do veículo, além do caso da Fiat com versões Tetrafuel (gasolina alcoolizada brasileira, gasolina pura de especificação estrangeira, etanol e gás natural) do Siena e posteriormente do Grand Siena que fizeram sucesso principalmente com taxistas e frotas de empresas como a Sulgás, chega a ser surpreendente que hoje não se veja mais nenhuma iniciativa nesse sentido mesmo durante o atual momento de transição na linha de motores de ignição por faísca dos principais fabricantes instalados no país rumo à injeção direta e a uma presença mais massificada do turbocompressor. Mesmo que alguns motores medíocres que escancararam as deficiências dos automóveis "flex" movidos a etanol e gasolina ainda sejam efetivamente mais fáceis de se converter ao gás natural podendo desativar os bicos injetores originais ao utilizar o combustível alternativo, e até mesmo alguns modelos lançados recentemente como o Volkswagen Virtus mantenham ao menos um como alternativa para quem ainda prefira não aderir à injeção direta pelas mais variadas razões, chega a ser um tanto surpreendente de se observar o aparente desinteresse em trazer ao Brasil a tecnologia mais apropriada para o uso do gás natural integrado à injeção direta. Relembrando previsões de 15 anos atrás quando especulava-se que a Volkswagen pudesse eliminar os motores de aspiração natural em toda a linha a nível mundial, bem como as vantagens da injeção direta em dispensar um enriquecimento de mistura ar/combustível para evitar a pré-ignição e e viabilizar o uso de combustíveis com diferentes resistências à detonação sem a necessidade de alterar a taxa de compressão num mesmo motor, dá a impressão de que a empresa estaria deixando passar uma oportunidade para dar um passo mais firme nessa direção sem deixar de lado alguns consumidores fiéis à marca mas que não abrem mão do gás natural.

A bem da verdade, é até mais fácil associar a injeção direta ao gás liquefeito de petróleo (GLP - "gás de cozinha") sem alterações nos bicos injetores originais, tendo em vista que pode ser injetado ainda na fase líquida como ocorre com a gasolina e o etanol, embora o uso desse combustível hoje não seja permitido para fins automotivos no Brasil. No entanto, além da viabilidade técnica para a injeção direta ser efetivamente associada ao gás natural, perspectivas para integrar o biogás/biometano a projetos de saneamento básico ainda constituem uma alternativa para promover a estabilização biológica e oferecer um combustível que pode ter a produção mais regionalizada em comparação ao etanol. Portanto, além de uma maior economia de combustível sem comprometer o desempenho, a injeção direta é importante para demonstrar a viabilidade de um biocombustível ainda negligenciado no mercado brasileiro que pode livrar o país da dependência pelo gás natural importado da Bolívia.

terça-feira, 3 de abril de 2018

Uma breve reflexão sobre o etanol e a arrogância chavista

À primeira vista poderia parecer loucura sugerir, logo num país exportador de petróleo e detentor de grandes reservas de gás natural como é o caso da Venezuela, que o etanol teria vantagens a oferecer. Num país antes receptivo às "banheiras" americanas, mas onde hoje a maior parte dos veículos novos é de origem chinesa como essa ZX Auto GrandTiger que apareceu em Porto Alegre no ano passado, a simples idéia de economizar gasolina já teria se tornado motivo de risadas. Hoje, em meio à crise que tem feito venezuelanos fugirem em massa para países vizinhos como o Panamá, a Colômbia, Trinidad e Tobago, e também para o Brasil, fica cada vez mais evidente que certas medidas tomadas pelo então ditador Hugo Chávez não apenas impediram qualquer perspectiva de melhoria econômica e social na Venezuela mas fazem com que uma recuperação de curto a médio prazo seja muito improvável.
Por incrível que pareça, por volta de 2005 o etanol chegou a figurar em tratativas de Chávez e Lula, que ainda tentava usar a "diplomacia do etanol" para assegurar uma posição de prestígio junto aos demais ditadores do subcontinente sul-americano. A necessidade de substituir o MTBE, ainda usado como antidetonante, soava atrativa para ambas as partes, e ainda havia planos para a reinstalação de antigas usinas de açúcar cubanas na Venezuela e a conversão dos equipamentos para produzir etanol. No entanto, por mera teimosia do Hugo Chávez, o interesse pelo biocombustível diminuiu, na mesma medida que passou a ocupar posição de destaque em negociações entre Brasil e Estados Unidos. Uma demonstração irracional de orgulho fez com que uma alternativa eficaz para proporcionar uma maior rentabilidade para o setor agropecuário e ao mesmo tempo fortalecer a segurança energética ficasse prejudicada, quando o discurso chavista deixou de ser favorável ao etanol a partir de 2007, mas apesar do cenário político hostil aos Estados Unidos ainda tinha muito veneco que não abria mão de um veículo de concepção tipicamente americana como uma Chevrolet Silverado...
Naturalmente, a predileção por veículos com uma concepção que passa longe de ser a mais eficiente é uma dificuldade para apresentar o etanol como uma opção sustentável na Venezuela, tendo em vista o descrédito que se vê hoje no Brasil diante dos preços pouco competitivos com a gasolina e alegações sobre o impacto na disponibilidade de alimentos ou sobre um incremento nos desmatamentos visando abrir espaço para o plantio da cana. Durante uma viagem à Jamaica em março de 2017, Chávez fez um discurso contra o etanol usando como "argumento" que encher o tanque de um veículo com etanol acarretaria no uso de áreas agricultáveis e água suficientes para alimentar 7 pessoas, e alegando que tentaria demover Lula do otimismo com relação ao combustível de origem vegetal. Simplesmente foi ignorado o benefício que o milho apresentaria como matéria-prima para o etanol como predomina nos Estados Unidos e já se tem feito no Centro-Oeste brasileiro, onde o "grão de destilaria" (DDG - distillation-dried grain) serve como substrato proteico para a alimentação de gado e outros animais de corte e promove um ganho de peso mais rápido em comparação ao grão de milho ao natural. Faria sentido implementar a produção do etanol de milho ao menos no Táchira, estado venezuelano que tinha uma tradição muito forte na pecuária e pode ser comparado ao Rio Grande do Sul tanto nesse aspecto quanto por ser a terra natal do general Marcos Pérez Jiménez, ex-presidente militar que antecedeu ao período que se conhece como "puntofijismo" e pode ser comparado ao ex-presidente brasileiro Emílio Garrastazu Médici que ainda hoje é considerado um dos filhos mais ilustres de Bagé.

Considerando que o petróleo venezuelano é predominantemente pesado e requer importação de óleos mais leves para diluição antes do refino, e que compostos como o MTBE também sejam importados principalmente dos Estados Unidos, a rejeição chavista ao etanol soava ainda mais incoerente. Ainda que a exportação de petróleo bruto e derivados como a gasolina e o óleo diesel permaneça lucrativa, o recurso a um ou mais combustíveis alternativos de produção mais regionalizada no mercado interno como o etanol e o biodiesel seria até mais justificável de se subsidiar em função do menor prejuízo à balança comercial devido à menor dependência por insumos importados. A bem da verdade, manter o preço da gasolina artificialmente baixo foi um dos catalisadores que levou a situação da Venezuela a tomar as proporções extremas de hoje, e para dar contornos ainda mais sombrios à situação há muitas famílias que só não morreram de fome porque conseguem sobreviver contrabandeando da Venezuela para a Colômbia (e em alguns casos para o Brasil) o combustível subsidiado e usar os ganhos dessa operação para garantir os mantimentos básicos que são encontrados mais facilmente nos países vizinhos. Nesse contexto, a falta de um "plano B" efetivamente viável a nível governamental e que até poderia ter sido encabeçado com o etanol só torna ainda mais difícil reverter a tragédia em andamento...

Enquanto o etanol passava a ser rejeitado, mas ainda havia a necessidade de procurar um meio de diminuir a sangria nos cofres da PDVSA por causa dos subsídios à gasolina e do uso de verbas da estatal para projetos eleitoreiros (e que pode ser comparado com o rombo da Petrobras), o gás natural passava a ser a nova obsessão doentia de Hugo Chávez. Ignorando eventuais empecilhos de ordem prática, o ditador simplesmente decretou que uma cota mínima de 50% dos veículos 0km oferecidos por cada fabricante ou importador de automóveis na Venezuela fossem adaptados para usar o gás natural além da gasolina, bem como subsidiar a conversão de veículos já em circulação. Não deixa de ser possível comparar tal circunstância com a popularização dos veículos "flex" movidos a gasolina e etanol no Brasil, ainda que o sistema de gás natural tenha empecilhos que não são replicados com o etanol, mais notadamente o peso e volume que afetam a capacidade de carga e podem até tornar menos prática a acomodação de bagagens, materiais e ferramentas. Como seria de se esperar, a intenção de promover a substituição da gasolina extremamente subsidiada no mercado interno para liberar uma maior quantidade para exportação pelas cotações internacionais fracassou numa rede de distribuição de gás natural muito aquém do que seria necessário a nível nacional, que se somava à autonomia menor com o combustível alternativo e por conseguinte uma necessidade de paradas mais frequentes para reabastecimento Até mesmo na Bolívia, onde o gás ganhou relevância após a "nacionalização" dos hidrocarbonetos, não há uma obrigatoriedade para os importadores oferecerem modelos prontos para usá-lo, e a disponibilidade em zonas rurais também tem sido insatisfatória e feito com que os produtores rurais bolivianos manifestem uma insatisfação ainda maior diante da proibição à importação de veículos com motor Diesel de cilindrada igual ou inferior a 4.000cc que fez do motor 2TR-FE de 2.7L a gasolina a única opção para a atual geração da Toyota HiLux na Bolívia.

Por mais que o etanol não justifique ser tratado como uma tábua de salvação, principalmente em um país que já se encontra imerso no que há de pior no socialismo como hoje é a Venezuela, ignorá-lo mostrou-se mais desastroso e de certa forma serve hoje para expor claramente que há fatores políticos efetivamente mais críticos para a segurança alimentar que uma competição por terras agricultáveis com as commodities agroenergéticas. O povo venezuelano permanece subjugado por um assassino que é herdeiro político do sanguinário Hugo Chávez, e tudo leva a crer que o hoje ditador Nicolás Maduro estaria próximo de superar o antecessor no tocante à perseguição de opositores, sempre usando a máquina estatal ainda financiada pelos escombros da PDVSA. Enfim, a arrogância chavista com relação ao etanol hoje cobra um preço muito caro à população venezuelana.

segunda-feira, 2 de abril de 2018

Rápida observação sobre o caso dos Volkswagens afetados pelo "Dieselgate" e estocados no deserto de Mojave

Um dos desdobramentos do "Dieselgate" sobre o qual já vinha-se debatendo, a destinação de carros a serem recomprados dos consumidores atingidos nos Estados Unidos pela Volkswagen ganhou outra vez algum espaço nos holofotes da mídia à medida que foram sendo reveladas imagens de veículos no aeroporto Southern California Logistics, famoso cemitério de aviões na cidade de Victorville, a 140km de Los Angeles. As instalações no deserto de Mojave, cujo clima seco e quente é considerado ideal para a estocagem de veículos e máquinas, são apenas uma dentre 37 alugadas para que os automóveis das marcas Volkswagen e Audi recomprados pelo fabricante após o escândalo de emissões permaneçam até que o futuro dos mesmos seja definido. No entanto, enquanto especula-se a aplicação de soluções que vão desde as atualizações necessárias para que cumpram as normas de emissões nas quais foram homologados ou o sucateamento, outra possibilidade que seria a exportação também se vê afetada pela burocracia ao depender de aprovação para as alterações a serem efetuadas, mesmo que sejam destinados a países com normas de emissões menos restritivas.

Dos cerca de 350 mil veículos recomprados, apenas 41 mil (entre 11 e 12%) já tiveram destinação final, que para 13 mil foi a revenda enquanto 28 mil foram destruídos. Convém recordar que alguns proprietários optaram por retirar peças e acessórios que não impedissem que o veículo chegasse às concessionárias funcionando, que junto com o licenciamento válido estava entre as únicas exigências da Volkswagen para a participação no plano de contingência para a crise deflagrada, e portanto alguns dos veículos que ainda poderiam ser requalificados para cumprir as normas de emissões tornaram-se economicamente inviáveis de restaurar com vistas a uma eventual revenda. Além de objeções morais que possam ser feitas à prática, que não deixa de ter um fundo daquela desonestidade tão associada ao "jeitinho brasileiro", não deixa de ser relevante considerar também o impacto ambiental resultante do manejo dos veículos que passam a ser considerados inservíveis e cujo único destino adequado é a reciclagem, bem como da fabricação de automóveis novos (independentemente dos tipos de motor e combustível que venham a usar) que viessem a substituí-los. Portanto, não deixa de soar até um pouco desmedida a reação de agências regulatórias que penalizaram ainda que de forma indireta os consumidores que tenham se sentido enganados pela promessa fraudulenta de conciliar um baixo índice de emissões e o consumo modesto de combustível, e foram condicionados a crer que estariam "salvando o mundo" ao abrir mão do Diesel durante um momento de relativa perplexidade.

De fato, o "Dieselgate" escancarou problemas que vão desde a concorrência desleal da Volkswagen até o nefasto jogo de poder por trás da EPA durante o governo Obama, mas não deixa de ser irônico que um país que exporta veículos de produção local em versões com motores Diesel não-homologados para o mercado interno tenha entraves para o fim dessa novela quando uma extensão da vida útil operacional de carros em bom estado de conservação em países com normas de emissões menos rígidas como o Paraguai ou Angola seria aceitável. O custo e o esforço na busca por uma "solução" que na prática serviria mais para encenação de virtude e demonstração de poder por parte de burocratas torna-se um transtorno tão severo quanto a violação cometida pela Volkswagen, ao passo que outras iniciativas até mais efetivas no tocante à "sustentabilidade" como uma ampliação do uso de biodiesel e outros combustíveis renováveis é tratada com algum descaso. Enfim, por mais que seja justo buscar por uma solução eficaz para cumprir a promessa feita aos consumidores e satisfazer as exigências ambientais, enterrar os pivôs do escândalo num cemitério de aviões soa contraproducente...