sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Considerações sobre a proposta da União Européia em reduzir pela metade o consumo de biocombustíveis até 2030

Já não há como negar que os biocombustíveis representam uma maior garantia das liberdades tão apreciadas pela nossa civilização judaico-cristã que o petróleo, cuja produção está mais concentrada em áreas conflagradas e zonas de influência islamo-socialista onde o respeito aos direitos humanos é tripudiado com a conivência da mesma esquerda-caviar que esboça uma falsa compaixão quando um ladrão ou um assassino levam umas borrachadas da polícia. Além de proporcionar uma maior estabilidade à balança comercial de países que hoje dependem de fontes de energia majoritariamente importadas para abastecer as respectivas frotas, há ainda a possibilidade de integrar a renovação da matriz energética às atividades agropecuárias já consolidadas e assim contribuir para a melhoria da qualidade de vida das populações do campo e por conseguinte uma diminuição do êxodo rural. Portanto, a notícia divulgada a 2 dias pelo portal NovaCana.com acerca de uma intenção da União Européia em reduzir pela metade o uso dos biocombustíveis torna-se extremamente preocupante.

A bem da verdade, o modelo internacionalista proposto pela União Européia tem se mostrado falido mesmo antes que o movimento Brexit ganhasse força. Além de relações comerciais que de certa forma se mostraram injustas com relação a países como Portugal e Espanha, por exemplo, é evidente uma tentativa de desconstrução de identidades nacionais em nome de um suposto "multiculturalismo" que tem renegado e relativizado valores morais inalienáveis. Na prática, é como uma versão mais enfeitada da antiga União Soviética, embora esteja mais aberta à infiltração de inimigos externos através de uma falsa pretensão de "tolerância" e de certa forma também sujeita a um colapso. E o perigo reside exatamente no domínio sobre recursos energéticos, como o petróleo. Muito se fala hoje sobre uma suposta "islamofobia" como a principal motivação por trás de reações mais acaloradas e eventualmente extremadas em decorrência da "crise de refugiados" impulsionada pelas ações da facção terrorista conhecida como Estado Islâmico, mas quase ninguém ousa recordar as pressões da Arábia Saudita por um enfraquecimento de relações econômicas e diplomáticas com Israel e maiores facilidades para a imigração islâmica rumo à Europa como condições para aliviar o embargo instituído pela OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) após uma coalizão islâmica ser derrotada por Israel na Guerra do Yom Kippur. O temor de ser rotulado como "racista" ou "xenofóbico" e comparado aos nazistas, ainda que de forma totalmente injustificada, fomentou o surgimento de algumas gerações de europeus acovardados que hoje estão prestes a cavar a própria sepultura...

Sob pontos de vista supostamente técnicos, o uso de biocombustíveis estaria levando as emissões de carbono a aumentar ao invés de serem reduzidas, além das polêmicas já associadas à segurança alimentar e mudanças no uso de terras agricultáveis. Já nesse aspecto podem ser apontadas algumas incoerências, como críticas ao uso de açúcar e óleo de canola como matérias-primas para a agroenergia em detrimento do uso na alimentação humana ou animal, enquanto a presença de quantidades excessivas de açúcar refinado e gorduras na composição de alimentos industrializados já é encarada como uma questão de saúde pública ao ser associada ao diabetes e enfermidades cardiovasculares. Também é aparentemente ignorada pela Comissão Européia a prática das rotações de cultura durante entressafras, que até proporciona uma melhoria da qualidade dos solos devido à maior fixação do nitrogênio promovida por leguminosas e algumas plantas forrageiras, além da maior rentabilidade que tal prática garante aos produtores rurais ao longo do ano. E por mais que os processos de produção de alguns biocombustíveis como o etanol de 1ª geração possam acarretar em perdas por evaporação, além do próprio cultivo e da colheita de commodities agroenergéticas ainda dependerem em grande parte de combustíveis fósseis que tendem a reduzir o saldo energético (diferença entre a energia aplicada no manejo agropastoril e a gerada pelo beneficiamento de cultivares ou subprodutos do processamento de itens de origem animal), o simples fato de fecharem o ciclo do carbono e do nitrogênio já se mostra vantajoso com relação aos derivados do petróleo ou ao gás natural proveniente de reservas fósseis.

A bem da verdade, o único aspecto aparentemente útil da proposta é fomentar uma maior participação dos biocombustíveis de 2ª geração na matriz energética européia, beneficiando especialmente o etanol celulósico e outros combustíveis que possam ser elaborados a partir de resíduos agropecuários de menor valor comercial de modo a gerar o menor impacto possível sobre a disponibilidade de gêneros alimentícios. No entanto, a proposta enfrenta resistências de entidades como a ePURE, que congrega produtores de etanol e considera a medida temerária até para o desenvolvimento dos biocombustíveis de 2ª geração. De fato, ao reduzir a contribuição máxima de biocombustíveis líquidos para as metas de energias renováveis de 7% em 2021 para 3,8% em 2030, a proposta de incrementar a participação dos biocombustíveis de 2ª geração de 1,5% em 2021 para 5,5% em 2030 não parece muito consistente e também leva a crer em uma disparidade no domínio das tecnologias associadas ao beneficiamento de determinados insumos que viria a favorecer principalmente Alemanha (líder no desenvolvimento de tecnologias para a produção e aplicação do biometano), Suécia (com destaque para o etanol celulósico) e Finlândia (onde gorduras de origem animal e óleos vegetais já são integrados à cadeia produtiva da petroquímica Neste Oil) com o risco de que os combustíveis gasosos sejam encarados como uma "salvação" em detrimento da possibilidade de uma maior integração com os combustíveis líquidos que, gostando ou não, ainda contam com um manejo mais simples e prático na maioria das situações. A participação de pequenos produtores no mercado de agroenergia também tende a ficar comprometida diante de grandes players com uma capacidade maior de fazer investimentos mais arrojados, contribuindo ainda para um maior risco que o impacto de uma quebra de safra de alguma grande monocultura viria a ter sobre a segurança energética.

Por mais que os recentes casos de desconformidades entre padrões de emissões aferidos em testes de homologação e em condições reais de uso tenham atingido de forma mais significativa a percepção da atual geração de motores turbodiesel como uma alternativa "eco-eficiente", levando alternativas como o gás natural e os sistemas de tração híbridos a serem vistos como substitutivos em detrimento de uma maior integração que permitiria explorar de forma mais adequada as vantagens de cada tecnologia em benefício de uma mobilidade com menor impacto ambiental, a eficiência térmica superior do ciclo Diesel - tanto diante das turbinas a gás quanto do ciclo Otto ainda predominante nos motores de ignição por faísca - permaneceria como um aliado decisivo para metas de redução na dependência por recursos energéticos. Não se deve esquecer também que a principal matéria-prima na síntese da uréia industrial destinada à produção do reagente químico conhecido na Europa como AdBlue e no Brasil como ARLA-32 ainda é o gás natural proveniente de reservas fósseis, e que poderia ser melhor aproveitado diretamente através de injeção suplementar nos motores Diesel de forma análoga ao que se faz com soluções alcoólicas em algumas aplicações de alto desempenho. Dessa forma, não só a qualidade da combustão é beneficiada, mas o saldo energético é favorecido por um menor processamento não apenas na síntese de uréia mas também na desmineralização da água usada para elaboração do AdBlue.

Enfim, o anseio em reduzir o consumo de commodities agrícolas como fonte de energia não seria tão execrável, mas o plano esboçado para levar a cabo tal intenção se mostra claramente equivocado. Por uma questão de justiça e respeito a identidades nacionais tão distintas entre os países-membros da União Européia, uma revisão se faz necessária para assegurar a viabilidade da meta de promover uma redução no consumo de combustíveis, que diga-se de passagem deveria priorizar os biocombustíveis que se revelem mais adequados não apenas a pretensões políticas mas, principalmente, às reais necessidades dos usuários finais e que contem com uma fácil integração às práticas agropecuárias já adotadas ao longo da Europa.

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Resfriador de ar, mais conhecido por um nome um tanto equivocado

É muito comum se deparar com a designação "intercooler" identificando o resfriador de ar, dispositivo que tem como finalidade reduzir as temperaturas da carga de ar de admissão após passarem pelo turbocompressor. No entanto, quando consideramos o contexto histórico por trás do surgimento desse componente, é fácil deduzir que o nome popular não é o mais apurado.
Para princípio de conversa, engana-se quem suponha que o resfriador de carga de admissão tenha surgido para atender a alguma necessidade das pick-ups turbodiesel da década de '90 que consolidaram no Brasil a popularidade desse tipo de veículo junto a um público mais urbano e voltado ao lazer, como a Nissan Frontier D22. Por mais que contribua para uma maior longevidade dos motores equipados com turbocompressor de um modo geral ao diminuir o stress térmico, além de favorecer uma combustão mais completa e hoje tenha também se tornado indispensável em motores turbodiesel da geração mais recente também para proporcionar uma condição menos propícia à formação dos óxidos de nitrogênio (NOx), o principal intuito por trás do desenvolvimento dessa peça está relacionado às condições operacionais de aeronaves com motorização a gasolina como o lendário Douglas DC-3 Dakota, imortalizado por um passado glorioso em companhias como a saudosa Viação Aérea Rio-Grandense - VARIG.
Foi muito difundido nos antigos motores radiais o uso de compressor do tipo Roots com acionamento mecânico mais conhecido como "supercharger" ou "blower", embora a capacidade de proporcionar alguma compensação sobre a perda de rendimento em função das variações de altitude fosse limitada pelas proporções fixas entre a rotação do motor e a do compressor. Até houve compressores de velocidade variável, que possibilitavam ao piloto fazer uma correção altimétrica mais precisa, mas eram mais complexos e, por conseguinte, mais caros e de produção mais difícil. O esforço de guerra exigia soluções mais práticas e de fácil implementação para preservar a capacidade de operar em altitudes mais elevadas, e assim motores como o Pratt & Whitney R-1830 Twin Wasp de 14 cilindros tiveram na combinação do supercharger ao turbocompressor um importante aliado inicialmente para atender a finalidades militares mas que também impulsionou uma revolução na aviação civil durante o pós-guerra.
Longe de entrar no mérito acerca de qual sistema de indução forçada seria o "melhor", o aquecimento aerodinâmico proporcionado por ambos os tipos de compressor impõe alguns desafios. Motores de ignição por faísca podem vir a apresentar um problema do qual o ciclo Diesel está livre, que é a pré-ignição, também mencionada eventualmente como detonação ou "batida de pino", tendo nas altas temperaturas um fator de risco. A própria durabilidade de um sistema "twincharger" poderia ficar comprometida por stress térmico ou mesmo a decomposição de juntas e retentores expostos a um calor excessivo, e portanto se fazia necessário resfriar a massa de ar antes de transferi-la do turbo para o supercharger ou vice-versa. Como o resfriador da carga de ar ficava posicionado entre ambos os compressores, a nomenclatura "intercooler" até faz algum sentido nesse contexto.


Enfim, com a hegemonia do turbocompressor tanto na linha automotiva quanto nos poucos aviões com motores a gasolina dotados de indução forçada que permanecem em operação regular como o Piper Seneca II, e com o resfriamento da carga de ar de admissão dando-se após um único estágio de compressão, seria mais correto usar o termo "aftercooler".

sexta-feira, 18 de novembro de 2016

A eleição de Donald Trump pode favorecer o Diesel?

Que as eleições presidenciais americanas tem um impacto mundial já é algo notório, tendo em vista os diferentes rumos que as interações econômicas, políticas e estratégico-militares dos Estados Unidos com países tão diversos quanto o Brasil ou o Japão possam tomar de acordo com as convicções pessoais de quem estiver residindo na Casa Branca. Semana passada, Donald Trump venceu não somente a disputa contra Hillary Clinton, mas principalmente o ceticismo de setores da imprensa que subestimaram a capacidade dos eleitores americanos em tomar uma decisão em benefício do próprio país ao invés de tentar agradar aos socialistas da União Européia. E a partir de 20 de janeiro, quando tomar posse do cargo, Trump pode tomar medidas que direta ou indiretamente favoreçam uma maior participação do Diesel no mercado automobilístico americano e ainda exerçam influência a nível mundial.

Deixando um pouco de lado as polêmicas no tocante às políticas para controle de imigração e deportações de ilegais em massa, uma das metas apontadas por Trump como prioritárias para fazer a América grandiosa novamente (make America great again) é aumentar a competitividade da indústria americana em diversos setores tanto no mercado interno quanto para exportação. A chamada "maioria silenciosa", prejudicada pela recessão econômica agravada pela incompetência do governo Obama, teve um peso significativo na eleição de Trump, depositando esperanças não apenas na questão da segurança nacional mas também na recuperação de postos de trabalho em áreas afetadas pela "desindustrialização". E hoje, um dos maiores desafios está na indústria automobilística, que vem tentando recuperar o prestígio em segmentos superiores ao mesmo tempo que sofre para oferecer produtos com um custo/benefício razoável entre os modelos de entrada. Naturalmente, a oferta ainda um tanto restrita de motores Diesel em veículos leves nos Estados Unidos acaba refletida numa menor presença de modelos tipicamente americanos em mercados de exportação.

Ao contrário do que ocorreu em outros países onde a configuração dos motores acaba por balizar a carga tributária imposta aos veículos, a menor importância dada à capacidade volumétrica nesse sentido também acabou por tornar a indústria automobilística americana menos competitiva em mercados internacionais desde o pós-guerra, mas não é o único motivo. A falta de uma harmonização entre as normas de emissões veiculares americanas e as que são aplicadas a outros mercados tão diversos quanto a Europa, a Austrália ou o Japão pode ser apontada como uma dificuldade para o fortalecimento da participação de mercado do Diesel entre os veículos leves nos Estados Unidos, tendo em vista o custo elevado para a aplicação de sistemas de tratamento de emissões eventualmente mais sofisticados com o intuito de atender às exigências para homologação. Por mais que se tenha chegado a uma maior similaridade técnica entre os sistemas, principalmente com a ampliação do uso do sistema SCR na Europa também em veículos leves numa resposta à introdução das normas Euro-6, ainda há um descrédito em torno das oportunidades que o mercado americano teria a oferecer.

Além do transporte comercial pesado permanecer muito dependente do óleo diesel convencional e outros óleos combustíveis pesados nos Estados Unidos, mesmo com um uso mais intenso do modal ferroviário em comparação ao Brasil, a tradição agropecuária reforçada por elementos como a figura do cowboy e do redneck também soam promissoras para o desenvolvimento de soluções voltadas ao biodiesel, podendo também vencer resistências entre consumidores com um perfil mais urbano que tratam esse combustível como uma mera excentricidade de neo-hippies. É possível que, ao menos num primeiro momento, não pareça tão fácil convencer alguns consumidores mais apegados ao tradicional V8 sedento por gasolina e outros tantos que perpetuam estereótipos e frases de efeito, mas aspectos tão diversos quanto a maior suavidade no funcionamento de motores Diesel mais modernos e até o patriotismo um tanto exacerbado de grande parte da população americana podem fazer a diferença. A maior valorização da livre iniciativa na cultura americana também é um bom pretexto para uma adesão de produtores rurais, que seriam potencialmente atraídos pela perspectiva de uma autonomia energética e as possibilidades de agregar valor a sobras e resíduos tanto da produção quanto do beneficiamento industrial dos cultivares.

Um indício de possível mudança na política energética no governo Trump é a escolha de Myron Ebell, um crítico das teorias do aquecimento global antropogênico, para supervisionar a atuação da controversa EPA (Environment Protection Agency - agência de proteção ambiental). Enquanto alguns que se dizem "ecologistas" lamentam a medida e alegam que haverá um maior alinhamento com a indústria petrolífera, não falta quem contra-argumente que a questão ambiental vinha sendo usada por Barack Obama como um pretexto para aumentar em demasia o tamanho do governo e afetar não apenas as atividades produtivas mas também representar uma ameaça às liberdades individuais tão valorizadas pelos cidadãos americanos. É possível que algumas regulações que afetaram o setor energético sejam flexibilizadas, o que num primeiro momento chega a parecer uma continuidade do cenário de elevada dependência por fontes de energia fósseis que não se resumem ao petróleo e ao gás natural e incluem também o carvão mineral, mas não se deve subestimar o potencial que um fomento aos biocombustíveis tem não apenas para recuperar postos de trabalho como também promover uma maior estabilidade na balança comercial americana ao reduzir a dependência por petróleo importado principalmente de áreas conflagradas.

Há de se levar em consideração a insatisfação de alguns americanos com as misturas de etanol que vão se tornando obrigatórias na gasolina por ação da EPA, vistas como prejudiciais ao funcionamento de alguns equipamentos tão diversos quanto cortadores de grama e pequenos aviões. Mesmo que a adoção em larga escala do etanol, que nos Estados Unidos tem o milho como principal matéria-prima, também envolva questões como os subsídios agrícolas, o engajamento de uma parte do eleitorado americano mais interiorana e vinculada ao agribusiness na campanha de Trump torna arriscado estabelecer previsões quanto a uma improvável anulação dessa medida. Também é oportuno destacar que um eventual impacto sobre o custo dos alimentos atrelado à produção do etanol a partir do milho é muitas vezes superestimado por críticos, ignorando a utilidade do chamado "grão de destilaria" (DDG - distillation-dried grain) como substrato proteico tanto na formulação de rações pecuárias quanto em alimentos industrializados destinados ao consumo humano. É mais fácil crer que a habilidade de Donald Trump como gestor de negócios viabilize uma maior integração entre diferentes agências e departamentos na busca por soluções técnicas que não proporcionem tanto prejuízo ao consumidor final como algumas decisões da EPA que chegam a contrariar decisões da Suprema Corte e leis já em vigor.

Em meio a críticas quanto à nomeação de Myron Ebell, vale destacar algumas incoerências na atuação da EPA como a liberação de técnicas de extração do gás natural não-convencional a partir do xisto betuminoso que acabam por contaminar lençóis freáticos subterrâneos com solventes e resíduos de explosivos usados para promover o fracking (fraturação) das rochas. A mesma agência que tem criado entraves para o encerramento do escândalo de emissões da Volkswagen (popularmente conhecido como "Dieselgate") e persegue adeptos de modificações no sistema de controle de emissões de veículos não parece ser uma reserva moral, tampouco efetivamente comprometida com a proteção ambiental como seria de se esperar. Levando em consideração tanto a anuência dada à exploração do gás de xisto quanto a forma como normas de emissões para motores e veículos são implementadas, a atual gestão da EPA chega a parecer mais comprometida com os interesses da indústria de petróleo e gás. O atual cenário de comodismo em torno de combustíveis gasosos com uma aplicabilidade mais efetiva em motores de ignição por faísca, dotados de uma eficiência térmica inferior à oferecida pelo ciclo Diesel, é portanto apenas parte do problema.

Outro ponto que pode fomentar discussões é o envolvimento de forças militares americanas em guerras e, por extensão, o suporte técnico e logístico às atividades de combate. Deixando de lado as discussões ideológicas e eventuais benefícios que as intervenções militares no Iraque e Afeganistão poderiam trazer à ExxonMobil (proprietária da marca Esso), à Chevron ou outras petrolíferas, é evidente que a escala de produção mais limitada de motores Diesel para aplicações veiculares leves pode em algumas circunstâncias se revelar prejudicial ao desempenho de algumas viaturas militares americanas que, por incrível que pareça, até poderiam eventualmente estar melhor servidas com propulsores mais compactos e eficientes. Indo um pouco além das motivações para a escolha dos motores Diesel como padrão na "frota verde" de países signatários do Tratado do Atlântico Norte, não se deve ignorar outros aspectos como a influência do próprio motor sobre a distribuição de peso entre os eixos e por extensão a aptidão do veículo na transposição de certos tipos de terreno. Por mais que as normas de emissões sejam menos restritivas para viaturas militares, o que também acaba por facilitar a adaptabilidade dos motores a uma maior variação na qualidade dos combustíveis que possam ser usados, é evidente que o compartilhamento de componentes e sistemas com motores de especificação civil podem reduzir os custos de desenvolvimento e agilizar o suprimento de peças de reposição.

Criou-se uma grande expectativa em torno das políticas a serem implementadas por Donald Trump nos mais diversos campos da economia americana e dos impactos que virão a ter tanto a nível local quanto mundial, e é natural que os setores energético e automobilístico possam guardar algumas surpresas. Enfim, mesmo diante da ênfase frequentemente dada aos automóveis híbridos como uma alternativa para redução na dependência americana por gasolina, e também os combustíveis gasosos sejam tratados como mais uma zona de conforto para quem insiste na ignição por faísca, não se deve subestimar o quanto a eleição de Donald Trump para presidente dos Estados Unidos pode representar como uma esperança pela liberdade do consumidor americano em escolher o tipo de motor e combustíveis que mais lhe convir.

terça-feira, 8 de novembro de 2016

Reflexão: que benefícios econômicos e sociais seriam trazidos por uma liberação do Diesel para veículos leves?

Não é incomum que a defesa de uma liberação do Diesel para veículos leves no mercado brasileiro seja rotulada como interesse em um mero favorecimento pessoal mediante a possibilidade de se usar um combustível mais barato que a gasolina e com um maior rendimento por litro. Por mais que tal percepção até tenha um pequeno fundo de verdade, afinal ninguém em sã consciência iria se dispor a defender algo onde saísse perdendo, é muito simplório ignorar benefícios econômicos e sociais que estariam atrelados a uma liberação do Diesel e por extensão uma maior presença de fontes de energia renováveis para o transporte rodoviário.

Com uma maior centralização não apenas da produção do etanol mas também dos combustíveis derivados de petróleo como a gasolina e o óleo diesel convencional, não se pode ignorar o impacto ambiental que a distribuição por todo o país acarreta devido às maiores distâncias a serem vencidas. Convém recordar uma das críticas que o engenheiro João Augusto Conrado do Amaral Gurgel costumava fazer ao etanol, quando dizia que o ProÁlcool era "movido a diesel", e certamente a quantidade de óleo diesel consumido nos caminhões-tanque usados para levar etanol de São Paulo para outros estados poderia ser reduzida praticamente à metade se o próprio óleo diesel convencional já pudesse ser usado em veículos com capacidade de carga inferior a uma tonelada, acomodação para menos de 9 passageiros além do condutor, e tração 4X2 ou 4X4 de velocidade simples (sem "reduzida"). Ainda assim, não faria muito sentido acomodar-se em torno do óleo diesel convencional e ignorar os biocombustíveis em geral, tampouco demonizar completamente o etanol.

Naturalmente, os temores quanto a um súbito incremento na demanda por óleo diesel convencional e o respectivo efeito sobre a disponibilidade do principal combustível usado no transporte pesado comercial, agroindústria e atividades extrativistas como a pesca e o manejo florestal não devem ser ignorados. Por outro lado, a própria adaptabilidade do ciclo Diesel a uma grande variedade de combustíveis alternativos já favorece uma busca por soluções eficientes e relativamente baratas para garantir a segurança energética e evitar um aumento nos custos operacionais das principais atividades econômicas brasileiras. Embora alguns sistemas de controle de emissões aplicados aos motores Diesel automotivos mais modernos sejam desafiadores por apresentar incompatibilidade com proporções mais elevadas de biodiesel e o uso direto de óleos vegetais como combustível, a idade média avançada da frota de caminhões e a defasagem na regulamentação de emissões nos segmentos fora-de-estrada (principalmente agrícola, estacionário/industrial e náutico) ainda viabiliza uma maior participação do biodiesel e até dos óleos vegetais brutos na matriz energética.

É evidente que cada combustível alternativo tem vantagens e desvantagens, bem como uma maior adaptabilidade às condições climáticas e ambientais de cada região, com o biodiesel e o uso direto de óleos vegetais naturais apresentando uma melhor integração às cadeias produtivas agropecuárias já estabelecidas. Ao contrário do etanol, que ainda tem uma forte dependência pela cana de açúcar e uma produção mais concentrada em São Paulo, há uma ampla variedade de oleaginosas que podem servir de matéria-prima para o biodiesel enquanto alguns subprodutos conservam propriedades alimentícias e podem servir tanto na elaboração de ração animal quanto aplicados em alimentos industrializados. Apesar da soja permanecer como a mais importante nesse cenário, há outras opções que se adaptam bem a um manejo mais simples como o girassol e o amendoim, e outras menos convencionais como o pequi nativo do Cerrado e que em reservas cultivadas para fins extrativistas pode apresentar uma produtividade de óleo por hectare até 5 vezes superior à da soja ainda que a polpa do pequi apresente uma quantidade elevada de espinhos e se mostre menos palatável quando administrada ao gado. Mesmo em meio a diferenças regionais, a diversidade de matérias-primas viáveis ao biodiesel permite uma inserção mais efetiva do pequeno produtor rural na cadeia produtiva dos biocombustíveis.

A possibilidade de tornar mais regionalizada a produção de combustíveis e das respectivas matérias-primas oferece uma perspectiva para o desenvolvimento da auto-suficiência energética de produtores rurais, reduzindo custos e contribuindo para derrubar um dos principais argumentos de opositores em torno de um impacto dos biocombustíveis sobre o preço de gêneros alimentícios. Até mesmo alguns resíduos com baixo valor agregado que hoje são subaproveitados, como sementes e caroços de frutas, podem servir como matéria-prima para a produção de óleos combustíveis de boa qualidade, com algum destaque para a semente de uva e o caroço de manga. Gorduras animais também se mostram adequadas ao intuito de conciliar a oferta de alimentos com a necessidade de uma renovação da matriz energética do transporte rodoviário, com oportunidades para aproveitar o potencial energético e agregar valor desde o sebo e gorduras viscerais provenientes principalmente de bovinos, suínos e aves até o óleo do fígado de peixes brancos. Dessa forma, um custo menor da energia aplicada ao manejo, beneficiamento e processos logísticos pode servir de pretexto para uma maior estabilidade nos preços de alguns alimentos.

Outro aspecto a ser levado em consideração é uma maior facilidade para manter o suprimento de combustíveis o menos afetado possível em resposta a emergências. Ainda que de qualquer forma um racionamento se tornasse inevitável devido à necessidade de transportar biodiesel e/ou óleos vegetais provenientes de outras regiões, o impacto de um acidente, sabotagem ou ataque a uma usina de biocombustíveis com uma área de abrangência menor causaria menos prejuízos que a mesma ocorrência em uma refinaria de petróleo maior. É relevante ainda a localização das principais refinarias brasileiras, geralmente mais próximas ao litoral e portanto a maior suscetibilidade a um eventual ataque estrangeiro não deveria ser descartada por completo. Do mesmo jeito que a segurança nacional foi um dos principais argumentos que levaram à transferência da capital federal do Rio de Janeiro para Brasília na década de '60, o mesmo princípio também seria aplicável à localização de indústrias estratégicas, de modo que uma interiorização da produção de combustíveis compatíveis com a maior parte da frota militar brasileira seria benéfica à defesa da soberania nacional. E que Deus nos livre de virar uma colônia da Venezuela ou da Arábia Saudita...

Apesar de tanta desconfiança que ainda rodeia as propostas de uma liberação do Diesel, há vantagens que não podem seguir ignoradas. A questão ambiental é outra que também suscita controvérsias, embora a forte dependência pelo óleo diesel convencional desde a produção até o processo logístico de outros combustíveis reputados como menos poluentes já sirva como um contra-argumento. Enfim, uma eventual liberação do Diesel para veículos leves no mercado brasileiro acarretaria em diversos benefícios econômicos e sociais, principalmente ao ser complementada por um efetivo compromisso com o fomento ao biodiesel e uso direto de óleos vegetais como combustível.

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Uma reflexão sobre a proposta de eliminação dos veículos com motor a combustão interna na Alemanha entre 2030 e 2050

Não há dúvidas que uma das notícias mais impactantes do ano foi um projeto de lei em tramitação na Alemanha com o intuito de pôr um fim na produção e venda de veículos com motor a combustão interna naquele país até 2030, com uma posterior restrição à circulação dos mesmos prevista para 2050. Como se não bastasse tratar-se de uma medida consideravelmente drástica, chega a ser uma ironia que tenha partido logo do país reconhecido mundialmente pelo pioneirismo na produção desse tipo de veículos e motores.

Tal proposição não me parece muito viável dentro do cronograma proposto. Seria mais fácil apostar na transição para outros ciclos termodinâmicos que numa efetiva eliminação dos motores a combustão interna. Ainda que evoluções na tecnologia de baterias estejam fazendo com que ressurja um interesse por carros elétricos, questões como a reciclabilidade e a composição química dos eletrólitos são importantes para mensurar o real impacto ambiental desde a produção e operação do veículo até o descarte de componentes em fim de vida útil. E por mais que a Alemanha esteja anos-luz à frente do Brasil no tocante à infraestrutura e tecnologias para energias renováveis, proporcionando um menor risco para a ocorrência de "apagões", gato escaldado tem medo de água fria...

Chama a atenção a força do legado de ícones da engenharia alemã como Felix Wankel, Nikolas August Otto, e naturalmente Rudolf Diesel. Se por um lado os motores rotativos tipo Wankel perderam participação de mercado diante das dificuldades associadas à vedação dos retentores apicais nos rotores triangulares e o alto consumo de óleo lubrificante, por outro os ciclos termodinâmicos Otto e Diesel ainda reinam absolutos nos motores automotivos modernos sendo também populares em outras aplicações que vão desde equipamentos estacionários/industriais até a aviação de pequeno porte. No campo das turbinas a gás, embora operem de acordo com o ciclo Brayton teorizado pelo americano George Brayton, a Alemanha também levou vantagem durante algum tempo ainda durante a II Guerra com o caça Messerschmitt Me 262 Schwalbe, também conhecido como Sturmvogel na versão caça-bombardeiro. Embora a eficiência térmica ainda seja eventualmente posta em xeque, esse tipo de motor consolidou-se na aviação comercial e militar em função da relação peso/potência e da provisão de ar comprimido para acionamento de sistemas pneumáticos, climatização e pressurização de cabine através de sangria nos últimos estágios do compressor, e pode ter alguma ineficiência compensada pela recuperação de energia térmica através de sistemas de cogeração a vapor mais comuns em aplicações estacionárias como grandes usinas de geração de energia elétrica.

Já em aplicações veiculares terrestres, por razões diversas que vão desde a maior saturação de filtros de ar em ambientes com muita poeira até a falta de um consenso na definição de uma fórmula para cálculo da capacidade volumétrica, as turbinas a gás estão longe de ser unanimidade. Um caso particularmente emblemático é o tanque de guerra americano M1 Abrams, originalmente equipado com um motor turboshaft Honeywell AGT1500, com planos para um repotenciamento com motor MTU 12V883 Diesel 2-tempos de 12 cilindros em V que contrariando expectativas ainda tem peso e volume mais contidos e ainda tem uma "assinatura térmica" menos intensa que contribui para dificultar a detecção por radares inimigos. Uma versão do mesmo motor feita sob licença pela empresa americana General Dynamics (GD883) já equipa o tanque israelense Merkava Mk.IV com sucesso.

Por mais que num primeiro momento a leveza frequentemente atribuída às turbinas a gás pareça estar de acordo com as metas de redução de consumo de combustível estipuladas por outros programas, a exemplo do CAFE (Corporate Average Fuel Economy - ou Média Corporativa de Economia de Combustível numa tradução literal) americano e do polêmico Inovar-Auto brasileiro, a grande dissipação de calor que se observa nas temperaturas de gases de escape mais altas em comparação aos motores a pistão já é suficiente para denotar uma desvantagem nesse sentido e ainda representa um maior desafio no tocante ao controle de emissões. Já não é novidade que altas temperaturas oferecem condições propícias para a formação dos óxidos de nitrogênio (NOx), problema também apontado como o calcanhar-de-Aquiles dos motores Diesel devido às altas taxas de compressão necessárias para promover a auto-ignição do combustível, e que ganhou notoriedade com o escândalo protagonizado pela Volkswagen no ano passado.

Outra característica a ser destacada é a menor elasticidade em comparação aos motores dos ciclos Otto e Diesel hoje predominantes no mercado automobilístico mundial. Oscilações nos regimes de rotação inerentes ao anda-e-para do tráfego urbano e à interrupção da transmissão da potência do motor quando a embreagem é acionada num veículo com câmbio manual não são muito toleradas pelas turbinas a gás, fazendo com que se adaptem melhor a operações que permitam uma velocidade constante como é o caso da aviação e de grupos geradores. A bem da verdade, caso seja implementado algum recurso para melhorar a eficiência geral, não chega a ser totalmente inviável recorrer a microturbinas, que podem ser otimizadas para geração on-board de eletricidade nos automóveis híbridos, com destaque para os chamados "veículos elétricos de autonomia estendida" (EREV - Extended Range Electric Vehicle) como o BMW i3 atualmente oferecido com um motor do ciclo Otto de 2 cilindros e 650cc movido a gasolina. Também é conveniente destacar a adaptabilidade do ciclo Brayton ao uso de praticamente qualquer combustível, não apenas o querosene de aviação (Jet-A1/JP8) mas também óleo diesel convencional e outros óleos combustíveis pesados, gasolina sem chumbo, etanol e combustíveis gasosos em geral, até mesmo o hidrogênio. Resta esperar para avaliar cenários futuros do mercado de recursos energéticos para delimitar as opções que estarão mais facilmente acessíveis, mas de qualquer maneira ainda é difícil que a eletricidade venha a monopolizar a propulsão automotiva num período relativamente curto diante dos 130 anos de evolução já decorridos.
É até previsível que qualquer movimento contrário a uma maior participação de mercado para os sistemas de tração elétricos se torne uma batalha perdida, porém ainda soa precipitado estabelecer um cronograma para eliminação dos motores a combustão interna. Promover um uso racional de recursos energéticos permanece como a alternativa mais realista e, por mais que a Alemanha já tenha provado ser capaz de mobilizações tanto para causas nobres quanto para as mais espúrias, fica difícil crer que nenhum automóvel com motor a combustão interna vá trafegar pela terra do sauerkraut a partir de 2050...