domingo, 28 de outubro de 2018

Caso para reflexão: Fiat Strada de um frigorífico

Vi na última sexta-feira no estacionamento do shopping Lindóia, aqui em Porto Alegre, essa Fiat Strada com baú refrigerado a serviço de um frigorífico especializado em carne de ovinos. Não é a primeira e nem vai ser a última pick-up pequena com tração simples e capacidade de carga nominal inferior a uma tonelada que eu vejo ser efetivamente usada para trabalho, e justamente numa atividade relacionada à agropecuária. Portanto, já está aí um argumento prático contra a alegação de que uma restrição ao uso de motores Diesel em veículos leves baseada na capacidade de carga nominal, tração ou acomodação de passageiros poderia ser benéfica para produtores rurais.

Não é sempre que uma pick-up média ou grande vá ser o tipo de veículo mais acertado para algum serviço, tanto por condições de tráfego que favoreçam uma caminhonete menor e mais ágil e fácil de manobrar em operações de distribuição quanto por uma redução nos custos de manutenção devido ao preço mais baixo de alguns componentes compartilhados com carros "populares". Até a menor quantidade de sistemas propensos a sofrer alguma falha, como se vê em algumas pick-ups 4X4 cujo custo de reparos na caixa de transferência pode corresponder à metade do preço duma pick-up compacta básica, também tem pesado a favor das pequenas desde a lida campeira até o escoamento da produção.

Não é eficiente privar o setor agropecuário brasileiro de opções já disponíveis no exterior, principalmente levando em consideração que a Fiat Strada feita no Brasil mesmo sempre contou com motores Diesel para exportação, e podem ser realmente usadas para trabalho pesado enquanto algum cowboy de posto usa uma pick-up média japonesa só como isca de pescar piranha nas baladas sertanejas ou forçando até capotar. Enfim, por mais que se insista que restrições ao Diesel assegurem a oferta de combustível para o transporte de cargas num país tão dependente do modal rodoviário, a migração de operadores comerciais para veículos leves faz dessa medida uma faca de dois gumes.

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Reflexão: faria sentido "dieselizar" os híbridos?

Embora tenha sido mais abordada uma disputa por participação de mercado entre o Diesel os híbridos de ignição por faísca, com algum destaque para o Toyota Prius que foi o primeiro híbrido a alcançar o público generalista mundo afora, não deixa de ser conveniente observar diferentes propostas visando uma melhoria da eficiência geral da frota e como poderiam ser integradas ao invés de segregadas. No caso específico do Prius, levando em consideração também a estratégia mais conservadora da Toyota em termos de motores de ignição por faísca evidenciada por uma certa resistência à adoção maciça do turbo e da injeção direta, talvez a mediocridade ocultada por uma ilusão de uma simplicidade inerente à ignição por faísca possa parecer um pretexto válido para que nem se cogite o Diesel, mesmo que no fim das contas possa levar mais adiante a proposta de economia de combustível e "sustentabilidade". Não se pode ignorar que há desafios de ordem técnica numa "dieselização" de híbridos, mas pode ser uma estratégia muito mais coerente sob pontos de vista tão diversos quanto a ecologia ou motivações estratégico-militares.

A bem da verdade, pode soar tentador não fazer a transição para o turbo e a injeção direta que já põe em xeque a eficiência do downsizing no controle de emissões, além de eventuais dificuldades para as conversões a gás natural também serem relevantes. Até mesmo em modelos com uma pretensão mais sofisticada como o Lexus CT200h que compartilha a mecânica básica com o Prius, e teoricamente já poderia justificar a adoção de tecnologias com percepção de um maior valor agregado, é justamente a proposta de uma combinação de prestígio com a confiabilidade pela qual a Toyota fez fama que inibe maiores ousadias técnicas. Até as recentes apostas do conglomerado japonês no etanol para uso como combustível em veículos híbridos num futuro próximo, que poderiam levar a crer numa incorporação da injeção direta para dispensar auxílios à partida a frio como o "tanquinho" auxiliar que se usava nos carros movidos somente a etanol e nos primeiros "flex" brasileiros, continua não trazendo perspectiva de uma mudança radical na concepção dos motores. De certa forma, o recente lançamento do Toyota Yaris no mercado brasileiro só reforça essa percepção de conservadorismo, mesmo que o motor usado no modelo afro-asiático que passou a ser também produzido localmente não tenha incorporado aquele conceito mais difundido entre os híbridos de emular o ciclo Atkinson que já está se fazendo presente no modelo nipo-europeu.

Na linha leve da Toyota, convém mencionar o motor 1ND-TV (1.4 D-4D) oferecido desde 2002 em modelos tão diversos quanto o Yaris de 1ª geração na Europa, além do Etios e do Corolla em alguns países onde o Diesel permanece relevante em automóveis de passageiros como é o caso da Índia e de Portugal. Como esse motor se enquadra nas normas Euro-6 quando equipa o Corolla de especificação européia mesmo sem recorrer ao SCR, de certa forma pode-se levar a crer que uma eventual inclusão desse motor no Prius é viável e dispensaria maiores gambiarras para acomodar o sistema de controle de emissões, não trazendo um inconveniente prático representado pela necessidade de repor o fluido-padrão AdBlue (denominado oficialmente ARLA-32 no Brasil) e que tem desagradado uma parte dos consumidores que poderiam manter algum interesse por veículos leves com motor Diesel. Também é relevante considerar a presença do turbocompressor em todas as versões já produzidas do 1ND-TV, o que hoje poderia servir de pretexto para a incorporação da tecnologia MGU-H oriunda da Fórmula 1 que proporciona uma maior recuperação de energia cinética dos gases de escape por meio de geração de eletricidade, reduzindo o arrasto decorrente do acionamento de um gerador por tomada de força no motor e por conseguinte aumentando a eficiência geral do conjunto motriz.

Outro ponto bastante controverso no tocante aos motores Diesel é uma eventual perda de eficiência ao operar em regimes de rotação intermitente, tendo em vista uma relativa demora que se alcancem as temperaturas ideais de funcionamento quando comparados aos motores de ignição por faísca, que por sua vez tem mais esse parâmetro para ser ajustado de acordo com a temperatura e condições de carga. No entanto, modelos como o Peugeot 508 de 1ª geração que ofereceu desde versões "micro-híbridas" com o sistema start-stop junto ao motor 1.6 e-HDi (DV6) até o sistema Hybrid4 com o motor 2.0 HDi (DW10) e versões indianas do Suzuki S-Cross equipadas com o motor 1.3 DDiS de origem Fiat e um sistema BAS-Hybrid com um starter-generator de 48 volts capaz também de proporcionar algum grau de assistência motriz já colocam em xeque essa suposta inadequação dos motores turbodiesel da atual geração a um funcionamento mais intermitente em meio ao tráfego urbano. Além do maior rigor no controle de emissões de óxidos de nitrogênio (NOx) favorecer o uso de temperaturas de combustão mais baixas, não se pode ignorar que os sistemas de gerenciamento eletrônico tem proporcionado um controle cada vez mais apurado do funcionamento dos motores e proporcionando também ajustes nos ciclos de injeção inclusive de acordo com a temperatura.

Também cabe considerar o caso da atual geração do Ford Fusion mexicano e do Mondeo europeu, contando nos diferentes mercados onde é oferecido com opções de motor que vão desde a concepção tradicional de ignição por faísca com injeção sequencial e aspiração natural até o Diesel, passando pelo híbrido (inclusive a versão plug-in Energi que não é disponível no Brasil) e também tem opções EcoBoost enquadradas no conceito do downsizing com turbo e injeção direta. Enquanto nos países onde o modelo é importado do México é possível encontrar ao menos uma das 3 opções no espectro da ignição por faísca, sendo que no Brasil o Duratec de 2.5L é o único "flex" mesmo que se possa crer que o EcoBoost pudesse proporcionar melhores resultados justamente em virtude do turbo e da injeção direta, na Europa o híbrido é o único a contar com aspiração natural e injeção sequencial. Assim, tendo em vista que de certa forma o downsizing proporcionou alguma aproximação entre os motores de ignição por faísca e o Diesel no tocante à massificação da indução forçada, do recurso à injeção direta para permitir uma proporção ar/combustível mais pobre sem o risco de pré-ignição e até de aspectos indesejáveis como um incremento nas emissões de NOx e material particulado antes vistos como um calcanhar de Aquiles inerente ao Diesel, talvez até soe mais coerente partir para uma "dieselização" logo duma vez.

Considerando também aspectos práticos como uma racionalização da logística de combustíveis em frotas, bem como a natureza militar do policiamento ostensivo no Brasil e a época que a Brigada testou um Prius na área servida pelo 9º BPM aqui em Porto Alegre, não seria de se descartar que uma "dieselização" dos híbridos pudesse ser bem-vinda, tendo em vista uma certa discrepância no uso da ignição por faísca em viaturas leves enquanto o Diesel predomina nos camburões pelo menos desde quando a Chevrolet parou de oferecer o motor Vortec 4300 V6 na Blazer. Eventuais vantagens de um sistema híbrido em comparação a um câmbio automático convencional, cada vez mais requisitado por usuários com um perfil mais urbano mesmo na linha Diesel, também pesariam a favor da integração em detrimento da percepção de um antagonismo fortalecida pelo marketing. Enfim, por mais que inicialmente possa parecer que não tenha muito sentido, pode-se deduzir que não seria tão inoportuno "dieselizar" a oferta dos híbridos...

sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Observações sobre o desgaste acentuado do sistema SCR em veículos pesados da Volvo

Foi recentemente anunciada pela Volvo a possibilidade de fazer um recall, abrangendo veículos que operam em vários continentes, em função de índices de emissões de óxidos de nitrogênio (NOx) acima dos limites especificados. A alegação do fabricante, coligado à Renault Trucks e à UD (antiga Nissan Diesel), é que o sistema SCR estaria sofrendo um desgaste mais acentuado do que o previsto, reduzindo a capacidade de neutralizar os NOx com eficiência. No entanto, mesmo que se aponte um problema de ordem técnica como causa da discrepância nos índices de emissão ao invés de uma ação deliberada como houve no caso da Volkswagen, referências ao "Dieselgate" também ganham algum destaque na imprensa européia e junto a grupos que fazem um lobby anti-Diesel sob falsas premissas de "sustentabilidade" que na prática só tem servido de pretexto para inibir a atividade econômica.
Como o sistema SCR acabou tornando-se de certa forma um padrão junto à indústria de caminhões e ônibus, estando quase onipresente em modelos acima de 300hp homologados das normas Euro-4 (não-aplicada no Brasil) em diante, o problema divulgado pela Volvo e que derrubou em 6% o valor das ações da empresa também acabou por suscitar dúvidas quanto à possibilidade de atingir veículos de outros fabricantes.Ao menos a Traton, subsidiária do Grupo Volkswagen encarregada da operação das marcas MAN e Scania, teria declarado através de um porta-voz que não haveria indícios quanto à ocorrência de um desgaste acentuado em componentes do sistema de tratamento de emissões nem de eventuais reflexos na efetividade. De um modo geral, como se não bastasse o inconveniente de ordem prática acarretado pela dependência de mais um insumo para garantir a correta operação dos veículos equipados com motores Diesel modernos, também há de se levar em conta no âmbito da manutenção a eventual necessidade de substituir componentes de custo muito alto em caso de não-conformidade com os índices de emissão por conta do desgaste natural como mais um empecilho para promover o Diesel como uma opção ainda razoável para atender às necessidades de operadores de veículos leves para conciliar alto desempenho comparável ao de similares com motor do ciclo Otto e o cumprimento das normas de emissões.
Se para um carro como o Volkswagen Passat B8 ainda é possível encontrar em alguns mercados a opção pelos motores 1.6 e 2.0 TDI, sendo este último disponível em 3 ratings de potência e torque com os 2 mais potentes já recorrendo ao SCR, semelhante liberdade de escolha já não se observa em segmentos menos prestigiosos nos quais as limitações não se concentram apenas no custo e também abrangem o espaço que seria necessário para acomodar o reservatório do fluido-padrão conhecido na Europa como AdBlue enquanto no Brasil é denominado oficialmente ARLA-32. Mas como seria de se esperar, o público generalista acaba sendo mais influenciado pelo valor agregado no momento de avaliar o quão disposto estaria a desembolsar pela manutenção de um veículo particular, enquanto no transporte comercial a relação entre força bruta e o impacto da quantidade de combustível a bordo ainda fazem do Diesel uma necessidade para a quase-totalidade dos operadores. No caso de empresas de ônibus por exemplo, mesmo que operem em localidades já servidas pelo gás natural canalizado como é o caso de Porto Alegre, o maior valor de revenda ainda desincentiva um fim da hegemonia do Diesel.

Ainda que um recall iminente venha a ser bem-sucedido, e também não acarrete num transtorno muito significativo para operadores e usuários dos veículos possivelmente afetados pelo problema, essa situação não deixa de fomentar também outros questionamentos em torno da própria adoção do sistema SCR como padrão. Como a maior parte da uréia industrial usada na formulação do AdBlue/ARLA-32 é sintetizada a partir do gás natural, já se abre espaço para refletir sobre a eventual utilização desse combustível tanto puro ao se converter um motor Diesel para operar no ciclo Otto quanto por meio de injeção suplementar no coletor de admissão e valendo-se de uma injeção-piloto do óleo diesel convencional para promover a ignição. Outro produto químico cuja síntese ainda tem no gás natural uma das principais matérias-primas e pode vir a ter serventia no controle de emissões é o metanol, embora também possa ser produzido a partir de matérias-primas mais diversificadas e até acidentalmente quando se erra o ponto da fermentação de bebidas alcoólicas como a "maria-louca" dos presidiários e sem-teto. Além do uso direto como combustível em aplicações automotivas de alto desempenho antes que o etanol se tornasse mais difundido, o metanol também foi muito usado como aditivo anticongelante em injeções suplementares de água (desmineralizada para evitar cavitação em componentes metálicos) e ainda como base de fluidos para degelo de carburadores em motores aeronáuticos.

Mesmo em motores com configurações muito distintas entre si, a injeção suplementar de água com algum álcool tende a proporcionar melhorias efetivas ao processo de combustão, podendo refletir-se também numa formação menos intensa dos NOx que tem sido o calcanhar-de-Aquiles dos controles de emissões. Enquanto num motor do ciclo Otto se observam efeitos análogos a um enriquecimento da mistura ar/combustível, num Diesel mesmo que não ocorra uma formação de mistura durante a admissão o resfriamento da massa de ar mediante a vaporização da água injetada é menos propício à formação dos NOx mesmo aumentando a concentração de oxigênio devido à massa de ar mais densa que se obtém. Além de prevenir o congelamento da água, o conteúdo de metanol também facilita a vaporização no coletor de admissão. Devido a fatores como disponibilidade e toxicidade do metanol, não seria má idéia aventar a possibilidade se se usar etanol para a mesma finalidade.

Já o gás natural por sua vez acaba tendo um efeito até certo ponto semelhante ao de uma carga mais alta de recirculação de gases de escape (EGR - Exhaust Gas Recirculation) ao ser usado em injeção suplementar num motor Diesel, tendo em vista que reduz a concentração de oxigênio no fluxo de admissão, mas ao considerarmos que se pode recorrer a um menor volume da injeção de óleo diesel convencional para manter os mesmos valores de potência e torque também faz sentido destacar uma menor formação de fuligem devido à combustão mais completa. Nesse caso, o filtro de material particulado (DPF - Diesel Particulate Filter) também pode ter a vida útil prolongada, sendo submetido a menos ciclos de autolimpeza ou "regeneração forçada". Porém, como se não bastasse a limitação da disponibilidade em algumas regiões e o descaso com o biogás/biometano que poderia constituir uma opção para a interiorização da oferta de combustíveis gasosos no Brasil e atender a necessidades específicas do setor agropecuário, não se pode esquecer que o gás natural vem sendo tratado como se fosse efetivamente antagônico ao Diesel em detrimento de uma integração que poderia promover uma maior segurança energética.

Não dá para negar que a situação apontada pela Volvo é preocupante por colocar em xeque a pauta da redução de emissões como uma garantia da viabilidade futura do Diesel, sendo desafiadora no tocante a fatores como a facilidade de uso e o custo operacional que tem induzido potenciais consumidores a vê-lo como uma opção cada vez mais restrita a aplicações pesadas onde o desempenho proporcionado sob fatores de carga mais pesados é imprescindível. Enfim, tendo em vista que há outras opções que podem ser até mais adequadas que o SCR e articuláveis a diferentes condições de operação que vão desde rotas regionais predeterminadas com infraestrutura de reabastecimento mais conhecidas até a carga geral em percursos mais variados, disseminar qualquer alarmismo que coloque o Diesel em xeque seria uma grande irresponsabilidade...

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Caso para reflexão: triciclo chinês na Rua da Praia e a incoerência em classificar utilitários pela capacidade de carga nominal

Triciclos podem constituir efetivamente uma opção interessante de veículo para servir às operações de distribuição urbana e logística de "última milha", sobretudo pela leveza e a racionalização entre o tamanho e a capacidade volumétrica de carga, mas também dão margem à reflexão em torno do quão infeliz é a restrição ao uso de motores Diesel com base apenas numa capacidade de carga nominal inferior a uma tonelada. No caso específico desse Tiger Cargo TB 200 do Bistrô Marzana que eu vi ontem na Rua da Praia, não seria aplicável tratar da ausência de acomodação para passageiros ou de tração suplementar, mas qualquer um com o mínimo de bom senso seria capaz de reconhecer o caráter utilitário de um veículo com essa configuração.

O uso de um motor com concepção essencialmente motociclística já seria um bom pretexto para levar em consideração a defasagem nas normas de emissões hoje aplicadas às motos e assemelhados, o que fomenta até a permanência do carburador cujo uso em automóveis tornou-se oficialmente inviável no mercado brasileiro a partir de 2012 quando tornou-se obrigatória a compatibilidade com a plataforma de diagnóstico de falhas OBD-II junto à introdução das normas Euro-5. Essa situação já se revela um problema em virtude das dificuldades para recorrer a combustíveis alternativos sem sacrificar o uso da gasolina, tendo em vista não só a adaptabilidade proporcionada pelo gerenciamento eletrônico a eventuais oscilações nas especificações do combustível sendo essencial para os motores "flex" mas também o fato da incompatibilidade com o gerenciamento eletrônico de certa forma ter se tornado um empecilho a mais para a homologação de sistemas a gás natural para aplicações motociclísticas. Logo, tendo em vista que o princípio de funcionamento num motor 4-tempos de ignição por faísca é o mesmo tanto para aplicações motociclísticas quanto automobilísticas e até mesmo aeronáuticas, não cabe deixar passar batido essa incoerência também no tocante a politicagens anti-Diesel que tratam ou a ignição por faísca ou eventualmente a tração elétrica como se pudessem efetivamente atender a todos os cenários operacionais.
Até recursos que já se tornaram lugar-comum nos automóveis, como catalisador no escapamento e a refrigeração líquida no motor, tiveram uma adoção muito mais lenta em motos e triciclos, o que acaba por fomentar até mesmo uma desconfiança quanto a eventuais melhorias na qualidade do ar em áreas urbanas que um uso mais intenso desse tipo de veículo em substituição a caminhonetes de pequeno porte tradicionais poderia trazer. Vale destacar que, mesmo com uma concepção mecânica bastante rústica e a velocidade final dificilmente ultrapassando os 60km/h devido às relações de marcha que priorizam a força para o modesto motor superar fatores de carga significativamente mais elevados em comparação aos que se aplicam a uma moto, é usual nesses triciclos chineses uma média de consumo entre 20 e 25km/l com gasolina. Pode parecer satisfatório, mas ainda seria tentador considerar o que um motor Diesel poderia proporcionar, mesmo que fosse um daqueles estacionários cuja potência específica (cv/L) e a relação peso/potência não são nada espetaculares nem mesmo comparadas aos primeiros motores Diesel automotivos leves...

O triciclo em questão obviamente tem a capacidade de carga nominal inferior a 1000kg, sendo o mais comum nessa categoria de veículos que não supere os 400kg, mas qualquer um percebe que não seria tão propenso a se tornar um brinquedão de cowboy de apartamento ou servir de ornamento para uma dondoca desfilar no estacionamento do Iguatemi. Portanto, já derruba facilmente a crença em torno da capacidade de carga nominal como um pretexto válido para determinar qual veículo é "utilitário" ou não. Enfim, esse é mais um retrato do efeito das restrições ao uso do Diesel em veículos leves no Brasil, desafiando os empreendedores a buscar soluções menos ortodoxas para conciliar a necessidade de transporte a um custo operacional reduzido.

terça-feira, 16 de outubro de 2018

Uma reflexão sobre a interrupção anunciada pela PSA no desenvolvimento de novos motores Diesel

Não há dúvidas que o Grupo PSA, detentor das marcas Peugeot, Citroën, DS Automobiles, Opel e Vauxhall, é uma referência no desenvolvimento de motores Diesel para veículos leves desde muitas décadas. Além do uso em modelos próprios como o lendário Peugeot 504 que fez tanto sucesso na Argentina, vale destacar o fornecimento de motores a terceiros como a Auverland francesa e a JPX brasileira para uso no jipe Auverland A3/JPX Montez e parcerias estratégicas com outras fabricantes como a Ford no desenvolvimento de motores como o DV4/DLD-414 usado em versões de exportação da 1ª geração do EcoSport. Portanto, é justificável que a informação recentemente divulgada de uma interrupção no desenvolvimento de novos motores Diesel por parte da PSA fomente preocupações.

A diminuição na participação de mercado do Diesel no mercado europeu, de 50% para cerca de 36%, já teria sido suficiente para acender o sinal de alerta quanto a uma maior dificuldade em obter retorno do investimento. De acordo com recentes declarações feitas no Salão de Paris de 2018 pelo diretor de produtos do Grupo PSA, Laurent Blanchet, o desenvolvimento de novos motores Diesel ou um fim da oferta dos mesmos depende de uma estabilização do mercado para que seja definida a estratégia. O executivo apontou que uma participação de mercado de 5% não justificaria manter a opção pelo Diesel, enquanto se permanecer por volta de 30% garantiria a permanência. Naturalmente, convém observar outros aspectos como eventuais efeitos do recrudescimento nas normas de emissões sobre a concentração de mercado no fornecimento de motores Diesel ou ainda uma resistência de fabricantes tradicionais ao outsourcing de motores e tecnologias correlatas como um possível pretexto para jogar a toalha, mas não é possível fazer apostas muito precisas nesse momento.

O custo de implementação e eventuais dificuldades de manutenção inerentes a novos métodos de pós-tratamento de gases de escape cada vez mais sofisticados também se torna um porre para boa parte dos consumidores europeus, que eventualmente se deixem seduzir pela aparente simplicidade que se nota em alguns motores de ignição por faísca que poderiam ser referidos como medíocres sem fazer nenhuma injustiça, tendo em vista a evolução muito mais lenta dos mesmos diante do Diesel ao longo dos últimos 20 anos. No caso da própria linha Peugeot, ao observarmos a 1ª geração da Partner ainda muito popular na Argentina e a geração subsequente, enquanto os rústicos motores XUD9 e DW8 acabaram perdendo espaço para o DV6 com turbo e injeção direta com gerenciamento eletrônico do tipo common-rail, no tocante à ignição por faísca o máximo que se fez for dar um de-rating de potência e torque no TU5.

É natural que a grande maioria dos consumidores tenha ficado desmotivado diante da vulnerabilidade de um filtro de material particulado (DPF) a oscilações na qualidade dos combustíveis e até do teor de cinzas no óleo lubrificante, além de eventuais restrições à circulação nas zonas centrais de cidades como Paris e Madrid. E por mais que o desafio do controle de emissões conciliado à manutenção de um desempenho aceitável possa ser vencido, tudo isso envolve um custo que ainda é considerado um tanto fora da realidade tanto por usuários particulares quanto por alguns operadores comerciais que não veem muita perspectiva de retorno do investimento numa convergência de tecnologias que já não são exatamente baratas como seria o caso de uma associação entre o Diesel e sistemas híbridos. E assim, até tecnologias como o sistema MGU-H originário da Fórmula 1 que poderia trazer uma maior previsibilidade no processo de combustão e aumentar a eficiência nos controles de emissões em uma faixa mais ampla de condições operacionais acabam ofuscadas por politicagens e pelo incentivo à mediocridade em detrimento de uma evolução tecnológica muito mais alinhada com a "sustentabilidade" que os discursos de políticos anti-Diesel.


Sem dúvidas, a mancha negra causada na reputação do Diesel nos últimos 3 anos em decorrência do escândalo "Dieselgate" protagonizado pela Volkswagen passou a ser explorada à exaustão pelas mais diversas vertentes do socialismo que tem usado o discurso ecologista-melancia como pretexto para inviabilizar atividades econômicas, por sua vez trazendo grandes prejuízos ao desenvolvimento de soluções no âmbito da segurança energética como o biodiesel. A competição com os híbridos, não só na Europa em função de benefícios concedidos até a modelos mais luxuosos como o BMW i8 e o Volvo XC90 T8 mas também nos Estados Unidos e no Japão onde a ignição por faísca é favorecida pela grande maioria do público generalista, foi sem dúvida outro duro golpe, mas outros fatores como a expansão do gás natural em países terceiro-mundistas como a Índia e a aposta num uso como o "combustível regional" do Mercosul e Boliviguay adjacências também vem suscitando dúvidas um tanto exageradas em torno da viabilidade futura do Diesel. A bem da verdade, por mais que a Volvo também tenha anunciado que interromperia a produção de motores Diesel e promoveria uma maior eletrificação/hibridização de toda a linha, o fato da atual arquitetura modular de motores servir tanto à ignição por faísca quanto ao Diesel com uma alta intercambialidade de componentes leva a crer que nem tudo esteja de fato se encaminhando para um passo tão radical.

Vale evocar ainda a memória dos Cruzados/Templários que lutavam contra o expansionismo islâmico na Terra Santa e posteriormente na Reconquista da Península Ibérica, enquanto na atualidade o front de batalha espalhou-se por praticamente todo o continente europeu. Por mais exagerado que possa soar à primeira vista, a adaptabilidade dos motores Diesel a biocombustíveis de produção regional é uma boa arma para secar algumas fontes de financiamento para a jihad islâmica que se instaurou na Europa. Logo, por mais que algumas questões estratégicas de cada fabricante para enfrentar as novas e cada vez mais restritivas normas de emissões pareçam sugerir o contrário, o Diesel ainda pode se manter relevante até para a sobrevivência da população européia nativa.

sábado, 13 de outubro de 2018

5 passos para o etanol recuperar a competitividade e o prestígio

Não é de hoje que o etanol figura como uma das principais alternativas para reduzir a dependência do transporte pelo petróleo, aplicável até em competições pela maior resistência à pré-ignição com taxas de compressão mais altas comparado às gasolinas de baixa octanagem disponíveis regularmente nos postos. Até no exterior, o etanol vem atraindo interesses para aplicações de alto desempenho como alternativa a gasolinas especiais de alta octanagem ou aditivos, tomando também uma participação de mercado antes destinada ao metanol. Enquanto isso no Brasil, com raras exceções, o etanol vem sendo marginalizado a ponto se tornar mais fácil ver um carro rodando no álcool em competições de arrancada do que na rua...

Desconfianças que remontavam à crise do álcool deflagrada na safra '89-'90 da cana quando foi dada prioridade à produção de açúcar visando atender ao mercado externo só foram amenizadas a partir de 2003 quando a Volkswagen passou a oferecer versões TotalFlex com motor de 1.6L inicialmente para o Gol, com a opção chegando às versões "populares" de 1.0L em 2005. A escolha por oferecer antes a opção bicombustível no motor 1.6 se devia à alíquota de IPI mais baixa para veículos acima de 1.0L movidos a etanol em comparação aos similares a gasolina, enquanto na faixa de cilindrada abaixo não se discriminava o combustível. Portanto, num primeiro momento a vantagem para o fabricante estava clara, valendo a pena eliminar do catálogo versões movidas exclusivamente a etanol que já não eram muito requisitadas, de modo que eventuais adeptos do combustível alternativo aderissem aos "flex" e o consumidor generalista fosse no embalo diante da estratégia de marketing que apresentava esse recurso como uma revolução tecnológica.

Mesmo com a massificação dos carros "flex" no Brasil, diversos motivos levam a uma desconfiança em torno do etanol e levam potenciais usuários a não aproveitar eventuais vantagens em alguns casos específicos. A minha mãe chegou a ter um Celta VHC e, mesmo que esse motor chegue a apresentar um funcionamento muito melhor com pequenas quantidades de etanol além da mistura obrigatória na gasolina, chegando até a apresentar um consumo menor em decorrência da possibilidade de "esticar" marchas mais altas mesmo em aclive ou da injeção eletrônica empobrecer um pouco mais a mistura ar/combustível sem resultar em pré-ignição. Apesar do preço do etanol não estar competitivo diante da gasolina na maior parte do país, vale destacar que mesmo entre os carros "flex" aquele cálculo que estabelece o etanol como melhor opção quando o preço estiver no mínimo 30% mais baixo que o da gasolina não é uma fórmula absoluta, podendo manter-se competitivo em alguns modelos mesmo que essa diferença esteja mais estreita.
De fato, o descrédito de uma parte considerável do público brasileiro com relação ao etanol alcançou proporções assustadoras diante da importância histórica desse combustível desde o regime militar, no entanto está longe de ser algo irreversível. É necessário abordar eventuais deficiências num âmbito multidisciplinar, para que o público generalista no mercado interno volte a estabelecer uma relação de confiança e respeito com o que foi uma iniciativa de sucesso e até hoje destacada internacionalmente como referência de sucesso na substituição de combustíveis fósseis. Mesmo diante da concorrência de outros combustíveis alternativos, que podem ser apresentados como uma alternativa mais fácil de implementar pelas mais variadas razões, o etanol pode ter certas desvantagens amenizadas ou mesmo revertidas através de algumas melhorias tanto no processo produtivo quanto características técnicas dos veículos para o qual venha a ser destinado, além de jogadas de marketing. Nesse contexto, cabe destacar 5 passos para o etanol recuperar a competitividade e o prestígio:
1 - diversificar matérias-primas: por mais que a cana de açúcar seja favorecida na produtividade por hectare quando se refere ao etanol, é precipitado ignorar vantagens que outras opções como o milho podem apresentar. Além da possibilidade de serem feitas duas colheitas anuais, durante a safra principal ou na chamada "safrinha" e assim já contribuir mais ainda para a estabilidade da oferta ao longo do ano mesmo durante a entressafra da cana, é importante salientar que o "grão de destilaria" ao ser usado como substrato proteico na formulação de rações pecuárias proporciona um ganho de peso mais rápido ao gado de corte, além de eventualmente poder ter aplicações também na indústria alimentícia voltada ao consumo humano em substituição à proteína da soja que é alergênica para uma parcela maior de consumidores. E mesmo que a soja seja mais frequentemente associada ao biodiesel, cuja produção no Brasil ainda a tem como principal matéria-prima, há viabilidade técnica para obter etanol a partir do melaço residual do processamento de concentrados de proteína. Portanto, também é coerente apostar numa integração com a produção de outros biocombustíveis sem se converter numa ameaça à segurança alimentar, além de eventualmente aproximar o etanol de eventuais consumidores em regiões que não tenham o cultivo da cana como principal vocação...

2 - liberar a venda direta das usinas aos postos: um tópico muito polêmico, que chegou a fazer parte de uma lista de recomendações do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) para reduzir os preços dos combustíveis em meio ao rescaldo da greve dos caminhoneiros deflagrada em maio último. Dispensando a passagem do combustível por bases operacionais das distribuidoras, tal medida favoreceria mais os postos localizados mais próximos das usinas, mas proporcionaria uma redução nos custos também em outras localidades em função da incidência de impostos sobre uma única operação de venda, e agilizaria a logística ao permitir uma viagem sem escalas nem baldeação. Por mais que se possa esperar alguma objeção de distribuidoras, mas levando em consideração que algumas redes de postos tem operações próprias de distribuição devidamente registradas junto à Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), tudo leva a crer que empecilhos à venda direta do etanol seguem em vigor com a intenção de minar a competitividade do etanol diante da gasolina e favorecer o monopólio da Petrobras no refino.

3 - aperfeiçoamentos nos motores para explorar melhor as propriedades do etanol: seria muito mais fácil encontrar um venezuelano pesando mais de 5 arrobas do que ocorrer uma volta de veículos movidos somente a etanol ao mercado brasileiro. Por mais que experiências de sucesso nos motores monocombustível como a da Ford com o motor CHT permaneçam na memória, não há possibilidade de se descartar os "flex". Mas se antes era tido como impossível fazer com que uma Pampa pudesse operar tanto com gasolina quanto com etanol, tendo em vista as limitações inerentes ao carburador e à ignição que se valia somente do vácuo como parâmetro para alterar o ponto, hoje em meio à presença maciça do gerenciamento eletrônico o ajuste de parâmetros do motor em tempo real de acordo com o combustível em uso tornou-se padrão. E se alguns motores mais modestos variam apenas o volume de injeção e o ponto de ignição, outros que incorporam comando de válvulas variável, turbo e injeção direta oferecem um grau de adaptabilidade maior às especificidades do etanol sem sacrificar a economia ao operar com gasolina. Vale recordar o BMW 320i ActiveFlex, primeiro modelo "flex" que incorporou simultaneamente o turbo e a injeção direta.
A principal vantagem da injeção direta é a possibilidade de manter taxas de compressão mais altas e benéficas ao etanol sem comprometer o funcionamento normal do motor com gasolina, nem precisar desperdiçar um volume de injeção maior somente para resfriar as câmaras de combustão de modo a mitigar a pré-ignição. Com a variação de fase no comando de válvulas e o turbo por sua vez, seria possível emular uma taxa de compressão variável de acordo com o combustível em uso. Valer-se de um "overbooster" para permitir que a pressão absoluta no coletor de admissão (MAP - manifold absolute pressure) possa se manter momentaneamente mais elevada favoreceria a operação com etanol. Já a tática de prolongar a duração da abertura das válvulas de admissão, designada comercialmente como "ciclo Atkinson" e mais usada em híbridos cujo motor de combustão interna opere exclusivamente com gasolina usando injeção sequencial nos pórticos de válvula como o Toyota Prius C tem o efeito colateral de diminuir a eficiência volumétrica, mas aliviando a compressão dinâmica sem alterar a compressão estática que é a "taxa de compressão" propriamente dita e assim permitindo também a emulação de uma variação desse parâmetro caso se deseje usar etanol.
Embora a injeção sequencial fique em desvantagem diante da injeção direta quando se trata da partida a frio, situação potencialmente mais crítica num híbrido devido ao funcionamento mais intermitente do motor em meio ao trânsito urbano, o tanque auxiliar de gasolina para partida que se fazia presente desde a época dos carros movidos primariamente a etanol já não é mais necessário nas gerações mais recentes de motores "flex" mesmo que a injeção direta esteja ausente. O desenvolvimento de sistemas como o Bosch FlexStart, que promove um pré-aquecimento do combustível com o uso de elementos aquecedores elétricos montados junto aos bicos injetores, facilita a vaporização do etanol quando a temperatura ambiente se encontre abaixo de 15°C. Embora tenha sido usado inicialmente pela Volkswagen já a partir de 2009, ganhou mais espaço por volta de 2012 em modelos de outros fabricantes como o Peugeot 308 importado da Argentina e equipado com o motor EC5 de fabricação brasileira.

4 - fortalecimento da "diplomacia do etanol": se esse tópico parecia não fazer muito sentido nos primórdios da reabertura do mercado aos carros importados, tomando como exemplo uma versão argentina do Voyage com 4 portas que vinha exclusivamente com o motor 1.8 a gasolina, hoje ganha relevância não só em função do Mercosul mas também pela experiência do Brasil com o etanol ter motivado as matrizes de fabricantes estrangeiros terem usado motores nacionais em versões "flex" de modelos provenientes do exterior como o Citroën C4 argentino e até mesmo no similar destinado ao mercado europeu (onde no entanto se usa o E85 ao invés do etanol puro). Por mais que inicialmente pareça ser uma decisão meramente logística diante da demanda por motores bicombustível ser mais forte no Brasil, não deixa de ser uma oportunidade para tentar reaver o respeito dos estrangeiros pelo nosso país como pólo de desenvolvimento tecnológico. Também faz sentido considerar que uma maior difusão do etanol em países vizinhos, eventualmente impulsionada por uma centralização da produção de motores no Brasil atendendo às sucursais dos respectivos fabricantes em outras partes da América Latina, poderia diminuir a tão falada "síndrome de vira-lata" que faz uma parte expressiva da população brasileira desprezar até mesmo boas soluções quando a aplicabilidade das mesmas se mantenha mais restrita ao nosso país.

Tendo em conta a questão da integração regional, não seria oportuno ignorar especificidades de cada país vizinho quando se procurar abordar uma expansão do uso do etanol. Seria muita mediocridade esperar que a Argentina ou o Uruguai se tornassem imensos canaviais mas, até em função da tradição da pecuária nesses países, justamente o etanol de milho faria algum sentido dada a possibilidade de se usar o "grão de destilaria" na alimentação animal. Outro aspecto pertinente é a eventual competição com o gás natural que tem uma presença bastante consolidada na Argentina e já vem ganhando destaque a nível regional, logo uma integração da produção de etanol de milho consorciada à pecuária também poderia ser promissora para o biometano de modo que ambos os combustíveis pudessem ser encarados mais como um complemento mútuo ao invés de fomentar uma canibalização. Diferentes condições de uso e características de cada veículo podem influenciar as preferências dos respectivos operadores, além do eventual desconhecimento de brasileiros quanto a documentações como a "cédula Mercosul" que visa atestar a equivalência entre os países do bloco na conformidade de veículos convertidos para gás natural, de modo que às vezes até um argentino que vá veranear em Florianópolis a bordo de um Renault Kangoo com kit GNV e se lembre que o mesmo modelo chegou ao Brasil importado da Argentina em versões "flex" possa ficar tentado a se entregar ao álcool quando um frentista se recusar a abastecer com gás por não ver um selo do Inmetro no parabrisa...

5 - uso como combustível aeronáutico: não é de hoje que a aviação desperta o fascínio e passa uma imagem de progresso tecnológico, mesmo que aviões ainda equipados com hélice como o Embraer Ipanema ou o Piper Pawnee C sejam vistos com um injustificado desprezo pelo público generalista. Em conversa informal ocorrida a uns anos atrás com um mecânico do Esquadrão Pampa da Força Aérea Brasileira que leciona numa escola de aviação daqui de Porto Alegre, além da questão do custo menor do etanol em comparação à AvGas ser competitivo por margem mais larga do que se observa com a gasolina automotiva (MoGas no jargão aeronáutico em países onde também é certificada como combustível aeronáutico pelas autoridades competentes), a questão da incompatibilidade do chumbo com os catalisadores usados em automóveis também figurou como um subsídio a propostas para um incentivo à substituição da AvGas por etanol diante do recrudescimento de normativas ambientais e a intransigência de comunistas que promovem um discurso de ecologista-melancia usando falsas premissas de "sustentabilidade" para prejudicar o desenvolvimento econômico e tem transformado a aviação agrícola num dos principais bodes expiatórios. Mas voltando a focar no combustível, enquanto o Ipanema já é produzido em série numa versão movida a etanol, o Pawnee e outros aviões agrícolas estrangeiros podem ser convertidos valendo-se de uma certificação suplementar de tipo (STC - Supplemental Type Certificate), e no caso do Pawnee talvez o fato da atual detentora da certificação de tipo ser a empresa argentina Laviasa possa ser mais um pretexto para enquadrar esse tema no tocante à integração regional...