terça-feira, 29 de janeiro de 2019

Alguns modelos da Mercedes-Benz equipados com os motores OM611, OM646 e OM651

Sprinter: as primeiras versões a usarem injeção eletrônica do tipo common-rail, ainda na primeira geração mas já incorporando o facelift, traziam o motor OM611 em versões de 2.1L com pistões de 88mm e curso de 88,3mm. Feitas na Argentina com ratings de potência de 109cv e 129cv, ainda se vê muitas rodando no Brasil levando carga ou passageiros além de aplicações especiais. Mas exemplares com uma configuração de uso misto que faz sucesso com usuários particulares são mais comuns do lado de lá da fronteira, aparecendo no Brasil mais durante temporadas turísticas. Provavelmente as restrições de altura em estacionamentos cobertos na Argentina não sejam tão severas como costumam ser no Brasil...

Vito da 2a geração: com um porte que se mostra mais favorável a usos particulares em comparação à Sprinter, mais notadamente no tocante à altura, usava o motor OM646 com as mesmas medidas de diâmetro e curso do OM611 em ratings de 109cv, 129cv e 150cv, ou diferentes versões do OM651 de acordo com o ano de fabricação e a certificação de emissões. Em função da homologação de versões com menos de 10 assentos e capacidade de carga nominal abaixo de 1000kg, eventualmente nessa configuração e com tração simples pudesse ser requerido um motor de ignição por faísca ao invés de um Diesel se tivesse sido vendida no Brasil, a exemplo do que ocorre com a 3a geração nas versões de passageiros.

Classe C W204: um modelo que está longe de ser incomum no Brasil, embora versões como esse C220 CDI emplacado no Paraguai e ao que tudo indica equipado com o motor OM651 numa versão de 170cv infelizmente não tenham sido comercializadas no Brasil. Apesar de se manter na mesma faixa de cilindrada dos motores OM611 e OM646, o OM651 é tem pistões de 83mm com curso de 99mm, além de versões de 1.8L com o curso reduzido para 83mm.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Refletindo sobre a cultura dos furgões

Não é de hoje que a Argentina tem uma cultura automotiva com diferenças substanciais diante da brasileira, apesar de ser um país próximo e com um processo de colonização parecido com o do Sul do Brasil. Um aspecto que logo salta aos olhos é a maior receptividade aos furgões de uso misto como o Peugeot Traveller entre os argentinos, enquanto no Brasil prevalecem as pick-ups e mais recentemente a modinha dos SUVs. Pode-se relacionar essa situação com as restrições ao Diesel em veículos leves no Brasil, e tais categorias se tornando a alternativa mais viável para quem não abre mão dessa opção, às custas de eventuais prejuízos à eficiência geral da frota brasileira resultantes da menor presença de modelos com características mais coerentes às efetivas necessidades de uma parte considerável do público brasileiro.
A princípio a imagem de rusticidade normalmente associada aos furgões pode levar a crer que nem o apelo do espaço interno seria suficiente para fazer frente à oferta de comodidades cada vez maior nas pick-ups e sport-utilities, embora modelos como o Peugeot Traveller desafiem essa lógica e ofereçam facilidades cada vez mais apreciadas pelo público urbano como o câmbio automático que ainda não é oferecido no Peugeot Expert com o qual compartilha o projeto básico e que já é vendido no Brasil em versão cargueira. Também é importante recordar que às vezes um veículo de tamanho mais exagerado pode provocar algumas dificuldades na operação, e justamente nesse aspecto está um dos principais argumentos usados pela Peugeot para divulgar o Expert no Brasil, com destaque para a altura máxima inferior a 2 metros viabilizando o tráfego em áreas com restrição de altura como a maior parte dos estacionamentos cobertos. Embora o comprimento e a largura possam ser semelhantes entre furgões e outras categorias de veículo mais populares junto ao público generalista e de certa forma levar a crer que no fim das contas dê tudo na mesma para quem a princípio vá fazer uso do veículo na maior parte das vezes desacompanhado e sem aproveitar a capacidade de carga, a proporção entre a área útil e/ou a capacidade volumétrica pelas dimensões externas costuma fazer a diferença.

Não é incomum que a principal referência quando se fala em uso de furgões para fins particulares ainda seja a Kombi, tendo em vista que por bastante tempo foi a única van de porte médio disponível no Brasil em versão que podia ser conduzida com carteira de habilitação categoria B como qualquer carro normal. Apesar de em outras épocas a Volkswagen ter chegado a anunciar que cabiam até 12 pessoas "extra-oficialmente" na Kombi, a versão Standard sempre foi homologada para 9 ocupantes já contando o condutor, apesar de que logo após a remodelação trazida ao Brasil em '97 chegou a ser homologada uma versão de 12 lugares para atender ao segmento das lotações que ganhou força na década de '90 com o fenômeno das concorrentes coreanas como a Kia Besta. Naturalmente, vale destacar a posição do cockpit avançado sobre o eixo dianteiro em ambas, sendo que na Kombi teve como principais justificativas o aproveitamento da mecânica básica da linha Volkswagen refrigerada a ar e a concentração de peso mais próxima do centro em diferentes condições de carga favorecendo a tração também em terrenos irregulares, enquanto no caso da Besta a motivação é o projeto originário da Mazda se enquadrar numa norma japonesa que considera "de luxo" qualquer veículo que exceda o comprimento de 4,70m e/ou a largura de 1,70m de modo que essa configuração se tornou a mais indicada para manter uma capacidade volumétrica satisfatória. Por mais que servissem bem ao fim que se destinavam, os modelos tinham algumas peculiaridades que podiam se tornar inconvenientes, como a intrusão do compartimento do motor da Kombi no compartimento de carga eventualmente dificultando a acomodação de bagagens, enquanto na Besta o acesso ao motor por baixo dos bancos dianteiros requer que o motorista e quem mais estiver na primeira fileira de assentos desembarque sempre que houver a necessidade de intervenção de um mecânico. Enquanto um usuário profissional poderia relevar essas pequenas inconveniências dependendo de qual tipo de serviço seja desempenhado com o veículo, um consumidor particular nem sempre se dispõe a aceitar tais condições em nome da otimização do aproveitamento de espaço...

Considerando faixas de tamanho mais de acordo com o que tem se consolidado na preferência do público generalista, convém lançar um olhar sobre o Renault Kangoo de 1ª geração que era fabricado na Argentina e o Renault Captur brasileiro. Além das versões de passageiros que se mantiveram em linha apesar de não serem mais trazidas ao Brasil, também não era incomum entre os argentinos uma configuração de uso misto baseada na cargueira e apenas parcialmente envidraçada na parte traseira, fácil de encontrar em Florianópolis durante a temporada de verão. A bem da verdade, tendo em vista que não só que o Kangoo oferece uma capacidade volumétrica maior mesmo sendo mais curto e estreito que o Captur mas também que ambos estão longe de ser efetivamente destinados a condições de rodagem fora-de-estrada severas, a imagem de robustez constantemente propagandeada como um diferencial para os sport-utilities se revela uma meia-verdade inconveniente para o consumidor que se vê com menos opções e cada vez mais empurrado para segmentos de valor agregado mais alto, e talvez pela percepção do automóvel ainda como um símbolo de status o povão parece não se importar tanto com o impacto dessa situação desfavorável.

Há de se levar em conta também a ironia no fato de que duas categorias distintas de veículos com um pretexto a princípio similar como utilitário tomaram rumos tão distintos no tocante à preferência do brasileiro. Em que pese uma eventual facilidade para transportar alguma carga mais volumosa numa pick-up de cabine dupla como a Renault Duster Oroch sem sacrificar o espaço de passageiros, mesmo que possa requerer um maior preparo na amarração para prevenir quedas e alguma proteção adicional contra intempéries ou materiais que por alguma razão não convenha transportar enclausurados junto aos passageiros como botijões de gás de cozinha ou alguns agroquímicos, para uma grande maioria do público generalista ainda faria mais sentido um furgão multiuso como o Dacia Dokker atualmente produzido na Argentina onde é comercializado como Renault Nuevo Kangoo. No entanto, novamente convém destacar a influência do marketing com relação às pick-ups e SUVs que são apresentados em meio a uma imagem de liberdade e aventura muito mais frequentemente, mesmo que um furgão possa fazer mais sentido até nesse aspecto. Considerando conjuntos mecânicos similares, há momentos em que a maior versatilidade nas configurações do interior de um furgão pode ser mais conveniente tanto no uso cotidiano quanto em viagens de lazer, oferecendo mais conforto e praticidade até numa parada para descanso durante o trajeto.

Mesmo que a capacidade de carga nominal num furgão compacto como o Peugeot Partner/Citroën Berlingo de 1ª geração se mantenha na faixa de 800kg nas versões somente cargueiras e por volta de 760kg numa configuração mista, já os afastando do enquadramento meramente arbitrário numa classe de "utilitários" aptos a usar óleo diesel convencional no Brasil mesmo com acomodação para menos de 9 passageiros além do motorista que seria exigida para classificação como microônibus e a tração simples, é oportuno destacar que a popularização no uso particular/familiar na Argentina se mostra mais sustentável que forçar a classe média a se atolar em dívidas para adquirir veículos de concepção eventualmente mais pesada sem que isso se reflita numa melhor capacidade de carga ou passageiros. Caso o exemplo da cultura dos furgões fosse replicado no Brasil e acompanhado por uma liberação do Diesel em veículos leves, apesar de um eventual temor quanto ao impacto de uma maior demanda por óleo diesel para fins particulares sobre a oferta do combustível para aplicações profissionais, não seria tão justificável o alarmismo ao considerarmos que um modelo com projeto mais racional pode servir bem tanto a quem deixaria de partir para um SUV na hora de comprar o primeiro Diesel quanto no contexto de uma "renovação de frota".

Um configuração mais racional e que atenda melhor às reais necessidades de uma parte expressiva do público pode ser observada em modelos como o Fiat Fiorino Qubo oferecido na Argentina, mas não no Brasil onde o mercado apresenta uma tendência ao comodismo e à mediocridade. Pelos motivos mais diversos que possam ser apresentados, a cultura dos furgões infelizmente não foi tão difundida a ponto de mostrar tão claramente ao público brasileiro generalista o quão vantajosa pode se tornar para a eficiência geral da frota, dada a proporção entre o espaço ocupado sobre o leito carroçável e a carga ou passageiros que possam ser transportados separadamente ou em simultâneo, resultando até mesmo numa maior fluidez em meio a condições de tráfego mais intenso. Enfim, por mais que eventualmente uma pick-up ou sport-utility possa soar justificável como uma opção mais imediatista para assegurar o direito ao Diesel, não faz sentido deixar de reconhecer que outras configurações de veículo podem oferecer resultados melhores.

sábado, 19 de janeiro de 2019

Uma reflexão sobre o SCR: solução ou transtorno?

Ao menos desde 2012 em uso no Brasil para atender aos limites de emissões de óxidos de nitrogênio (NOx) estipulados pelas normas Proconve P7/Euro-5, o sistema SCR tornou-se muito controverso e, ao menos entre os operadores, encontra mais críticos do que entusiastas. De fato, apesar da difusão do SCR no mercado brasileiro de caminhões e ônibus ter ocorrido mais em função da baixa qualidade do óleo diesel convencional que eventualmente viesse a causar mais danos num motor que recorresse ao EGR, acabou por se revelar igualmente problemático por outras razões, que vão desde a necessidade de usar mais um insumo para a operação do veículo até um desgaste mais acentuado do dispositivo que foi constatado pela Volvo ao longo da vida útil operacional. Vale lembrar que no Brasil todos os caminhões e chassis para ônibus comercializados pela Volvo usam o sistema SCR, o que leva a crer que um eventual recall para a substituição de componentes possa vir a comprometer alguns serviços de transporte coletivo urbano e intermunicipal ao menos temporariamente.

Em outros mercados com normas de emissões mais rigorosas que as brasileiras e onde não se proíbe a venda de veículos leves com motor Diesel, mesmo que nos últimos anos a questão das emissões tenha estado mais em evidência e até acarretado alguma desconfiança quanto ao futuro desse tipo de motor em segmentos de entrada exatamente por causa dos custos de implementação de sistemas de controle, a presença do SCR nas atualizações de modelos como o Citroën C-Elysée acaba trazendo à discussão eventuais incoerências de ordem técnica e pequenos inconvenientes práticos que podem se tornar um empecilho para potenciais usuários e fazer com que se voltem à percepção da ignição por faísca como algo mais simples. Convém salientar que hoje o ar condicionado tem uma presença mais consolidada nos veículos 0km na imensa maioria dos mercados, de modo que ainda possa fazer mais sentido um eventual reaproveitamento por meio de injeção suplementar daquela água residual removida através da condensação de umidade em suspensão no ar dentro do habitáculo, de forma análoga ao que já se faz com a mistura de água a algum álcool em aplicações de alto desempenho e até na aviação. Ainda que a ênfase maior dessa solução não seja o controle de emissões, não deixa de ser interessante frisar que um resfriamento da carga de admissão proporciona condições menos favoráveis à formação dos NOx, e o adensamento da massa de ar resulta numa combustão mais completa que também passa a requerer uma menor frequência dos igualmente controversos ciclos de autolimpeza ou "regeneração" do filtro de material particulado (DPF/FAP).

Naturalmente há de se considerar outros fatores, como uma eventual dificuldade em adaptar o SCR a plataformas antigas como a do Renault Kangoo de 1ª geração, o que poderia já servir de pretexto para pôr em dúvida a viabilidade do Diesel em veículos mais básicos, embora seja justa a comparação com conversões para gás natural em versões com motor de ignição por faísca devido ao peso agregado e à diminuição do volume aproveitável no compartimento de carga ainda que os cilindros de gás possam ser instalados por baixo do assoalho (devido à necessidade de realocar o pneu sobressalente). Outro ponto bastante controverso no tocante ao gás natural é o fato da maior parte da uréia industrial usada na formulação do fluido-padrão AdBlue, denominado oficialmente ARLA-32 no Brasil e ARNOx-32 na Argentina e no Uruguai, ser sintetizada a partir do gás natural com um gasto de energia superior ao que poderia resultar do recurso a uma injeção suplementar desse combustível em motores Diesel. Não se pode ignorar que eventualmente o gás natural não se adapte tão bem a essa função devido ao peso da adaptação e de requerer um volume maior em proporção à quantidade de energia equivalente em litros de gasolina, etanol ou óleo diesel, o que se tornaria particularmente crítico para trafegar longas distâncias com a consequente necessidade de mais paradas para abastecer com gás e ainda não haver uma suficiente capilarização da oferta desse combustível pelo interior, mas não se pode ignorar que a injeção sequencial nos pórticos de válvula (para não haver perda de combustível não-queimado no cruzamento das válvulas de admissão e escape quando ambas encontram-se parcialmente abertas) tem uma ação análoga à do EGR ao diminuir a concentração de oxigênio e formar uma proporção ar/combustível mais rica que auxilia na refrigeração das câmaras de combustão, mas sem necessitar de uma recirculação de gases de escapamento para essa finalidade nem comprometer a eficiência do processo de combustão. A volatilidade do gás até proporciona uma propagação de chama mais intensa e homogênea, com queima mais completa do óleo diesel ou eventuais substitutos como o biodiesel e assim reduzindo a formação de fuligem.

Também é conveniente considerar possibilidades hoje ainda pouco exploradas para o biometano, que pode se tornar extremamente relevante no Brasil tanto para minimizar a dependência pelo gás natural de origem fóssil quanto suprir parte da demanda por óleo diesel convencional em veículos pesados e outras aplicações beneficiadas pela classificação arbitrária como "utilitários" que os credencia ao uso desse combustível, incluindo sport-utilities. Evidentemente o biometano pode soar mais convidativo ao uso em caminhões de coleta de lixo do que em uma Nissan XTerra, considerando tanto as diferenças nas certificações de emissões de acordo com os respectivos anos de fabricação quanto as condições operacionais. Até a exigência pelo kit de conversão gerenciado eletronicamente para aplicação em veículos produzidos após '97 pode ser um empecilho dependendo do caso, o que não seria impedimento para a grande maioria dos veículos com motor Diesel produzidos a partir do final de 2005 com a entrada em vigor das normas Proconve P5/Euro-3 que levou a uma consolidação da presença do gerenciamento eletrônico nos motores. Por mais que a demanda pelo uso simultâneo do gás natural e/ou do biometano com o óleo diesel ou outro substitutivo pesado ainda pareça algo distante de ganhar relevância no mercado nacional, vale considerar uma eventual equivalência entre as emissões de um motor homologado em normas defasadas que venha a fazer uso desse recurso e um mais recente operando somente com o combustível líquido. Considerando a implementação de medidas absurdas visando restringir o tráfego de veículos com motor Diesel com base no ano de fabricação e certificação de emissões em algumas cidades do exterior, além de um projeto de lei absurdo proposto por um petista visando impedir quase totalmente a circulação dos mesmos na cidade de São Paulo, reabilitar um modelo mais antigo não deixa de ser um ato de resistência contra os ecologistas-melancia...

Por mais que possa inicialmente parecer um apelo à mediocridade recorrer à injeção suplementar de água pura ou combinada a algum combustível volátil no coletor de admissão, não deixa de ter algum fundamento quando nos damos conta de que pode proporcionar bons resultados tanto no tocante ao controle de emissões quanto ao desempenho e até à manutenção do motor. Tomando como exemplo na linha Volkswagen a geração anterior do Jetta que chegou a dispor de ampla variedade de motores tanto com ignição por faísca quanto turbodiesel nos diferentes mercados em que foi oferecida, e que no Brasil dispôs apenas da ignição por faísca tanto com aspiração natural e injeção sequencial quanto da opção com turbo e injeção direta, e no exterior chegou a estar envolvida no "Dieselgate" tentando justamente dispensar o SCR nas versões turbodiesel de especificação americana, já cabe destacar a preferência de alguns operadores como taxistas pelos motores mais rudimentares devido à maior facilidade da conversão para gás natural. Nos motores com injeção direta, é sempre necessário um fluxo de gasolina e/ou etanol no caso dos "flex" para manter a refrigeração e lubrificação dos bicos injetores originais de modo a evitar danos aos mesmos, tendo em vista que ficam diretamente expostos à frente de propagação de chama nas câmaras de combustão, de modo que ou vale mais a pena permanecer com a injeção sequencial nos pórticos de válvula e poder rodar só no gás ou partir para um motor Diesel (com ou sem turbo) operando simultaneamente com óleo diesel convencional e o gás. Relembrando a questão do controle de emissões, convém destacar que a própria Volkswagen já recorre ao filtro de material particulado até em versões a gasolina de alguns modelos como o Tiguan na Europa e Estados Unidos, embora não chegue a precisar recorrer também ao SCR tendo em vista que um enriquecimento da proporção ar/combustível e resfriamento da carga de admissão podem ser obtidos por meio da injeção dupla (tanto direta quanto nos pórticos de válvula), que também auxilia a evitar formação de depósitos de sedimentos carbonizados no coletor de admissão e ao redor da carcaça do EGR. Embora no caso de versões Diesel não se possa recorrer ao mesmo expediente com o combustível principal devido à menor volatilidade, uma injeção suplementar de água e/ou álcool ou de gás natural pode proporcionar resultados semelhantes e eventualmente dispensar o SCR.

A consolidação da preferência pelos híbridos com ignição por faísca em âmbito político no mercado europeu onde antes parecia difícil de superar a hegemonia do Diesel, e que acaba sendo usada como pretexto por alguns que se opõem à proposta da liberação do Diesel em veículos leves no Brasil, não deixa de ser outro ponto controverso. Tomando por referência a atual geração do Volvo XC90, que é oferecida tanto em versões convencionais de ignição por faísca, Diesel e híbridas plug-in de ignição por faísca com todos os motores originados de um mesmo projeto modular, o impacto do volume das bancadas de baterias tracionárias que antes era um grande inconveniente nos híbridos hoje pode ser de certa forma considerado menos relevante, tendo em vista que em similares com motor Diesel hoje a exigência do SCR toma proporções semelhantes devido ao tanque de AdBlue também ocupar um espaço considerável. Essa percepção muito infeliz da tecnologia híbrida como sendo antagônica ao Diesel acaba por inibir o desenvolvimento e a aplicação de soluções técnicas mais eficientes não só no tocante ao motor de combustão interna quanto na recuperação de energia para recarga das baterias, indo além do controle de emissões e considerando também tecnologias como o sistema MGU-H que poderia ser uma alternativa unificada tanto ao "twincharger" usado em versões de ignição por faísca convencionais e híbridas do Volvo XC90 de 2ª geração quanto ao impulsionador eletropneumático PowerPulse aplicado ao motor twin-turbo Diesel para eliminar o turbo-lag e manter uma pressão mais constante no coletor de admissão que resulta numa maior eficácia também do controle de emissões.

É importante destacar que o AdBlue/ARLA-32/ARNOx-32 não é tão fácil de manipular sem colocar operadores e a própria integridade dos veículos em risco, tendo em vista que apresenta algum grau de corrosibilidade, além de não proporcionar uma melhoria direta no processo de combustão como a que se poderia esperar de outros recursos. Novas dúvidas quanto à eficácia do sistema SCR ao longo da vida útil operacional trouxeram não apenas desconfiança quanto à viabilidade do Diesel de médio a longo prazo mesmo em aplicações pesadas, mas levam a uma falta de visão estratégica em torno da importância dos motores de combustão interna de modo geral para o fechamento do ciclo de carbono. Enfim, por mais que à primeira vista o SCR pudesse ser um paliativo não tão inconveniente e de fácil implementação especialmente em veículos pesados, por outro se tornou uma fonte de transtornos para as aplicações leves e até sendo apontado como um dos motivos para o Diesel em automóveis não ter as vantagens devidamente reconhecidas na atualidade.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

Falta de AVgas, um risco para a agricultura brasileira

A aviação agrícola é uma atividade essencial para garantir a segurança alimentar no Brasil, e proporciona uma redução nos custos e até no impacto ambiental sobretudo nas lavouras de arroz, cuja maior parte do total consumido no país é proveniente do Rio Grande do Sul. Com a maior parte da frota aeroagrícola operando com AVgas como combustível, e dependendo da refinaria de Cubatão como único local onde é produzida no Brasil, a situação fica crítica diante escassez observada desde dezembro nas distribuidoras, em função da parada na produção da AVgas para manutenção na linha que atende à aviação. Apesar de uma parte considerável dos operadores já terem migrado para o etanol, e outros usarem motores turboélice movidos a querosene de aviação (e ao menos uma versão do motor Pratt & Whitney Canada PT6-A ser homologada pelo fabricante para usar óleo diesel convencional com até 500ppm de enxofre), cerca de metade da frota ainda depende da AVgas.
Naturalmente, algumas considerações devem ser feitas sobre algumas condições que ainda agravam o impacto do desabastecimento. Uma questão de ordem técnica a se considerar é a recusa da ANAC em homologar o uso de gasolina automotiva (às vezes tratada no exterior por "mogas" quando usada para fins aeronáuticos), o que até pode parecer razoável em virtude da mistura obrigatória de etanol em proporções acima dos teores de "oxigenados" considerados seguros pelos principais fabricantes de motores aeronáuticos a pistão. Lembrando que a injeção suplementar de água com metanol surgiu em aplicações aeronáuticas, além do uso de fluidos alcoólicos para fazer o degelo de carburadores, já pode soar menos coerente o temor quanto à presença de etanol na gasolina comum afetar o motor. No tocante aos sistemas de combustível, hoje a maioria dos materiais usados na produção de componentes de tubulações e conexões resiste tanto aos derivados de petróleo quanto ao etanol, embora no caso de alguns aviões que usam sistema de combustível pressurizado possa haver algum temor quanto à formação de calços de vapor (vapor-lock) fazendo com que o motor possa sofrer uma parada súbita em voo, o que é particularmente crítico em virtude de algumas manobras feitas durante a pulverização aérea das lavouras. Apesar disso, o fato do Embraer Ipanema ter o sistema de combustível pressurizado e ser o primeiro avião produzido em série com opção por uma versão movida a etanol deixa claro que o combustível alternativo não é a raiz do problema...

A necessidade do chumbotetraetila na AVgas remonta à época que a gasolina não tinha uma resistência à detonação e pré-ignição em meio ao aumento nas taxas de compressão dos motores de ignição por faísca, além da recessão de sedes de válvula causada tanto por causa do impacto repetitivo das cabeças das válvulas quanto pelo uso de ligas metálicas um tanto macias, e os cristais de chumbo formados deveriam se depositar nas sedes de válvula. No entanto, alguma parte se deposita ao redor dos eletrodos das velas de ignição, o que também pode causar falhas. Atualmente a octanagem da gasolina comum já supera até a de algumas formulações antigas de AVgas, mesmo sem a adição do chumbotetraetila devido às normas ambientais em vigor para uso automotivo. O problema de recessão de sedes de válvula já não é mais tão grave devido à evolução da metalurgia, tanto que não impediu o uso do etanol em motores aeronáuticos a pistão ainda em uso regular.
Mesmo considerando que a maioria das usinas sucroalcooleiras esteja concentrada nos estados de São Paulo e Alagoas, e recentemente o uso do milho tenha se expandido como matéria-prima para a produção de etanol no Mato Grosso, já é uma opção menos crítica em comparação à absurda dependência por uma única instalação como fornecedora de um insumo essencial para a aviação, não apenas na operação aeroagrícola mas também na aviação geral de pequeno porte. Não deixa de ser ainda mais preocupante a vulnerabilidade da refinaria de Cubatão a eventuais ataques estrangeiros em caso de guerra por estar situada no litoral, bem como a falta de planejamento na Petrobras para organizar o armazenamento e a logística da importação de AVgas enquanto a produção nacional está interrompida num momento em que a demanda está mais alta exatamente em função da aviação agrícola. A produção de soja, que é uma das mais importantes para a balança comercial brasileira, fica particularmente ameaçada pela eventual dificuldade em aplicar fungicidas para o controle da ferrugem asiática, que é capaz de destruir uma lavoura em 5 dias.

Não deixa de ser um tanto suspeito que essa crise tenha se deflagrado durante a transição entre um governo de continuidade do petismo e o governo Bolsonaro, tendo em vista o aparelhamento do Estado pelo PT e o forte apoio do setor ruralista à candidatura de Jair Bolsonaro à presidência. Em algum momento pode ter sido tão somente a incompetência de apadrinhados políticos infiltrados na Petrobras e nas agências reguladoras que tenha aberto o terreno para o problema, mas de outubro para cá daria tempo de articular um plano de contingência que não pusesse o bem-estar da população brasileira de bem em risco, ao invés de tentar sabotar a produção de alimentos e fazer o que a esquerda faz com mais maestria que é matar gente de fome. Já passou da hora da aviação agrícola brasileira se libertar da dependência pela AVgas, e as soluções técnicas atualmente disponíveis permitem a transição para uma operação simplificada da logística de combustíveis, esbarrando somente na incompetência de gestões anteriores.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

Ford Focus TDCi argentino

Esse é para lembrar de uma época em que os argentinos dispunham de mais opções de carro com motor Diesel, e despertavam alguma curiosidade quando vinham passear no litoral brasileiro. No caso do Ford Focus de 2a geração, o motor 1.8 TDCi dotado de turbo, intercooler e injeção eletrônica common-rail ainda era basicamente uma versão modernizada do antigo Endura-D/Lynx com injeção indireta e versões naturalmente aspiradas ou turbo dependendo da aplicação. Enquanto na Europa ainda havia a opção por motores turbodiesel co-projetados pela Ford e pelo grupo PSA nas faixas de 1.6L (PSA DV6/Ford DLD-416) e 2.0L (PSA DW10), este último com a opção por câmbio automático, na Argentina só foi oferecido regularmente o 1.8 TDCi e sempre com câmbio manual de 5 marchas. Os argentinos já estavam em vantagem diante dos brasileiros, que nem sequer puderam contar com a opção pelo Diesel, embora nos últimos anos na Argentina esteja diminuindo a oferta desse tipo de motor...

terça-feira, 8 de janeiro de 2019

Toyota Raum: engine swap ou false flag

Apareceu ontem na praia de Canasvieiras esse Toyota Raum de 1ª geração com placas do Paraguai, e um emblema alusivo aos motores com injeção direta que a Toyota comercializa com a designação D-4D. Como se já não fosse suficientemente exótica a presença de um modelo JDM no Brasil, o fato de ser permitido o uso de motores Diesel no Paraguai já seria outro ponto a se destacar. No entanto, o modelo nunca chegou a ser oferecido de fábrica com qualquer motor Diesel.
Até existem alguns motores na linha da Toyota que poderiam caber sem muita dificuldade no Raum e, como o motor original teria de ser removido para facilitar o acesso à parede de fogo durante a transferência do cockpit do lado direito para o esquerdo, nada impediria a adaptação de motores como o 1ND-TV de 1.4L ou o 1CD-FTV de 2.0L que foram usados no Corolla E120 de especificação européia que compartilhava a carroceria estreita com o modelo vendido no Japão, e é apenas 1 centímetro mais largo que o Raum. Ou até aqueles motores 2C naturalmente aspirados e com injeção indireta que foram usados no Corolla importado oficialmente no Paraguai eventualmente servissem à adaptação, tendo em vista que para o mercado japonês também era possível encontrá-lo especificado para uso com câmbio automático que sempre foi equipamento de série no Raum. E como os câmbios automáticos usados na linha Toyota costumam ser feitos pela Aisin e não raro o mesmo câmbio serve a modelos muito diferentes, faria até bastante sentido um engine swap.
Como além do emblema alusivo aos motores D-4D ainda estava presente um alusivo à cilindrada de 1.6L também não faria muito sentido diante do motor 5E-FE de 1.5L movido a gasolina, embora a Toyota tenha incorporado em 2015 na linha européia o motor BMW N47D16 sob a denominação própria 1WW nessa faixa de 1.6L para se manter numa faixa de tributação mais favorável em países como Portugal, mas é recente (e caro) demais para chegar de segunda mão no Paraguai, e seria mais trabalhoso de ser integrado à parte elétrica original do veículo. Portanto, não seria de se desconfiar que algum paragua mais zoeiro tenha optado por atiçar brasileiros favoráveis à liberação do Diesel...