sábado, 20 de abril de 2019

Caso para reflexão: Gurgel e a tração simples

Uma antiga fabricante de capital nacional que fez relativo sucesso com pequenos utilitários derivados do layout mecânico do Fusca como o X-12/Tocantins, a Gurgel chegou a desafiar fabricantes mais tradicionais que ofereciam jipes e outros utilitários com tração 4X4 na disputa pela preferência do consumidor. A tração simples poderia soar como uma desvantagem incontestável em terrenos mais severos, mas a leveza somada à distribuição de peso mais concentrada junto ao eixo traseiro favoreciam a capacidade de trafegar por trechos onde muito 4X4 moderno passa sufoco. E além de usos recreativos análogos ao de um buggy, também servia a aplicações utilitárias onde a concorrência se visse desfavorecida por alguma razão.

Para atenuar eventuais desvantagens que seriam associadas à tração somente traseira, um recurso que se fazia presente na grande maioria dos modelos da Gurgel foi a frenagem manual individual para as rodas traseiras que a empresa apresentava com o nome Selectraction, para bloquear alguma roda que estivesse girando em falso ao transpor um atoleiro, tal como um bloqueio de diferencial ou um diferencial de deslizamento limitado fariam. Apesar de não ser livre de manutenção, e naturalmente fomentar questionamentos quanto a um impacto no desgaste do material de atrito dos freios traseiros, era um sistema absolutamente simples e mais acessível para a substituição de componentes desgastados em comparação a um bloqueio de diferencial e, mesmo que um diferencial de deslizamento limitado pudesse ser melhor por não necessitar intervenção por parte do condutor nem agregar muita complexidade às rotinas de manutenção, com um custo contido e facilidade para encontrar peças de reposição. E por mais que possa parecer desproporcional uma comparação com o tradicional Jeep CJ-5 que permaneceu sendo fabricado no Brasil pela Ford até '83, foi a concorrência com a Gurgel que levou o modelo a ter a escala de produção considerada inviável.
Não se deve descartar a possibilidade da ausência de ao menos uma versão com motor Diesel ter sido a pá de cal no Jeep Willys/Ford, que por ter contado com tração 4X4 e caixa de transferência de dupla velocidade (a popular "reduzida") podia recorrer legalmente a esse tipo de motorização a exemplo do que fazia a Toyota com o Bandeirante e garantiu a sobrevida do modelo até 2001 quando a Gurgel já nem existia mais. Por mais que a tração 4X4 possa tornar-se efetivamente uma vantagem para muitos operadores, há casos em que se possa dispensá-la, embora no Brasil a impossibilidade de regularizar qualquer veículo com capacidade de carga nominal abaixo de uma tonelada e assentos para menos de 9 passageiros sem contar o condutor tenha criado de certa forma uma reserva de mercado e perpetue a ineficiência energética ao obrigar eventuais usuários a carregar um peso morto nos veículos caso não façam uso efetivo desse recurso.

Mas se a Gurgel parecia não incomodar os grandes fabricantes multinacionais enquanto produzia uma modesta linha de jipes e caminhonetes derivadas da concepção mecânica tradicional da Volkswagen, parecia tornar-se efetivamente uma pedra no sapato a partir do momento em que teve a "ousadia" de lançar em '88 o BR-800, um automóvel subcompacto com uma proposta mais generalista e a ambição de preencher lacunas deixadas pelo fim da produção nacional do Fusca em '86. A tração traseira que é uma característica marcante do Fusca, e acabou sendo estendida a todos os modelos que chegaram a ser comercializados pela Gurgel, também se fazia presente no BR-800 devido à intenção de atender a uma parcela do público em regiões rurais e periféricas que não seriam atendidos tão satisfatoriamente pela geração de carros compactos que já havia tomado muito da participação de mercado do Fusca junto a consumidores com perfil mais urbano. Apesar de ter recorrido ao motor dianteiro, afetando a distribuição de peso entre os eixos que passava a ser de 50% sobre cada um com o veículo vazio, em diferentes condições de carga ainda havia uma maior concentração de peso sobre o eixo traseiro, o que favorecia a condução em trechos com pavimentação mais precária ou ausente.

Mesmo quando o Gurgel BR-800 foi substituído pelo Supermini em '92, com atualizações de estilo que tentavam torná-lo competitivo diante dos carros "populares" com motor de 1.0L que já vinham sendo oferecidos pelos fabricantes generalistas, o modelo ainda era o único que conciliava alguma modernidade com uma concepção que também contemplava as efetivas necessidades de usuários que não teriam como ficar plenamente satisfeitos com uma mera depauperação de compactos com projeto europeu das décadas de '70 e '80 em condições de rodagem severas. Tendo saído de linha em '95 em meio ao nebuloso processo de falência pelo qual passou o fabricante, o Gurgel Supermini chegou a enfrentar entre outros concorrentes de concepção mais primitiva o próprio Fusca que visava substituir, e que voltou à produção por insistência do então presidente Itamar Franco em '93 para sair de linha em '96.

Não seria justo ignorar mais esse exemplo da incoerência nas restrições brasileiras ao Diesel em veículos leves. Tanto com modelos que podem ser considerados precursores do atual modismo dos crossovers com plataforma de algum carro normal quanto pela tentativa de se firmar junto ao público generalista sem ignorar condições geográficas brasileiras, o trabalho do engenheiro João Augusto Conrado do Amaral Gurgel demonstrou na prática que um veículo de tração simples e capacidades de carga e passageiros modestas pode às vezes se justificar diante de outros que são classificados como "utilitário" de forma meramente arbitrária para fins de homologação e assegurar o direito ao uso de motor Diesel.

terça-feira, 9 de abril de 2019

Acionamento de válvulas sem eixo de comando: alguns aspectos a considerar

Já faz algum tempo que o método tradicional de comando de válvulas nos motores 4-tempos tanto de ignição por faísca quanto nos Diesel, baseado num ou mais eixos de comando e demais componentes a depender da localização do(s) eixo(s) no bloco ou no(s) cabeçote(s), se mostra longe do ideal para que se alcance uma maior eficiência geral nas mais diversas faixas de rotação. Limitações em função do perfil dos cames (ressaltos) que atuam sobre os balancins ou sobre os tuchos e por fim promovem a abertura das válvulas, mesmo que atualmente existam comandos variáveis na duração da abertura e/ou na distância que a cabeça da válvula se afasta da sede, só podem ser dribladas com outro sistema de comando de válvulas. Para atender a essa necessidade, a proposta de um sistema eletrônico com atuadores hidráulicos ou hidropneumáticos tem sido uma opção a ser levada a sério.

Alguns grandes motores Diesel usados em navios e aplicações estacionárias já fazem uso de sistemas eletro-hidráulicos ou eletromagnéticos para acionar as válvulas, com a vantagem de poder inverter a rotação do motor no caso dos navios e dispensar um reversor que de outro modo permaneceria necessário para algumas manobras. Como um eixo de comando de válvulas vai invariavelmente ter uma geometria fixa, e até a variação de fase ou de vá obedecer limites estritos, uma inversão no sentido de giro do motor afetaria o sequenciamento da abertura das válvulas e impediria o correto funcionamento do motor nessas condições. Já um sistema eletro-hidráulico de acionamento das válvulas, além dessa vantagem prática especificamente para a propulsão naval, ainda proporciona uma sensível redução de peso (podendo alcançar uma faixa de 20kg no caso de um motor de 1.6L destinado a carros médios) e volume em comparação a um comando de válvulas mais tradicional, além de impor menos atritos internos e perdas de eficiência e desempenho.

Já nas aplicações automobilísticas, a proposta de uma aplicação de sistemas como o Freevalve que está sendo desenvolvido por uma empresa associada à Koenigsegg está mais direcionada a motores de ignição por faísca com a expectativa por um incremento da ordem de 47% no torque, 45% na potência e de 15% na economia de combustível, além de uma redução de 35% nas emissões. A maior versatilidade no controle da abertura e duração das válvulas, podendo não só alterar mais facilmente esses parâmetros de acordo com os regimes de rotação mas também com o combustível em uso, chegou a ser apontada por Christian von Koenigsegg como pretexto para manter o uso da injeção sequencial nos pórticos de válvula ao invés de levar adiante a transição para a injeção direta que vem ocorrendo em motores de ignição por faísca principalmente quando também são equipados com turbocompressor. Outro aspecto relevante é a maior linearidade tanto na abertura quanto no fechamento das válvulas, tendo em vista que o acionamento mais rápido proporcionado por um sistema hidropneumático controlado eletronicamente possibilita manter a abertura máxima por um intervalo mais longo em comparação aos perfis dos ressaltos num eixo de comando de válvulas que mais lembram uma rampa.

O tamanho mais compacto do cabeçote em um motor dotado com o sistema Freevalve também chama a atenção, tendo em vista que dispensa desde os eixos de comando até as correias ou correntes com os respectivos tensores, passando ainda pelas polias ou engrenagens de sincronização. Outros elementos como o corpo de admissão (throttle-body) e até pré-catalisadores também se tornam dispensáveis, em função do controle individual de cada válvula suprir a função de controlar a aceleração num motor de ignição por faísca e também proporcionar um melhor gerenciamento térmico de modo a atingir e estabilizar mais cedo a temperatura operacional do motor e do catalisador, contemplando também a aplicabilidade em motores "flex" movidos a gasolina e etanol. Em comparação à injeção direta, que se por um lado facilitou a partida a frio com o etanol por outro dificulta a conversão para gás natural, a preservação da injeção nos pórticos de válvula de admissão não intensifica a formação de material particulado que tem deixado de ser um calcanhar de Aquiles exclusivo do Diesel, além da mistura ar/combustível formada antes da carga de admissão entrar nos cilindros sofrer um resfriamento que já contribui também para a redução na formação de óxidos de nitrogênio. A persistência da Toyota que tem apostado na permanência da injeção sequencial em alguns modelos híbridos como o Prius, bem como as perspectivas para que o etanol ganhe relevância junto a esse tipo de propulsão por iniciativa da própria Toyota, levam a crer que a aposta de Christian von Koenigsegg pela injeção sequencial nos pórticos de válvula efetivamente mantenha acirrada a competição entre a ignição por faísca e o Diesel de médio a longo prazo...
Embora não seja possível apontar uma unanimidade em se tratando de configurações do motor a gasolina num veículo híbrido, com a estratégia mais conservadora da Toyota contrastando com o uso do turbo e da injeção direta versões híbridas de modelos da Volvo como o S90, é natural que volte à pauta a alegada maior facilidade para mitigar a pré-ignição mesmo combinando a injeção sequencial e uma alta taxa de compressão e o turbo que em outras épocas era invariavelmente tratado como um problema para a economia de combustível antes da injeção direta se firmar no mercado. Pode parecer um xeque-mate para o Diesel, mas o caso da atual linha de motores modulares da Volvo que faz uso de um mesmo projeto básico de blocos para todas as versões ainda dá margem a outras interpretações que não apontem para essa circunstância. E caso houvesse um real interesse em integrar diferentes alternativas para reduzir o consumo de combustível ao invés de gerar a divisão acentuada no âmbito político, que se reflete na recente caça às bruxas contra o Diesel em veículos leves, não se justificaria varrer para baixo do tapete as experiências prévias do acionamento de válvulas sem eixo de comando na propulsão naval antes que se cogitasse levar adiante um análogo para aplicações automotivas.
Naturalmente, o sistema Freevalve e similares podem soar como uma forte oposição ao Diesel de forma comparável à que os híbridos geralmente são apresentados na mídia, mas essa está longe de ser uma verdade absoluta. Além da aplicabilidade junto ao ciclo Diesel já ter sido comprovada antes mesmo de se tornar uma promessa na ignição por faísca, é possível traçar um paralelo com outros sistemas de acionamento de válvulas sem contato com um eixo de comando, desde alguns motores 4-tempos muito antigos cujas válvulas de admissão recorriam ao vácuo gerado pela sucção durante a própria fase de admissão para a abertura e o retorno por mola, passando pelo uso de palhetas também acionadas por sucção na admissão de alguns motores 2-tempos, para não entrar no mérito do que se conhecia como "válvula de potência" como o YPVS usado no escapamento de motos Yamaha com motor 2-tempos a exemplo da RD 350 LC apesar de não ter o funcionamento tão intermitente quanto o duma válvula de motor 4-tempos ou mesmo de um conjunto de palhetas. No fim das contas, o que mais se aproximaria dessa proposta de adaptabilidade a diferentes faixas de rotação para modular o desempenho seria o YPVS por ser ativo, enquanto outros tipos de válvula destinados à admissão e acionados de forma passiva não proporcionam nenhuma possibilidade de ajustes em tempo real de acordo com as condições operacionais às quais o motor estaria submetido.

Como tantos outros recursos que incluem desde a hibridização até o sistema MGU-H que suprime o turbo-lag e recupera uma maior parte da energia contida nos gases de escape, acionar as válvulas sem depender de eixos de comando pode acabar servindo como mais uma ponta de lança contra o Diesel, mesmo que para esse tipo de motor se tenha feito necessário desenvolver soluções mais efetivas em comparação ao que se aplicou na ignição por faísca em outros momentos históricos. Também seria no mínimo desonesto ignorar que outros aperfeiçoamentos também se encaminharam para alcançar uma massificação quando as vantagens foram inicialmente observadas em maior escala exatamente em motores Diesel, como o turbo e a injeção direta. Enfim, o acionamento de válvulas sem um eixo de comando pode soar como mais uma tentativa de salvação para o motor de ignição por faísca, mas os benefícios práticos não estariam restritos a essa configuração e podem beneficiar também o Diesel.

domingo, 7 de abril de 2019

Caso para reflexão: geração atual da Chevrolet S10 e da Isuzu D-Max em meio à histeria por potência no mercado das pick-ups

A semelhança visual entre a Chevrolet S10 e a Isuzu D-Max não é mera coincidência, tendo em vista que as fabricantes são parceiras de longa data. No entanto, apesar de compartilharem o projeto básico de chassi e carcaça, na parte mecânica há uma diferenciação mais acentuada. No caso da S10, que no Brasil e mercados de exportação regional tem no motor Duramax de 2.8L a única opção turbodiesel, o comando de válvulas duplo é sincronizado por correia dentada, com potência e torque de 200cv a 3600 RPM e 440Nm com câmbio manual ou 500Nm com câmbio automático a 2000 RPM. Por sua vez a D-Max tem uma grande variedade de motores desenvolvidos pela própria Isuzu de acordo com especificidades de cada mercado, mas na Argentina e no Paraguai recorre ao 4JJ1-TC num rating de 177cv também a 3600 RPM e torque de 430Nm de 2000 a 2200 RPM para ambos os tipos de câmbio oferecidos, diferindo-se também pela sincronização por corrente ao invés de correia dentada. Ainda que não seja exatamente um motor tão rústico quanto outros da mesma série J que foram utilizados em gerações anteriores das pick-ups Isuzu, chama a atenção essa estratégia de oferecer o motor numa configuração menos ousada e aparentemente inspirada na tradição de utilitários mais destinados ao trabalho, podendo ser interpretada como uma opção para gerar menos esforços sobre componentes do motor, que também está disponível numa versão de 148cv a 2800 RPM e 375Nm de 1600 a 2800 RPM para uso em alguns caminhões leves. Naturalmente que o torque abundante é uma característica muito desejável e apreciada por quem opta por motores Diesel, e as gerações mais modernas tem sido beneficiadas pela evolução nos sistemas de injeção eletrônica e recursos diversos como o turbo de geometria variável, mas às vezes não é necessário ir com tanta sede ao pote e um ajuste mais conservador pode atender bem a muitos operadores que visem tanto a durabilidade quanto economia de combustível.

sábado, 6 de abril de 2019

Mais uma pérola do YouTube: motoneta similar à Honda Biz convertida para Diesel no Vietnã

Já não é nenhuma novidade que se pode converter motores de ignição por faísca para Diesel, sendo uma prática bastante difundida até entre os fabricantes de automóveis com o intuito de economizar custos de desenvolvimento. Mas o vídeo mostrando uma motoneta similar à Honda Biz convertida no Vietnã surpreende.
Do lado esquerdo pode ser observada a bomba injetora, adaptada junto à engrenagem do eixo de comando de válvulas para sincronização, e ainda um orifício adicional feito para acomodar a vela de incandescência (glowplug) usada para pré-aquecer o motor e facilitar a partida a frio. Do lado direito observa-se o bico injetor no orifício originalmente destinado à vela de ignição. Possivelmente o sistema de injeção direta tenha sido adaptado de algum motor estacionário pequeno.

quinta-feira, 4 de abril de 2019

Caso para reflexão: eventual influência das restrições brasileiras ao Diesel na defasagem entre as gerações do Peugeot 308 na Europa e América do Sul

Ao me deparar na semana passada com um Peugeot 308 de 2ª geração com placas brasileiras, que foi algo surpreendente embora eu já tivesse visto um com placa do Uruguai nas imediações do Colégio Militar de Porto Alegre no ano passado, foi impossível esquecer que a PSA vem sendo uma das mais importantes desenvolvedoras de motores Diesel para veículos leves a nível mundial. O exemplar que eu vi é a gasolina mesmo, equipado com o motor THP de 1.6L com turbo e injeção direta, e ao que tudo indica faz parte de um lote importado só para testes de homologação e posteriormente revendido antes que planos da importação dessa geração fossem suspensos. Em parte a maior sofisticação e os custos para atualizar o ferramental de produção na Argentina podem ter sido um empecilho para que fosse estabelecida uma produção regional no Mercosul, bem como as políticas protecionistas ainda em vigor no Brasil, mas nada me convence de que as restrições ao uso de motores Diesel em veículos leves com base nas capacidades de carga e passageiros ou tração não possam ter afetado perspectivas de mercado tanto para esse quanto para outros hatchbacks médios e também modelos de segmentos diferentes que cada vez mais perdem espaço para SUVs urbanóides que geralmente não chegam nem perto de honrar as capacidades de incursão off-road de antecessores com concepção mais tradicional.
Naturalmente o comprador de um hatch médio iria preferir uma imagem de mais "esportividade" que não costuma ser associada tão imediatamente a uma proposta off-road, ainda mais num país onde não se lembra com tanta frequência do histórico da Peugeot em campeonatos de rally, apesar de que com a necessária "tropicalização" que em ex-colônias francesas na África e departamentos ultramarinos franceses inclui maior altura de rodagem e até mesmo um diferencial de deslizamento limitado não é de se espantar que um modelo dessa categoria na mão de um colono na Guiana Francesa ou de um africano possa enfrentar condições de rodagem mais severas do que as encontradas por boa parte dos compradores de SUV no Brasil. Eventualmente não seja nem o caso de tentar fazer uma analogia com a aptidão off-road do Fusca e derivados como outro pretexto para se considerar uma derrubada dessas restrições absurdas ao licenciamento de automóveis com motor Diesel no país ao considerarmos uma disponibilidade do diferencial de deslizamento limitado que às vezes faz falta até em trechos urbanos, mas não se pode negar que o modismo dos SUVs mesmo que nem sempre dotados dessa motorização fomenta o desinteresse em atualizar a linha de modelos como o Peugeot 308 cuja 1ª geração ainda em produção na Argentina passou por uma remodelação concentrada na frente e cujo resultado ficou um tanto questionável. O grande volume de vendas do mercado brasileiro comparado a países vizinhos, e que nos últimos anos vem contando com uma maior participação de modelos com percepção de valor agregado superior como é o caso dos SUVs e também com a opção pelo câmbio automático atraindo mais consumidores, levaria a crer que uma liberação do Diesel pudesse ser atrativa para manter uma oferta mais diversificada e manter a relevância de segmentos como o dos hatches médios.
Levando em consideração que na Argentina o modelo antigo permanece em linha com duas opções de motores de ignição por faísca entre o vetusto EC5 e o THP além de um turbodiesel, paralelamente à versão GT da atual geração importada da França somente com o motor THP, pode-se deduzir que a liberdade de escolher a motorização mais adequada às necessidades e/ou preferências do operador sem distinções por capacidades de carga e passageiros ou sistema de tração é uma medida salutar para uma diversificação das categorias de veículos no mercado e também favorece os consumidores. Não dá para esquecer que um automóvel mais convencional frequentemente proporciona condições mais favoráveis à economia de combustível em comparação a um SUV de tamanho próximo, destacando o peso mais baixo e a aerodinâmica mais apurada, o que seria especialmente vantajoso diante do uso de pick-ups e SUVs legalmente aptos a usar motores Diesel no Brasil como veículos particulares e assim subvertendo a idéia de que uma definição arbitrária de "utilitários" poderia ser útil para priorizar a disponibilidade de óleo diesel convencional para aplicações de serviços. Enfim, mesmo que passe longe de ser o fator mais determinante para a defasagem entre o Peugeot 308 europeu e o argentino, nem para a consolidação do mercado automobilístico brasileiro numa menor variedade de categorias, não dá para descartar que as restrições brasileiras ao Diesel tenham alguma influência nessa dinâmica até mesmo a nível de Mercosul.