A questão da defasagem do valor máximo de R$70.000,00 (incluídos os impostos) para que um carro 0km fabricado no Brasil, Mercosul ou México possa ser adquirido com isenção de IPI, ICMS e IOF (quando financiado) também desperta controvérsias, e faz com que esse segmento tão específico da população seja cada vez mais compelido a abrir mão do próprio direito ou partir para um downgrade de motorização, equipamentos ou mesmo de modelo, mas naturalmente não é o único empecilho. De certa forma, as restrições ao Diesel em veículos leves também podem ser encaradas como parte do problema ao inviabilizar que alguns consumidores com um orçamento mais modesto tenham acesso a uma alternativa mais econômica e prática. Convenhamos que uma cadeira de rodas ou outro equipamento assistivo não ter que disputar espaço com um cilindro de gás natural, por exemplo, já seria um argumento válido a favor do Diesel para um deficiente físico que esteja buscando por uma redução do custo operacional num carro adaptado.
A bem da verdade, uma compatibilidade com motores Diesel nunca esteve entre as prioridades da indústria de adaptações veiculares para deficientes físicos que ia se estabelecendo durante o pós-guerra visando principalmente atender aos veteranos mutilados tanto nos Estados Unidos quanto na Europa. Motores de ignição por faísca, além do custo inicial mais baixo, normalmente contam
com o vácuo gerado na depressão do coletor de admissão como uma provisão para os atuadores usados em
sistemas de automatização de embreagem frequentemente indicados para
condutores com deficiência em uma ou nas duas pernas que desejassem um veículo com câmbio manual. Enquanto carros americanos como o Chevrolet Bel-Air dispunham de motores com cilindrada mais avantajada que se adaptavam melhor aos pesados câmbios automáticos da época, tanto de 6 cilindros em linha quanto os V8, os europeus levavam a economia de gasolina mais a fundo com modelos como o Opel Olympia Rekord que dispunha somente de motores com 4 cilindros e câmbio manual de 3 marchas.
A percepção do Diesel como "coisa de trator", e que só foi mudar a partir de fins da década de '90 e início dos anos 2000 quando algumas caminhonetes médias como a Nissan Frontier e a Mitsubishi L200 passaram a contar exclusivamente com essa opção de motorização para o mercado brasileiro, talvez tenha contribuído para manter alguns tabus em função do longo período em que o câmbio automático permaneceu como um ilustre desconhecido e rejeitado pelo consumidor brasileiro mediano. A própria concepção dos sistemas de injeção totalmente mecânicos ainda predominantes durante a maior parte da década de '90 fazia com que o câmbio manual e a embreagem fossem vistos como um fator de segurança a mais ao poderem ser usados para "matar na embreagem" caso o solenóide de parada do motor não fosse devidamente acionado ao se desligar o veículo ou mantê-lo minimamente controlável até uma parada segura na ocorrência de um "disparo".
Mesmo entre modelos com uma maior influência americana na concepção, como era o caso da Ford F-250, durante muito tempo não dispunham da comodidade do câmbio automático nas versões destinadas ao mercado brasileiro, mas apesar desse pequeno detalhe eventualmente aparece algum exemplar adaptado para deficiente físico sem abrir mão da economia proporcionada pelo motor turbodiesel. A maior dificuldade está justamente na adaptação do controle da embreagem, para o qual não restavam muitas outras escolhas além de dispositivos rudimentares de acionamento manual que podem também comprometer a segurança do veículo, além do próprio câmbio manual fazer com que a aplicabilidade do veículo fique mais limitada no tocante às deficiências para as quais possa ser adaptado de uma forma que não sacrifique o conforto nem ponha em xeque a segurança.
A situação hoje é diferente, com a presença massiva do gerenciamento eletrônico nos motores trazendo uma maior suavidade no funcionamento que alçou a atual geração de motores Diesel a uma condição de prestígio antes reservada aos motores a gasolina com 6 ou mais cilindros e alta cilindrada. Antigos questionamentos quanto à compatibilidade com o câmbio automático também vem sendo derrubados, chegando-se ao ponto de alguns veículos como a pick-up full-size Ram 2500 e o SUV compacto Jeep Renegade nem sequer oferecerem o câmbio manual nas versões Diesel direcionadas ao mercado brasileiro mesmo quando tal opção está disponível no exterior. Portanto, além de uma eventual adaptação tornar-se mais fácil, é possível atender a uma maior variedade de deficiências físicas que inviabilizem o uso do câmbio manual.
Ainda pode-se dizer, no entanto, que se trata de uma injustiça o direito ao uso do Diesel ficar reservado aos que podem se dar ao luxo de pagar os altos valores pedidos por alguns dos modelos classificados arbitrariamente como "utilitários" em função de capacidades de carga, passageiros ou tração mesmo que não venham a ser realmente necessários durante a operação do veículo. Particularmente no caso de deficientes físicos, para quem um carro acaba se tornando muito mais do que um mero símbolo de status, a maior durabilidade inerente ao Diesel pode de certa forma tornar a vida mais fácil por diminuir o tempo que o veículo ficaria parado para manutenções, além da economia de combustível proporcionar uma maior autonomia e custos operacionais menores sem prejudicar a acomodação de equipamentos de acessibilidade.