sexta-feira, 26 de abril de 2024

Caso para reflexão: Asia Motors Rocsta e incoerências na restrição ao uso de motores Diesel em veículos de tamanho semelhante em outras categorias

Uma circunstância que eventualmente possa passar despercebida à primeira vista, é como as dimensões externas mais contidas tendem a favorecer a manobrabilidade de utilitários de concepção tradicional como o antigo Asia Motors Rocsta R2 nos trechos off-road mais travados, e que também é convidativa a uma observação quanto a incoerências em torno das restrições contra o uso de motores Diesel em veículos leves no Brasil. Podendo chegar ao extremo de comparar um jipão raiz a um calhambeque, e considerando obviamente as diferenças no tocante à tração nas 4 rodas ou à própria disponibilidade do motor Diesel no caso específico do Rocsta, só o comprimento e a largura menores que o das gerações de carros "populares" brasileiros oferecidos na mesma época tornava compreensível até um jipão essencialmente voltado a atender às necessidades das forças militares da Coréia do Sul ao redor de 30 anos atrás pudesse ser atrativo para quem buscasse tão somente a diferenciação em proporções semelhantes à atual moda de SUV, além do mais no embalo da reabertura das importações ocorrida no início da década de '90 no Brasil. Permanecia literalmente na medida certa para trafegar pelos centros urbanos que já se mostravam um tanto congestionados, eventualmente até com mais desenvoltura que um "popular".

De forma análoga a como as caminhonetes foram alçadas a uma condição de artigo de luxo até em ambiente urbano, ainda que os SUVs da moda tenham como característica o tamanho exagerado sem reflexos práticos na capacidade de carga ou passageiros, era até de se esperar que a farra dos importados em meio à reabertura da importação de veículos no começo da década de '90 favorecesse uma maior receptividade até a uma categoria tão marcada pela austeridade, como costumava ser o caso de jipes tradicionais, tão somente pela procedência estrangeira. Embora ainda tivesse uma largura até bastante normal em comparação aos carros compactos nacionais, e a bem da verdade esteja mais estreito que a grande maioria dos modelos das gerações mais recentes de carros "populares", tinha o comprimento e a distância entre-eixos mais contidos já como uma vantagem prática que se revelava desejável até para o uso urbano, de forma bastante análoga à antiga cultura do owner-type Jeep (OTJ) filipino emergida do aproveitamento de excedentes deixados pelas forças militares dos Estados Unidos no imediato pós-guerra nas Filipinas que ainda havia dado origem também a aplicações no transporte comercial de passageiros com os jeepneys. Mas ao contrário do Brasil, cujo envolvimento direto na II Guerra Mundial foi apenas no front externo e o Jeep tinha um destaque maior em função dos usos na atividade agropecuária, ao longo do tempo a tração 4X4 imprescindível para uso militar nunca foi transformada em parâmetro para definir se um veículo com capacidade de carga abaixo de uma tonelada e acomodação para menos de 9 passageiros (sem contar o motorista) poderia usar motor Diesel.

Talvez a infeliz ridicularização do homem do campo por parte da mídia e de "artistas" de caráter duvidoso, e a forma como utilitários 4X4 eram mais vinculados à imagem de um Brasil rural e muito estereotipado, eram um empecilho para modelos como o Asia Motors Rocsta terem sido apresentados com enfoque mais generalista junto a um público urbano, em que pese o tamanho até mais favorável a usos menos especializados. Naturalmente a concepção bem mais pesada em comparação a carros generalistas de tração dianteira que já haviam sido consolidados como o padrão, e características que vão do layout de chassi separado da carroceria ao motor em posição longitudinal, e as suspensões por eixo rígido acabarem comprometendo a eficiência geral, dão a entender que um utilitário mais bruto atrair a usuários essencialmente generalistas vai além do tamanho, e também abrangendo a possibilidade de usar um motor Diesel em função da burocracia brasileira que impede tal opção em veículos de outras categorias com um footprint semelhante sobre o leito carroçável das ruas. Enfim, apesar de atender tanto a operadores estritamente profissionais quanto ao uso recreativo mais eventual, fica claro como as normas limitando o uso de motores Diesel a veículos utilitários deixaram de fazer sentido.

sexta-feira, 19 de abril de 2024

Caso para reflexão: Ford Maverick híbrida

Com a peculiaridade de ter versões híbridas como opção de entrada e sempre com tração dianteira, enquanto as versões não-híbridas são apresentadas como uma opção especial e para as quais é oferecida a tração 4X4 como parte de pacotes de equipamento voltados ao uso off-road, a atual geração da pick-up Ford Maverick apresentada em 2021 e trazida ao Brasil já em 2022 inicialmente só em versão 4X4 também passou a vir como híbrida em 2023. Produzida exclusivamente no México e enquadrada naquela proposta da Ford para concentrar esforços na linha de utilitários no mercado americano e adjacências imediatas por ter melhores margens de lucro que as de um carro generalista, e beneficiada naquela regulamentação que favorece os "caminhões leves" também no tocante às metas CAFE de eficiência energética aplicáveis aos Estados Unidos, por lá é o modelo de entrada dentre as pick-ups Ford enquanto em outras regiões incluindo o Mercosul chegou a alternar tal posição com a Ranger, situação curiosa ao lembrarmos pelas diferentes características técnicas de uma pick-up dita compacta para os padrões americanos como a Maverick é a princípio mais barata de produzir com o uso de estrutura monobloco e motor transversal. E apesar de haver uma maior percepção de simplicidade na tração dianteira, bem como o conjunto de engrenagens do acoplamento entre o motor 2.5 aspirado a gasolina e os 2 motores elétricos, além do mais que nessa configuração os motores elétricos assumem as funções que seriam do motor-de-arranque e do alternador em congêneres sem sistemas híbridos, é natural que questionamentos em torno do custo e logística tanto de produção quanto de substituição e descarte de baterias nos veículos híbridos e elétricos fomentem o ceticismo de uma parte do público.

Tendo em vista que no Brasil tem chegado só nas versões FX4 com a tração 4X4 que exige o motor 2.0 EcoBoost a gasolina com câmbio automático de 8 marchas e Lariat Hybrid, já chama a atenção a híbrida vir mais cara em que pese principalmente ter tração simples, e certamente fatores tão diversos quanto os veículos híbridos em geral serem isentos do rodízio em São Paulo que é o maior mercado automobilístico do Brasil e a expectativa por um consumo de combustível mais contido já acabam influenciando a percepção de valor agregado em torno da imagem que tem sido atrelada aos híbridos e elétricos como opção inerentemente mais "moderna" e portanto prestigiosa. O contraste com a "obrigação" de oferecer a configuração híbrida nos Estados Unidos por motivações talvez mais políticas e vantagens fiscais ao invés de estritamente aspectos técnicos também pode fomentar os mais variados questionamentos quanto a um motor turbodiesel poder favorecer o modelo e permanecer com um preço competitivo em mais regiões, até no Brasil caso um eventual fogo amigo com a Ranger seja ignorado pela parte do público mais direcionada a um uso predominantemente particular/recreativo de pick-ups em geral. E apesar da Ford já dispor dos recursos técnicos necessários para uma extensão da oferta de tração 4X4 às versões híbridas da Maverick, condição que poderia ser explorada também naquele âmbito de se tratar sempre híbridos como inerentemente antagônicos aos motores Diesel em todas as categorias de veículos leves e como ponta de lança contra propostas de uma derrubada de restrições baseadas em capacidades de carga e passageiros ou tração para classificar de forma totalmente arbitrária e obsoleta quais veículos justificariam um privilégio de usar motor Diesel no Brasil mesmo desvirtuando as alegações que o óleo diesel convencional deveria ser permitido somente a "utilitários".

Enquanto o cerco aos motores de combustão interna tem sido especificamente pior contra o Diesel a nível mundial, e os Estados Unidos como principal destino para a atual geração da Ford Maverick tendo dificuldades a mais no tocante às regulamentações de segurança veicular e emissões muito mais específicas em comparação à Europa que é o parâmetro mais lembrado no Brasil ao abordarmos tais temas, cabe lembrar que eventuais impactos sobre o peso e a capacidade de carga de um veículo com motor turbodiesel moderno e os mais recentes dispositivos de controle de emissões encontra um paralelo com algumas dificuldades para acomodar uma bancada de baterias em congêneres híbridos. Apesar de parecer que filtros de material particulado e tanques de AdBlue/ARLA-32 representariam uma sentença de morte para motores Diesel junto ao público generalista mundo afora, e favorecimentos políticos a veículos híbridos e elétricos gerarem distorções pontuais nos rankings de vendas em países desenvolvidos, uma caminhonete que além da capacidade de carga mais modesta só é oferecido com motores de ignição por faísca acaba ficando com uma presença global menor que outra disponibilizada com motores turbodiesel na maioria dos mercados mundiais, em que pese haver cenários regulatórios diferentes que se revelem inócuos em induzir o público generalista à preferência por híbridos. Logo, por mais válido que seja considerar diversas configurações de chassi e transmissão para utilitários de acordo com as necessidades ou orçamentos (considerando países onde seja mais razoável o preço de um veículo novo), na prática a Ford Maverick é um parâmetro pertinente para avaliar se a receptividade aos híbridos seria algo natural ou forçado pelas mais diversas razões de acordo com cada mercado.

quinta-feira, 11 de abril de 2024

5 motores eventualmente melhores que o Toyota 1VD-FTV

Possivelmente um dos motores que fizeram menos sentido na história, o 1VD-FTV V8 de 4.5L surgiu em 2007 para equipar a linha Toyota Land Cruiser, tendo sido oferecido como opção na geração J200 em alguns mercados e o único motor oferecido durante todo o ciclo desse modelo na Europa onde foi apresentado simplesmente como Land Cruiser V8. Mas a bem da verdade, considerando calibrações diferentes de acordo com fatores regionais como uma preferência pelo Diesel restrita a aplicações estritamente utilitárias ou espaço para dimensionar adequadamente o sistema de refrigeração de acordo com a quantidade de turbos aplicada, na prática foi um motor difícil de justificar. Dentre tantos outros que poderiam ter eventualmente servido melhor, ao menos 5 motores podem ser lembrados...

1 - Steyr Monoblock M16: um motor pouco reconhecido, embora tenha méritos como a integração entre o cabeçote e o bloco que é especialmente vantajosa para a refrigeração, e dispensando as juntas de cabeçote que são susceptíveis a danos com consequências um tanto imprevisíveis a depender de quando seja efetuada a manutenção corretiva. Com 6 cilindros em linha e 3.2L poderia parecer um tanto insuficiente à primeira vista, embora tenha também uma variedade de calibrações de potência e torque, bem como sistemas de injeção mais facilmente ajustáveis a uma variabilidade nas especificações do óleo diesel e de eventuais substitutivos que vão do biodiesel ao querosene, passando até por alguns óleos combustíveis mais pesados de uso marítimo. Tem as principais aplicações em algumas viaturas militares, e a propulsão de embarcações que pode ser considerada um parâmetro razoável para comparações ao motor Toyota 1VD-FTV porque a Yanmar comercializa uma versão com 2 turbos sob a denominação 8LV para uso em lanchas e outros barcos de lazer;

2 - Cummins ISF3.8: as diferenças tanto na cilindrada quanto em outras características do ISF3.8 diante do 1VD-FTV podem agradar a quem prefira a simplicidade, tendo só 4 cilindros e comando de válvulas no bloco com sincronização por engrenagens, mas a proposta luxuosa do Toyota Land Cruiser 200 provavelmente desencorajava o uso de motores com 4 cilindros mesmo que fossem uma opção melhor que versões do 1VD-FTV com somente 1 turbocompressor ou até com 2 turbos na especificação mais austera que era oferecida em versões mais rústicas do Land Cruiser 200 que a Toyota Gibraltar Stockholdings comercializava;

3 - Toyota 15B-FTE: um motor bem mais rústico com 4 cilindros e 4.1L que a princípio poderia atender mais satisfatoriamente a algumas condições ambientais severas, que foi usado em caminhões e outros utilitários maiores que um Toyota Land Cruiser. Cairia como uma luva em regiões onde os diversos motores V6 e V8 a gasolina oferecidos para o Land Cruiser 200 poderiam atender a uma parte do público mais voltada à proposta de luxo, enquanto a opção turbodiesel ficava com um viés escancaradamente utilitário;

4 - Toyota 1GD-FTV: lançado em 2015, e pivô de uma polêmica recente quanto a testes de homologação, com só 4 cilindros e 2.8L podia parecer subdimensionado, mas tem passado a substituir motores em faixas de cilindrada próxima à do 1VD-FTV em utilitários Toyota e Hino. Também tem uma versão marítima na linha Yanmar, denominada 4LV;

5 - Optimizer 6500: pode até parecer muita loucura num primeiro momento sugerir que um motor como esse, que ainda usa injeção indireta e dificilmente poderia atender às normas de emissões Euro-4 e Euro-6, mas como chegaram a ser oferecidas versões do 1VD-FTV enquadradas nas normas Euro-2 para a África e o Oriente Médio já poderia fazer algum sentido. Além do mais que ainda é um dos principais motores para viaturas militares americanas, favorecido por uma vasta experiência em campo de batalha que já provou as capacidades operacionais desse motor em condições extremamente críticas.

sexta-feira, 5 de abril de 2024

Carros rebaixados: teoricamente proibidos, mas na prática tratados com alguma leniência que eventualmente pudesse ser estendida às conversões para Diesel

Ver um carro com a suspensão rebaixada às vezes a um patamar bastante extremo, e que obviamente traz reflexos à dirigibilidade do veículo como um todo, é algo até comum de acontecer pelas ruas brasileiras, ainda que a princípio haja uma regulamentação quanto a parâmetros como altura mínima do solo e também dos fachos dos faróis nem sempre seguidas tão à risca. Modificação feita mais em função de uma preferência estética, que a bem da verdade tem resultados discutíveis também nesse aspecto acentuados pelo fato de vir mais frequentemente associado a um uso de rodas com um tamanho maior que as originais a ponto dos paralamas "engolirem" parte dos pneus, contrastando com a prática dos latinos dos Estados Unidos que iniciaram a cultura dos low-riders usando conjuntos de roda e pneu com diâmetro total menor que o original. Deixando de lado como o diâmetro externo dos pneus no eixo de tração exerce efeito análogo ao de alterações na relação de diferencial, ou como tal circunstância talvez pudesse ser aproveitável para compensar ou atenuar diferenças nas curvas de potência e torque em substituições de motores, algo que tende a ser especialmente relevante no caso de conversões para Diesel, chama a atenção o tratamento diferenciado a ser dispensado por burocratas e por outros agentes estatais a modificações automotivas que costumam atender a segmentos do público que quase sempre divergem nas motivações.

Em primeiro lugar, alguns rebaixamentos de suspensão mais extremos também requerem alterações em outros componentes, sistemas e até elementos estruturais dos veículos, e na maioria das vezes por já haver uma série de regulamentações que acabam descumpridas pode haver prejuízos à segurança do veículo, e outros usuários das vias públicas também ficam expostos aos riscos que possam estar associados aos efeitos que tais modificações possam ter em sistemas como freio e direção por exemplo. Naturalmente a substituição de um motor também pode apresentar efeitos adversos a serem solucionados de um jeito ou de outro, considerando tanto motores de ignição por faísca quanto Diesel que possam ser adaptados com os mais diferentes graus de complexidade, além do mais destacando como um isolamento tecnológico que já foi mais intenso com relação aos motores Diesel de alta rotação limitou em demasia a oferta no Brasil quanto a motores compatíveis com faixas de potência e peso mais assimiláveis pelo público generalista, que acabou sendo condicionado a uma visão utópica em torno do álcool/etanol ou a eventualmente aceitar o gás natural como paliativo para atender às necessidades de quem efetivamente usa um veículo leve para trabalhar. Apesar de ainda ser um tanto escassa uma disponibilidade de motores turbodiesel de concepção moderna e desempenho mais conforme a expectativa do público generalista, especialmente agora que motores de ignição por faísca como o 1.8 FlexPower lançado na geração inicial da Chevrolet Montana dão lugar ao downsizing e à massificação do turbo, cabe salientar que alguns motores "de trator" até poderiam ter uma aplicabilidade mais imediata para atender a usuários com perfil estritamente profissional para quem o rebaixamento estaria fora de questão, mas a permanência das infundadas restrições com base nas capacidades de carga e passageiros ou tração para definir arbitrariamente se um veículo qualificaria como utilitário para fins de autorização do uso de um motor Diesel é um problema...

Embora qualquer substituição de motor feita legalmente seja mais rastreável por causa da numeração do bloco do motor no certificado de registro e licenciamento do veículo (CRLV - documento de porte obrigatório), e no fim das contas tal exigência dificulte fazer uma conversão clandestina além da possibilidade de problemas sérios que pode incorrer quem se arrisque com um motor "pinado" ou cujo número do bloco seja diferente do que tenha no documento, os carros rebaixados acabam beneficiados pela inspeção veicular nunca ter sido implementada com o mesmo rigor no Brasil até em comparação a países como a Argentina ou a Colômbia. Trazer o número do motor no documento a princípio pode ser relevante para tentar inibir a receptação de peças de procedência duvidosa faz sentido, mas tem como efeito colateral de dificultar a conversão para Diesel até em função do som diferenciado do motor atrair uma atenção de agentes de trânsito ou da polícia, e mesmo se puder comprovar a procedência lícita de um motor Diesel adaptado precariamente ainda haveria o risco de ser enquadrado por crime contra a economia popular. Enfim, apesar de serem alterações que atraem públicos com perfis quase sempre bem distanciados, essa questão dos carros rebaixados também pode exemplificar algumas distorções do mercado de veículos utilitários, tendo em vista como uma modificação feita por usuários de perfil mais estritamente recreativo acaba tendo uma maior facilidade para burlar entraves burocráticos que impedem a implementação de soluções mais adequadas para quem use efetivamente a trabalho um veículo do mesmo modelo.