terça-feira, 23 de janeiro de 2024

Poderia um motor Diesel 4-tempos ter mantido a Vemag competitiva na época dos DKW?

A marca DKW-Vemag foi uma das mais destacadas em estágios iniciais da indústria automobilística no Brasil, embora a empresa Vemag já tivesse experiências anteriores com a montagem tanto de veículos quanto máquinas agrícolas (o próprio nome Vemag sendo uma sigla de "veículos e máquinas agrícolas") no regime CKD, embora o motor a gasolina 2-tempos de 3 cilindros que equipou tanto o jipe Candango análogo ao DKW Munga alemão quanto os automóveis como o sedan DKW-Vemag Belcar que chegou a ser o primeiro modelo escolhido para servir de táxi na época da inauguração de Brasília em 1960 e foi produzido até 1967 despertasse reações de amor e ódio diante da concorrência com motores 4-tempos. A operação da Vemag para produção dos DKW ter sido sob licença da antiga Auto Union, encerrada de forma unilateral pela Volkswagen após adquirir a Auto Union da Daimler-Benz tanto no Brasil quanto em outros países como Espanha e Argentina onde veículos DKW também eram produzidos sob licença por empresas independentes torna inevitável uma comparação com o que se fazia na Espanha onde os únicos DKW produzidos eram furgões que passaram a ser oferecidos opcionalmente com motor Diesel 4-tempos Mercedes-Benz OM-636 de 1.8L e 4 cilindros em linha que acabou por substituir o 2-tempos a gasolina de origem DKW antes mesmo que a licenciatária IMOSA fizesse a transição da marca dos furgões para Mercedes-Benz. Mas ao contrário do que aconteceu na Espanha, ainda em meio ao regime franquista com estatismo exagerado na indústria automobilística visando assegurar reserva de mercado para a SEAT entre os veículos leves e a ENASA entre os caminhões, a Volkswagen do Brasil comprou a Vemag, e simplesmente descartando a linha DKW-Vemag sem qualquer possibilidade de usar o mesmo expediente aplicado na antiga Alemanha Ocidental e na África do Sul onde a marca Audi ressurgia com uma transição da Auto Union dos motores 2-tempos para 4-tempos ainda somente a gasolina.
Embora modelos mais antigos da DKW que tiveram alguns exemplares importados usassem um motor também 2-tempos a gasolina mas com somente 2 cilindros e instalado em posição transversal, no Brasil o único motor que equipou a linha DKW-Vemag ter sido de 3 cilindros em posição longitudinal à frente do eixo dianteiro também impunha alguma dificuldade para adaptar os poucos motores Diesel da época, tanto na Europa onde a Espanha teve algum destaque com fabricantes independentes de motores como a Barreiros Diesel (depois Chrysler España, e por último vendida em partes às antigas Renault Véhicules Industriels e PSA Peugeot-Citroën, sendo atualmente produzidos caminhões Renault e diversos veículos leves de marcas de propriedade da Stellantis em Madrid na área onde a Barreiros esteve instalada), e até a Matacás que operava entre 1954 e 1966 na cidade de Sant Feliu de Llobregat, província de Barcelona, e teve uma notoriedade especial por produzir de 1962 a 1966 o motor Diésel Matacás Tipo 932-D de 2 cilindros para atender especificamente a adaptações em veículos DKW tanto com o motor de 2 cilindros transversal quanto com o de 3 cilindros longitudinal. Infelizmente são escassas as informações precisas de especificações técnicas do motor Matacás 932-D, embora a potência fiscal declarada em 8cv permita afirmar que esteja situado numa faixa entre 1.3L e 1.4L de cilindrada com base na fórmula matemática usada para definir a potência fiscal, sem distinção por tipo de combustível mas que situava o motor de 3 cilindros a gasolina original dos DKW entre 10 e 11cv fiscais, e o porte compacto por ter só 2 cilindros a princípio já minimizava eventuais alterações na concentração de peso entre os eixos que outro motor Diesel da época pudesse causar. Além de talvez ter facilitado para a Vemag tentar vender jipes para as forças armadas, que recusaram o Candango e abreviaram a produção do modelo apenas de 1958 a 1963, certamente a introdução de um motor Diesel compacto e leve o suficiente para atender tanto a modelos DKW-Vemag quanto a adaptações em veículos de outros fabricantes teria sido desejável, eventualmente até para fomentar a produção e uso de óleos vegetais como combustível veicular paralelamente ao que o álcool/etanol representou no tocante aos motores de ignição por faísca, e antecipando-se às restrições que acabaram sendo implementadas ao uso de motores Diesel em veículos leves no rescaldo da Guerra do Yom Kippur e das crises do petróleo deflagradas a partir da década de '70 quando a própria Vemag já havia virado história...

quarta-feira, 17 de janeiro de 2024

Câmbio automático: único motivo para o motor V6 ainda ter seguido em catálogo para a Blazer até ao menos 2004?

Um daqueles modelos que marcaram a perda do status de top de linha dos motores V6 a gasolina e uma ascensão dos turbodiesel mesmo com 4 cilindros à posição de destaque, a Chevrolet Blazer foi alçada à condição de um ícone no Brasil por motivos que vão do conforto ao uso como viatura de polícia, tendo sido competitiva até diante de concorrentes importados ao longo de uma parte considerável do ciclo de produção brasileira. Lançada em '95 com motor 2.2 a gasolina de injeção monoponto e 4 cilindros, e em '96 tendo recebido a opção pelo 4.3 V6 também a gasolina e pelo Maxion 2.5 HS turbodiesel ainda com tração somente traseira, teve em '98 o motor 2.2 atualizado para injeção multiponto e a opção de tração 4X4 para os motores V6 e turbodiesel, e já no ano 2000 à medida que o motor V6 perdia protagonismo em função do preço e da percepção de um alto consumo de combustível a introdução do motor MWM Sprint 4.07 TCA de 2.8L em substituição ao Maxion chamava a atenção naquele momento. E em 2001 a reestilização conhecida como "pitbull" onde o motor a gasolina com 4 cilindros passou a 2.4 parecia ser a pá de cal para o V6 no Brasil, embora esse motor ter ficado disponível apenas com tração traseira e câmbio automático deu uma sobrevida a essa opção até 2004 na versão Executive, e apesar de ser um SUV raiz de concepção tradicional que poderia fazer supor que a tração 4X4 seja imprescindível tinha o perfil de uso mais como símbolo de status para o público urbano no caso da versão V6, enquanto para o público interiorano ou estritamente profissional como forças policiais o motor turbodiesel soava até um tanto óbvia como a melhor opção mesmo tendo sido oferecido somente com câmbio manual.

A bem da verdade, o câmbio automático já oferecia benefícios no tocante ao conforto e podia até ser mais adequado a determinadas condições operacionais mesmo em uso off-road severo, tendo em vista o acoplamento ao motor sem interrupções durante mudanças de marcha, embora os controles eletrônicos incorporados a câmbios automáticos modernos pudessem ser mais facilmente integrados aos motores a gasolina que já incorporavam a injeção eletrônica antes que o MWM Sprint 4.07 TCE passasse a usar a injeção common-rail para o ano-modelo 2006 e a vigência das normas de emissões Euro-3, e portanto a aparente simplicidade de especificar os câmbios manuais e diferenciais para o motor menor a gasolina e o turbodiesel levando em consideração apenas as distintas faixas de rotação prevalecia. O motor V6 ter sido o único importado a equipar a Blazer no Brasil também o desfavorecia, além do mais levando em consideração a ascensão dos motores flex para quem fazia questão da ignição por faísca, e assim o 2.4 que passou a incorporar tal opção em 2007 apresentava um desempenho até interessante com o etanol, e até para adeptos das conversões ao gás natural a maior presença de kits de conversão "pressão positiva" com injeção sequencial era capaz de proporcionar resultados satisfatórios, e a princípio um perfil mais conservador do público-alvo da Blazer à medida que o encerramento do ciclo de produção no Brasil ia se aproximando acabou culminando na eliminação da opção pelo motor turbodiesel e por extensão da tração 4X4 para os anos-modelo 2010 e 2011 que foram os últimos. Enfim, apesar do motor V6 ainda ter sido reconhecido como expoente de desempenho mesmo em meio à ascensão dos turbodiesel, talvez a exclusividade do câmbio automático tenha sido o que proporcionou uma sobrevida ao V6 no mercado brasileiro...

quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

Breve reflexão sobre faixas de cilindrada antes subestimadas e como um veículo antigo possa ter um tamanho mais conveniente

Talvez a melhor referência para abordar como o downsizing levou algumas faixas de cilindrada que em outras épocas seriam consideradas "patéticas" seja a 3ª geração dos utilitários Volkswagen Transporter, a famosa Kombi quadrada que só chegou ao Brasil através de importação independente, como é o caso da Vanagon de especificação americana das fotos que esteve à venda na Expoclassic 2023 e cadastrada como motorhome na documentação. Certamente seria uma opção tentadora para adeptos da #vanlife em busca de um veículo diferenciado, mas que ainda tem dimensões externas mais razoáveis comparadas a modelos de concepção mais recente dentro do mesmo segmento de vans médias. No tocante a motores, a Volkswagen T3 teve opções boxer sempre com 4 cilindros a gasolina entre 1.6L e 2.0L refrigeradas a ar ou 1.9L e 2.1L já com refrigeração líquida, enquanto para a África do Sul o motor EA827 "AP" 1.8 a gasolina com 4 cilindros em linha precisou ser montado em posição horizontal para manter inalterada a altura do assoalho do compartimento de bagagens, mesma situação dos motores EA827 Diesel de 1.6L tanto atmosféricos quanto turbo oferecidos principalmente na Europa e em proporção muito menor nos Estados Unidos, sem entrar no mérito dos motores de 5 cilindros em linha a gasolina entre 2.3L e 2.6L que fizeram sucesso na África do Sul mas requeriam um assoalho mais alto do compartimento de carga.
A faixa de cilindrada de 1.6L podia soar insuficiente para um brasileiro acostumado a motores Diesel de concepção mais pesada e originalmente destinados a tratores, ou mesmo aos asiáticos que já associavam faixas de cilindrada mais generosas a utilitários da mesma categoria quando especificado motor Diesel, e passados mais de 30 anos desde o encerramento do ciclo de produção da Volkswagen Transporter T3 é até curioso que utilitários com capacidades de carga e passageiros análogas mas dimensões externas até exageradas de projeto mais recente usem motores turbodiesel na faixa entre 1.5L e 1.6L com sucesso. É compreensível que se possa considerar tanto a questão da segurança em impactos quanto o espaço para acomodar as gerações mais recentes de dispositivos de controle de emissões como os filtros de material particulado (DPF) ou um tanque de AdBlue/ARLA-32/ARNOx-32 para o sistema SCR fomentando um aumento nas dimensões externas de furgões médios modernos, acaba contrastando com o perfil bastante compacto inerente até à configuração de cabine avançada, mesmo que tenha permanecido uma faixa de cilindrada que podia anteriormente ser até considerada patética. Enfim, à medida que a massificação do turbo em motores Diesel e a injeção direta realmente proporcionam melhorias notáveis no desempenho, e também na eficiência geral, soa um tanto curioso que as dimensões compactas úteis tanto nos serviços para os quais um furgão médio pode ser aplicado quanto a usos turísticos para acessar locais onde uma "rolha de trilha" fique inconveniente acabe contrastando com a ascensão do downsizing...

sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

Rápida observação sobre a abordagem mais conservadora da Toyota com os motores de ignição por faísca

Uma das fabricantes de veículos com maior destaque a nível mundial, tanto em virtude da grande presença global quanto por uma adaptabilidade a peculiaridades e desafios de cada região onde atua, a Toyota chama a atenção por promover uma abordagem mais conservadora quanto aos motores de ignição por faísca. Tomando como referência o Yaris da geração XP150, que no Brasil teve a opção por motores de 1.3L e 1.5L flex com câmbio manual ou automático CVT antes que fossem consolidados só o motor 1.5 e o CVT a partir do ano-modelo 2022, salta logo aos olhos que nenhum motor enquadrado nos conceitos do downsizing tenha sido oferecido, ainda que a concorrência já apresente modelos dotados de turbo, injeção direta, ou ambos. De fato, a aparente simplicidade da injeção sequencial nos dutos de admissão e a aspiração natural agradam até mesmo a operadores de perfil mais conservador como taxistas, e também é possível destacar uma maior facilidade para implementar conversões ao gás natural.
Embora as regulamentações de emissões que entraram em vigor no Brasil em 2022 fossem um pretexto para a Toyota optar por manter um único conjunto motriz para o Yaris, é até curioso seguir com uma faixa de cilindrada acima dos "populares" que vem sendo muito mais associada ao turbo e à injeção direta na concorrência. Naturalmente, uma vantagem da injeção sequencial nos dutos de admissão pesa a favor, tendo em vista que dispensa o uso de filtros de material particulado que já deixaram de ser um calcanhar de Aquiles só dos motores turbodiesel, à medida que uma maior participação da injeção direta junto a motores de ignição por faísca acompanhou a ascensão do turbocompressor em modelos de perfil generalista. Assim como os motores Diesel tiveram consolidada a fama de serem eficientes em função da proporção menor de combustível pela carga de ar da admissão, os motores turbo a gasolina ou flex com ignição por faísca são favorecidos pela possibilidade de dispensar um enriquecimento da mistura ar/combustível que era o método mais fácil de mitigar os riscos da pré-ignição, e que era um empecilho junto ao público generalista por levar a um aumento do consumo de combustível.
Apesar de uma parte do público brasileiro generalista ter a imagem de simplicidade "à prova de burro" de motores flex com injeção sequencial nos dutos de admissão e aspiração natural, e até operadores de perfil mais conservador os aceitem para escapar da complexidade de gerações mais recentes dos dispositivos de controle de emissões nos motores turbodiesel, um aspecto claro é ser questionável até que ponto recursos como o turbo e a injeção direta realmente sejam tão imprescindíveis num motor de ignição por faísca. Tentar incorporar características que alçaram o Diesel a uma posição de destaque pela eficiência energética podem apresentar resultados pouco ou nada satisfatórios para um motor a gasolina ou flex, e portanto uma apresentação do downsizing antagonizando contra o Diesel torna-se um tiro no pé. Logo, se a Toyota prefere seguir uma abordagem mais conservadora, tem algum fundamento que às vezes passa despercebido por alguns concorrentes que insistam em empurrar o downsizing como desafiante ao Diesel em países onde se permite o uso em veículos leves ou como pretexto para silenciar essa pauta no Brasil...