sexta-feira, 27 de agosto de 2021

Até que ponto a indústria automobilística instalada no Brasil mais influencia ou é influenciada no tocante à ausência de opções Diesel ao menos para exportação regional?

Um país de grande extensão territorial e com diferenças culturais notáveis entre as regiões, o Brasil tem peculiaridades que se refletem em praticamente todos os aspectos da vida cotidiana, o que naturalmente encontra reflexos na oferta da indústria automobilística de capital estrangeiro instalada localmente. Não se pode negar também como o grande volume de vendas e a importância da produção de veículos para a economia brasileira terem favorecido a consolidação do país entre os principais hubs de exportação, em que pesem peculiaridades como a insistência em delinear o que é um carro "popular" tão somente com a cilindrada de até 1.0L e a aptidão para funcionar com etanol nos motores "flex" tendo sido favorecida a ponto de alguns como os FireFly 1.0 de 3 cilindros e 1.3 com 4 cilindros inicialmente lançados no Fiat Argo já as incorporem desde a fase de projeto. Apesar da importância que o Brasil tem não só a nível de América Latina, tendo em vista que diversos veículos brasileiros já chegaram a ser comercializados em algum momento na África e Oriente Médio ou até em mercados um tanto improváveis quanto Taiwan e Indonésia, fica difícil apontar com precisão se exerce uma influência maior que o eventual feedback de alguns destinos de exportação.
O caso específico do Argo, que foi apresentado com a proposta de atender tanto ao segmento de hatches compactos quanto cobrir a lacuna surgida na retirada da Fiat da categoria de hatches médios no Brasil, é um claro indício da importância que o mercado nacional tem para o fabricante a ponto de justificar uma uma solução para essa necessidade estratégica. Levando em consideração também uma influência que a escala de produção no Brasil tende a exercer em países vizinhos com uma menor capacidade instalada, a princípio poderia soar mais fácil deduzir que ao menos uma opção turbodiesel ficasse inviável mesmo em versões com pretensões menos austeras como o Argo Trekking, mas chega-se a um ponto em que já não é tão claro se o projeto especificamente destinado a uma região "emergente" dificulta a oferta dessa opção inerentemente mais custosa ou atrapalha uma maior inserção do modelo em mercados externos, a exemplo de países africanos onde a atual geração do Fiat Tipo europeu é oferecida em que pese o preço mais alto que reflete uma proposta mais sofisticada até por ser efetivamente de uma categoria acima do Argo. A bem da verdade, justificar tanto o maior custo já esperado de um motor turbodiesel quanto dos dispositivos de controle de emissões cada vez mais sofisticados fica mais fácil à medida que se dilui em um preço inicial mais alto, embora um modelo como o Argo pudesse manter um desempenho adequado com uma calibração de potência mais modesta em comparação a um modelo maior e ainda dispensar a complicação de um sistema SCR por exemplo.
Também não deixa de ser relevante salientar como alguns países que possam ser considerados sob uma influência direta da produção automobilística brasileira permanecem até mais defasados que o Brasil no tocante às normas de emissões já em vigor em outras regiões como Europa, partes da Ásia e Austrália, o que poderia favorecer a disponibilidade de um motor turbodiesel ao menos para exportação mesmo que prescindisse até do filtro de material particulado (DPF). Naturalmente o fato da produção brasileira hoje atender mais a países "emergentes" onde o custo inicial menor favorece motores de ignição por faísca, e alguns como a Argentina as conversões para gás natural sejam bastante populares enquanto outros mais próximos geograficamente ao México reflitam a influência dos Estados Unidos onde o Diesel tem dado vôos de galinha entre os veículos leves mesmo já sendo devidamente reconhecido como a melhor opção para as caminhonetes tão idolatradas por qualquer redneck (inclusive anglo-canadenses). Enfim, apesar do Brasil tenha entraves burocráticos específicos que impedem a oferta de bons motores turbodiesel em veículos leves, um feedback regional fomenta algum comodismo que dificulta oferecer essa opção para exportação regional.

quinta-feira, 19 de agosto de 2021

Refletindo sobre a questão dos "caminhões leves" nos Estados Unidos e "utilitários" no Brasil com uma breve observação sobre o mercado brasileiro de motos de pequena cilindrada

De uma pick-up como a Ford Ranger que mesmo nas versões de cabine dupla ainda pode efetivamente atender a finalidades profissionais até um SUV como o Jeep Compass que é de fato mais direcionado ao público generalista, algumas definições essencialmente burocráticas tornam diversos modelos de ambas as categorias uma opção convidativa e até desejável a consumidores que intencionem parecer estar levando uma vantagem ou aos próprios fabricantes que podem alegar o retorno mais rápido do investimento em comparação a automóveis mais austeros. Enquanto a principal motivação de um brasileiro para comprar uma caminhonete seja o direito de usar um motor turbodiesel caso a capacidade de carga ultrapasse uma tonelada ou disponha de tração 4X4, para um americano a possibilidade de obter um abatimento no imposto de renda justifica a eventual preferência por um "caminhão leve" mesmo descartando uma aplicação efetivamente utilitária. Também chama a atenção no caso dos Estados Unidos, além das regras menos rígidas quanto à capacidade de carga nominal, que os SUVs ainda podem ser enquadrados como "caminhões leves" mesmo quando dotados de tração simples, em oposição ao ocorrido no Brasil onde só as versões 4X4 de modelos com capacidade de carga nominal inferior a uma tonelada e lotação de menos de 10 pessoas já contando o motorista são homologadas como "utilitário" de acordo com as restrições ainda em vigor contra o uso de motores Diesel em automóveis.

O fato de SUVs e outros "caminhões leves" especificamente direcionados ao transporte de passageiros serem isentos da Chicken Tax incidente sobre pick-ups e furgões de carga nos Estados Unidos, além das normas mais lenientes no tocante às metas de redução no consumo de combustível que viabilizaram aos fabricantes americanos insistirem na produção de motores V8 sedentos por gasolina mesmo durante os primeiros choques do petróleo e o recrudescimento de normas de emissões, motivou ainda fabricantes de outras nacionalidades a darem cada vez mais atenção a esse segmento e impulsionando o fenômeno dos "crossovers" que aliam uma estética de SUV a uma configuração mais próxima a um automóvel que efetivamente a um caminhão. Como o Brasil está numa área que reúne influências tanto americanas quanto européias e japonesas sobre o mercado automotivo local, até alguns fabricantes que o público generalista reputa conservadores tem seguido aquela estratégia "americanizada" de impor os SUVs aos consumidores cujo perfil anteriormente privilegiaria as station-wagons, a exemplo da Toyota que chegou a introduzir o Corolla Cross antes no mercado brasileiro antes mesmo que o modelo chegue aos Estados Unidos. Ainda que o sufixo Cross possa num primeiro momento levar a crer que vá oferecer uma aptidão off-road muito destacada, na prática é só mais uma forma para burlar uma regra que inicialmente parecia ter uma finalidade nobre para atender a operadores profissionais mas rapidamente ficou obsoleta à medida que os americanos passaram a privilegiar caminhonetes em geral, mantendo a mesma concepção básica predominante nos automóveis modernos com estrutura monobloco e tração dianteira com motor transversal.

Torna-se inevitável fazer uma analogia com situações observadas no mercado brasileiro de motocicletas de pequena cilindrada, com destaque para a Honda CG hoje na 9ª geração, e a Honda NXR Bros dotada do mesmo motor da CG e atendendo ao segmento trail mas também atraindo consumidores generalistas de forma análoga ao que pode ser observado com relação ao modismo dos SUVs. Naturalmente, a idéia de uma maior capacidade de incursão off-road torna-se muito convidativa tanto para o uso cotidiano em ruas nem sempre bem conservadas quanto para quem deseje percorrer trilhas em momentos de lazer, e a diferenciação técnica entre as configurações de chassi é só a ponta do iceberg, e alguns fatores que num primeiro momento possam parecer irrelevantes como a altura do paralama dianteiro evitando o acúmulo de detritos entre o paralama e o pneu revelam-se mais práticas que uma abordagem meramente estética de alguns SUVs contemporâneos destinados a parecer mais brutos do que efetivamente sejam. No fim das contas, mesmo com as motos de um modo geral estando ainda mais afastadas de uma possibilidade para oferecer motores Diesel no Brasil, e uma trail possa ter uso urbano análogo às gerações recentes de SUVs com tração simples, constituem um bom parâmetro para avaliar também as distorções na regra de "caminhões leves" aplicáveis aos Estados Unidos.

sexta-feira, 13 de agosto de 2021

Caso para reflexão: Toyota Corolla Cross e algumas incoerências em apontar os híbridos como antagônicos ao Diesel

Em meio à obsessão pelos SUVs a nível mundial, a Toyota passou a oferecer essa opção de carroceria até para um verdadeiro símbolo de conservadorismo no tocante a automóveis como é o Corolla. Modelo que sempre foi conhecido pela proposta tradicionalista, mesmo com alguns poucos pontos fora da curva ao longo de uma linhagem de 55 anos, agora é oferecido também com a configuração de carroceria da moda devido ao ainda recente lançamento do Corolla Cross. Também é conveniente evidenciar através desse modelo o quanto os SUVs estão cada vez mais distanciados da proposta essencialmente utilitária para tornarem-se basicamente um "appliance car" para uso predominantemente urbano, em que pesem a ineficiência própria de uma carroceria mais volumosa que já constitui naturalmente um desafio para os aerodinamicistas e o peso que acaba sendo excessivo em comparação a outros tipos de carroceria.

Nem considerando o fato do Toyota Corolla Cross ser oferecido fora dos Estados Unidos somente com tração simples evidenciar uma mudança de perfil no público predominante dos SUVs, mesmo quando opções para oferecer tração 4X4 sem abrir mão do sistema híbrido no qual a fabricante de origem japonesa tem insistido em apostar tanto em mercados desenvolvidos como uma abordagem de oposição ao Diesel quanto no Brasil onde já incorpora a capacidade de operar tanto com a gasolina quanto com etanol, chama a atenção o fato de ter um tanque de combustível com capacidade menor para facilitar a acomodação da bateria tracionária nas versões híbridas. Tal medida já acaba constituindo um contraponto razoável à caça às bruxas que se faz com relação aos motores turbodiesel modernos, em função não só do custo associado a dispositivos de controle de emissões cada vez mais complexos mas também do espaço que exigem para a instalação. É impossível deixar de fazer uma comparação com o sistema SCR que depende de um reservatório para o fluido-padrão AdBlue, ou ARLA-32 como é mais conhecido no Brasil e já usado em maior escala em caminhões e ônibus, lembrando ainda que não deixa de ser mais fácil moldar tanques em polietileno em formatos mais convenientes para instalação em alguns espaços tão exíguos onde não é possível instalar uma bateria tracionária compatível com as necessidades de híbridos com o sistema HSD da Toyota, e portanto o Corolla Cross ter o tanque de combustível para 36 litros em versões híbridas contra 47 litros nas não-híbridas torna injustificável insistir em automóveis híbridos como mero pretexto para invalidar propostas de liberação do Diesel em veículos leves no Brasil.

Por mais que algumas opções como o híbrido flex a gasolina e etanol ou até conversões para gás natural possam ser justificados em diferentes condições, tanto estritamente operacionais quanto políticas como a isenção do rodízio para híbridos em São Paulo ou o desconto no IPVA para veículos convertidos a gás natural no Rio de Janeiro, nem sempre tais abordagens são feitas de uma forma mais conveniente para o usuário final. O exemplo do gás natural mesmo, que no caso do Corolla Cross eventualmente seria mais fácil de adaptar no híbrido por ainda ter somente a injeção sequencial nos pórticos de válvula enquanto o não-híbrido incorpora paralelamente a injeção direta, a instalação dos cilindros de armazenamento do gás frequentemente tomando algum espaço no compartimento de bagagens, mas não sacrifica o volume do tanque de combustível original. Enfim, além de salientar como tornou-se obsoleta aquela definição arbitrária de "utilitário" ainda usada para fins de homologação no Brasil, o Toyota Corolla Cross acaba por oferecer uma perspectiva que pode contrariar a apresentação dos híbridos como "anti-Diesel".

segunda-feira, 2 de agosto de 2021

5 veículos que poderiam ficar bons com o motor Volkswagen 1.4 TDI de 3 cilindros

Um dentre tantos bons motores praticamente desconhecidos pelo grande público brasileiro em função das restrições burocráticas ao uso de motores Diesel em veículos leves de tração simples com base nas capacidades de carga e passageiros, o 1.4 TDI de 3 cilindros da Volkswagen tem um tamanho bastante conveniente para uma adaptação tanto em alguns modelos reconhecidos como "utilitários" para fins de homologação quanto outros que não são beneficiados por essa categorização. Vale destacar ao menos 5 veículos que poderiam ficar bons com esse motor:

1 - Lada Niva: o tradicional 4X4 russo chegou a oferecer motores Diesel como opção de fábrica após as importações oficiais para o Brasil terem sido encerradas, e portanto não chegou a contar nem com o motor Peugeot DW8 nem com o Fiat 1.3 Multijet no mercado local. Tendo em vista que o 1.4 TDI fica numa faixa de cilindrada próxima à do Multijet, em que pese ter 1 cilindro a menos e só duas válvulas por cilindro, já estaria plenamente apto a proporcionar um desempenho próximo a parâmetros normais de fábrica;

2 - Suzuki Vitara/Sidekick: com um porte relativamente compacto viabilizando que se mantenha um desempenho aceitável mesmo com um motor mais simples como o 1.6D aspirado de injeção indireta da Volkswagen que chegou a ser mais comum no Brasil devido ao breve uso na Kombi Diesel e em alguns exemplares da Saveiro, inegavelmente seria beneficiado pelo turbo e pela injeção direta que o 1.4 TDI já incorpora. Já não deixaria a desejar no tocante ao desempenho em comparação aos motores Suzuki de 1.6L da série G tanto de 8 quanto de 16 válvulas que foram os mais comuns na 1ª geração do Vitara;

3 - Mitsubishi Pajero iO/TR4: embora pareça num primeiro momento que esse modelo, inicialmente dotado de motor 1.8 a gasolina quando vinha importado do Japão e posteriormente o 2.0 usado quando passou a ser montado no Brasil e rebatizado como TR4, o fato de guardar alguma semelhança técnica com o Vitara já seria suficiente para o 1.4 TDI parecer uma boa opção para adaptações;

4 - Saveiro: a geração atual da pick-up compacta da Volkswagen já não oferece opções Diesel nem para exportação, mas o 1.4 TDI certamente cairia como uma luva tanto para usuários particulares/recreativos quanto aplicações estritamente profissionais. À medida que o turbo e o gerenciamento eletrônico foram se tornando um padrão, o layout de 3 cilindros acaba fazendo sentido especialmente por se tratar de um modelo mais restrito a mercados emergentes onde o custo inicial e a complexidade técnica inerentes às gerações mais recentes de motores turbodiesel veiculares motivam uma parte do público a se acomodar em torno de uma aparente simplicidade de motores de ignição por faísca naturalmente aspirados e com injeção nos pórticos de válvula de admissão;

5 - Mazda MX-5/Miata: com um destaque especial para primeira geração que foi alçada à condição de ícone, a leveza e a configuração de motor central-dianteiro resultariam numa experiência interessante para conciliar economia de combustível a uma proposta esportiva. Por um motor de 3 cilindros ser mais curto que um congênere com 4 cilindros, o impacto sobre a distribuição de peso entre os eixos seria menor.