sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

Breve observação sobre a aplicação do sistema MHEV em versões turbodiesel do Land Rover Range Rover Sport

Um daqueles SUVs de luxo que desafiam a falta de lógica por trás das limitações ao uso de motores Diesel em determinadas classes de veículos, a atual geração do Land Rover Range Rover Sport traz a peculiaridade de todas as versões turbodiesel incorporarem alguma modalidade de hibridização, nesse caso o método MHEV (Mild Hybrid Electric Vehicle) que provê apenas funções com um caráter auxiliar ao motor Ingenium de 3.0L e 6 cilindros em linha. Além de proporcionar uma recuperação de energia cinética através da frenagem regenerativa, ao usar um único conjunto moto-gerador que também serve como motor-de-arranque, o sistema MHEV já é reconhecido como híbrido para disfrutar de alguns benefícios em regiões onde exista alguma restrição ao tráfego de veículos com base em fatores supostamente "ecológicos", e a isenção do rodízio de placas em São Paulo é um exemplo. Mesmo que na prática fique impossibilitado de trafegar exclusivamente usando o conjunto moto-gerador, enquanto outros métodos de hibridização oferecem ao menos um modo de operação 100% elétrica, e o incremento na economia de combustível normalmente esperado de veículos híbridos tenha uma proporção menor, chama alguma atenção por contrariar algumas percepções equivocadas de parte do público generalista.

Mesmo mantendo a necessidade de sistemas de controle de emissões que passaram a ser imprescindíveis para as gerações mais novas dos motores de combustão interna de modo geral atenderem às normas de emissões cada vez mais exageradas, e ao que tudo indica de alguma forma já calculadas para impor uma eletrificação mais massiva, é inevitável que o funcionamento mais intermitente do motor turbodiesel especialmente mais perceptível no tráfego urbano pareça desafiador, tendo em vista como o controle da temperatura do motor acaba sendo mais difícil comparado a um congênere de ignição por faísca movido a gasolina. Pode soar exagerado alegar que a integração entre um motor turbodiesel mais recente e um método de hibridização ficaria totalmente prejudicial ao funcionamento de alguns dispositivos, como filtros de material particulado (DPF) ou o SCR, ainda mais que desde outras épocas já havia uma tentativa de apresentar híbridos movidos a gasolina com um viés de oposição ao Diesel para uso em veículos leves, situação que no contexto brasileiro acabaria sendo constantemente tratada como pretexto para censurar alguma opinião favorável à liberação do Diesel sem qualquer distinção por capacidades de carga e passageiros ou tração. Enfim, apesar de ter algum fundamento de ordem estritamente técnica norteando o uso do sistema MHEV, tal abordagem em um motor turbodiesel chama a atenção em meio a políticas que de um lado favorecem explicitamente veículos híbridos e de outro parecem desafiar ainda mais a viabilidade de um motor turbodiesel.

quinta-feira, 21 de dezembro de 2023

Volkswagen Jetta/Vento TDI potencialmente afetado pelo escândalo do Dieselgate desovado no Paraguai?

É bastante conhecida a facilidade que se tem para importar veículos usados no Paraguai, embora o mais comum quando se trata de tais operações seja lembrar de veículos japoneses que ainda precisam passar pela conversão do cockpit do lado direito para o esquerdo, também acontecendo a importação de outras regiões como os Estados Unidos, a Europa ou a Coréia do Sul, e a maior leniência do Paraguai quanto a normas de emissões em comparação aos principais mercados automobilísticos mundiais aparentemente viabilizaria até a desova de modelos da Volkswagen afetados pelo escândalo do Dieselgate e que foram recomprados pela empresa nos Estados Unidos. Alguns exemplares ainda foram revendidos nos Estados Unidos após a remoção do software fraudador das normas de emissões, embora seja incerta a legalidade da exportação de outros que mantivessem a configuração original de fábrica mesmo para regiões onde a defasagem das normas de emissões em comparação aos Estados Unidos e à Europa tornasse redundante o "conserto". Durante uma ida recente a Bombinhas, cidade turística no litoral norte de Santa Catarina que é bastante apreciada pelos paraguaios como destino para as férias de verão, ao avistar um Jetta de 6ª geração com o I azul no logotipo TDI logo fomentou um questionamento quanto à situação do modelo.

Embora alegadamente a Volkswagen tivesse conseguido manter o enquadramento às normas ambientais dos Estados Unidos em 2008 sem recorrer ao sistema SCR no Jetta, mediante o uso do LNT (Lean NOx Trap) para controle dos óxidos de nitrogênio (NOx), um procedimento específico antes da partida servia para deflagrar na central eletrônica de controle do motor uma programação específica para permanecer dentro das normas durante testes de homologação de consumo de combustível e emissões junto à EPA e outras agências regulatórias em mercados como a União Européia. Como no uso normal dificilmente o motorista faria tal procedimento, que era até desconhecido do grande público antes de ser deflagrado o escândalo do Dieselgate, as emissões ficavam em desacordo com os valores homologados e excediam a regulamentação vigente, especialmente no tocante aos NOx. Mas no caso específico do Jetta com placa do Paraguai avistado por mim em Bombinhas, além do I azul no emblema que remetia ao mote "Clean Diesel" usado pela Volkswagen ou da designação BlueMotion para versões de apelo "ecológico", o que me levou a crer que se trate de um exemplar afetado pelo Dieselgate foram os faróis de especificação americana, mesmo que tivesse um logotipo com o nome Vento que poderia levar a crer até tratar-se de um exemplar desde 0-km emplacado no Paraguai ao invés de ter sido importado já usado.

terça-feira, 19 de dezembro de 2023

Gás natural veicular sendo transportado de caminhão: situação que ainda evidencia a necessidade por um combustível com manejo mais simples

Uma cena que eu já vi em Florianópolis mais de uma vez, mas que ainda me chama muito a atenção, é um caminhão transportando gás natural veicular ao invés de um gasoduto. O mais curioso é que a categoria teoricamente mais receptiva a esse combustível, que seria a dos taxistas, em Florianópolis já o rejeita e permanece usando gasolina na maioria das vezes devido à oferta ainda pequena para o tamanho da parte insular da cidade, e assim pode-se deduzir que os maiores interessados no gás natural longe do centro onde 2 postos o oferecem e da Agronômica onde passou a ser oferecido no posto Angeloni poucos anos atrás seriam turistas principalmente vindos da Argentina que passaram a considerar um motor de ignição por faísca o mais medíocre possível como "à prova de burro" à medida que os motores Diesel ficavam cada vez mais sofisticados e complexos. E na falta ao menos um ramal do gasoduto para o Norte da Ilha e outro para o Sul da Ilha, o inusitado uso de um caminhão para transportar gás natural a um posto permite comparações tanto ao gás liquefeito de petróleo ("gás de cozinha" ou GLP) quanto a combustíveis de uso veicular como a gasolina e o óleo diesel convencional, e até ao etanol recordando a possibilidade de apresentar o biogás/biometano como outra opção de biocombustível, em que pesem as diferenças no manejo que ainda podem ser mais favoráveis aos combustíveis líquidos tradicionais.

 

sexta-feira, 15 de dezembro de 2023

Curiosidade histórica: trator Ferguson 30 a gasolina

Embora seja bastante comum ver motores Diesel como uma opção óbvia em máquinas agrícolas, já chegou a ser predominante em outras épocas a ignição por faísca em faixas de potência mais modestas. Um exemplo muito destacado foi da linha de tratores Ferguson TE-20, que levou a mecanização agrícola da Inglaterra e outros países da Comunidade Britânica a alcançar uma parte significativa dos pequenos agricultores, além de ter contado também com variações como o TO-30 destinado a mercados externos e até sendo produzido nos Estados Unidos numa operação conjunta com a Ford. Chegou a ter inicialmente motores a gasolina como o Continental Z-129 flathead com 4 cilindros e 2.1L que equipa o exemplar das fotos, antes de começar a predominar o uso de motores Diesel principalmente de origem Perkins.
Embora um interesse pela ignição por faísca em segmentos onde o Diesel ainda tem uma maior aceitação tenha sido reacendido junto a novos desenvolvimentos voltados ao uso do biometano, que pode ser útil para setores como o agrícola como mais uma alternativa ao óleo diesel convencional e ao biodiesel, na época que tratores como o Little Grey Fergie recorriam a esse expediente ainda era uma prática recorrente entre fazendeiros na Inglaterra usar um óleo combustível que era comercializado lá sob a denominação TVO (tractor vaporizing oil), e na falta deste o querosene, lembrando que em Portugal o TVO é denominado Tratol e ainda é usado. Já no Brasil, muito por influência dos Estados Unidos, no máximo experiências isoladas com o querosene acabavam tendo espaço, e até o álcool/etanol tinha pouco sucesso em tentativas de manter uma viabilidade para a ignição por faísca em tratores. Mas ainda chama a atenção que, após experiências de conversão de tratores Ferguson dessa série para Diesel e o desenvolvimento de versões com tal opção de fábrica na Inglaterra, tanto com motores Perkins quanto Standard, de vez em quando apareçam exemplares bem preservados até no Brasil, como esse que foi exposto na Expointer de 2023.

terça-feira, 5 de dezembro de 2023

5 motores que seriam tentadores para adaptar a um Nissan Patrol Y62

Com uma proposta mais declaradamente de luxo, o Nissan Patrol Y62 chama a atenção pela ausência da opção por ao menos um motor Diesel, contando somente com um motor 4.0 V6 de disponibilidade limitada e só em configurações mais básicas e o 5.6 V8 que é o grande destaque da linha. Naturalmente, por ser ainda um utilitário destacado pela capacidade de incursão off-road, a falta da opção por um motor Diesel constitui um eventual empecilho para uma grande parte do público que o destina efetivamente a um uso para longas viagens. Caberia destacar vários motores que possivelmente serviriam bem ao modelo, dentre os quais ao menos 5 seriam especialmente dignos de nota...

1 - Cummins ISF3.8: apesar de ter só 4 cilindros, e portanto presumivelmente uma menor suavidade comparado a motores de 6 a 8 cilindros em faixa de cilindrada próxima, seria adequado para movimentar com desenvoltura um caminhonetão grande como o Nissan Patrol Y62. A rusticidade de um motor mais voltado a caminhões e ônibus com peso bruto total entre 7 e 10 toneladas pode destoar à primeira vista da proposta mais luxuosa, e os regimes de rotação mais modestos em comparação a um motor V6 ou V8 a gasolina pode desagradar a quem tenha o péssimo hábito de exagerar na velocidade mesmo que caminhonetes e SUVs tenham algumas características mais próximas de um caminhão e portanto sejam mais difíceis de controlar em determinadas condições, mas ficaria conveniente para um uso normal;

2 - Cummins ISF2.8: menor e mais leve que o 3.8 e com regimes de rotação mais altos, é até tratado pela própria Cummins como uma opção aos V8 small-block a gasolina para o mercado de reposição nos Estados Unidos e Canadá. A princípio uma comparação aos V6 ficaria mais apropriada, tomando como referência o que ocorreu no Brasil à medida que motores turbodiesel de alta rotação em faixas de cilindrada entre 2.5L e 3.0L iam tomando o espaço dos V6 a gasolina junto a um público que destinava pick-ups médias a um uso particular/recreativo. O projeto do ISF2.8 ter sido desenvolvido com algum grau de cooperação entre Cummins e Nissan é outro aspecto a destacar;

3 - GM Duramax 6600: ter sido usado em adaptações em gerações anteriores do Nissan Patrol na Europa abre um precedente interessante. Podia até soar overkill diante dos motores de 2.8L e 4.2L com 6 cilindros em linha e injeção indireta que chegaram a ser usados tanto em configuração aspirada quanto turbo em alguns modelos antigos do Nissan Patrol, ou do motor turbodiesel de 3.0L e 4 cilindros com injeção eletrônica common-rail que os substituiu em regiões como a Europa e a Austrália, mas atenderia bem ao Y62 também;

4 - Iveco F1C: com origens que remontam aos motores SOFIM de 2.5L e 2.8L usados em diversas gerações de furgões Fiat, Iveco e Renault, com versões 4X4 em alguns casos, é um motor bem conhecido. Tendo em vista a cooperação entre Renault e Nissan, talvez o precedente histórico da joint-venture SOFIM justificasse esse motor;

5 - Isuzu 4HK1: apesar de ser algo pesado para um motor de apenas 4 cilindros, e pelo que alguns estrangeiros (principalmente africanos) já me disseram o Brasil seria o único país onde a Isuzu é basicamente ignorada e pouco prestigiada, certamente seria capaz de proporcionar desempenho adequado a um Nissan Patrol Y62, e ser absolutamente robusto para enfrentar condições bastante desafiadoras em longos trajetos.

 

sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

Seria o Gurgel Xavante um retrato fiel da estupidez de se proibir o uso de motores Diesel com base nas capacidades de carga e passageiros ou tração?

Um dentre tantos veículos de pequenos fabricantes que se basearam no layout mecânico do Fusca, mais focado especialmente na aptidão ao enfrentamento de condições de terreno severas, a Gurgel valia-se da simplicidade da mecânica Volkswagen para conciliar desenvoltura em trechos off-road a uma economia operacional que o permitiam disputar mercado com modelos 4X4 de concepção mais tradicional. Ainda foi alegadamente o motivo para a Ford tirar de linha em '83 os modelos Jeep que mantinha em produção desde '67 quando incorporou as operações da Willys-Overland do Brasil, e motivaram as especificações referentes à tração 4X4 com caixa de transferência de dupla velocidade entre as características para um veículo com capacidade de carga nominal abaixo de uma tonelada e acomodação para até 9 ocupantes já contando o motorista serem homologados como "utilitário" mesmo que à época da implementação de restrições ao uso de motores Diesel nenhuma versão do Jeep ou da Rural e da F-75 tivessem a opção de motor Diesel. Possivelmente uma escassez de motores Diesel de alta rotação e fabricação brasileira que fossem compatíveis para instalação no Gurgel Xavante fizessem tal circunstância parecer irrelevante à época, ao contrário do que acontecia em países vizinhos como a Argentina, e uma distância entre-eixos mais curta em comparação a Fusca e Kombi poderia tornar até perigoso usar algum motor Agrale com 2 cilindros feito sob licença da Hatz em função das alterações na concentração de peso entre os eixos.

Até por ter sido usado pelos militares, faria sentido que se usasse algum motor Diesel mesmo contando com tração somente traseira, tal qual a padronização de um combustível comum para frotas militares de países-membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) promove uma simplificação da logística de suprimentos em zonas conflagradas para atender a viaturas das mais diferentes categorias e também aos mais diversos equipamentos especializados tanto numa base operacional militar quanto em campo de batalha. Ter sido bastante apreciado também para trabalhos em zonas rurais, fato que motivou a Gurgel a buscar um enfrentamento direto com o Jeep CJ-5 até o ponto que a Ford considerou inviável manter em produção os modelos provenientes do espólio da Willys-Overland do Brasil, tendo em vista a evidente diferença entre as escalas de produção praticamente artesanal da Gurgel que ainda se valia de componentes off-the-shelf compartilhados com modelos da Volkswagen que eram vendidos em grandes quantidades, contrastando com o viés mais especializado da linha Jeep requerendo alguns componentes mais específicos com um destaque até óbvio para a caixa de transferência. Podia até parecer que a Ford estava chorando de barriga cheia, e deveria providenciar um motor Diesel para nivelar uma disputa com a linha Toyota Bandeirante que de '83 a '90 acabaria sendo a principal referência de veículos com tração 4X4 no Brasil entre o encerramento da produção do Jeep Ford e a reabertura das importações, embora o erro de proibir o uso de motores Diesel em veículos de tração simples com capacidade de carga abaixo de uma tonelada e acomodação para menos de 9 passageiros sem contar o motorista seja evidente.

O entusiasmo dos militares durante a implementação do ProÁlcool nunca foi compartilhado por João Augusto Conrado do Amaral Gurgel, embora alguns exemplares tenham saído de fábrica somente sob encomenda usando motor a álcool/etanol, e uma relativa facilidade para converter motores Volkswagen boxer refrigerados a ar para operar normalmente com gasolina ou até usar o combustível "errado" antes que se começasse a falar de motor flex poderia até minimizar os inconvenientes de um combustível que por muito tempo era irrelevante fora do Brasil. Mesmo sendo incomparavelmente mais fácil manusear o etanol e a gasolina que o gás natural por exemplo, o fato de ainda serem mais voláteis em comparação ao óleo diesel os torna mais críticos tanto no tocante ao risco de incêndio quanto a eventuais perdas por evaporação ao usar galões tipo Jerry-can para transportar combustível adicional, portanto fica evidente outra vantagem operacional de motores Diesel em condições ambientais severas tanto em regiões rurais quanto numa zona de guerra. Enfim, mesmo que para alguns operadores ainda ficasse mais convidativo um utilitário maior e mais pesado desde que tivesse a tração 4X4, o Gurgel Xavante é um retrato fiel da estupidez que é proibir o uso de motores Diesel com base nas capacidades de carga ou passageiros e no sistema de tração de um veículo.