sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

Breve observação sobre a aplicação do sistema MHEV em versões turbodiesel do Land Rover Range Rover Sport

Um daqueles SUVs de luxo que desafiam a falta de lógica por trás das limitações ao uso de motores Diesel em determinadas classes de veículos, a atual geração do Land Rover Range Rover Sport traz a peculiaridade de todas as versões turbodiesel incorporarem alguma modalidade de hibridização, nesse caso o método MHEV (Mild Hybrid Electric Vehicle) que provê apenas funções com um caráter auxiliar ao motor Ingenium de 3.0L e 6 cilindros em linha. Além de proporcionar uma recuperação de energia cinética através da frenagem regenerativa, ao usar um único conjunto moto-gerador que também serve como motor-de-arranque, o sistema MHEV já é reconhecido como híbrido para disfrutar de alguns benefícios em regiões onde exista alguma restrição ao tráfego de veículos com base em fatores supostamente "ecológicos", e a isenção do rodízio de placas em São Paulo é um exemplo. Mesmo que na prática fique impossibilitado de trafegar exclusivamente usando o conjunto moto-gerador, enquanto outros métodos de hibridização oferecem ao menos um modo de operação 100% elétrica, e o incremento na economia de combustível normalmente esperado de veículos híbridos tenha uma proporção menor, chama alguma atenção por contrariar algumas percepções equivocadas de parte do público generalista.

Mesmo mantendo a necessidade de sistemas de controle de emissões que passaram a ser imprescindíveis para as gerações mais novas dos motores de combustão interna de modo geral atenderem às normas de emissões cada vez mais exageradas, e ao que tudo indica de alguma forma já calculadas para impor uma eletrificação mais massiva, é inevitável que o funcionamento mais intermitente do motor turbodiesel especialmente mais perceptível no tráfego urbano pareça desafiador, tendo em vista como o controle da temperatura do motor acaba sendo mais difícil comparado a um congênere de ignição por faísca movido a gasolina. Pode soar exagerado alegar que a integração entre um motor turbodiesel mais recente e um método de hibridização ficaria totalmente prejudicial ao funcionamento de alguns dispositivos, como filtros de material particulado (DPF) ou o SCR, ainda mais que desde outras épocas já havia uma tentativa de apresentar híbridos movidos a gasolina com um viés de oposição ao Diesel para uso em veículos leves, situação que no contexto brasileiro acabaria sendo constantemente tratada como pretexto para censurar alguma opinião favorável à liberação do Diesel sem qualquer distinção por capacidades de carga e passageiros ou tração. Enfim, apesar de ter algum fundamento de ordem estritamente técnica norteando o uso do sistema MHEV, tal abordagem em um motor turbodiesel chama a atenção em meio a políticas que de um lado favorecem explicitamente veículos híbridos e de outro parecem desafiar ainda mais a viabilidade de um motor turbodiesel.

quinta-feira, 21 de dezembro de 2023

Volkswagen Jetta/Vento TDI potencialmente afetado pelo escândalo do Dieselgate desovado no Paraguai?

É bastante conhecida a facilidade que se tem para importar veículos usados no Paraguai, embora o mais comum quando se trata de tais operações seja lembrar de veículos japoneses que ainda precisam passar pela conversão do cockpit do lado direito para o esquerdo, também acontecendo a importação de outras regiões como os Estados Unidos, a Europa ou a Coréia do Sul, e a maior leniência do Paraguai quanto a normas de emissões em comparação aos principais mercados automobilísticos mundiais aparentemente viabilizaria até a desova de modelos da Volkswagen afetados pelo escândalo do Dieselgate e que foram recomprados pela empresa nos Estados Unidos. Alguns exemplares ainda foram revendidos nos Estados Unidos após a remoção do software fraudador das normas de emissões, embora seja incerta a legalidade da exportação de outros que mantivessem a configuração original de fábrica mesmo para regiões onde a defasagem das normas de emissões em comparação aos Estados Unidos e à Europa tornasse redundante o "conserto". Durante uma ida recente a Bombinhas, cidade turística no litoral norte de Santa Catarina que é bastante apreciada pelos paraguaios como destino para as férias de verão, ao avistar um Jetta de 6ª geração com o I azul no logotipo TDI logo fomentou um questionamento quanto à situação do modelo.

Embora alegadamente a Volkswagen tivesse conseguido manter o enquadramento às normas ambientais dos Estados Unidos em 2008 sem recorrer ao sistema SCR no Jetta, mediante o uso do LNT (Lean NOx Trap) para controle dos óxidos de nitrogênio (NOx), um procedimento específico antes da partida servia para deflagrar na central eletrônica de controle do motor uma programação específica para permanecer dentro das normas durante testes de homologação de consumo de combustível e emissões junto à EPA e outras agências regulatórias em mercados como a União Européia. Como no uso normal dificilmente o motorista faria tal procedimento, que era até desconhecido do grande público antes de ser deflagrado o escândalo do Dieselgate, as emissões ficavam em desacordo com os valores homologados e excediam a regulamentação vigente, especialmente no tocante aos NOx. Mas no caso específico do Jetta com placa do Paraguai avistado por mim em Bombinhas, além do I azul no emblema que remetia ao mote "Clean Diesel" usado pela Volkswagen ou da designação BlueMotion para versões de apelo "ecológico", o que me levou a crer que se trate de um exemplar afetado pelo Dieselgate foram os faróis de especificação americana, mesmo que tivesse um logotipo com o nome Vento que poderia levar a crer até tratar-se de um exemplar desde 0-km emplacado no Paraguai ao invés de ter sido importado já usado.

terça-feira, 19 de dezembro de 2023

Gás natural veicular sendo transportado de caminhão: situação que ainda evidencia a necessidade por um combustível com manejo mais simples

Uma cena que eu já vi em Florianópolis mais de uma vez, mas que ainda me chama muito a atenção, é um caminhão transportando gás natural veicular ao invés de um gasoduto. O mais curioso é que a categoria teoricamente mais receptiva a esse combustível, que seria a dos taxistas, em Florianópolis já o rejeita e permanece usando gasolina na maioria das vezes devido à oferta ainda pequena para o tamanho da parte insular da cidade, e assim pode-se deduzir que os maiores interessados no gás natural longe do centro onde 2 postos o oferecem e da Agronômica onde passou a ser oferecido no posto Angeloni poucos anos atrás seriam turistas principalmente vindos da Argentina que passaram a considerar um motor de ignição por faísca o mais medíocre possível como "à prova de burro" à medida que os motores Diesel ficavam cada vez mais sofisticados e complexos. E na falta ao menos um ramal do gasoduto para o Norte da Ilha e outro para o Sul da Ilha, o inusitado uso de um caminhão para transportar gás natural a um posto permite comparações tanto ao gás liquefeito de petróleo ("gás de cozinha" ou GLP) quanto a combustíveis de uso veicular como a gasolina e o óleo diesel convencional, e até ao etanol recordando a possibilidade de apresentar o biogás/biometano como outra opção de biocombustível, em que pesem as diferenças no manejo que ainda podem ser mais favoráveis aos combustíveis líquidos tradicionais.

 

sexta-feira, 15 de dezembro de 2023

Curiosidade histórica: trator Ferguson 30 a gasolina

Embora seja bastante comum ver motores Diesel como uma opção óbvia em máquinas agrícolas, já chegou a ser predominante em outras épocas a ignição por faísca em faixas de potência mais modestas. Um exemplo muito destacado foi da linha de tratores Ferguson TE-20, que levou a mecanização agrícola da Inglaterra e outros países da Comunidade Britânica a alcançar uma parte significativa dos pequenos agricultores, além de ter contado também com variações como o TO-30 destinado a mercados externos e até sendo produzido nos Estados Unidos numa operação conjunta com a Ford. Chegou a ter inicialmente motores a gasolina como o Continental Z-129 flathead com 4 cilindros e 2.1L que equipa o exemplar das fotos, antes de começar a predominar o uso de motores Diesel principalmente de origem Perkins.
Embora um interesse pela ignição por faísca em segmentos onde o Diesel ainda tem uma maior aceitação tenha sido reacendido junto a novos desenvolvimentos voltados ao uso do biometano, que pode ser útil para setores como o agrícola como mais uma alternativa ao óleo diesel convencional e ao biodiesel, na época que tratores como o Little Grey Fergie recorriam a esse expediente ainda era uma prática recorrente entre fazendeiros na Inglaterra usar um óleo combustível que era comercializado lá sob a denominação TVO (tractor vaporizing oil), e na falta deste o querosene, lembrando que em Portugal o TVO é denominado Tratol e ainda é usado. Já no Brasil, muito por influência dos Estados Unidos, no máximo experiências isoladas com o querosene acabavam tendo espaço, e até o álcool/etanol tinha pouco sucesso em tentativas de manter uma viabilidade para a ignição por faísca em tratores. Mas ainda chama a atenção que, após experiências de conversão de tratores Ferguson dessa série para Diesel e o desenvolvimento de versões com tal opção de fábrica na Inglaterra, tanto com motores Perkins quanto Standard, de vez em quando apareçam exemplares bem preservados até no Brasil, como esse que foi exposto na Expointer de 2023.

terça-feira, 5 de dezembro de 2023

5 motores que seriam tentadores para adaptar a um Nissan Patrol Y62

Com uma proposta mais declaradamente de luxo, o Nissan Patrol Y62 chama a atenção pela ausência da opção por ao menos um motor Diesel, contando somente com um motor 4.0 V6 de disponibilidade limitada e só em configurações mais básicas e o 5.6 V8 que é o grande destaque da linha. Naturalmente, por ser ainda um utilitário destacado pela capacidade de incursão off-road, a falta da opção por um motor Diesel constitui um eventual empecilho para uma grande parte do público que o destina efetivamente a um uso para longas viagens. Caberia destacar vários motores que possivelmente serviriam bem ao modelo, dentre os quais ao menos 5 seriam especialmente dignos de nota...

1 - Cummins ISF3.8: apesar de ter só 4 cilindros, e portanto presumivelmente uma menor suavidade comparado a motores de 6 a 8 cilindros em faixa de cilindrada próxima, seria adequado para movimentar com desenvoltura um caminhonetão grande como o Nissan Patrol Y62. A rusticidade de um motor mais voltado a caminhões e ônibus com peso bruto total entre 7 e 10 toneladas pode destoar à primeira vista da proposta mais luxuosa, e os regimes de rotação mais modestos em comparação a um motor V6 ou V8 a gasolina pode desagradar a quem tenha o péssimo hábito de exagerar na velocidade mesmo que caminhonetes e SUVs tenham algumas características mais próximas de um caminhão e portanto sejam mais difíceis de controlar em determinadas condições, mas ficaria conveniente para um uso normal;

2 - Cummins ISF2.8: menor e mais leve que o 3.8 e com regimes de rotação mais altos, é até tratado pela própria Cummins como uma opção aos V8 small-block a gasolina para o mercado de reposição nos Estados Unidos e Canadá. A princípio uma comparação aos V6 ficaria mais apropriada, tomando como referência o que ocorreu no Brasil à medida que motores turbodiesel de alta rotação em faixas de cilindrada entre 2.5L e 3.0L iam tomando o espaço dos V6 a gasolina junto a um público que destinava pick-ups médias a um uso particular/recreativo. O projeto do ISF2.8 ter sido desenvolvido com algum grau de cooperação entre Cummins e Nissan é outro aspecto a destacar;

3 - GM Duramax 6600: ter sido usado em adaptações em gerações anteriores do Nissan Patrol na Europa abre um precedente interessante. Podia até soar overkill diante dos motores de 2.8L e 4.2L com 6 cilindros em linha e injeção indireta que chegaram a ser usados tanto em configuração aspirada quanto turbo em alguns modelos antigos do Nissan Patrol, ou do motor turbodiesel de 3.0L e 4 cilindros com injeção eletrônica common-rail que os substituiu em regiões como a Europa e a Austrália, mas atenderia bem ao Y62 também;

4 - Iveco F1C: com origens que remontam aos motores SOFIM de 2.5L e 2.8L usados em diversas gerações de furgões Fiat, Iveco e Renault, com versões 4X4 em alguns casos, é um motor bem conhecido. Tendo em vista a cooperação entre Renault e Nissan, talvez o precedente histórico da joint-venture SOFIM justificasse esse motor;

5 - Isuzu 4HK1: apesar de ser algo pesado para um motor de apenas 4 cilindros, e pelo que alguns estrangeiros (principalmente africanos) já me disseram o Brasil seria o único país onde a Isuzu é basicamente ignorada e pouco prestigiada, certamente seria capaz de proporcionar desempenho adequado a um Nissan Patrol Y62, e ser absolutamente robusto para enfrentar condições bastante desafiadoras em longos trajetos.

 

sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

Seria o Gurgel Xavante um retrato fiel da estupidez de se proibir o uso de motores Diesel com base nas capacidades de carga e passageiros ou tração?

Um dentre tantos veículos de pequenos fabricantes que se basearam no layout mecânico do Fusca, mais focado especialmente na aptidão ao enfrentamento de condições de terreno severas, a Gurgel valia-se da simplicidade da mecânica Volkswagen para conciliar desenvoltura em trechos off-road a uma economia operacional que o permitiam disputar mercado com modelos 4X4 de concepção mais tradicional. Ainda foi alegadamente o motivo para a Ford tirar de linha em '83 os modelos Jeep que mantinha em produção desde '67 quando incorporou as operações da Willys-Overland do Brasil, e motivaram as especificações referentes à tração 4X4 com caixa de transferência de dupla velocidade entre as características para um veículo com capacidade de carga nominal abaixo de uma tonelada e acomodação para até 9 ocupantes já contando o motorista serem homologados como "utilitário" mesmo que à época da implementação de restrições ao uso de motores Diesel nenhuma versão do Jeep ou da Rural e da F-75 tivessem a opção de motor Diesel. Possivelmente uma escassez de motores Diesel de alta rotação e fabricação brasileira que fossem compatíveis para instalação no Gurgel Xavante fizessem tal circunstância parecer irrelevante à época, ao contrário do que acontecia em países vizinhos como a Argentina, e uma distância entre-eixos mais curta em comparação a Fusca e Kombi poderia tornar até perigoso usar algum motor Agrale com 2 cilindros feito sob licença da Hatz em função das alterações na concentração de peso entre os eixos.

Até por ter sido usado pelos militares, faria sentido que se usasse algum motor Diesel mesmo contando com tração somente traseira, tal qual a padronização de um combustível comum para frotas militares de países-membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) promove uma simplificação da logística de suprimentos em zonas conflagradas para atender a viaturas das mais diferentes categorias e também aos mais diversos equipamentos especializados tanto numa base operacional militar quanto em campo de batalha. Ter sido bastante apreciado também para trabalhos em zonas rurais, fato que motivou a Gurgel a buscar um enfrentamento direto com o Jeep CJ-5 até o ponto que a Ford considerou inviável manter em produção os modelos provenientes do espólio da Willys-Overland do Brasil, tendo em vista a evidente diferença entre as escalas de produção praticamente artesanal da Gurgel que ainda se valia de componentes off-the-shelf compartilhados com modelos da Volkswagen que eram vendidos em grandes quantidades, contrastando com o viés mais especializado da linha Jeep requerendo alguns componentes mais específicos com um destaque até óbvio para a caixa de transferência. Podia até parecer que a Ford estava chorando de barriga cheia, e deveria providenciar um motor Diesel para nivelar uma disputa com a linha Toyota Bandeirante que de '83 a '90 acabaria sendo a principal referência de veículos com tração 4X4 no Brasil entre o encerramento da produção do Jeep Ford e a reabertura das importações, embora o erro de proibir o uso de motores Diesel em veículos de tração simples com capacidade de carga abaixo de uma tonelada e acomodação para menos de 9 passageiros sem contar o motorista seja evidente.

O entusiasmo dos militares durante a implementação do ProÁlcool nunca foi compartilhado por João Augusto Conrado do Amaral Gurgel, embora alguns exemplares tenham saído de fábrica somente sob encomenda usando motor a álcool/etanol, e uma relativa facilidade para converter motores Volkswagen boxer refrigerados a ar para operar normalmente com gasolina ou até usar o combustível "errado" antes que se começasse a falar de motor flex poderia até minimizar os inconvenientes de um combustível que por muito tempo era irrelevante fora do Brasil. Mesmo sendo incomparavelmente mais fácil manusear o etanol e a gasolina que o gás natural por exemplo, o fato de ainda serem mais voláteis em comparação ao óleo diesel os torna mais críticos tanto no tocante ao risco de incêndio quanto a eventuais perdas por evaporação ao usar galões tipo Jerry-can para transportar combustível adicional, portanto fica evidente outra vantagem operacional de motores Diesel em condições ambientais severas tanto em regiões rurais quanto numa zona de guerra. Enfim, mesmo que para alguns operadores ainda ficasse mais convidativo um utilitário maior e mais pesado desde que tivesse a tração 4X4, o Gurgel Xavante é um retrato fiel da estupidez que é proibir o uso de motores Diesel com base nas capacidades de carga ou passageiros e no sistema de tração de um veículo.

quarta-feira, 22 de novembro de 2023

Foi muita mancada a Renault nunca ter trazido ao menos uma versão turbodiesel para o Renault Duster no Brasil?

Um daqueles modelos para os quais a princípio um motor turbodiesel poderia ter caído como uma luva no Brasil, o Renault Duster até chegou a ter versões 4X4 antes da reestilização que marcou a chegada do modelo 2021, e portanto poderia até ser enquadrado naquela definição de utilitário tendo em vista a equivalência entre a 1ª marcha mais curta e uma "reduzida" propriamente dita que o qualficaria para ser documentado como jipe ao invés de camioneta. Burocracias brasileiras, tão difíceis de explicar e que a bem da verdade continuam sem fazer qualquer sentido, mas restringem a liberdade tanto para o público generalista escolher um carro conforme dê na telha quanto para operadores estritamente profissionais como taxistas optarem por uma ferramenta de trabalho mais adequada às condições operacionais. E por mais que parecesse improvável um taxista numa grande capital como Porto Alegre sequer cogitar tração nas 4 rodas como uma característica de primeira necessidade, certamente atenderia bem a outros tantos dentre o público-alvo do Renault Duster, embora tal recurso ter sido oferecido somente em conjunto com o câmbio manual no Brasil diminuísse a aceitação à medida que os SUVs passaram a ser cada vez mais favorecidos por um público predominantemente urbano.

O fato de ter passado a ser oferecido com motor 1.3 turbo flex, além do 1.6 aspirado e também flex que havia passado a ser o único disponível no Brasil tão logo foi remodelado ainda em 2020 já abrangendo o ano-modelo 2021, é outro aspecto digno de nota, à medida que entre os motores turbo tem sido muito mais comum o recurso à injeção direta, que permite enriquecer a proporção ar/combustível numa menor intensidade e ainda assim evitar (ou ao menos reduzir significativamente) a pré-ignição/detonação. Com o turbo e a injeção direta tendo alcançado uma massificação nos motores Diesel leves bem antes de ser algo mais corriqueiro nos motores de ignição por faísca, circunstância vista como uma "modernidade" no âmbito do downsizing, é inevitável lembrar do "arcaico" motor Renault K9K turbodiesel de 1.5L que entre outros modelos mundo afora chegou a ser usado no Renault/Dacia Duster, e esse mesmo motor já teve diferentes calibrações indo desde 65cv até 115cv com a produção iniciada em 2001 e cobrindo das normas de emissões Euro-3 até a mais recente Euro-6D sem alterações tão substanciais que aumentem demasiadamente a complexidade técnica. É natural que a incorporação de dispositivos para controle de emissões como filtros de material particulado (DPF) e o SCR para redução catalítica seletiva dos óxidos de nitrogênio (NOx), imprescindíveis para o enquadramento em algumas normas cada vez mais rígidas, cause insatisfações mas, ao lembrarmos que em outras regiões mesmo entre os motores a gasolina tem predominado o turbo e a injeção direta, até o material particulado tem sido um calcanhar de Aquiles, em que pese a simplicidade aparentemente maior para mitigar condições que levam à formação dos óxidos de nitrogênio através de um pontual enriquecimento da proporção ar/combustível ao invés de usar um reagente químico como o AdBlue/ARLA-32 imprescindível em veículos equipados com SCR.

Apesar da preferência do brasileiro estar ficando mais voltada ao câmbio automático, especialmente em categorias tidas como mais "prestigiosas" a exemplo dos SUVs, e tal opção no Renault Duster ter ficado restrita a versões de tração simples ter contribuído para um direcionamento dos 4X4 para públicos mais especializados, nada teria impedido que um motor turbodiesel pudesse ter sido até mais conveniente em determinadas condições operacionais, ou até mesmo que a tração 4X4 e o câmbio automático pudessem ser oferecidos simultaneamente, como acontece em outros SUVs compactos de motor transversal. Cabe considerar talvez uma percepção tanto de parte do público generalista quanto dos principais fabricantes de veículos que seria mais fácil redirecionar até uma parte mais especializada do mercado rumo a carros híbridos, e o fato de um sistema híbrido com tração suplementar elétrica proporcionando tração 4X4 ter sido desenvolvido pela ZF usando como mula de testes precisamente um Renault Duster de uma antiga versão indiana parece ser mais que uma simples coincidência... Enfim, mesmo que os atuais patamares do controle de emissões pareçam "estrangular" em demasia a praticidade de um motor Diesel moderno, outras abordagens junto à ignição por faísca passam longe de ser "à prova de burro", e portanto pode ser considerado mancada a Renault nunca ter oferecido versões turbodiesel do Renault Duster no Brasil.

quarta-feira, 15 de novembro de 2023

Uma observação sobre como a restrição ao uso de motores Diesel ficou tão defasada tomando como referência utilitários compactos

O mercado automobilístico brasileiro às vezes é um tanto confuso, embora alguns modelos como a Fiat Strada aparentem conciliar algumas necessidades e preferências locais, sem entrar no mérito de como as gerações mais recentes de caminhonetes compactas passaram a ter dimensões comparáveis às médias de 20 a 30 anos atrás. E levando em conta tudo o que se alardeia quanto a estruturas monobloco terem uma rigidez torcional eventualmente maior que teria um veículo similar com o chassi separado da carroceria, eventualmente ainda fosse tecnicamente viável um hipotético aumento na capacidade de carga nominal para o mínimo de uma tonelada exigido para ser classificado como utilitário mesmo com tração simples e acomodação para menos de 10 pessoas, apesar que pela tração dianteira uma transferência de peso em diferentes condições de carga prejudicasse a trafegabilidade em terrenos mais bravios. Nesse caso, uma eventual opção pela tração 4X4 poderia ser bem-vinda, em que pese o óbvio impacto que teria no custo.
Pode parecer que uma caminhonete compacta de tração dianteira atenda a um "cowboy de apartamento" e ninguém mais, embora tenham a versatilidade e uma aptidão também para trabalho mais reconhecida à medida que se evidencia o custo inicial menor comparado às caminhonetes médias até para pequenos produtores rurais. Considerando a massificação dos motores flex aptos a funcionar tanto com a gasolina quanto o álcool/etanol e ainda a possibilidade de conversões para gás natural, condições para as quais a aparente "defasagem" da injeção sequencial e aspiração natural revelam-se até certo ponto benéficas, já poderia soar conveniente experimentar uma produção própria de álcool combustível, até porque muitos outros cultivares além da cana de açúcar são produzidos no Brasil. E até os resíduos do beneficiamento de alguns produtos agrícolas justificariam o uso numa produção em pequena escala, em contraponto ao aumento na complexidade técnica dos sistemas de pós-tratamento de gases de escape em veículos com motor turbodiesel que desencorajaria experiências com biodiesel ou o uso direto de óleos vegetais ainda que tais combustíveis também pudessem ser produzidos pelo usuário no âmbito rural ou reaproveitando resíduos do beneficiamento de uma produção agrícola.
E embora as pick-ups de um modo geral enfrentem um fogo amigo dos SUVs considerando o público generalista que busque um veículo para uso particular, uma categoria que no Brasil ficou praticamente desprezada é a de furgões compactos como o Fiat Fiorino, embora no caso de furgões seja mais comum modelos maiores e cuja capacidade de carga os credencie a usar motores Diesel tenham mais aceitação em aplicações recreativas como motorhomes e campervans para uso essencialmente turístico. Pode ser que dispositivos como o SCR e um filtro de material particulado (DPF), e até a maior complexidade de um turbo e um sistema de injeção direta de alta pressão, desencorajassem gestores de frota a incorporar motores turbodiesel em furgões compactos, mesmo se simplificar a logística de combustíveis e outros insumos a serem compartilhados com utilitários de capacidades superiores, e portanto nesse caso uma proibição seja inócua porque o mercado ficaria mais regulado pelas condições operacionais a favorecer diferentes combustíveis, que acabariam anulando pressões sobre um combustível específico. Logo, fica cada vez mais inegável que a restrição arbitrária ao uso de motores Diesel em veículos leves é defasada.

sexta-feira, 10 de novembro de 2023

Se deu certo nas vans, qual será o motivo para a configuração de motor transversal e tração dianteira ser tão subestimada em pick-ups?

Tomando como referência um caso bastante emblemático que foi a Hyundai Staria ter deixado para trás a antiga tradição de usar motor longitudinal e tração traseira em vans de porte médio, que vinha desde a época que a Hyundai era mais voltada à produção de modelos Mitsubishi sob licença, é inegável que já está bem desmistificado o uso da configuração de motor transversal e tração dianteira para utilitários de diversas categorias. Com conjuntos motrizes mais compactos e leves, mesmo considerando a opção por tração 4X4 que pode ser oferecida e recorrendo-se à suspensão traseira independente visando preservar a menor altura da plataforma de embarque normalmente mais inerente à tração no mesmo eixo ao qual o motor fica mais próximo, é natural que ocorra também uma maior intercambialidade de componentes com automóveis fomentando experiência de condução e conforto de rodagem mais convidativos ao uso recreativo/turístico. Cabe destacar também que tal configuração está longe de ser empecilho à oferta de motores turbodiesel tão apreciados por operadores estritamente comerciais, além de no caso de vans um motor transversal geralmente facilitar uma diminuição do nível de ruídos a bordo devido a uma intrusão menos significativa de motor e câmbio com relação ao habitáculo, e a Hyundai Staria ser oferecida com a opção por um motor 2.2 turbodiesel com 4 cilindros ou pelo 3.5 V6 a gasolina disponível também em versão a gás liquefeito de petróleo (GLP - "gás de cozinha") na Coréia do Sul torna esse modelo talvez o melhor parâmetro para observações relacionadas a uma pick-up média.
Como os motores a gasolina oferecidos na Hyundai Staria e na pick-up média Honda Ridgeline seguem uma "receita" semelhante quanto à faixa de cilindrada e a quantidade de cilindros, e também a oferta de tração somente dianteira ou 4X4 em ambos os modelos, logo chama a atenção o segmento de vans já ter outras opções com um layout de motor transversal e tração dianteira ou 4X4 enquanto entre as pick-ups médias propriamente ditas a Ridgeline se destaca em meio ao predomínio da configuração "arcaica" que mantém uma prevalência do motor longitudinal com tração primariamente traseira por eixo rígido entre as concorrentes mais próximas. Naturalmente o fato das vans explorarem uma maior racionalidade que é indispensável ao uso estritamente comercial na Europa e na Ásia por exemplo, enquanto as pick-ups de um modo geral tem sido "desvirtuadas" e transformadas num símbolo de status mais voltado a perfis de uso recreativo, fomenta uma diferença na percepção de consumidores, bem como um enfoque maior na capacidade de carga para as vans enquanto as pick-ups principalmente nos Estados Unidos passaram a ter mais ênfase na capacidade de reboque, para a qual tradicionalmente uma concepção mais "bruta" é tida como invariavelmente mais recomendável. E assim, mesmo que eventualmente uma van possa ser conveniente até para acampar na praia sem a necessidade de recorrer a um trailer, e a princípio o motor transversal por si só esteja longe de ser um impedimento para uma pick-up eventualmente maior que a Honda Ridgeline tivesse uma capacidade de reboque mais destacada, algum empecilho parece ser mais cultural, muito mais atrelado à percepção austera em torno das vans que estritamente técnico à medida que pick-ups passaram a ser tratadas como um símbolo de status junto ao público urbano.

quarta-feira, 1 de novembro de 2023

Relutância da GM do Brasil em incorporar a injeção direta no Chevrolet Onix de 2ª geração: mais que uma mera contenção de custos?

Da geração anterior que era basicamente um projeto regional, e que acabaria ganhando espaço ao redor da América Latina de um modo geral porque o Brasil junto com o México é um dos maiores produtores de veículos e portanto um dos mais influentes na região, o Chevrolet Onix foi alçado a uma posição de destaque quando a 2ª geração passou a ter uma participação chinesa no desenvolvimento, sendo lançada inicialmente na China antes de vir para o Brasil em 2019, embora a carroceria hatch seja exclusiva para a fabricação brasileira, assim como são as configurações flex para o motor CSS Prime de 1.0L tanto em versão naturalmente aspirada quanto turbo. No tocante ao motor, uma particularidade que também cabe destacar é o motor brasileiro usar somente a injeção sequencial nos dutos do coletor de admissão, ainda que os equivalentes chineses lancem mão da injeção direta no caso das versões turbo, e o que podia soar como uma mera economia porca pode se revelar eventualmente um bom ponto para questionar algumas tentativas de apresentar o downsizing dos motores a gasolina (ou flex mais especificamente no caso do Brasil e também em partes da Ásia como a Tailândia e a Índia onde o etanol tem fomentado interesse de órgãos governamentais). Afinal, se por um lado seria especialmente atraente em motores turbo poder ter uma proporção ar/combustível mais pobre como a que caracterizou por tanto tempo os motores Diesel e por consequência incrementar a eficiência geral, por outro é inegável que alguns desafios no âmbito do controle de emissões que fizeram uma parte do público tradicional dos motores Diesel recuar passaria a causar transtornos também a usuários de motores de ignição por faísca...

Lembrando das infundadas restrições ao uso de motores Diesel com base nas capacidades de carga ou passageiros e tração em algumas categorias de veículo ainda em vigor no Brasil, e que de certa forma já influenciam também alguns destinos de exportação regional devido ao maior custo que acarretaria uma eventual versão turbodiesel exclusiva para atender a países cujos volumes totais de vendas de veículos novos são consideravelmente menores em comparação ao mercado brasileiro, até usuários comerciais como taxistas saem prejudicados, embora o gás natural acabe sendo um paliativo ao menos aonde possa ser encontrado com relativa normalidade, situação mais restrita aos grandes centros e arredores. E dada a natureza de gasolina e etanol que são injetados ainda na fase líquida, ao contrário do gás natural que é sempre injetado na fase de vapor, a instalação de um kit GNV pode ser considerada mais tranquila, bem como o menor risco de danos a componentes do sistema de combustível original por ser desnecessário o uso de uma pequena parte de gasolina ou etanol junto ao gás natural que seria necessária em motores de injeção direta devido à impossibilidade na imensa maioria deles de usar os injetores originais tanto com o gás quanto com combustíveis líquidos, ao contrário do que acontece com o gás liquefeito de petróleo (GLP - "gás de cozinha") cujo uso como combustível automotivo no Brasil é proibido mas ainda é mais usado para tal finalidade que o GNV em alguns países como o Japão, a China e a maior parte da Europa Ocidental onde o gás natural tem sido mais voltado a veículos pesados em oposição ao óleo diesel. Vale até frisar que, embora alguns fabricantes generalistas como a Volkswagen lancem mão da injeção direta em versões turbo de concorrentes diretos do Onix, e no caso específico da Volkswagen tenha associado a injeção direta simultaneamente ao gás natural e à gasolina em alguns motores disponíveis somente na Europa, fabricantes especializados em motores Diesel para aplicações pesadas que também já ofereçam soluções específicas para o uso exclusivo de combustíveis gasosos como o gás natural e o biometano ou até o gás liquefeito de petróleo e mais recentemente o hidrogênio priorizem a injeção sequencial nessas aplicações.

Uma desvantagem da injeção direta nos motores de ignição por faísca é tornar imprescindível o recurso a alguns sistemas de controle de emissões que tem tirado o sono de usuários de motores Diesel ao longo dos últimos anos, desde filtros de material particulado (DPF no caso dos Diesel, e OPF ou GPF quando aplicados à ignição por faísca) até os mais variados métodos para tratar dos óxidos de nitrogênio (NOx) que vão de um aparentemente singelo EGR que se vale da recirculação de uma parte de gases inertes do fluxo de escapamento ao SCR que já depende do fluido-padrão AdBlue/ARLA-32/ARNOx-32 ou ainda um filtro LNT (Lean NOx Trap) que surte mais efeito em motores de menor potência. E apesar que um motor de ignição por faísca tem a possibilidade de mitigar as condições propícias a um incremento dos índices de NOx tão somente por meio de um enriquecimento da proporção ar/combustível, a depender das condições ambientais e de carga às quais esteja submetido, é um tanto óbvio que tais condições vão influir também na formação de material particulado que passou a ser mais crítica exatamente à medida que a injeção direta ganhou espaço. Portanto, ainda que possa parecer um salto tecnológico que deveria invariavelmente ser oferecido também no Brasil, a injeção direta e a bem da verdade o próprio conceito de downsizing justificam eventuais críticas e questionamentos ao invés de serem apontados como uma solução infalível, além do mais caso sejam usados como pretextos para justificar restrições arbitrárias ao uso de motores Diesel como já acontece em outras regiões, de modo que uma eventual relutância da GM do Brasil em adotar tal recurso no Chevrolet Onix de 2ª geração pode fazer sentido sob um ponto de vista estritamente técnico.

quarta-feira, 25 de outubro de 2023

Ford Cargo Turbo A.T.A.C. resistindo à modernidade, e à imagem do turbo como algo tão óbvio na atualidade

Houve uma época que o turbo já era raro, e vir acompanhado do intercooler era um acontecimento à parte, anunciado com pompa e circunstância como em caminhões Ford Cargo que durante uma parte da década de '90 até traziam uma faixa adesiva decorativa com os dizeres "TURBO A.T.A.C." no painel de inspeção de fluidos entre a grade dianteira e o parabrisa. O ensino da língua inglesa no Brasil ainda era algo precário, com poucos atentando para A.T.A.C. ser uma sigla referindo-se ao air-to-air cooler, ou o intercooler do tipo ar-ar, que equipou tanto versões dotadas de motores FTO (também conhecidos como FNH) fabricados pela própria Ford originalmente para uso agrícola quanto outras versões com motores Cummins. Com tantos caminhões antigos ganhando uma extensão da vida útil operacional em canteiros de obras, vez por outra ainda aparecem exemplares que poderiam passar despercebidos por um Enzo ou uma Valentina que só lembram da existência do câmbio manual quando se deparam com algum veículo "de trabalho", e dificilmente vão em algum momento da vida colocar as mãos num carburador ou numa bomba injetora governada mecanicamente, mas quem viu estágios iniciais daquela transição de motores mais rústicos rumo ao atual estágio de precisão do gerenciamento eletrônico ainda pode ficar inebriado por uma nostalgia que pequenos detalhes são capazes de reacender à memória. E até um nada discreto adesivo, dando um destaque todo especial a uma característica técnica que hoje passa como algo óbvio em motores modernos, tem seus encantos, principalmente quando lembramos que as condições pesadas frequentemente enfrentadas na operação de caminhões às vezes são implacáveis mesmo com pequenos detalhes...

quinta-feira, 19 de outubro de 2023

5 motivos que podem soar tentadores para substituir um motor Toyota da série L por outro ainda mais rústico

Pode-se dizer sem medo de errar que um dos principais expoentes para desmistificar os motores Diesel de alta rotação no Brasil em meio à reabertura das importações foi o Toyota 3L que vinha em algumas das primeiras versões da Hilux quadrada a chegarem ao mercado local. Naturalmente a boa reputação que a Toyota já havia conquistado, tanto a nível mundial quanto brasileiro, também foi oportuna para a boa aceitação de um motor que fugia daquela concepção mais próxima à de máquinas agrícolas que foi tão característica daquela abordagem imediatista e um tanto improvisada que caracterizou o começo da prevalência dos motores Diesel nas caminhonetes grandes no Brasil como reação às primeiras crises do petróleo, antes que as médias passassem a ter uma maior participação de mercado a partir da reabertura das importações. Ainda assim, é possível que algum Professor Pardal de plantão ficasse tentado a fazer adaptações com outros motores, até eventualmente de concepção mais austera e ao menos teoricamente "inferior" ao Toyota 3L em um ou mais aspectos...

1 - rejeição à injeção indireta: tanto pela injeção direta já ter sido consolidada nos motores "de trator" que predominavam no Brasil quando SUVs importados como a Toyota Hilux SW4 começavam a atrair um público mais urbano de classe média-alta e alta, ecoando as declarações do ex-presidente Fernando Collor de Mello que se referia aos carros de fabricação nacional como "carroças" entre as justificativas para liberar as importações, quanto pela injeção indireta resultar numa menor eficiência térmica no uso de óleo diesel convencional ou biodiesel à medida que os índices de cetano (fórmula matemática para mensurar a intensidade de propagação da chama nas câmaras de combustão) fiquem mais altos e numa maior tendência a superaquecimentos e queimas de juntas de cabeçote (especialmente após a proibição do uso de amianto), ficaria mais fácil compreender desde fabricantes chineses que desovavam as cópias de qualquer caminhonete japonesa usando alguma imitação do motor Isuzu 4JB1 nas versões Diesel até um mecânico de trator que deseje fazer aquela antiga adaptação do motor MWM de 3 cilindros da série 229 que chegou a ser comum em caminhonetes full-size nacionais antigas. A bem da verdade, talvez o único motivo que poderia tornar mais relevante uma preferência pela injeção indireta original do motor Toyota 3L por exemplo, seria a maior adaptabilidade da injeção indireta a eventuais experiências com o uso direto de óleos vegetais brutos como combustível alternativo;

2 - para se ver livre da correia dentada: novamente, para quem vê um carro que já atingiu uma certa idade, no Brasil uma parte considerável do público que compra carros usados associa tanto idade de um veículo quanto um preço de aquisição mais baixo com a ilusão que a manutenção fosse custar troco de pinga. Portanto, fazendo uma analogia com as adaptações de motores Volkswagen e Chevrolet ainda tão comuns em veículos cuja regulamentação brasileira impediria legalizar repotenciamentos com motores Diesel, seria pouco ou nada surpreendente alguém considerar uma adaptação parecida. Vale destacar até um precedente histórico bastante curioso da Argentina, onde alguns fabricantes de motores Diesel como a Deutz e a antiga Borgward Argentina apresentavam soluções específicas para o mercado de reposição. E como instalar corretamente uma correia dentada e respectivos tensores pode parecer menos "à prova de burro" num motor Diesel, comparado por exemplo a um motor Volkswagen AP a gasolina, pode soar mais tentador adaptar um motor que tenha comando de válvulas e bomba injetora sincronizados por um conjunto de engrenagens que, apesar de parecer complicado para sincronizar num primeiro momento, vá exigir menos intervenções durante a vida útil do motor;

3 - compartilhar peças de reposição com outros veículos, equipamentos e dispositivos: motores de fabricantes independentes como a MWM e a Perkins ou a Cummins e a Deutz por exemplo, por serem direcionados tanto a aplicações veiculares quanto embarcações, máquinas agrícolas e uma infinidade de equipamentos estacionários/industriais, podem simplificar as logísticas de manutenção e reposição de peças de acordo com as necessidades de cada operador. Desde um produtor rural até um pescador, que poderiam usar motores rigorosamente idênticos numa caminhonete e num trator ou num barco de pesca, passando por entusiastas do off-road recreativo que considerem conveniente uma similaridade técnica mais evidente que poderia facilitar reparos quando o mecânico mais próximo tiver como especialidade os tratores agrícolas, já poderia soar mais razoável uma adaptação "pouco ortodoxa", a exemplo do que faziam os argentinos adaptando motores Deutz da série 913 refrigerados a ar em praticamente qualquer caminhonete onde caiba ao menos uma versão de 3 cilindros;

4 - resiliência a condições ambientais e operacionais severas: como dizia Amaral Gurgel, "peça que não entra no carro não quebra", e portanto um motor com menos vulnerabilidades fica mais convidativo a depender do perfil do operador. E mesmo que um motor "de trator" eventualmente com quantidade de cilindros menor possa parecer subdimensionado para equipar uma caminhonete, vale destacar tanto que os motores Diesel de alta rotação com injeção indireta e aspiração natural como o Toyota 3L já tinham um desempenho consideravelmente modesto quanto motores mais rústicos compartilhando um projeto modularizado com outros destinados a fatores de carga mais extremos levam a crer que uma improvável adaptação tenha mais possibilidades de dar certo que de dar errado;

5 - testar uma integração com outros combustíveis: considerando uma maior facilidade para misturar gás natural à carga de ar de admissão, ou ainda uma injeção suplementar de etanol, ainda que a eventual redução nos picos de temperatura do processo de combustão e a propagação de chama mais homogênea também pudessem ser especialmente benéficas a um motor de injeção indireta como o Toyota 3L, seria menos arriscado aplicar tais métodos a um motor "de trator" mais abrutalhado, principalmente se tiver injeção direta. Eventualmente, considerando que até alguns motores mais rústicos hoje já tem versões com bomba injetora governada eletronicamente, é possível o débito da injeção do combustível principal ser diminuído para manter a proporção estequiométrica mais próxima do parâmetro padrão, enquanto as versões de injeção mecânica tendem a ter um desempenho mais vigoroso quando aplicada uma injeção suplementar de algum combustível volátil que acabe por enriquecer a proporção ar/combustível.

terça-feira, 10 de outubro de 2023

LiquidPiston: uma antiga receptividade ao outsourcing de motores turbodiesel em caminhonetes poderia favorecer tentativas de inserir novas tecnologias no âmbito de motores?

Os ciclos termodinâmicos aplicados a motores veiculares, tanto de ignição por faísca quanto os do ciclo Diesel, tem sido basicamente os mesmos por mais de 100 anos, ainda que algumas evoluções pudessem ser observadas como na época do motor MWM Sprint 4;07 TCA que entre outros veículos chegou a ser usado em versões brasileiras da Chevrolet S10 em versão de 132cv com injeção totalmente mecânica ou 140cv quando incorporou o gerenciamento eletrônico. Por mais que tivesse sincronismo do comando de válvulas por engrenagens como um bom motor "de trator" meramente adaptado até um tanto às pressas para uso veicular, é natural que ter sido desenvolvido já como um motor de alta rotação e com comando de válvulas no cabeçote chamasse a atenção de uma parte do público brasileiro, que ainda estava pouco habituado com tal configuração até os motores Diesel de um modo geral começarem a ter um destaque maior no segmento de caminhonetes mid-size por volta do ano 2000. Eventualmente a configuração até conservadora em outros aspectos, tendo em vista que tratava-se ainda de um motor convencional com 4 cilindros em linha, a princípio pode parecer menos convidativa a uma reflexão sobre possibilidades que um motor substancialmente diferente, como os que a empresa americana LiquidPiston tem apresentado em versões de ignição por faísca sempre operando em ciclo 4-tempos aptas a operar tanto com gasolina quanto com combustíveis gasosos (até mesmo hidrogênio) e no ciclo Diesel em configuração 4-tempos, e mais recentemente Diesel 2-tempos que parece especialmente interessante, além do mais que pode ter taxas de compressão entre conservadores 16:1 até extremos 26:1 mais próximos do que a Scania usou em motores do ciclo Diesel para caminhões e ônibus especificamente preparados para o uso de etanol.
Obviamente a escalabilidade precisa ser levada em consideração, e um motor basicamente portátil mais voltado ao uso em grupos geradores compactos ou para veículos aéreos não-tripulados (VANTs/UAVs - unmanned aerial vehicles - "drones") como é o caso do LiquidPiston XTS-210 operando no ciclo Diesel 2-tempos com 210cc numa faixa de 26cv seria insuficiente mesmo num carro compacto, mas digno de nota por ser um motor rotativo que lembra um Wankel virado do avesso, com um rotor oval ao invés de triangular se movimentando dentro de um alojamento que lembra uma estrela de 3 pontas por dentro, e a comparação com o motor Wankel Mazda 13B de ignição por faísca torna-se inevitável. Apesar de ser mais difícil considerar a possibilidade de conciliar motores LiquidPiston a um turbo, hoje considerado imprescindível em motores Diesel veiculares até no âmbito do controle de emissões, porque mesmo os motores LiquidPiston de ignição por faísca usam injeção de óleo lubrificante para os retentores apicais e lubrificação por salpico onde o eixo excêntrico que faz as vezes de virabrequim é engrenado ao rotor, a menor quantidade de peças móveis e o fato de ser bem adaptável a diversos combustíveis alternativos por alcançar taxas de compressão que um motor Wankel dificilmente alcançaria, seria racional depositar alguma expectativa em torno dos projetos da LiquidPiston fora do âmbito militar nos Estados Unidos, se a escalabilidade for efetivamente levada adiante e surjam motores de 2 a 3 rotores cobrindo faixas de cilindrada entre 1.3L e 2.0L tal qual a Mazda fez com motores Wankel a gasolina. E mesmo que apareça uma solução no tocante à lubrificação que um turbo venha a exigir, possivelmente integrada até mesmo a diferentes graus de hibridização, uma menor quantidade de peças que venha a diminiur os custos de produção, e uma maior densidade de potência em proporção ao peso e dimensões comparado a motores de configuração tradicional facilite a acomodação dos dispositivos de controle de emissões como filtros de material particulado (DPF) e o sistema SCR para controle de óxidos de nitrogênio (NOx) atualmente muito difundidos e cuja competição por espaço com componentes de sistemas híbridos pode ficar mais problemática e fortalecer a imagem dos híbridos como inerentemente antagônicos a um motor Diesel...

quinta-feira, 5 de outubro de 2023

Por que a insistência em apontar só o hidrogênio como "solução infalível" para o transporte comercial é exagerada?

Em um vídeo que circulou recentemente por grupos de Whatsapp, com o piloto de testes e jornalista César Urnhani apresentando um protótipo de caminhão Mercedes-Benz com propulsão elétrica cuja energia é suprida por uma célula de combustível a hidrogênio, foi evidente o otimismo demonstrado em torno desse combustível principalmente devido ao menor peso em comparação a uma bancada de baterias caso fosse um veículo totalmente elétrico. Tratando-se de uma configuração híbrida serial, é inevitável uma comparação entre o hidrogênio e outros combustíveis mais fáceis de manejar, bem como eventuais possibilidades para motores de combustão interna com configuração mais próxima do que o público generalista está acostumado. A dificuldade inerente ao armazenamento do hidrogênio tanto a bordo de um veículo que o utilize quanto nos postos de abastecimento que venham a atender à demanda projetada para um maior uso no transporte rodoviário, por mais que se fale muito em usar o etanol como substrato para extrair o hidrogênio puro, já é problemática também em função do gasto de energia elétrica para purificar e manter o hidrogênio armazenado antes de ser abastecido no veículo.

Experiências de sucesso com outros tipos de propulsão elétrica associada à geração de energia a bordo a partir de motores térmicos também podem ser relevantes, como o caso de turbinas a gás que já são muito usadas na propulsão naval tanto em função da redução de tamanho e peso do conjunto motriz quanto pela capacidade de operar com uma maior variedade de combustíveis é atrativa para os armadores. É inevitável também fazer uma alusão à inserção da tecnologia híbrida nos automóveis, que já contempla também a integração com os motores flex a gasolina e etanol complementados por uma possibilidade de conversões para o gás natural, e até o hidrogênio também poder atender a motores de combustão interna sem sacrificar totalmente a adaptabilidade a outros combustíveis conforme a necessidade do operador. E assim como também o ciclo Diesel pode ser integrado a combustíveis alternativos, como o biodiesel e até injeções suplementares de etanol e gás natural, ou até o uso de gás natural ou biometano que já tem servido como substitutivo ao óleo diesel por alguns operadores mesmo no Brasil, fica mais difícil esperar que o hidrogênio possa efetivamente atender a todas as condições operacionais abrangidas por motores de combustão interna isoladamente ou integrados a sistemas de propulsão híbrida.

quarta-feira, 27 de setembro de 2023

Ford Modelo T: justifica comparações a um "utilitário" moderno?

Produzido entre 27 de setembro de 1908 e 26 de maio de 1927, o Ford Modelo T foi concebido com um intuito de tornar o automóvel acessível para o americano comum, apesar de permanecer sendo artigo de luxo na mesma época em outros países como o Brasil por exemplo, e uma das principais características do projeto era contemplar as necessidades de usuários nas zonas rurais com condições de rodagem mais severas. Lembrando ainda como houve uma desvirtuação de conceitos como o de "caminhão leve" nos Estados Unidos e de "utilitário" no Brasil à medida que pick-ups e SUVs passaram a ter participação de mercado mais significativa por questões burocráticas e políticas, acaba por ser inevitável uma analogia entre veículos que podem ter algumas semelhanças conceituais tão significativas quanto as diferenças de ordem técnica. A bem da verdade, mesmo com o Ford Modelo T remetendo a uma época já distante, só o fato da imensa maioria das pick-ups médias e todas as pick-ups full-size ainda recorrerem ao chassi separado da carroceria e terem tração traseira por eixo rígido com opção pela tração 4X4 com ao menos o eixo traseiro rígido já torna a comparação com utilitários inevitável quando a tração dianteira hoje é o mais comum em segmentos declaradamente generalistas.

Mesmo que a opção pela tração 4X4 nunca tenha estado entre as premissas durante o desenvolvimento do Ford Modelo T, e a capacidade de carga da imensa maioria das versões tenha ficado abaixo de uma tonelada que é o mínimo para um veículo de tração simples ser considerado "utilitário" no Brasil para fins de homologação visando assegurar o direito de usar motor Diesel caso tenha a capacidade de até 8 passageiros além do motorista, a experiência de Jesse Livingood com conversões de veículos como o Ford Modelo T e outros para tração 4X4 realçava uma aptidão para trafegar por terrenos bravios que já servia para promover a motorização no Exército dos Estados Unidos durante a I Guerra Mundial, então constituindo de certa forma um precedente histórico para o Jeep. E mesmo com a ignição por faísca, só de ter uma compatibilidade com o etanol que poderia ser produzido em propriedades rurais para uso do produtor também podia ser comparada às experiências de Rudolf Diesel com o óleo de amendoim como combustível alternativo por sugestão do governo francês durante o período colonial que se estendeu na África bem depois do ciclo de produção do Ford Modelo T acabar. Enfim, sendo um retrato fiel de antes da distorção que elevou pick-ups e SUVs à condição de artigo de luxo, o Ford Modelo T ainda justifica algumas comparações a um "utilitário" moderno, e eventualmente até pode ter mais desenvoltura que muito soft-roader de shopping em algumas condições de terreno mais bravias...

sexta-feira, 22 de setembro de 2023

Caso para rápida reflexão: motor Mercedes-Benz OM-616 e como um motor antigo não deveria ser tão subestimado

Um daqueles motores pouco lembrados no Brasil, o OM-636 chegou a vir em alguns carros de luxo da Mercedes-Benz tanto antes das restrições ao uso de motores Diesel quanto às importações de veículos, e também acabaria vindo em utilitários Mercedes-Benz MB 180D importados da Espanha na década de '90. Naturalmente, a vetusta injeção indireta e a aspiração atmosférica faziam com que o desempenho se revele muito mais modesto em comparação ao observado em utilitários modernos, mas o que causa uma certa curiosidade é a própria Daimler, detentora da marca Mercedes-Benz, ter praticamente "esquecido" esse que foi sem dúvida um dos motores que deram boa fama de robustez a toda prova para os carros da marca em algumas regiões com condições de rodagem extremamente severas. Lembrando precedentes como a Daimler ter dado início ao desenvolvimento dos motores que originaram o AP da Volkswagen, e que a bem da verdade ainda servem de base para o desenvolvimento dos motores 2.0 TDI ainda em uso pelo grupo Volkswagen, e também que os motores Mercedes-Benz de modelos antigos costumavam ter uma modularidade e compartilhamento de componentes entre versões a gasolina ou óleo diesel, chega a soar ainda mais intrigante o fim do motor OM-616 quando ainda parecia adequado em alguns aspectos.

É especialmente digno de nota que o motor Mercedes-Benz OM-616 também teve versões produzidas na Índia sob licença pela antiga Bajaj-Tempo, atual Force Motors, que além de fazer outsourcing para a Mercedes-Benz e até para a BMW, ainda produz versões modificadas do OM-636 que apresenta como sendo baseados em tecnologia da Mercedes-Benz, e é impossível negar alguma semelhança. Apesar das modernidades hoje indispensáveis como o turbo e a injeção direta, bem como dispositivos de controle de emissões de padrão internacional como o filtro de material particulado (DPF) e o SCR para redução dos índices de óxidos de nitrogênio (NOx) que permitem o enquadramento nas normas Bharat Stage VI Phase II equivalentes à Euro-6d, o principal motor hoje usado pela Force Motors é basicamente um OM-616 com stroker para 2.6L ao invés de 2.4L como o original, chamando a atenção que pode entregar desempenho comparável a motores mais modernos com cilindrada entre 15 e 20% menor e que são favorecidos por sistemas de comando de válvulas mais modernos e precisos. Enfim, por mais que um motor à primeira vista "arcaico" pareça relegado ao esquecimento, assim como os modelos que dispunham desse motor já vão ficando raros de se ver, na prática ainda podem permanecer satisfatórios com aprimoramentos de implementação relativamente fácil, sem ter que reinventar a roda para dizer que os motores Diesel estão ficando demasiadamente caros e impossíveis de manter a competitividade frente à ignição por faísca.

quarta-feira, 13 de setembro de 2023

Mais uma pérola aleatória da internet: carro chinês adaptado com motor estacionário de 1 cilindro horizontal


Embora muitos digam que a gambiarra é uma instituição brasileira, tal ditado é uma meia-verdade, e até do outro lado do mundo há quem incorpore uma mistura de McGyver com Professor Pardal. No caso desse vídeo que tem circulado principalmente em grupos do Whatsapp, aparece um sedan FAW Xiali adaptado com motor Diesel de apenas 1 cilindro horizontal, ao que tudo indica uma cópia chinesa daqueles motores Yanmar ou Kubota de origem japonesa que no Brasil são muito conhecidos pelo uso em microtratores Tobatta e similares. Infelizmente não há como ver o acoplamento entre o motor e o câmbio, embora nesse tipo de motor seja comum o acoplamento ao câmbio no caso de tratores ou a outros implementos no caso de aplicações estacionárias através de correias, com o grande e pesado volante do motor já tendo polias incorporadas como uma peça única. Chama a atenção que, devido ao uso de um tanque (hopper) de água ao invés de um radiador para fazer o arrefecimento do motor, nesse caso por perda total da água ao invés de recirculação, e também o tanque de combustível montado imediatamente acima do motor, foi simplesmente feito um corte no capô para o conjunto formado pelo motor e pelos tanques de combustível e da água para o arrefecimento ficar acomodado. A saída do escapamento ser também visível no capô, com um simples cano vertical passando por outro corte, confere um aspecto ainda mais inusitado à adaptação. A partida manual por uma manivela, acoplada ao virabrequim por um orifício no paralama dianteiro direito, é outra característica curiosa, além do mais que muitos desses motores já dispõem da partida elétrica ao menos como opcional. O fato dos antigos Tianjin Xiali, e depois FAW Xiali, serem baseados na 3a geração do Daihatsu Charade, também tem contornos curiosos por ter sido a última geração do modelo a ter em alguns países a opção por motores Diesel de 1.0L e 3 cilindros, faixa de cilindrada bastante próxima às da maioria desses motores estacionários de 1 cilindro.

quinta-feira, 7 de setembro de 2023

Breve reflexão sobre o Gurgel BR-800 e a heterogeneidade do público-alvo de carros "populares"

Com o reaquecimento das discussões em torno do conceito a bem da verdade defasado do que seria um carro "popular", é natural que surjam questionamentos quanto à possibilidade de atender a públicos com uma diversidade de condições operacionais tão somente com uma canetada, e um exemplo emblemático como o Gurgel BR-800 naturalmente é lembrado quando se discute o preço de tabela como parâmetro a ser privilegiado no âmbito político. Além de hoje a carroceria com somente duas portas ser rejeitada por quase todos os eventuais interessados no que seria um carro popular modernizado, considerando ainda a possibilidade de usar um modelo com 4 portas nos serviços de transporte por aplicativo e também como táxi em cidades onde hatches sigam permitidos para tal finalidade, uma série de desafios mais de ordem técnica que política devem ser destacados, e a rejeição de Amaral Gurgel ao ProÁlcool também merece uma menção tendo em vista a atual hegemonia dos motores flex no Brasil também em outros segmentos cuja percepção de valor agregado é maior em comparação a hatches de entrada. Quanto à diversidade, o Gurgel BR-800 ter contemplado no projeto desde a manobrabilidade em espaços mais exíguos dentro da cidade até uma capacidade de incursão off-road moderada e comparável à que se observava na linha antiga da Volkswagen que se valia de motor e tração traseiros é outro aspecto que merece um destaque.

Naturalmente pode parecer desejável que um pequeno agricultor recorresse a uma caminhonete ou SUV de tração nas 4 rodas, até para eventualmente racionalizar o uso de um combustível compartilhado com tratores e outros maquinários agrícolas especializados valendo-se do óleo diesel convencional fornecido por um transportador revendedor retalhista (TRR) que faça entregas diretamente na propriedade rural, e talvez experiências com o biodiesel ou outro combustível renovável ficassem também mais tentadoras, mas tal aspecto já evidencia que mesmo um carro pequeno pode tanto representar uma maior liberdade de locomoção quanto ser um bem de capital e favorecer a eficiência de uma atividade laboral. E apesar do álcool/etanol ou mais recentemente o biometano talvez conseguirem um destaque maior em meio às propostas de uma "neutralização de carbono" que chega a beirar a paranóia em alguns momentos, além de poderem ser implementados em motores de ignição por faísca sem tantas intercorrências em função de incompatibilidades com alguns dispositivos de controle de emissões que tem causado incômodos a operadores de veículos com motor Diesel como o filtro de material particulado (DPF) diante de alguma alteração nas especificações do combustível, o fato da tração simples (traseira nesse caso específico do Gurgel BR-800, até por influência da Volkswagen que por décadas priorizou tal característica) nunca ter sido exatamente um empecilho ao desenvolvimento de veículos aptos a servir à população do campo já expõe uma incoerência em se manter restrições ao uso de motores Diesel atreladas às capacidades de carga e passageiros ou tração. Por mais que o Gurgel BR-800 fosse imbuído de um patriotismo que até motivou as primeiras apresentações oficiais a serem no desfile cívico-militar do Dia da Independência em 1987 em Brasília, com o lançamento ocorrendo no ano seguinte e uma tributação diferenciada que foi instituída no governo Sarney especificamente para fomentar o projeto, eventualmente um jipino que se valesse do mesmo conjunto mecânico de forma análoga a como outros modelos Gurgel se valiam de conjuntos mecânicos da Volkswagen, e fosse direcionado mais explicitamente a funções utilitárias, seria o caso até de considerar uma possibilidade de oferecer a opção por motores Diesel mesmo com tração simples, ao contrário de uma desvirtuação do conceito de utilitário à medida que caminhonetes e SUVs de luxo passavam a ser usados como veículo de luxo tão somente por valer-se de motores Diesel.

Até uma concorrência mais acirrada com as motos ao longo das últimas décadas, à qual pode-se atribuir em parte uma influência das restrições ao uso de motores Diesel que acaba por motivar uma procura por veículos inerentemente mais simples e econômicos no intuito de reduzir o custo operacional total, ainda que possa ser considerada um mero paliativo e também um reflexo do aumento nos preços de carros em função da inclusão de equipamentos de segurança como airbags e freios ABS enquanto motos até 250cc podem ser comercializadas sem ABS, denotam que o público a ser buscado por um carro popular hoje é bem mais desafiador que na época do Gurgel BR-800 por exemplo. Mudanças nas regulamentações que balizavam o segmento, como o fim da inclusão de utilitários em meados da década de '90, acabaram por dificultar ainda mais a efetividade que um programa de carros populares poderia ter para atender a uma parte mais significativa do público brasileiro, tanto nos grandes centros urbanos quanto pelo interior, e a falta de uma visão a longo prazo que contemple desde aspectos técnicos dos veículos quanto a eventual busca por uma renovação da matriz energética que se mantenha bem articulada com as necessidades e preferências dos operadores também constituem um problema. Enfim, considerando até mesmo um uso mais racional de recursos energéticos que poderia ter algum fomento caso motores inerentemente mais eficientes fossem aplicáveis a veículos com conjuntos de transmissão mais simples e com menos atritos internos e peso que o sistema de uma caminhonete 4X4, o já desacreditado conceito de carro "popular" até poderia ter uma contribuição ainda mais relevante para o Brasil atual.

sexta-feira, 1 de setembro de 2023

Eixo dianteiro rígido para adaptação em veículos de tração traseira: uma boa alternativa para facilitar a adaptação de motores mais pesados?

Avistar uma Toyota Hilux de 5ª geração com tração somente traseira e eixo dianteiro rígido é algo que chama facilmente a atenção, tanto pelo exemplar específico que apresentava essa peculiaridade ainda ter sido bem erguido como se costuma ver em exemplares 4X4 modificados para uso off-road extremo quanto pelo eixo dianteiro rígido só ter sido normal de série em versões 4X4 da Hilux enquanto as 4X2 tiveram suspensão dianteira independente desde o início. Mais rústica, a suspensão dianteira por eixo rígido também costuma ser mais frequentemente associada à direção por setor e rosca sem-fim, ao invés de uma direção mais moderna por pinhão e cremalheira, mas a simplicidade tem seus apreciadores, que tendem a priorizar uma percepção de maior robustez ou alguma adequação específica para as condições de uso às quais um veículo vá ser submetido. Outro aspecto que cabe destacar é a maior facilidade para uma eventual adaptação de motores diferentes dos originais e principalmente mais pesados, que chega a ser praticamente óbvio se considerarmos motores de concepção mais abrutalhada para eventualmente substituir os motores Toyota 2L na verdade de 2.4L e 3L de 2.8L Diesel, ambos aspirados e com injeção indireta que equiparam normalmente a Hilux de 5ª geração no Brasil.
Um aspecto a considerar com relação aos eixos rígidos, tanto os de tração quanto só direcionais é serem mais fáceis de instalar principalmente quando a suspensão é por molas semi-elípticas longitudinais, que dispensam braços de fixação do eixo ao chassi, bem como uma simplicidade também maior para fazer a readequação ao peso maior de alguns motores diferentes que possam ser adaptados em substituição ao original. No caso específico de uma Toyota Hilux de 5ª geração, que pela resiliência a condições de uso mais severas, ampla presença nos principais mercados mundiais tanto de forma oficial quanto as cópias chinesas, e a mecânica bastante simples tornando razoável a eventual comparação ao que seria um Ford Modelo T aproximadamente 80 anos mais moderno, há quem prefira ou preservar a originalidade e a confiabilidade ou fazer modificações também comparáveis com a justa licença poética ao conceito dos hot-rods, e para suportar melhor um motor mais "de caminhão" ou "de trator" o eixo dianteiro rígido até pode ser uma opção com boa relação custo/benefício. Enfim, mesmo que possa parecer inusitado por ser menos comum comparado à adaptação de eixos dianteiros rígidos motrizes em veículos 4X4 quando a suspensão dianteira independente pareça menos adequada às condições de uso ou seja demasiado cara para readequar ao peso do conjunto motriz modificado, o eixo dianteiro rígido em veículos de tração traseira ainda pode também fazer algum sentido...