domingo, 11 de agosto de 2013

Uma reflexão sobre o "footprint" ambiental

Determinar o quanto um veículo pode ser considerado "ecológico" muitas vezes acaba envolvendo parâmetros extremamente subjetivos e pouco precisos, que acabam desconsiderando as respectivas capacidades técnicas e outros fatores mais relevantes do que eventuais argumentos publicitários em torno de um  projeto supostamente "sustentável". Nada impede que, ao fim das contas, uma caminhonete antiga como a Mercedes-Benz MB-180 D apresente um impacto ambiental menos intenso que o de um Toyota Prius ao longo das expectativas de vida útil operacional.
Uma das maiores desvantagens práticas que se pode observar no Prius ou em outros híbridos de concepção mecânica similar é a menor adaptabilidade ao uso de combustíveis alternativos com a ignição por faísca, enquanto até mesmo uma antiga Chevrolet D-20 leva vantagem no tocante a esse aspecto. Em regiões produtoras de soja não é incomum se deparar com o uso do óleo de soja puro ou misturado ao óleo diesel convencional, em função da fácil disponibilidade e custo baixo, assim como ocorre com o etanol nas frotas de serviços internos das fazendas de cana-de-açúcar e usinas sucroalcooleiras. Vale lembrar, ainda que o próprio Dr. Rudolf Diesel via nos motores Diesel uma boa opção para levar auto-suficiência energética ao produtor rural nos rincões mais remotos, como na antiga África Alemã do Sudoeste (atual Namíbia).
Vale destacar a possibilidade dos biocombustíveis terem uma produção mais regionalizada, de acordo com preferências e as melhores propriedades físico-químicas para enfrentar variações das condições ambientais a serem encontradas, ao contrário dos combustíveis fósseis que, além de lançar "carbono velho" de volta à atmosfera, tem a produção e beneficiamento mais centralizados e por conseguinte geram gastos e incremento nas emissões em decorrência das operações logísticas necessárias para assegurar o suprimento.

Outro ponto polêmico envolve os processos de fabricação dos veículos. Para os híbridos, por exemplo, a composição química das baterias é um dos aspectos mais críticos, visto que demandam uma extração mineral mais intensa e muita energia a ser consumida para o beneficiamento de alguns materiais mais especiais como o níquel ou, mais recentemente, o lítio. E mesmo que muitas baterias usem compostos eletrolíticos recicláveis, o descarte e reprocessamento de uma bateria em fim de vida útil não é exatamente uma tarefa fácil. Há ainda algum temor quanto a um maior risco de incêndios que possam ter o princípio no sistema elétrico tracionário. Considerando uma expectativa de vida útil aproximada em torno de 10 a 15 anos para as baterias num híbrido, enquanto um motor Diesel pode operar facilmente por 20 anos sem maiores intercorrências, apenas com as necessárias manutenções preventivas, já é uma vantagem em função dos intervalos mais espaçados entre a realização de procedimentos mais complexos como uma retificação completa do motor.

Mesmo considerando um decréscimo previsivelmente mais elevado ao usar um determinado combustível alternativo num veículo equipado com motor Diesel sem tração auxiliar elétrica em comparação com um híbrido de ignição por faísca, como partir de 25km/l para 12,5km/l num Peugeot Partner com o motor 1.4e-HDi, e dos mesmos 25km/l para 17,5km/l num Toyota Prius, ambos abastecidos com etanol, ainda assim o menor gasto de energia na produção do Peugeot e das peças de reposição que se fariam necessárias ao longo de uma vida útil operacional prevista na ordem de 10 a 15 anos permaneceria mais favorável.

Mesmo entre os dieselheads pode haver espaço para controvérsias em torno de qual sistema de injeção seria mais adequado, bem como referências a sistemas de controle de emissões menos suscetíveis a danos na operação com o combustível alternativo da preferência de cada um ou às condições ambientais da região onde se vá trafegar com o veículo, de forma que um clássico Land Rover Defender 90 Tdi possa ser considerado tão "limpo" quanto um Freelander 2 SD4.
Para alguns, a injeção eletrônica, apesar de trazer mais precisão na dosagem do combustível, com controle em tempo real do processo de combustão, pode ser vista com uma certa desconfiança em função da maior complexidade de alguns componentes, bem como da maior sensibilidade a variações na qualidade dos combustíveis.

Há ainda quem prefira a injeção direta, como nos motores MWM Sprint 4.07 TCA (e posteriormente 4.07 TCE) que equiparam a S10 "pitbull" por poder operar num espectro mais amplo de combustíveis alternativos, ao passo que a injeção indireta usada entre outros na Peugeot 504 e na Mercedes-Benz MB-180 D ainda é apontada por muitos como a mais adequada à operação com óleo vegetal em função das temperaturas mais altas e o processo de combustão mais lento reduzirem a incidência de problemas decorrentes da presença da glicerina.

E mais recentemente, com a introdução de sistemas como o EGR, o SCR e o DPF nas novas gerações de caminhonetes, desde modelos de luxo como Audi Q7 TDI CleanDiesel até modelos mais orientados ao uso laboral como a Mercedes-Benz Sprinter, visando atender a normas ambientais cada vez mais rígidas, podem ser apontadas algumas incoerências: o EGR, por exemplo, além de aumentar a geração de material particulado (fumaça preta), ao eliminar calor de parte dos gases de escape no sistema de arrefecimento, diminui a energia térmica disponível para promover a oxidação da fuligem que se acumula no DPF, requerendo ciclos de regeneração mais frequentes e que provocam um aumento no consumo de combustível na ordem de 10%. Outro problema é a maior incidência de entupimentos no coletor de admissão, em virtude da fuligem que se precipita ao aderir a vapores oleosos provenientes da ventilação positiva do cárter (PCV). O próprio DPF, que em muitos veículos não tem um bico injetor específico incorporado na carcaça, fica dependendo do mapeamento da injeção eletrônica para que seja liberada através de pós-injeção uma quantidade de óleo diesel durante a fase de escape, e com o uso de concentrações de biodiesel superiores a 20% (B20) há uma maior dificuldade na vaporização do combustível para que o processo oxidativo ocorra.

Já com o SCR, que ganhou mais espaço nos veículos pesados como caminhões e ônibus (e se vacilar ainda pode desbancar o EGR nos leves), a maior controvérsia se dá pela interferência no processo logístico e de armazenamento de insumos para a operação dos veículos. Também, pelo fato da uréia usada na produção do reagente ARLA-32 ser proveniente de sínteses que utilizam como principal matéria-prima metano (gás natural) de origem fóssil, há objeções tanto à emissão de "carbono velho" na atmosfera quanto ao desperdício de energia para processar um composto que poderia ser usado diretamente como combustível por meio de injeção suplementar no coletor de admissão, tendo efeito semelhante à aspersão de água com metanol como uma espécie de "intercooler químico", de modo a promover um efeito semelhante ao do EGR na redução da formação de óxidos de nitrogênio mas sem efeitos colaterais prejudiciais à eficiência do motor.

Invariavelmente, para avaliar de forma justa o "footprint" ambiental de um veículo, deve-se evitar um apego excessivo a artifícios publicitários extremamente subjetivos e voláteis.

8 comentários:

  1. Tem hora que chega a dar ódio daquele discurso ensaiado que os naturebas usam para falar bem dos híbridos, mesmo a produção e a manutenção deles sendo a mais poluidora.

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  2. Essa cambada de fresco achando que vai transformar o mundo na terra da Alice no país das maravilhas com esses carrinhos de boneca tem mais é que tomar muita fumaça de caminhão na cara para ver se vira homem. Ficar se gabando que tem um carro do Jiraya só pode ser coisa de gente mal-amada que acha que arrotar dinheiro compensa todos os defeitos.

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    1. Até não sou favorável a esse lance de "rolling coal", por desperdiçar combustível. Fora isso, jogar fumaça nas fuças do proprietário de um híbrido é gastar vela boa com defunto ruim.

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  3. De vez em quando uso álcool na minha Explorer apesar de não ser flex de fábrica, será que já posso botar a cabeça no travesseiro com a consciência mais aliviada que um dono de Prius? Haha.. Bjs.

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    1. Dizem que até um Hummer H2 ao longo de uma vida útil operacional estimada em 20 anos é mais limpo que um Prius durante 15 anos.

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  4. Fica tudo muito bonito na teoria, mas na prática tem que ver quem é que realmente paga a conta pela pose de ecologista de uma meia dúzia de hipócritas que só se preocupam em fazer a opiniãozinha deles baseada em modismos fúteis prevalecer como se fosse a verdade absoluta. Esses híbridos são uma hipocrisia imensa mesmo.

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  5. Já estou acostumado a ser chamado de louco por apoiar carro a diesel, mas louco é quem acredita que um híbrido seja melhor.

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  6. Embora o mais lógico seja se valer efetivamente das capacidades de um veículo maior para que as emissões por passageiro (ou por peso carregado) fiquem proporcionalmente menores que num carro teoricamente ecológico, só de se manter um antigo que possa usar óleo de cozinha velho como combustível já parecer bastante sustentável.

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

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