segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Considerações sobre o etanol em motores do ciclo Diesel

Uma legislação absurda vem fazendo do inferno Brasil o único país com uma proibição expressa à comercialização de veículos movidos a óleo diesel com capacidade de carga inferior a uma tonelada, excetuando apenas os 4X4 com reduzida e alguns furgões com acomodações para no mínimo 9 passageiros além do motorista, e para os que não se enquadram em nenhum dos grupos citados acima além da gasolina "batizada" com solvente sobram o pum engarrafado gás "natural" e o goró etanol. Na época em que tais restrições começaram a entrar em vigor, em 1976, a desculpa esfarrapada era priorizar o uso do diesel para transporte em massa, mas até 1993 ainda havia quem conseguisse regularizar um automóvel convertido para diesel (era proibida a comercialização de modelos 0km, até então mais nada). Entretanto, a grande maioria das indústrias automobilísticas instaladas nesse fim de mundo localmente oferecem em países civilizados com um mercado menos restrito pelos 5 continentes alguns carros novos a diesel, e ironicamente de fabricação brasileira. Qual não seria a minha surpresa ao ver que em alguns desses mercados a versão de motor Diesel era a única opção...

O que poucos lembram, contudo, é da proposta original do Dr. Rudolf Diesel considerando o uso de combustíveis provenientes da biomassa, incluindo o etanol, visando uma maior rentabilidade e autonomia energética para os produtores rurais. E mesmo parecendo insanidade, ainda é tecnicamente possível fazê-lo, devido à maior adaptabilidade do ciclo Diesel a combustíveis líquidos das mais diversas especificações, apesar dos modernos sistemas common-rail usados em motores mais recentes demandarem alterações no mapeamento do módulo eletrônico de controle para evitar falhas, tanto que em algumas usinas sucroalcooleiras se investem em média R$20.000,00 para converter um único motor Diesel de 6 cilindros gerenciado eletronicamente para rodar com Caninha 51 sem problemas. Num sistema mais simples e arcaico tradicional, com bomba injetora de ação totalmente mecânica, basta tomar alguns cuidados para manter a mesma lubrificada adequadamente - há quem use óleo para motores 2-tempos de ignição por faísca (mais recomendados os de base vegetal, como o Castrol para kart, devido à maior miscibilidade) e, devido à falta de opções mais específicas, aditivos para manter lubrificados e protegidos de corrosão os carburadores em motores do ciclo Otto movidos a pinga etanol - alguns psicopatas desinformados chegavam a misturar enxofre em pó, acreditando que tal substância (presente no óleo diesel e ausente no cobertor de pobre etanol) teria propriedades lubrificantes. Durante o auge do ProÁlcool, no entanto, a Coopersucar dominava a tecnologia para produzir cachaça o combustível vegetal com um aditivo específico para facilitar a ignição em motores Diesel mas hoje para abastecer os ônibus Scania que rodam em testes na república das bananas por algumas cidades brasileiras, é vergonhoso necessário importar o aditivo da Suécia. Vale destacar que por lá a água que passarinho não bebe o combustível alternativo foi inicialmente planejado para servir aos veículos pesados com motor Diesel, sem no entanto eliminar tal opção de nenhum segmento de mercado. Já do lado de cá do Atlântico, se insistia no menos eficiente ciclo Otto, que ainda trazia maiores complicações à partida a frio, obrigando a recorrer em alguns momentos à gasolina para uma maior estabilidade da marcha-lenta - com o ciclo Diesel, apesar da partida a frio ser diferenciada (em alguns casos mais extremos usando assistência elétrica para aquecer o coletor de admissão e/ou os cabeçotes), a marcha-lenta costuma estabilizar mais depressa...

Na prática, a simples adição de 10% de iaiá-me-sacode etanol ao óleo diesel usado em caminhões a serviço da Usina da Pedra, por meio de um dispositivo especial adaptado no lugar do "pescador" original (que seria desnecessário ao se usar biodiesel por este, ao contrário do "petrodiesel", ser mais miscível ao tira-juízo etanol), fez com que a emissão de material particulado tivesse uma redução de até 65% nos veículos testados, enquanto CO, CO² e os famigerados óxidos de nitrogênio caíssem em mais de 10% sem alterações significativas no porre consumo nem desgaste mais elevado de componentes do motor e linhas de combustível - enquanto isso, com os motores do ciclo Otto a gasolina qualquer caipirinha mistura superior a 5% de assovio de cobra etanol já costuma provocar ressaca aumentos sensíveis no consumo e corrosibilidade, além de prejudicar a lubrificação das sedes de válvula de admissão (como no ciclo Diesel as válvulas de admissão e respectivas sedes já são projetadas prevendo um trabalho mais "seco", não há problemas). A propósito: a urina do capeta gasolina brasileira varia entre 18 e 25% de teor etílico, dependendo do humor dos usineiros resultado das safras de cana-de-açúcar e dos botecos estoques reguladores da ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis).

Ainda que o quebra-goela etanol acabe causando algum eventual comprometimento à segurança e, em comparação com o óleo diesel, apresente consumo até 70% mais elevado em volume (e a desvantagem só piora ao considerar o uso num motor do ciclo Otto), pode ser apontado como mais uma alternativa a quem deseja aliar o uso de biocombustíveis à eficiência superior do ciclo Diesel.

10 comentários:

  1. zé da bomba injetora8 de setembro de 2011 às 14:25

    tinha umas fazenda em que usavam alcool no trator valmet com motor mwm e tinha duas bomba e 2 tanque, dava a partida no diesel e qdo ficava numa temperatura que a marcha lenta não falhava ja podia colocar o álcool

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  2. Mesmo sem o uso do diesel para a partida a frio já é possível rodar no etanol, e dispositivos como os elementos de pré-aquecimento incorporados aos bicos injetores (fabricados pela Bosch) podem ser incorporados para melhorar o funcionamento nessas condições.

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    1. Qual a referencia desses bicos da bosh

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    2. Depende do modelo do carro. Tem que ver se são equipados com o sistema FlexStart como alguns Peugeots e Citroëns com motor 1.6 de 16 válvulas.

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  3. Deja el etanol de caña para la caipirinha y arriba BioDiesel.

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    1. Anda sabendo bem das coisas hein gringo...

      O problema é registrar um carro pequeno para rodar legalmente com motor a diesel na República das Bananas, mesmo que vá rodar só com biodiesel.

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  4. Já misturei um pouco de álcool em motor a diesel por causa de água no tanque. Pelo menos o álcool puxa a água que acaba ficando solta no tanque do diesel só pesando e ocupando volume.

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  5. É possível funcionar o motor diesel somente com etanol? Pode me responder precisamente? Funciona bem?

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    1. Há quem diga ser possível fazer funcionar só com o etanol, sem aditivos promotores de ignição. Mas se tiver interesse em usar o etanol, é melhor recorrer ao aditivo (Master Batch ED 95, que já está sendo produzido pela Clariant em Suzano-SP) a uma proporção de 5% em volume. Funcionar bem até funciona, mas para um aproveitamento melhor os motores movidos exclusivamente a etanol da Scania usam uma taxa de compressão até mais elevada que a dos movidos a óleo diesel convencional.

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  6. Já vi misturarem querosene em carro a álcool e até diziam que limpava umas gomas que podiam se formar no carburador, mas álcool em motor a diesel não me lembro de ter visto misturarem.

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
http://dzulnutz.blogspot.com/2016/03/relacao-de-marcha-refletindo-sobre.html