terça-feira, 26 de abril de 2016

Breve reflexão sobre downsizing, downrevving e respectivas vantagens e desvantagens

A configuração do motor escolhido acaba por influenciar muitos outros aspectos na concepção de um veículo, bem como o desempenho em determinadas condições de terreno. Um ponto que ainda fomenta muitas discussões acaloradas entre os entusiastas e usuários do Diesel é relacionado à cilindrada e faixas de rotação, havendo desde aqueles que se apegam a um motor maior e mais rústico como os Mercedes-Benz OM-324 de 3.4L, OM-314 de 3.8L e OM-364 de 4.0L e o Toyota 14B de 3.7L oferecidos no Toyota Bandeirante em diferentes fases do ciclo de produção e outros tantos que já não fazem uma oposição tão ferrenha a motores mais compactos, leves e com faixas de rotação mais elevadas como o Peugeot XUD9 de 1.9L usado no JPX Montez, derivado brasileiro do Auverland A3 francês.

Desde a concentração de peso entre os eixos e como possa influenciar a capacidade de transposição em terrenos instáveis, passando pela robustez requerida dos componentes de transmissão para lidar adequadamente com a forma como o torque é disponibilizado pelo motor, há todo um somatório que, se por um lado não permite definir com exatidão qual proposta é tecnicamente "superior", por outro pode balizar a tomada de decisão em torno da opção mais adequada às necessidades e expectativas de cada operador. Se por um lado a proposta do downrevving, associando cilindrada maior e torque mais farto em rotações significativamente mais baixas, ainda é considerada mais favorável à durabilidade do motor, por outro o downsizing permite uma classificação mais favorável em mercados onde a cilindrada é usada na composição das alíquotas de impostos e taxas incidentes sobre o veículo e, devido ao menor acréscimo de peso, ainda pode se refletir num eventual incremento da capacidade de carga sem interferir no peso bruto total do veículo. Indo um pouco mais além e observando as distorções burocráticas brasileiras pelas quais um veículo que não seja dotado de tração 4X4 com "reduzida" e acomode menos de 10 ocupantes só é legalmente apto ao uso do Diesel se for considerado "utilitário" em virtude de uma capacidade de carga igual ou superior a 1000kg, um conjunto de motor e câmbio mais leves já pode fazer toda a diferença.

O consumo de combustível e o desempenho, no fim das contas, sofrem ainda uma influência tão significativa da relação de transmissão quanto da proporção entre as faixas de rotação e a cilindrada do tipo de motor escolhido. Uma relação final mais longa, ainda que acabe por diminuir o vigor nas arrancadas e retomadas, permite uma velocidade final mais elevada mesmo com regimes de rotação mais contidos, e portanto se mostra mais adequada ao downrevving, tendo em vista que o torque mais abundante e concentrado em baixos regimes já proporciona a necessária agilidade. O oposto é observado nos motores de baixa cilindrada e alta rotação, usualmente mais associados a uma relação de transmissão mais curta para favorecer as arrancadas e retomadas com o menor torque disponível e deslocado para faixas de rotação mais elevadas, dependendo ainda do motor ser "esgoelado" para alcançar uma velocidade máxima satisfatória. O espaçamento entre cada marcha, bem como a quantidade total de marchas e o distanciamento entre a mais curta e a mais longa, também podem se mostrar decisivas para minimizar qualquer comprometimento inerente tanto aos regimes de rotação do motor quanto à relação do diferencial.

Pode-se observar ainda os motores Diesel de alta rotação como um pretexto para diminuir os custos de desenvolvimento e racionalizar a produção por meio do compartilhamento de componentes não apenas com os motores de ignição por faísca da mesma linha mas até mesmo da transmissão, como ocorre com diversos produtos da Land Rover desde o Series I original. Uma das intenções quando surgiu o primeiro motor próprio da Land Rover, um Diesel de 2.0L desenvolvido especificamente para o Land Rover Series I foi, justamente, a possibilidade de seguir com os mesmos conjuntos de transmissão já associados aos motores Rover IOE a gasolina, tradição que ganhou continuidade quando os motores a gasolina foram substituídos por unidades derivadas dos Diesel. Tal fato chega a soar até um tanto irônico quando o mais comum era o desenvolvimento de motores Diesel relativamente precários a partir de projetos originalmente destinados a motores de ignição por faísca...

Um caso bastante peculiar é o do Land Rover Defender: tendo como únicas opções Diesel na maioria dos mercados uma seleção de motores de alta rotação e com cilindrada entre 2.0L e 2.5L, mas na Austrália o Defender 110 chegou a contar com o motor Isuzu 4BD1 de 3.9L que, apesar de não oferecer a mesma intercambialidade de componentes observada entre versões a gasolina e Diesel do modelo original britânico, ainda teve a distinção de ser o único motor Diesel disponível para todos os Land Rovers australianos produzidos entre 1981 e 1990. Um tanto pesado em comparação aos motores de 2.25L a 2.5L disponibilizados nos outros mercados, possivelmente tal fator tenha levado tal opção a não ser estendida ao Defender 90, cujo entre-eixos mais curto poderia acabar acentuando a diferença no balanceamento e nas transferências de peso inerentes às variáveis observadas durante a operação do veículo.

Diante de argumentos diversos que possam ser usados em defesa de cada proposta, ainda fica difícil estabelecer uma "verdade" acerca de qual configuração seria efetivamente a mais acertada para um espectro maior de aplicações. Se por um lado o MWM 4.10 usado na Ford F-1000 tem seus méritos no tocante à durabilidade e facilidade de manutenção, por outro isso não serviria como justificativa para reputar como "absolutamente inferior" ou "desprezível" um motor consideravelmente menor e com uma concepção diferenciada como é o caso do Indenor XD2 que equipava a pick-up Peugeot 504. Enfim, as prioridades de cada operador sempre acabam sendo o fiel da balança entre o downrevving e o downsizing.

11 comentários:

  1. Quem era acostumado a mexer com motor de trator não se dava bem com essa primeira leva de motores de alta rotação. E mesmo no Toyota tem quem não goste do 14B por girar mais que os MBB.

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  2. Ainda acho que não teria sido problema se a Toyota tivesse usado o 5L-E da Hilux quadrada para manter o Bandeirante em linha por mais uns anos. É o mesmo motor usado hoje na Toyota Dyna africana após o término da produção do 14B.

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  3. Estou pensando em comprar um Toyota Bandeirante. Qual o melhor motor?

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    1. Não há muito consenso quanto a isso. Embora eu não faça objeção ao 14B, se pudesse escolher ficaria com o OM364 pela facilidade na reposição de peças e disponibilidade de upgrades como turbo e intercooler.

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  4. Será que o motor daquele caminhão GMC 7-110 cabe no Defender?

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    1. Pode até caber, mas seria um dos últimos motores que eu cogitaria adaptar num Defender. Não que seja necessariamente um motor ruim, mas a reposição de peças e acesso a assistência técnica no Brasil seriam preocupantes. Usar motor Isuzu pode ter sido uma boa opção na Austrália, mas está um tanto distante de ser a alternativa mais adequada à realidade brasileira.

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  5. Mesmo que um motor mais levinho com menos cilindrada e giro mais alto possa até dar certo, eu ainda prefiro uma dose maior de brutalidade.

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  6. Já usei muito motor grande e de baixo giro, mas hoje prefiro os menores e mais leves.

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  7. Eu fico meio em cima do muro, mas se for para uso pesado prefiro motor mais pesadão mesmo.

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  8. Pensou em tudo mesmo. Mas e aí, será que valem a pena esses motores menores num jipe ou é muito peso? Confesso, é para usar mais na cidade e de vez em quando ir num sítio ou na praia, mas nada muito radical que o peso do motor vá facilitar para afundar a frente.

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    1. Pergunta de prova, mas eu costumo ser mais conservador no tocante a motores. Se pudesse escolher, muito provavelmente a minha preferência recairia sobre um motor de maior cilindrada e com mais torque em baixa rotação.

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
http://dzulnutz.blogspot.com/2016/03/relacao-de-marcha-refletindo-sobre.html