Pode-se dizer que a Espanha, pelas mais diversas razões, já foi o país mais dieselhead do mundo, e com certeza o trabalho de verdadeiros artistas da mecânica como Eduardo Barreiros foi de suma importância para tal condição. Nascido em Gundiás, província de Orense, comunidade autônoma da Galícia no dia 24 de outubro de 1919, filho de Eduardo Barreiros Nespereira e Luzdivina Rodríguez Ansía, Eduardo Barreiros Rodríguez esteve envolvido desde muito pequeno com o transporte comercial, sendo filho de um proprietário de empresa de ônibus e tendo ajudado tanto na conferência de passageiros e bagagens quanto na manutenção dos veículos, tornando-se suficientemente familiarizado com os fundamentos da mecânica para posteriormente alçar vôos mais arrojados. Convocado para a Guerra Civil Espanhola, e conduzido um ônibus da empresa familiar que havia sido requisitado para o transporte de soldados e de feridos no decorrer do conflito, também teve contato com os caminhões ZIS de origem soviética que na Espanha ficaram conhecidos como Tres Hermanos Comunistas devido ao logotipo da marca no alfabeto cirílico que é usado na língua russa parecerem 3HC no alfabeto romano, experiência que viria a ser base para posteriores experiências com a conversão de motores a gasolina para Diesel antes de dar início à produção de motores próprios.
Daquelas experiências feitas a partir de 1949 com a conversão dos motores de caminhões ZIS, começou uma trajetória de sucesso com motores Barreiros que superaram as restrições burocráticas do Instituto Nacional de Indústria (INI) durante o governo de Francisco Franco no pós-guerra, ao ponto do motor EB6 ter sido reocnhecido por muitos espanhóis como mais importante para a Espanha que os da estatal ENASA usados nos caminhões Pegaso. E da importação de caminhões poloneses Star que recebiam o motor Barreiros até a fabricação de caminhões Barreiros efetivamente espanhóis, foram desenvolvidos outros tantos motores para aplicações mais leves como automóveis e caminhonetes, mas também com um amplo uso em maquinário especializado e na propulsão de pequenas embarcações, contrariando as crenças que a Espanha seria incapaz de ter produção própria de motores que representavam a excelência da engenharia numa época que a tecnologia era menos avançada que hoje mas o sangue espanhol fervia com o ímpeto de abrir caminhos para o progresso. Embora a transição da organização Barreiros Diesel para Chrysler España entre 1962 e 1969 tenha sido um tanto complicada, pela falta de entendimento dos dirigentes americanos da Chrysler acerca das condições da Espanha daquela época, o duradouro legado de Eduardo Barreiros na história da industrialização espanhola de um modo geral já estava consolidado, embora poucos hoje se dêem conta que aqueles motores "de trator" foram o embrião da enorme fábrica que hoje pertence à Stellantis em Madrid.
Naturalmente as dificuldades técnicas da época, somadas à incidência de impostos sobre os veículos na Europa já ter sido atrelada à cilindrada, podia dificultar a implementação de um motor Diesel a modelos compactos como o Simca 1000, enquanto para um modelo americano que só era compacto para padrões dos Estados Unidos mas era grande em outras regiões como o Dodge Dart acabava caindo como uma luva para diminuir os custos operacionais e atrair a um público para quem a lembrança das dificuldades de um passado conflituoso ainda parecia tão próxima. Mas da austeridade dos compactos europeus para a opulência dos carrões americanos, o esforço de Eduardo Barreiros pavimentou caminhos para abrir o mercado espanhol a uma competitividade que contrastava com os entraves burocráticos impostos pelo INI para proteger a então estatal SEAT que tinha convênios com a Fiat antes da privatização que levou à venda da SEAT para a Volkswagen. E a bem da verdade, a busca pela economia do Diesel promovida por Eduardo Barreiros como uma ferramenta para melhorar a vida em uma Espanha isolada do mundo em meio a conflitos que iam da Guerra Civil Espanhola e passando pela II Guerra Mundial até chegar à Guerra Fria serviu para demonstrar em condições reais de uso as vantagens que o grande público na Europa Ocidental só daria o merecido valor depois das crises do petróleo deflagradas pela derrota de uma coalizão àrabe que desencadeou a Guerra do Yom Kippur contra Israel em 1973.
Um acordo pactuado com a Chrysler enquanto Eduardo Barreiros e os irmãos Valeriano, Graciliano e Celso deixavam a empresa os impediu de trabalhar no setor de mecânica e fabricação de veículos e motores até 1978, quando dedicaram-se a atividades tão diversas quanto a produção de vinhos e o melhoramento genético de gado, passando pela mineração de estanho e pirita e atividades financeiras que causaram prejuízos honrados por Eduardo Barreiros às custas de patrimônio pessoal empenhado para saldar dívidas. Mas assim como aquelas experiências da conversão dos motores de caminhões ZIS para Diesel, reputadas como impossíveis antes que Eduardo Barreiros provasse que os céticos estavam errados, a implementação de uma empresa de consultoria técnica denominada DIMISA (Diésel Motores Industrias S.A.) viria a fazer os caminhos de Eduardo Barreiros se cruzarem com os soviéticos outra vez, com a participação em um concurso internacional para a instalação de uma fábrica de motores em Cuba, auditada pela instituição inglesa Lloyd's Register na qual uma linha de motores modulares entre 6 e 12 cilindros em V de projeto original da então novata DIMISA superou concorrentes da Nissan Diesel e até da Perkins, honrando o legado dos antigos motores Barreiros e motivando a mudança de Eduardo Barreiros para Cuba com o objetivo de supervisionar a implementação da fábrica e a produção dos motores tal qual a Ford fazia com a GAZ na Rússia antes da Guerra Fria e o que a Fiat fez com relação à Avtovaz (Lada). Motores russos então modernos da ZIL, denominação que a ZIS recebeu após a morte de Stalin, também chegaram a ser convertidos durante a estadia de Eduardo Barreiros em Cuba.
Daquele aprendizado empírico dos fundamentos da mecânica automotiva até atrair o interessa da então gigante Chrysler para a Espanha que ainda lutava para se reerguer das beligerâncias da primeira metade do século passado, até falecer no dia 19 de fevereiro de 1992 em Havana já trabalhando no projeto de um motor que seria produzido em Angola, e cujo primeiro protótipo funcional que foi finalizado por seus auxiliares ficou conhecido como El Póstumo, Eduardo Barreiros contribuiu de forma inestimável para apresentar os motores Diesel como uma solução viável para veículos dos mais diversos segmentos. Uma história pouco recordada em meio à demonização que vem sendo promovida contra os motores de combustão interna na atualidade, até mesmo na Espanha que certamente só se reergueu dos escombros da Guerra Civil por iniciativa de Eduardo Barreiros e outros tantos que honraram o sangue espanhol ao apresentarem soluções de excelência mesmo com a precariedade técnica que a engenharia vivenciava em uma época sem tantos recursos tecnológicos à disposição. Enfim, tendo conciliado a parte técnica com uma verdadeira passionalidade que o motivou até o fim da vida, talvez não seja um erro reputar Eduardo Barreiros como o primeiro dieselhead espanhol.
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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.
It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.
Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
http://dzulnutz.blogspot.com/2016/03/relacao-de-marcha-refletindo-sobre.html