terça-feira, 27 de maio de 2025

Favorecimento aos veículos 4X4 para fins de homologação como utilitário: até que ponto restringiu a pauta da liberação do Diesel em veículos leves?

Um aspecto que às vezes passa despercebido, o favorecimento aos veículos com tração 4X4 para fins de homologação como utilitários mesmo com capacidade de carga abaixo de uma tonelada e acomodações para menos de 9 passageiros além do motorista naturalmente chama a atenção, especialmente à medida que alguns veículos hoje antigos como um Jeep CJ-5 chegam a ser mais compactos por fora que muitos carros modernos, até mesmo os "populares". Tendo em vista o próprio custo adicional de um sistema de tração 4X4, que em outros momentos os tornava mais favorecidos tanto por uma parte mais específica do público interiorano que usava veículos com essa configuração em usos efetivamente profissionais, e também as forças militares para as quais até a regulamentação que permitia a homologação de veículos 4X4 chegou a tomar por base o Jeep CJ-5 mesmo que o modelo nunca tenha sido oferecido com a opção por motor Diesel original de fábrica no Brasil, chama ainda mais a atenção diante da antiga prevalência de veículos de tração simples nas mais diversas aplicações utilitárias/comerciais, a ponto de ainda ter sido comum até a década de '90 que sacos de areia semelhantes aos usados para treinamento de artes marciais fossem oferecidos comercialmente com a função de servir de lastro para as pick-ups de motor dianteiro e tração traseira terem um melhor assentamento do eixo motriz em trechos sem pavimentação. Vale lembrar que essa situação do Brasil destoava de outros países onde a imposição de sobretaxas aos veículos 4X4 foi insuficiente para desenvolver uma cultura distinta em torno do Jeep, como as Filipinas onde por muitas décadas a produção local de derivados baseados no Willys MB da época da II Guerra Mundial tanto para uso privado (OTJ - owner-type Jeep) quanto para transporte de passageiros (PUJ - public utility Jeep) mas com tração somente traseira chegou a ser uma das representações mais comuns em iconografias sobre a cultura filipina por algumas décadas.

Naturalmente a própria situação política em meio ao Milagre Econômico Brasileiro no regime militar e o fomento à substituição da gasolina pelo álcool/etanol, bem como o antigo predomínio da Volkswagen no mercado de veículos quando Fusca e Kombi ainda eram as principais referências, foram pouco ou nada convidativos até para outros fabricantes estrangeiros de veículos e motores com operação no Brasil como a Mercedes-Benz e a Perkins oferecerem localmente opções de motores Diesel de alta rotação que fabricavam em outros países e poderiam ter atendido a veículos leves com mais facilidade que motores "de trator" adaptados às pressas para uso em pick-ups full-size de projeto americano. Lembrando que o próprio Jeep CJ-5 chegou a ser oferecido entre os anos de 1961 a 1965 com a opção pelo motor Diesel Perkins 4-192 de 3.1L nos Estados Unidos, enquanto no Brasil o motor Perkins 4-203 de 3.3L foi usado só na Pick-Up Willys e na Rural opcionalmente a partir de 1962 para já sair de catálogo em 1964, e na Espanha motores Perkins 4-108 de 1.8L e 4-165 de 2.7L atenderam a diversos modelos Viasa-Jeep entre as décadas de '60 e '80 com sucesso a ponto de terem eliminado as opções de motores a gasolina, ainda que diferentes circunstâncias políticas, e mais especificamente no caso da Espanha toda uma cultura que foi desenvolvida em torno dos motores Diesel desde princípios do século passado até o rescaldo da Guerra Civil Espanhola tenham levado desde fabricantes 100% espanhóis como Barreiros e Matacás até players internacionais como Perkins e Mercedes-Benz que operavam joint-ventures com empresas como Motor Ibérica e IMOSA a terem oferecido opções tanto de motores para repotenciamentos em veículos originalmente movidos a gasolina quanto disponibilizado motores para versões espanholas de modelos que às vezes nem sequer tinham tal opção em outros mercados. E mesmo que a partida a frio de motores Diesel também pudesse ter algum grau de dificuldade, quando chegaram as primeiras crises do petróleo que motivou o regime militar brasileiro a instituir o ProÁlcool já eram conhecidas soluções para esse problema com relação aos motores Diesel até em países de clima frio do hemisfério norte, e algumas até poderiam ter sido mais úteis no Brasil com o álcool/etanol que o tanque auxiliar de gasolina para partida a frio que só foi abolido dos modelos flex modernos em 2022.

Até tendo em vista a forma como veículos 4X4 deixaram de ser vistos como algo inerentemente rústico e destinado tão somente ao público interiorano ou a operadores profissionais muito específicos que vão de forças militares a serviços de manutenção de infraestruturas, sendo alçados à condição de veículos de lazer em atividades off-road recreativas com alguns modelos modernos trazendo tal característica como se fosse um luxo, ou uma concessão à "Lei de Gérson" para assegurar o direito ao uso de motor Diesel que as restrições baseadas nas capacidades de carga e passageiros ou tração implementadas em '76 no Brasil visavam evitar para assegurar o suprimento de combustível para aplicações utilitárias, é evidente que a atual moda de SUV contrastando com a austeridade de um Jeep Willys clássico pode levar a crer que uma liberação do Diesel em veículos leves seja irrelevante para uma parte do público que disponha de uma capacidade financeira confortável para migrar de um sedã para um SUV ou pick-up 4X4. Ainda que a ascensão de dispositivos de controle de emissões como os filtros de material particulado (DPF) ou o SCR agregou um custo mais difícil de amortizar em segmentos mais austeros, nos quais uma presença da tração 4X4 costuma ser tratada como impraticável pelo tema do custo e complexidade técnica assim como na maioria das pick-ups brasileiras antigas, é claramente um contra-senso impedir o acesso à opção de motores turbodiesel que poderiam servir de pretexto para fomentar o biodiesel como resposta a uma descredibilização do etanol e ao alto custo e complexidade de conversões para gás natural ainda apreciada por alguns taxistas e por motoristas de aplicativo. Enfim, mesmo havendo outros fatores que também atrapalham a pauta da liberação do Diesel, a desvirtuação de função da norma que permitiu a veículos como o Jeep um eventual repotenciamento com motores Diesel por serem utilitários ainda tem reflexos na atualidade, com cowboys de apartamento usando pick-ups como um carro de luxo enquanto motoristas profissionais ficam reféns da gasolina ou das limitações atribuídas ao etanol e ao gás natural.

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
http://dzulnutz.blogspot.com/2016/03/relacao-de-marcha-refletindo-sobre.html