quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Refletindo sobre situações em que as restrições ao uso do Diesel em veículos leves se mostram infundadas

A simples proibição ao uso do óleo diesel convencional em veículos leves se trata de uma medida claramente defasada, parte de uma resposta imediatista do então presidente Ernesto Geisel diante dos choques do petróleo ocorridos na década de '70, mas ainda encontra defensores apegados a outros critérios de ordem técnica que no fim das contas se revelam muito subjetivos. Deixando um tanto de lado as discussões acerca da adaptabilidade de motores Diesel a combustíveis alternativos adequados às mais distintas realidades regionais brasileiras, podendo ir desde os tradicionais biodiesel e etanol até outros mais controversos como óleos vegetais brutos, há situações em que o privilégio conferido a veículos com algumas características mais específicas provoca uma grave distorção da proposta original de priorizar o transporte comercial e a atividade agropecuária.



A categorização de veículos como "utilitários" baseada apenas em parâmetros como as capacidades de carga, passageiros e tração tem se revelado particularmente ineficaz diante do atual contexto do mercado automobilístico brasileiro, que alçou as pick-ups médias e os sport-utilities à condição de objeto de desejo da classe média urbana valendo-se de pretextos tão diversos quanto a decadência das minivans e uma equivocada sensação de segurança associada à posição mais elevada da cabine. Enquanto isso, ao mesmo tempo que os agroboys que nunca plantaram nem feijão no algodão e os cowboys de posto que nunca criaram nem galinha no quintal usam pick-ups de cabine dupla com tração 4X4 apenas como mais um acessório para desfilar em estacionamentos de shoppings e supermercados, e tantas mulheres à beira da menopausa recorrem aos sport-utilities como parte integrante do "kit vaidade" composto por cirurgias plásticas e aplicações de botox, é cada vez mais comum que o grosso das frotas comerciais e de serviços se resuma a hatches "populares" e pick-ups compactas com tração 4X2 e capacidade de carga nominal por volta de 700kg (mas que às vezes ainda rodam com sobrepeso).




Um dos casos que exemplifica bem a pobreza de espírito que sustenta as restrições ao uso do Diesel em veículos leves é a exigência de tração 4X4 com caixa de transferência de dupla velocidade para qualificar veículos com capacidade de carga inferior a uma tonelada e acomodação para menos de 9 passageiros além do motorista como "utilitários". A persistente popularidade do Fusca e de derivados com alguma modificação mais orientada a algum uso fora-de-estrada não apenas para fins recreacionais mas também em aplicações utilitárias já evidencia ao menos em parte a incoerência por trás da limitação meramente burocrática ainda em vigor. Não é incomum que veículos e equipamentos dotados apenas de tração 4X2 já apresentem desempenho satisfatório em função de características tão diversas quanto a distribuição de peso entre os eixos ou alguns recursos rudimentares como o sistema de freio seletivo aplicado ao eixo traseiro dos antigos Gurgel e de alguns tratores para o condutor emular o efeito de um diferencial de deslizamento limitado.

Diante de toda a discussão sobre "sustentabilidade" e uso racional de recursos energéticos, convém lançar um olhar sobre a Fiat que fez da Palio Adventure uma alternativa para quem procurava por custos menores em comparação a um veículo 4X4 que viria a ser de certa forma subaproveitado. Embora a configuração de tração apenas dianteira compartilhada com os demais modelos da mesma plataforma permaneça razoável em circunstâncias onde o peso, complexidade e atritos internos inerentes a um sistema de tração nas 4 rodas não se justifique e possa até ser inconveniente em função do aumento no consumo de combustível e custo de manutenção, quem não estiver disposto a abrir mão do Diesel fica de mãos atadas. A recente canibalização dentro do grupo FCA (Fiat Chrysler Automobiles) com o Jeep Renegade, que poderia ser atribuída simplesmente ao modismo dos sport-utilities e crossovers, não deixa de ter uma influência das opções de motor com ambos os modelos compartilhando do mesmo E.torQ 1.8L "flex" a gasolina e etanol nas versões de tração somente dianteira no mercado brasileiro enquanto o Renegade ainda dispõe de um 2.0L turbodiesel apenas quando dotado de tração nas 4 rodas.

Não convém seguir subestimando o potencial a ser oferecido por um eventual relaxamento da definição meramente arbitrária de "utilitários" poderia trazer para a eficiência energética da frota nacional, com uma previsível queda nos índices de emissões como benefício adicional. Enfim, deixando de lado alguns temores referentes a um impacto de curto a médio prazo que poderia ser trazido pela liberação do Diesel para veículos leves sobre a disponibilidade de combustível para aplicações utilitárias e comerciais, fica cada vez mais evidente que já não há tanto fundamento para manter as restrições em função das capacidades de carga, passageiros e tração.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Top 5 de alternativas um tanto superestimadas que já foram mencionadas em oposição a uma eventual liberação do Diesel

A simples menção a uma possibilidade de liberação do Diesel para veículos leves no mercado brasileiro já é suficiente para despertar reações acaloradas, naturalmente tanto favoráveis quanto contrárias. Além da eterna polêmica quanto a índices de emissões em comparação a concorrentes com motores de ignição por faísca, bem como questionamentos sobre o efeito de dispositivos de pós-tratamento de gases de escape cada vez mais complexos sobre a durabilidade e o custo de manutenção das novas gerações de motores Diesel, não é incomum se deparar com outras reações que inicialmente podem parecer fundamentadas mas, no fim das contas, não se sustentam...


Ah, os híbridos... Uma das principais zonas de conforto de quem costuma se manifestar contra o Diesel em aplicações veiculares leves é a grande aceitação que modelos como o Toyota Prius conquistaram em alguns dos principais mercados internacionais. Embora o recurso à aspiração natural e à injeção convencional permaneça freqüente nos sistemas de tração híbridos baseados num motor de ignição por faísca, num contraponto ao downsizing que tem se firmado em veículos com uma configuração mais tradicional de transmissão, a barreira do custo ainda é desafiadora. Recursos como o desligamento automático do motor em marcha-lenta, a frenagem regenerativa e até algum grau de assistência motriz elétrica podem ser incorporados em praticamente qualquer veículo (inclusive nos dotados de motor Diesel) a um custo menor que o de um sistema híbrido pleno. Indo mais além, tanto a hibridização não é incompatível com o Diesel que ônibus híbridos já são produzidos em escala comercial até no Brasil onde os frotistas costumam ter um perfil mais conservador.

Mas e a experiência brasileira com o etanol, não valeu de nada? Se tem outra alternativa muito superestimada como uma "salvação" para a ignição por faísca, sem dúvidas é o etanol. Anteriormente usando as denominações comerciais "álcool etílico carburante" e "álcool hidratado", já chegou a ser mais competitivo diante da gasolina amparado principalmente por subsídios e incentivos fiscais à produção de veículos movidos pelo combustível que no Brasil ainda é muito dependente da cana-de-açúcar. Enquanto houver algum descaso com outras alternativas como o milho usado pela indústria agroenergética dos Estados Unidos, a beterraba açucareira predominante na França e na Inglaterra, ou ainda um reaproveitamento de resíduos da produção de alimentos como acontece na Finlândia, vai ser difícil recuperar a confiança de consumidores que já cansaram de ficar à mercê do humor do setor sucroalcooleiro e das oscilações do valor do açúcar nos mercados internacionais. Termina-se andando em círculos quando resta a atual geração de carros e motos "flex" para tentar reabilitar uma esperança pelo futuro do etanol se vendo obrigado a permanecer usando a gasolina durante a entressafra da cana...





Gasolina cara é o problema? Que tal uma moto para economizar? Por mais que motocicletas, triciclos e similares tenham alguns méritos, não convém simplesmente ignorar as limitações que possam apresentar. O recurso ao side-car para ampliar as capacidades de carga e/ou passageiros, que vem ganhando cada vez mais adeptos nos últimos 10 anos, deixa suficientemente claro que a mera substituição do carro pela moto não é suficiente para atender às necessidades de uma parte significativa do contingente de consumidores insatisfeitos com a falta de opções. Seja para quem prioriza o conforto e a segurança atribuídos a um automóvel convencional ou para quem deposita uma esperança na adaptabilidade a combustíveis alternativos inerente aos motores Diesel, uma moto com side-car vai ser tratada por muitos como um paliativo ao invés de uma solução. No tocante a triciclos, é interessante destacar tanto o caso daquele modelo chinês que foi comercializado como Gurgel TA-01 usando um motor Diesel de 1 cilindro horizontal quanto aqueles Bajaj indianos, que em alguns mercados também contam com essa opção como alternativa às versões equipadas com motor de ignição por faísca.


Gás: opção natural? Outra daquelas propostas tão apontadas como milagrosas que chegam a lembrar os produtos mirabolantes das Organizações Tabajara, o gás natural pode até estar de bom tamanho para alguns usuários mas está longe de ser inquestionável. Em tempos que as conversões para GNV de 5ª geração tornam menos sensível o prejuízo ao desempenho, e já se especula sobre a chegada de kits de 6ª geração no mercado brasileiro em resposta a uma maior presença da injeção direta entre os automóveis e utilitários com motor de ignição por faísca, o peso agregado e o volume ocupado pelo sistema de combustível seguem constituindo um inconveniente. A disponibilidade limitada do gás natural veicular, mais difícil de encontrar fora do eixo Rio-São Paulo e de outros grandes centros, também acaba inviabilizando uma adoção mais ampla desse combustível nos rincões do interior. No caso de pick-ups e utilitários esportivos, além da possibilidade de instalar os cilindros por baixo da carroceria diminuir a intrusão no compartimento de carga, o fato de serem menos visados pela ladroagem numa comparação aos mesmos modelos quando equipados com motores Diesel chega a soar atraente, mas não deveria servir como pretexto para negligenciar a questão da segurança pública cada vez mais precária tanto pela falta de investimentos quanto pela ascensão dos "direitos dos manos" no cenário político brasileiro. #Bolsonaro2018

Ah, os carros elétricos estão chegando... Daí a serem adequados à realidade brasileira, já é outra história. Convém lembrar o caso do BMW i3, que no exterior é oferecido tanto na versão puramente elétrica quanto na híbrida já trazida para o Brasil. Embora a autonomia esteja ficando menos limitada em função das baterias mais modernas, o tempo necessário para a recarga ainda é visto como um inconveniente por muitos potenciais usuários. Diante da precariedade do sistema elétrico nacional, que sofreu com uma prolongada falta de investimentos para atender com eficiência o crescimento no consumo culminando com os infames apagões e o racionamento de energia em 2001, além de outros casos mais isolados como o apagão de 2003 em Florianópolis provocado por um acidente na Ponte Colombo Salles e os transtornos causados por um temporal com queda de árvores sobre a fiação em Porto Alegre no ano passado, também fica realmente difícil desenvolver uma relação de confiança com veículos elétricos. A título de curiosidade, quando a Nissan promoveu uma série de eventos com test-drive do Leaf entre 2011 e 2012, valeu-se de geradores a óleo diesel para garantir a recarga das baterias.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Reflexão: até que ponto a aversão de alguns setores da indústria automotiva a tecnologias desenvolvidas por terceiros pode privilegiar o Diesel diante da ignição por faísca?

Já não é de hoje que a fabricação do próprio motor é questão de orgulho para diversas empresas no setor automobilístico, incluindo algumas já encerradas como a Gurgel que deu um passo importante rumo à "independência tecnológica brasileira" com o motor Enertron de 2 cilindros opostos (boxer) a gasolina com refrigeração líquida que equipou o BR-800. Tal iniciativa é apontada constantemente como um pretexto para teorias de conspiração muito difundidas entre admiradores da histórica fábrica de capital 100% brasileiro que se notabilizou por utilitários derivados de conjuntos mecânicos da Volkswagen antes de se aventurar numa inauguração do segmento hoje conhecido como o dos "carros populares", mas oferece um bom pretexto para reflexão num contraste com a maior receptividade ao outsourcing no mercado de caminhões e mesmo em outros segmentos onde o Diesel prevalece. Quem nutre uma admiração especial por fabricantes nativos pode tomar como exemplo a Agrale, que já chegou a oferecer um motor Diesel de fabricação própria em caminhões da antiga série TX paralelamente a um motor Chevrolet a etanol e um Diesel MWM.

De certa forma não se deve ignorar uma influência exercida pelo mercado de caminhões dos Estados Unidos, que por muito tempo favoreceu uma maior modularidade e variedade de motores e câmbios de diferentes fornecedores para um mesmo modelo. Essa situação está mudando, com uma maior receptividade ao uso de motores próprios de empresas associadas a cada fabricante de caminhões, embora a exclusividade ainda dê margem a algumas desconfianças por parte de proprietários e operadores. Enquanto modelos antigos como o International 4700 sofreram alguma rejeição ao contar apenas com um motor do próprio fabricante, outros como o Freightliner Argosy não repetiram o erro ao manter a opção por motores Cummins paralelamente aos Detroit Diesel hoje oferecidos exclusivamente em produtos da Daimler Trucks. Também seria prematuro descartar outros fatores que levaram a essa dinâmica observada no mercado americano, desde os altos custos de pesquisa e desenvolvimento de soluções para o controle de emissões até a maior intercambialidade de componentes com motores das mesmas linhas destinados a outras aplicações, trazendo economia aos processos logísticos tanto durante a produção quanto nas operações de manutenção e reposição de peças.


Não se pode esquecer que, enquanto o Diesel detém amplo respaldo em uma infinidade de segmentos além das aplicações veiculares, a ignição por faísca ainda encontra pretextos para uma continuidade principalmente em função de veículos leves nos quais os custos de fabricação e aquisição são críticos, e em alguns equipamentos portáteis que tem foco na redução de peso para a escolha do motor mais adequado. Nesse contexto, por mais incrível que possa parecer, até mesmo aquele motor 4-tempos de pistões opostos projetado na startup americana Pinnacle Engines ainda enfrenta alguma resistência mesmo diante de uma previsão de incrementar somente de 2,5 a 3% no preço final de uma moto de baixa cilindrada ou de um triciclo utilitário daqueles muito populares no sudeste asiático e oferecendo uma eficiência energética comparável à dos sistemas de tração híbrida gasolina-elétrica notadamente mais caros, complexos e pesados. Uma característica interessante desse projeto da Pinnacle Engines é o uso das camisas de cilindro como válvulas, podendo ser feita uma analogia ao sistema desenvolvido por Charles Knight e amplamente usado tanto em automóveis americanos e europeus como também em motores aeronáuticos por eliminar a ocorrência de recessão de sedes de válvula de escapamento quando ainda nem se falava em gasolina com chumbo ou no preenchimento de hastes de válvulas com sódio visando uma melhor refrigeração. Na prática, como os motores de pistões opostos ao menos aparentam ter uma boa tolerância às variações de inclinação que possam ser submetidos, até que não seria de se estranhar que começassem a aparecer em substituição aos motores 2-tempos que hoje ainda são o padrão nas motosserras...

Embora a cultura predominante na indústria automobilística em geral permaneça um tanto refratária a tecnologias desenvolvidas por terceiros, não faltam boas oportunidades em outros segmentos. A bem da verdade, não se deve esquecer que o ciclo Diesel ganhou notoriedade em aplicações náuticas e estacionárias/industriais antes que fosse levado a sério como uma alternativa para veículos terrestres. Portanto, não seria de se estranhar que projetos como o desenvolvido pela startup americana Achates Power, proponente de uma reabilitação dos motores Diesel 2-tempos com pistões opostos no segmento veicular, num primeiro momento conquistassem uma maior receptividade para o uso em embarcações e grupos geradores. Guardadas as devidas proporções, pode-se considerar o sistema de injeção direta desenvolvido pela empresa australiana Orbital Corporation para motores 2-tempos de ignição por faísca como um precedente favorável tendo em vista que, após toda a empolgação em torno de eventuais aplicações automotivas que no fim foram engavetadas, acabou consolidando-se como uma alternativa adequada tanto às particularidades de motores marítimos quanto de outros produtos especiais como snowmobiles, além de ser compatível com o uso de combustíveis alternativos como o etanol, o gás natural, e também o querosene de aviação e o óleo diesel convencional em algumas aplicações militares.

Como seria de se esperar, fabricantes de veículos da Índia e da China ainda considerados pequenos diante dos principais conglomerados americanos, europeus, japoneses e sul-coreanos e ainda muito dependentes da transferência de tecnologia proveniente tanto dos fabricantes mais tradicionais quanto de consultorias independentes oferecem uma possibilidade mais promissora para os outsiders. Entre os fatores que podem influenciar nessa perspectiva, a rápida expansão das frotas locais e também em mercados de exportação onde o custo baixo garante uma certa competitividade aos veículos indianos e mais recentemente chineses, bem como a necessidade de conciliar a manutenção da vantagem no preço com o cumprimento de normas de emissões mais rigorosas e metas de redução de consumo de combustíveis que se fazem necessárias para ir além dos mercados periféricos na Ásia, África, América Latina e Oriente Médio. Não se pode esquecer da competição com os carros usados exportados diretamente do Japão e da Coréia do Sul em países onde tal prática é permitida, e a larga escala que a hibridização tem atingido na frota japonesa impõe um desafio no tocante à manutenção e ao descarte de componentes como as baterias tracionárias ao final da vida útil operacional, e assim alguns projetos desenvolvidos fora das indústrias automobilísticas mais tradicionais podem vir a se mostrar mais adequados tanto à realidade dos mercados emergentes quanto dos subdesenvolvidos. No caso específico de alguns carros fabricados na China, onde ainda predomina entre os fabricantes locais o costume de copiar motores antigos da Mitsubishi, Toyota e Isuzu nem sempre com o devido licenciamento, há de se levar em consideração eventuais restrições à exportação a alguns mercados que levam o respeito à propriedade intelectual mais a sério.

Mesmo a questão ambiental, que em alguns momentos parecia dificultar exponencialmente o atendimento a normas de emissões cada vez mais rigorosas sem acarretar prejuízos tanto ao desempenho e à economia de combustível quanto à durabilidade, acaba por proporcionar situações antes consideradas praticamente impossíveis mas que reforçam tanto a viabilidade futura do ciclo Diesel em diversos cenários operacionais quanto da incorporação de tecnologias fornecidas pelos outsiders. Por exemplo, quem poderia supor que a Cummins, notabilizada por nunca ter oferecido um motor 2-tempos como resultado da decepção do fundador Clessie Cummins com um protótipo danificado durante uma corrida, iria algum dia desafiar a tradição e estabelecer um convênio com a Achates Power visando exatamente o desenvolvimento de um motor Diesel 2-tempos a ser inicialmente destinado ao uso em viaturas militares? Também não é possível ignorar a eficiência térmica superior inerente ao ciclo Diesel em comparação à ignição por faísca, sendo portanto um importante aliado na promoção de uma utilização mais racional de recursos energéticos e ainda oferecendo uma boa relação custo/benefício diante de alguns problemas inerentes aos sistemas híbridos como o maior gasto de energia aplicada aos processos produtivos e a utilização mais intensa de alguns minerais destinados à fabricação de ímãs para os motores elétricos e de compostos químicos presentes nas baterias.

É importante levar em consideração os efeitos de um maior rigor em normas de emissões que vem sendo implementadas em aplicações que até pouco tempo atrás sofriam menos restrições nesse âmbito, como equipamentos de construção e manejo de materiais, que eventualmente possam ter o desempenho e a operacionalidade afetados de forma mais prejudicial com alguns dos métodos de controle de emissões aplicados pela indústria automobilística. Tomando como referência alguns equipamentos do tipo skid-steer, para os quais não é incomum que a marca BobCat seja usada incorretamente como um sinônimo, as dimensões compactas tornam indispensável que o conjunto motriz e respectivos periféricos também não sejam demasiadamente volumosos ou pesados, e nesse sentido fica evidente uma oportunidade para a aplicação de algumas tecnologias que eventualmente o setor automobilístico ainda venha tratando com descaso enquanto se vê dependente de métodos um tanto problemáticos como o SCR por pura teimosia em desprezar soluções mais práticas e eficientes simplesmente por serem oferecidas por outsiders. Ou alguém em sã consciência ficaria satisfeito em ter que atrasar um serviço para fazer a "regeneração" de um filtro de material particulado (DPF) entupido, por exemplo?





Enquanto os sistemas híbridos como o usado no Toyota Prius são frequentemente alardeados como uma "salvação" para a ignição por faísca no médio a longo prazo, levando até a uma certa acomodação por parte de alguns grupos que rejeitam algumas soluções com uma relação custo/benefício mais favorável ao usuário final apenas por terem sido propostas por outsiders, ainda há oportunidades para integrar aperfeiçoamentos desenvolvidos de forma independente em motores Diesel sem uma dependência tão forte por uma iniciativa da indústria automobilística. Portanto, não seria de se duvidar que aplicações estacionárias/industriais, como grupos geradores, comprovem a viabilidade e eficácia de tais desenvolvimentos antes que finalmente vençam resistências no tocante ao uso veicular. Enfim, por mais que surjam desafios cada vez mais críticos principalmente com relação a normas ambientais e metas de incremento na eficiência energética, a cultura que se formou em torno dos motores Diesel ainda os credencia a um futuro promissor enquanto a ignição por faísca corre o risco de perder competitividade em função de estratégias de mercado um tanto medíocres.

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Biodiesel e uso direto de óleos vegetais: por uma questão de soberania nacional

Em meio a tantos desdobramentos da operação Lava-Jato e outras ações que expuseram o rombo da Petrobras após tanto tempo de manipulação dos preços da gasolina e do óleo diesel convencional para fins de mascarar a inflação durante a ditadura lulopetista que se arrastou de 2003 a 2016, uma das medidas adotadas pelo governo interino de Michel Temer foi a indexação dos preços dos combustíveis às cotações internacionais do petróleo. Tal medida, no entanto, nem sempre chega ao consumidor em momentos de queda do preço do petróleo bruto e derivados, enquanto os aumentos costumam ter um peso maior nos preços praticados pelas distribuidoras. Mas cabe relembrar a forte dependência brasileira por petróleo e derivados importados, e portanto a volatilidade na tomada de decisões pelo cartel da OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo - também conhecida no exterior como OPEC, "Organization of Petroleum Exporter Countries) acaba pondo em risco qualquer planejamento a longo prazo.

Após os últimos 2 anos nos quais a máfia islamo-socialista da OPEP esteve praticando dumping para combater o crescimento da influência dos Estados Unidos e da Rússia no mercado internacional de petróleo e gás natural, o grupo liderado pela Arábia Saudita anunciou no final do mês passado um corte na produção visando aumentar os preços do óleo bruto com o intuito de permitir às ditaduras socialistas da Venezuela e de Angola uma oportunidade para recompor caixa. Tal articulação leva alguns consumidores mais influenciáveis a terem subitamente reacendido um interesse por automóveis híbridos ou por combustíveis alternativos como o etanol e o gás natural, que nem sempre tem a competitividade efetivamente assegurada diante de eventuais diminuições futuras do preço da gasolina como pode ser observado em mercados internacionais, mas não restam dúvidas quanto à urgência na busca por alternativas sustentáveis a longo prazo para atender às necessidades do transporte comercial e outras aplicações utilitárias que permanecem fortemente dependentes do óleo diesel convencional. Considerando ainda a importância do setor agropecuário na economia brasileira, seria de se esperar que o biodiesel e em alguns casos também o uso direto de óleos vegetais como combustível veicular despontassem literalmente como a salvação da lavoura e tivessem por extensão uma maior aplicação no transporte comercial, apesar da falta de apoio efetivo em âmbito político levar a um eventual descrédito dessas soluções junto a potenciais usuários.

Embora predomine o uso do óleo de soja na produção brasileira de biodiesel, o que viria a manter uma competitividade maior nas regiões Centro-Oeste e Sul e impor desafios logísticos principalmente no Norte e Nordeste, há outras matérias-primas adequadas a diferentes realidades regionais que permitem não apenas assegurar um suprimento mais estável ao longo do território nacional como também uma maior estabilidade nos preços tendo em vista que uma maior diversificação tenderia a evitar a dependência por estoques reguladores durante a entressafra da soja e um menor impacto sobre o custo e disponibilidade de cultivares alimentícios. Restariam algumas dúvidas quanto ao custo e disponibilidade do metanol a ser usado como reagente no processo de transesterificação que dá origem ao biodiesel, mas também é possível diminuir a dependência pelo metanol sintetizado a partir do gás natural quando recordamos que uma fermentação mais prolongada durante tentativas de produção clandestina de uma bebida alcoólica feita a partir de restos de alimentos conhecida como "Maria Louca" muito comum entre presidiários e sem-tetos induz à formação do metanol. Diga-se de passagem, enquanto a produção do etanol a partir da cana de açúcar é frequentemente apontada como um motivo de orgulho nacional por apresentar um saldo energético superior ao método adotado nos Estados Unidos que faz uso do milho como matéria-prima, a Finlândia tem recorrido com sucesso a resíduos da indústria alimentícia para a produção do biocombustível em escala comercial sem afetar de forma significativa o uso de terras agricultáveis nem demandar uma eventual expansão de fronteiras agrícolas para o cultivo de commodities energéticas.

Logo num país que se destaca na produção de proteína animal como vem sendo o caso do Brasil, tanto com a carne bovina quanto consolidando a posição de grande exportador de carnes suína e de aves, soa um tanto incoerente que a participação de gorduras corporais residuais do abate e processamento das carnes não tenha ainda uma participação tão expressiva na renovação da matriz energética dos transportes no Brasil. Diversas restrições ao uso de subprodutos de origem animal na composição de rações pecuárias e avícolas são implementadas em alguns mercados de exportação atendidos por abatedouros e frigoríficos brasileiros, tanto por motivações sanitárias quanto culturais ou religiosas, de modo que a destinação à produção de biodiesel se mostra viável para recuperar algum valor econômico de gorduras viscerais podendo beneficiar até pequenos produtores rurais como aconteceu quando a cooperativa agroindustrial paranaense Coasul passou a fornecer gordura de frango, com valor comercial menor que o do sebo bovino, para a produção de biodiesel pela Petrobras Biocombustível. A viscosidade normalmente mais elevada nas gorduras de origem animal em comparação aos óleos vegetais acabaria por inviabilizar o uso direto como combustível, excetuando óleos de peixes.

Não se pode ignorar, porém, eventuais incompatibilidades entre alguns dispositivos de controle de emissões tanto com o biodiesel quanto com óleos vegetais brutos. Por mais que a frota de caminhões ainda tenha uma idade média avançada e portanto muitos modelos antigos ainda em circulação permaneçam enquadrados em normas de emissões menos restritivas, bem como alguns segmentos como o agrícola, o náutico e o estacionário/industrial sigam um tanto defasados no tocante a esse tipo de regulações, dispositivos como o EGR que promove a recirculação de uma parte do volume de gases de escape para a admissão e o filtro de material particulado (DPF) tem apresentado problemas em função de variações nas especificações dos combustíveis a serem usados. Nesse sentido, biocombustíveis avançados como o óleo diesel sintético refinado a partir de óleos vegetais e gorduras animais como a empresa americana Propel Fuels e a finlandesa Neste Oil já estão desenvolvendo em escala comercial se mostram competitivos diante do óleo diesel convencional derivado de petróleo, e tendem a apresentar também um melhor desempenho em condições extremas e cargas variáveis, embora o biodiesel e o uso direto de óleos vegetais ainda se mostrem adequados à operação em regimes de rotação constantes em cenários operacionais tão diversos quanto grupos geradores e maquinário agrícola. Os métodos de produção mais rudimentares aplicáveis ao biodiesel e óleos vegetais brutos também tornam o custo para implementação e por conseguinte o retorno do investimento mais favoráveis à auto-suficiência energética do produtor rural.

À primeira vista, pode parecer mais fácil apontar o gás natural e o etanol como eventuais substitutivos para o óleo diesel convencional, de modo que a operação em rotas internacionais entre o Brasil e países fronteiriços com uma clara preferência pelo gás natural como a Argentina, a Bolívia e a Colômbia não fosse prejudicada pela perseverança brasileira diante do etanol. Embora não deixem de ter alguma aplicabilidade, principalmente em operações regionais de curta distância e também através de injeção suplementar para reduzir as emissões e o consumo do óleo diesel convencional, a densidade energética menor leva a eventuais prejuízos à capacidade de carga tanto em peso quanto em volume devido ao espaço que seria comprometido pela necessidade de contar com uma maior quantidade de combustível a bordo. Também seria incoerente ignorar a eficiência energética inferior nos motores de ignição por faísca que são necessários para operar exclusivamente com gás natural, bem como os maiores desafios no âmbito do controle de emissões que a adoção da injeção direta nas gerações mais recentes dos motores de ignição por faísca vem trazendo e colocando-os mais próximos da crítica que se faz ao Diesel não apenas na formação de óxidos de nitrogênio mas, surpreendentemente, também com relação a material particulado.

Enfim, um país que ainda tem na agropecuária e agroindústria uma das principais forças econômicas, como é o caso do Brasil, teria condições de fomentar uma maior participação da agroenergia numa substituição ao óleo diesel convencional derivado de petróleo, o que viria a levar a uma menor dependência por recursos energéticos provenientes principalmente de ditaduras e regiões conflagradas. Por uma questão de defesa da soberania nacional diante da máfia da OPEP, que já adotou uma tática semelhante na década de '70 para manter a influência política após a derrota de uma coalizão de países islamizados que tentaram bater de frente com Israel na Guerra do Yom Kippur, é fundamental que o biodiesel e o uso direto de óleos vegetais naturais como combustível alternativo sejam tratados com a devida seriedade para assegurar custos competitivos e com uma certa estabilidade na oferta de combustíveis destinados tanto à atividade agropastoril quanto ao transporte pesado.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

PLS 430/2016: uma tentativa de tapar o sol com a peneira

Já não é de hoje que o Congresso Nacional está criando cortinas de fumaça que não auxiliam em nada na resolução dos problemas do país, mas às vezes alguns deputados e senadores aparecem com umas idéias tão absurdas que não apenas mascaram mas também podem agravar algumas situações. Um caso a se destacar é o Projeto de Lei do Senado nº 430 de 2016, da autoria de Jorge Viana (PT-AC). O petista do Acre propõe que refrigerantes e outras bebidas açucaradas em geral, nacionais ou importadas, sejam taxadas em 20%. Por mais que os alegados objetivos de reduzir o consumo de açúcar para promover uma diminuição dos índices de diabetes, obesidade e cárie dentária tenham algum fundamento, a proposição é mal-formulada e soa mais como uma represália ao setor sucroenergético pelo posição de enfrentamento adotada diante da ditadura Dilma Roussef.

Num primeiro momento, parece fazer algum sentido não apenas no âmbito da redução do consumo de açúcar contido em bebidas industrializadas mas também por ao menos teoricamente liberar uma maior quantidade de cana para a produção de etanol, embora muitos outros aspectos aparentemente sejam ignorados pela proposta. O atual momento de crise tem levado a um baixo índice de renovação dos canaviais, com impacto sobre a produtividade, e a indústria canavieira ficaria menos incentivada a investir e manter tantos empregos diretos e indiretos, embora pudesse ser uma boa oportunidade para expandir as pesquisas com a cana-óleo que pode ser destinada à produção de biodiesel. Naturalmente, há outras possibilidades para manter a rentabilidade com variedades de cana mais tradicionais além do uso do etanol como combustível, desde um maior aproveitamento do bagaço para a produção do adoçante conhecido como sucralose ou outras finalidades industriais como a fabricação de papel até a produção de bioplásticos como o "eteno verde" que a Braskem sintetiza a partir da desidratação de etanol, mas são iniciativas um tanto avançadas que se mostram mais adequadas à realidade de grandes indústrias e contrastam com a baixa tecnologia que caracterizou por tanto tempo o cultivo da cana no país e ainda se reflete na produção artesanal de cachaça, rapadura e açúcar mascavo em propriedades menores.

Em meio à carga tributária brasileira que beira a obscenidade, Jorge Viana chegou a declarar à imprensa que a proposta não seria "mais um imposto" e sim uma "Cide dos refrigerantes" e que as verbas iriam diretamente para o Fundo Nacional de Saúde. Ora, a quem ele tenta enganar quando diz que a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico não é um imposto? Tal declaração é uma verdadeira afronta à população brasileira, espoliada por politicagens tão sujas quanto o destino que é dado a uma parte considerável do que é arrecadado entre taxas e impostos no nosso país. Não apenas nos latifúndios e grandes usinas de São Paulo e Alagoas, o impacto de mais um imposto com uma alíquota tão elevada seria devastador até em comunidades ribeirinhas da Amazônia cuja principal fonte de renda para alguns habitantes é o açúcar mascavo produzido de forma artesanal. Na cidade de Eirunepé, maior produtora de açúcar mascavo do país e localizada a 1160km de Manaus já na divisa do Amazonas com o Acre, por exemplo, parte da produção de pequenos agricultores é adquirida pela multinacional The Coca-Cola Company e usada na composição de concentrados fabricados em Manaus e distribuídos entre todas as engarrafadoras de Coca-Cola no Brasil e também em outros países tão próximos quanto o Uruguai ou distantes como as Filipinas. É portanto visível a contradição do petista Jorge Viana, cujo partido já alegou em alguns momentos defender a "agricultura familiar" mas dá um contundente golpe contra pequenos produtores que aparentemente viriam a enfrentar uma maior dificuldade para escoar a produção.

Vale lembrar ainda a possibilidade de substituir o açúcar por outros edulcorantes com um teor de carboidratos igualmente elevado como os xaropes de glicose de milho (conhecidos no Brasil pela designação genérica "mel Karo" numa referência à marca mais conhecida desse tipo de produto no país, embora a versão nacional atualmente tenha uma maior concentração de sacarose proveniente da cana-de-açúcar), já amplamente usados na produção de refrigerantes e outras bebidas no exterior ao menos desde a década de '70. Portanto, antes de cogitar a incidência de um novo imposto sobre refrigerantes e outras bebidas, seria muito mais coerente sob a questão da saúde pública tratar da quantidade do açúcar em uma infinidade de alimentos industrializados que tem uma quantidade excessiva do ingrediente adicionada no intuito de torná-los hiperosmóticos e por conseguinte prolongar os períodos máximos de estocagem (shelf life), da mesma forma que vem sendo feita com relação aos teores de sódio e gorduras.

Por mais que uma diversificação da produção agrícola brasileira e uma menor dependência pela cana em algumas regiões seja desejável e venha a abrir espaço para o fortalecimento da segurança alimentar integrado ao desenvolvimento de biocombustíveis mais eficientes que o etanol, o inferno está cheio de boas intenções. Antes de formular uma proposição tão medíocre, seria melhor que Jorge Viana procurasse conhecer a realidade do setor agropecuário. Enfim, num país onde muita verba da saúde foi roubada pelo PT, o PLS 430/2016 é só mais uma daquelas imbecilidades que evidenciam a incoerência da esquerda, aquela mesma que alega lutar contra a "gordofobia" mas não perde a oportunidade de dar mais uma mordida no bolso do cidadão agora sob o falso pretexto de combater a obesidade e outras doenças associadas ao consumo excessivo de açúcar.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Uma reflexão sobre a Coréia do Sul e o Diesel

Já não é de hoje que a Coréia do Sul deixou de ser encarada como motivo de chacota pela qualidade dos carros que produz para ser alçada à posição de um player respeitado em mercados de exportação, com modelos como o Hyundai Accent marcando presença tanto em mercados com um volume de vendas relativamente baixo como o Uruguai quanto em outros mais movimentados. Em que pesem um esforço que remonta aos maciços investimentos em educação logo após o fim da Guerra da Coréia e as políticas que fomentaram o desenvolvimento de indústrias automobilísticas que não se limitam mais a replicar projetos estrangeiros, não seria de todo equivocado apontar uma maior receptividade ao uso de motores Diesel em veículos leves no próprio mercado interno sul-coreano a partir de 2004 como um dos motivos para fabricantes como a Hyundai se tornarem um incômodo até para os japoneses que já tinham uma presença mais consolidada nos Estados Unidos e na Europa.

Por mais que as principais referências quando se mencionam veículos sul-coreanos com motor Diesel no mercado brasileiro ainda sejam utilitários com uma concepção mais antiga como a 1ª geração da Kia Sportage e a Hyundai H-100, que ainda seguiam mais fielmente a velha escola japonesa com destaque para o predomínio da injeção indireta nas aplicações leves, muitas mudanças aconteceram desde a década de '90. De certa forma, hoje não seria mais tão apurado reputar Kia e Hyundai como meros puxadinhos da Mazda e da Mitsubishi. E apesar da proximidade geográfica favorecer uma continuidade do intercâmbio tecnológico com o Japão, a busca por espaço no mercado europeu que ainda tem uma participação expressiva do Diesel motiva uma maior sofisticação para garantir a competitividade. Ainda que possa parecer uma opinião um tanto "racista", me parece que o foco em consolidar a posição do país como grande exportador de veículos levou a Coréia do Sul a "branquear" tanto a engenharia quanto as preferências do mercado local.

Um maior interesse pelos sport-utilities também influenciou a popularidade dos motores Diesel no mercado sul-coreano. Embora modelos como o Kia Sorento acabem tendo uma proposta que ao menos na teoria deva agradar mais ao público dos Estados Unidos, e por lá o Diesel ainda seja um tanto negligenciado principalmente por uma cultura automotiva que sempre valorizou motores de ignição por faísca com alta cilindrada e aspiração natural mas também pelas diferenças entre normas de emissões, em outros países as vantagens inerentes aos motores turbodiesel modernos levaram a oferta de motores a gasolina em caminhonetes a se tornar um tanto marginalizada ou mais restrita a modelos com uma proposta mais focada no luxo que em capacidades de carga ou aptidão off-road. Nesse contexto, pode-se dizer que a maior afinidade com a engenharia européia também podia ser exemplificado em modelos como o exótico Ssangyong Korando da geração produzida entre 1996 e 2006, cujos poucos exemplares remanescentes no Brasil foram equipados de fábrica com o motor Mercedes-Benz OM602 produzido sob licença.

A mesma influência européia pode ser observada também em modelos produzidos por fabricantes ocidentais, como a Ford, que na Coréia do Sul atualmente oferece alguns modelos como o Focus e o Fusion (lá conhecido como Mondeo) somente com um motor turbodiesel já homologado nas normas Euro-6. É até previsível que o alto grau de protecionismo no mercado automotivo sul-coreano torne mais justificável entre os importados a prevalência de modelos com um maior valor agregado, o que acaba favorecendo o Diesel com um volume de 70% de todos os carros importados vendidos na Coréia do Sul contando com esse tipo de motorização. O consumo mais contido em comparação a um similar movido a gasolina também merece destaque, principalmente ao salientarmos que a Coréia do Sul ainda permanece em estado de guerra com a Coréia do Norte e eventualmente um confronto militar poderia colocar em risco o fornecimento regular de combustíveis. A adaptabilidade do ciclo Diesel a combustíveis alternativos até tenderia a amenizar esse problema, apesar de existirem algumas incompatibilidades entre a atual geração de dispositivos de controle de emissões e biocombustíveis mais antigos como o biodiesel e o uso direto de óleos vegetais.

Como seria de se esperar, ao contrário de China e Japão onde a venda de automóveis com motorização Diesel é inexpressiva, no ano passado a Coréia do Sul também se viu afetada pelo escândalo de emissões da Volkswagen, forçando a uma suspensão da comercialização de modelos como o Tiguan que mesmo assim permaneceu como o importado mais vendido no mercado sul-coreano no acumulado de 2015. Além das medidas administrativas aplicadas pelo ministério do meio-ambiente e de uma multa de 17,8 bilhões de wons (equivalente a 16 milhões de dólares), a Coréia do Sul também chegou a ser o primeiro país a registrar a emissão de ao menos um mandado de prisão contra um executivo da subsidiária local da Volkswagen. Outras empresas como a Nissan também enfrentaram medidas um tanto enérgicas por parte das autoridades sul-coreanas, e a questão das emissões acabou por ganhar proporções de uma batalha judicial com importadores contestando as multas e ordens para suspensão da venda de certos modelos. Considerando que até alguns produtos do conglomerado Hyundai/Kia como a 4ª geração do Kia Sportage encontram-se sob suspeita de fraude na certificação de emissões, também começam a surgir suspeitas em torno de uma desproporcionalidade na aplicação de penalidades à concorrência.

A bem da verdade, o governo sul-coreano está cada vez mais rigoroso quanto às emissões, inclusive com um plano para restringir a partir de 2017 a circulação de utilitários com motor Diesel e peso superior a 2,5 toneladas e ano de fabricação anterior a 2005 em Seul, com a zona de restrição a ser expandida para Incheon e outras 17 cidades da província de Gyeonggi em 2018 até chegar a todas as regiões metropolitanas em 2020, no intuito de diminuir principalmente as emissões de óxidos de nitrogênio (NOx) e material particulado fino. Ainda que seja apontada a possibilidade de adaptar dispositivos de controle de emissões em caminhões e ônibus antigos, ou mesmo substituir os motores originais por outros mais modernos e "limpos", o mais provável é que o sucateamento ou a exportação para países subdesenvolvidos seja o destino reservado a tais veículos. Porém, ainda que sejam tratados hoje como um problema, motores Diesel com uma concepção mais primitiva como os usados no caminhão Kia K3500 e no microônibus Asia Motors AM825 ainda se mostram mais resilientes diante de variações nas especificações de combustíveis e outros insumos, viabilizando a aplicação de combustíveis alternativos que podem atender perfeitamente não apenas ao intuito de diminuir emissões como também a dependência por recursos energéticos importados como o petróleo e o gás natural.

Enfim, mesmo diante de uma aparente virada de mesa a favor dos combustíveis gasosos e sistemas de propulsão híbridos em âmbito mundial, ainda me parece pouco provável que a Coréia do Sul abra mão dos recentes sucessos no desenvolvimento de motores Diesel adequados às características de modelos tão diversos quanto o compacto Kia Rio até utilitários como o Hyundai Porter (comercializado no Brasil como Hyundai HR) que no acumulado de 2016 está figurando como o veículo mais vendido no mercado sul-coreano nesse ano. Até não parece tão improvável que nos próximos anos a indústria automobilística sul-coreana vá ocupando mais espaços deixados pelos japoneses, e talvez até por fabricantes europeus, de modo a consolidar-se não apenas como uma alternativa mais em conta a marcas mais tradicionais mas ser respeitada pelo desenvolvimento de soluções para motores Diesel.