quarta-feira, 13 de novembro de 2024

5 motores turbodiesel que poderiam ser tentadores para adaptar a um Cadillac Escalade de 3ª geração

Tendo feito relativo sucesso através da importação independente para o Brasil, o Cadillac Escalade da 3ª geração produzido entre 2006 (para o ano-modelo 2007) e 2014 dispunha principalmente de motores 6.2 V8 a gasolina ou flex do padrão americano, que usa só 85% de etanol para facilitar a partida a frio com a mistura de 15% de gasolina, bem como uma opção híbrida com motor 6.0 V8 a gasolina que teve a disponibilidade restrita e nunca equipou a versão ESV mais longa. Embora o prestígio da Cadillac e a concepção robusta de um típico utilitário full-size americano tornem a manutenção menos problemática a longo prazo que a de alguns concorrentes europeus, mais frequentemente associados a estereótipos de "resto de rico", com o passar do tempo pode soar tentador substituir o V8 por algum motor turbodiesel. Ao menos 5 opções de motor turbodiesel, que dariam conta de movimentar o modelo com desenvoltura, merecem ser destacadas.
1 - GM LWN: o motor de 2.8L e "só" 4 cilindros pode parecer destoar da proposta de um modelo de luxo, além do desempenho ficar equiparável no máximo a motores 5.3 V8 que chegaram a ser usados em outros utilitários derivados do mesmo projeto que originou a 3ª geração do Cadillac Escalade, mas ser um motor produzido no Brasil mesmo após ser descontinuado nos Estados Unidos e na Tailândia é algo a se considerar quanto à disponibilidade de peças de reposição. Também seria até possível recorrer a remapeamentos para alcançar um desempenho mais vigoroso;

2 - Cummins ISF3.8: outro motor que pode ser favorecido pela facilidade de reposição de peças, tanto no Brasil quanto no exterior. Tem uma configuração mais rústica, com comando de válvulas no bloco tal qual os V8 originais do modelo, e naturalmente agradaria a quem tenha um perfil essencialmente conservador. Mesmo que a Cummins tenha até oferecido o motor ISF2.8 nos Estados Unidos e Canadá como uma alternativa para o mercado de reposição, rebatizado R2.8 e voltado a concorrer com motores V8 small-block a gasolina, eventualmente o 3.8 seja mais recomendável pela maior disponibilidade de torque em baixa rotação e por permanecer em uso em caminhões como as versões maiores da linha Volkswagen Delivery cujo peso bruto total supera com folga o de um Cadillac Escalade. Seria o caso até de considerar uma eventual preservação da capacidade de reboque após o repotenciamento com esse motor;

3 - Perkins 1104: um motor improvável, mas que poderia ser tentador adaptar. Por ter versões com injeção common-rail e gerenciamento totalmente eletrônico, a princípio pudesse ser mais fácil integrar aos controles de tração e estabilidade do veículo original, com a vantagem da robustez do motor a ser adaptado;

4 - MWM 4.12 TCE Acteon: a princípio seria melhor para exemplares anteriores ao ano-modelo 2012 porque estariam abrangidos pela norma de emissões Euro-3, que dispensa o sistema SCR usado em versões Euro-5 do mesmo motor. Na prática, pela MWM ser praticamente um equivalente ao que os motores Volkswagen EA827/AP representam no âmbito dos motores de ignição por faísca no tocante a adaptações no Brasil, acabaria sendo uma opção a considerar;

5 - Mercedes-Benz OM-924 LA: com certeza seria um dos motores mais prováveis para adaptações em modelos na mesma faixa de tamanho de um Cadillac Escalade à medida que sejam alçados à condição de "resto de rico", tendo em vista a disponibilidade desse motor pelo uso em caminhões e ônibus que acabaria por facilitar encontrar exemplares em desmanches, e ter boa disponibilidade de peças de reposição. A princípio, novamente vale lembrar que as versões Euro-3 pela ausência de um filtro de material particulado (DPF) e do SCR facilitariam a instalação.

quinta-feira, 7 de novembro de 2024

5ª geração do Jeep Grand Cherokee: teria a ausência de ao menos uma opção turbodiesel sido realmente acertada?

Modelo que em gerações anteriores marcou época como uma das principais referências no segmento de SUVs, o Jeep Grand Cherokee ao chegar à 5ª geração perdeu a opção por motores turbodiesel que antes era sempre disponibilizada ao menos para atender inicialmente à Europa, e depois ganharia destaque em regiões tão variadas como a Austrália e partes da África e da América Latina. Tendo chegado ao Brasil em doses homeopáticas como híbrido plug-in, usando o motor Hurricane a gasolina de 2.0L e apenas 4 cilindros que tanto contrasta com os grandes motores de 6 a 8 cilindros que alçaram gerações anteriores a uma condição icônica, já fica um tanto óbvio comparar o peso e volume ocupados por uma bateria no sistema híbrido diante de toda a parafernália de controle de emissões associada aos motores turbodiesel das gerações mais recentes, e portanto eventualmente uma parte do público mais cética com relação aos elétricos e que acabe fazendo pouco ou nenhum uso da possibilidade de recarregar as baterias por fonte externa talvez pudesse ser bem servido por ao menos uma opção turbodiesel.

Além de eventualmente um módulo de pós-tratamento de gases de escape agrupando o filtro de material particulado (DPF) a um catalisador oxidativo (DOC - Diesel Oxidizing Catalyst) e ao sistema SCR que promove a redução catalítica seletiva dos óxidos de nitrogênio (NOx) através da reação química com o fluido-padrão ARLA-32/AdBlue/ARNOx-32 à base de uréia, considerações referentes à segurança e a especificidades da manutenção de sistemas de alta tensão embarcados em veículos híbridos e elétricos também merecem ser lembradas. Embora o ARLA-32 seja corrosivo, e a complexidade das gerações mais recentes de sistemas de pós-tratamento de emissões em motores turbodiesel e intercorrências com tais componentes já tenham causado dissabores a operadores tanto estritamente profissionais quanto de perfil particular e/ou recreativo, há quem se iluda com alegações que veículos elétricos seriam livres de manutenção e esqueçam a exigência do enquadramento à norma técnica NBR 14039 para oficinas que prestem assistência tanto a modelos elétricos quanto híbridos como o Jeep Grand Cherokee 4xe devido às altas tensões envolvidas. E mesmo considerando que fosse possível incorporar o sistema mild-hybrid já aplicado ao motor Pentastar V6 a gasolina em outros mercados, cuja tensão é bem mais baixa, ainda é conveniente observar como vem sendo ignorada a possibilidade de usar etanol para promover reduções mais significativas de emissões que são apontadas constantemente por defensores de uma eletrificação ao menos em caráter auxiliar, tendo em vista também como a injeção direta usada no motor Hurricane proporcionaria mais facilidade para a partida a frio com o combustível alternativo.

O motor V6 Pentastar de 3.6L ainda ter aspiração natural e injeção sequencial indireta seria ao menos na teoria mais favorável também para eventuais experiências com conversões ao gás natural, e talvez uma parte dos reservatórios do combustível alternativo pudessem ser instaladas sob o assoalho tal qual ocorre com a bateria de um sistema híbrido plug-in que é muito maior comparada à de um mild-hybrid, sem entrar no mérito de como o downsizing nos motores de ignição por faísca tende a ser uma faca de dois gumes ao agregar uma complexidade técnica que já tem induzido uma parte do público generalista a considerá-los inerentemente mais simples que as gerações mais modernas de motores turbodiesel. É um tanto previsível que diferentes regiões vão favorecer abordagens distintas quanto à linha de motores e implementações de sistemas híbridos, cabendo considerar ainda que para fins de isenção do rodízio de placas em São Paulo e medidas similares já implementadas no exterior um mild-hybrid frequentemente já atende, e tecnicamente nada impediria ser associado até a um motor turbodiesel tão somente visando o mesmo benefício. Enfim, a princípio a ausência de ao menos uma opção turbodiesel na 5ª geração do Jeep Grand Cherokee pode ter sido equivocada.

sexta-feira, 1 de novembro de 2024

Controle de emissões ou integração da eletrônica embarcada: qual seria o maior desafio para o repotenciamento em um veículo moderno?

Embora seja constantemente apontada a observância das normas de emissões como principal empecilho à instalação de um motor turbodiesel em veículos modernos, desconsiderando como outras normas mais específicas para cada região interfiram na disponibilidade do motor mais adequado para tal empreitada, a complexidade técnica inerente a outros sistemas embarcados que necessitam de alguma comunicação com o gerenciamento eletrônico do motor também é algo a ser levado em consideração. Tomando como referência um Ford Expedition da 4ª geração, oferecido apenas com motor EcoBoost 3.5 V6 twin-turbo a gasolina e associado a um câmbio automático de 10 marchas, até seria de se esperar que uma parte do público-alvo do modelo pudesse ter a preferência mesmo por alguns motores a gasolina mais austeros e até facilmente adaptáveis a combustíveis alternativos como o etanol ou o gás natural por exemplo, mas a eventual adaptabilidade de motores turbodiesel além do 3.0 V6 twin-turbo que ainda equipa a F-150 nas Filipinas também fomenta especulações quanto à viabilidade de tais modificações. Motores como o Cummins F3.8 Euro-6 por exemplo, apesar de ainda haver necessidade de um local para instalação do reservatório do fluido-padrão AdBlue/ARLA-32/ARNOx-32/DEF, sendo equipados com um módulo de pós-tratamento dos gases de escape já incorporando os catalisadores e o filtro de material particulado (DPF) que ocupa praticamente o mesmo volume que um sistema de catalisadores e filtro de material particulado (quando aplicável) destinado a motores de ignição por faísca com capacidades operacionais equivalentes ou comparáveis, já levam a crer que esse aspecto seja menos problemático que alardeiam os ecoterroristas de plantão...

No caso específico do Ford Expedition da 4ª geração, mesmo que a discrepância nas faixas de potência e torque entre o motor EcoBoost original e alguma versão dos motores Cummins F2.8 ou F3.8 capaz de atender à efetiva necessidade de uma parte considerável do público-alvo dos SUVs full-size possa fazer parecer que a instalação de um motor turbodiesel conceitualmente mais rústico com só 4 cilindros seria injustificável até em função de como o recrudescimento das normas de emissões exigiu implementações mais complexas e portanto onerosas nos sistemas de pós-tratamento dos gases de escape especialmente para os motores turbodiesel, eventualmente algumas condições de uso mais específicas ainda justificam considerar a substituição do motor original. Desde um fazendeiro que disponha de instalações próprias de reabastecimento para atender ao maquinário agrícola e queira aproveitá-la também com um veículo de uso familiar ou recreativo, até aplicações mais específicas para como em grupamentos militares para os quais o Diesel já é padrão nas frotas de países alinhados à OTAN ou em alguns batalhões de polícia especializados para os quais um maior alcance em função do menor consumo de combustível seria uma inegável vantagem em operações longe da base à qual o veíclo esteja vinculado, convem ainda observar eventuais diferenças na implementação dos dispositivos de controle de emissões. Enquanto operadores com um perfil mais generalista e até alguns mais especializados permanecem obrigados a seguir todo o cronograma das regulamentações ambientais, com o eventual risco de danos ao sistema de controle de emissões ou mesmo ao motor caso seja usado um óleo diesel de especificação interior como teores de enxofre acima do especificado, a Cummins declarar ser possível as versões Euro-6 dos motores F2.8 e F3.8 resistirem ao uso de óleo diesel com até 5000ppm de enxofre que a princípio não se encontra mais no Brasil ou a adição de até 20% de biodiesel (B20) acabaria proporcionando uma tranquilidade diante das discrepâncias na qualidade da gasolina em diferentes países que vão desde variações na octanagem até a concentração de etanol a ser adicionado obrigatoriamente que tem sido alvo de críticas quanto a um eventual efeito prejudicial à durabilidade dos sistemas de injeção direta cada vez mais comuns nos motores a gasolina desenvolvidos de acordo com o downsizing quando não for especificada uma versão flex.

Dispositivos como controles eletrônicos de tração e estabilidade sempre vão requerer alguma integração com o gerenciamento eletrônico do motor e dos freios ABS, mesmo que fosse um sistema mais arcaico que incorporasse apenas um governador eletrônico a uma bomba injetora de atuação mecânica, embora sistemas mais complexos como o Pumpe Düse da Bosch ainda amplamente usado pela Mercedes-Benz em motores de caminhões e ônibus ou o common-rail que é atualmente o mais difundido possam servir melhor para tal finalidade devido aos controles eletrônicos mais precisos. É possível fazer a integração do gerenciamento eletrônico do motor a acessórios e dispositivos de segurança originais de veículos aos quais possa ser desejável em algum momento efetuar o repotenciamento com um motor turbodiesel, em que pese haver uma eventual diferença nas linguagens de programação e como inserir os códigos para o motor a ser instalado em substituição ao original fornecer e receber os sinais eletrônicos corretamente e assegurar o correto funcionamento do veículo completo quando substituído o motor original por um de outro fabricante ou ainda de outro modelo do mesmo fabricante do veículo. Enfim, por mais que ocorra uma presença cada vez mais maciça do gerenciamento eletrônico também fora do segmento automotivo e a tecnologia de sistemas de pós-tratamento dos gases de escape seja muito similar ou simplificada em função das diferenças nas regulamentações de acordo a cada aplicação e respectivas faixas de potência, na prática a integração do gerenciamento de um motor turbodiesel à eletrônica embarcada do veículo a ser repotenciado torna-se mais desafiadora, especialmente se o motor a ser adaptado tiver o volume de instalação mais compacto que o original.

quinta-feira, 24 de outubro de 2024

Teria sido Eduardo Barreiros o primeiro dieselhead espanhol?

Pode-se dizer que a Espanha, pelas mais diversas razões, já foi o país mais dieselhead do mundo, e com certeza o trabalho de verdadeiros artistas da mecânica como Eduardo Barreiros foi de suma importância para tal condição. Nascido em Gundiás, província de Orense, comunidade autônoma da Galícia no dia 24 de outubro de 1919, filho de Eduardo Barreiros Nespereira e Luzdivina Rodríguez Ansía, Eduardo Barreiros Rodríguez esteve envolvido desde muito pequeno com o transporte comercial, sendo filho de um proprietário de empresa de ônibus e tendo ajudado tanto na conferência de passageiros e bagagens quanto na manutenção dos veículos, tornando-se suficientemente familiarizado com os fundamentos da mecânica para posteriormente alçar vôos mais arrojados. Convocado para a Guerra Civil Espanhola, e conduzido um ônibus da empresa familiar que havia sido requisitado para o transporte de soldados e de feridos no decorrer do conflito, também teve contato com os caminhões ZIS de origem soviética que na Espanha ficaram conhecidos como Tres Hermanos Comunistas devido ao logotipo da marca no alfabeto cirílico que é usado na língua russa parecerem 3HC no alfabeto romano, experiência que viria a ser base para posteriores experiências com a conversão de motores a gasolina para Diesel antes de dar início à produção de motores próprios.
Daquelas experiências feitas a partir de 1949 com a conversão dos motores de caminhões ZIS, começou uma trajetória de sucesso com motores Barreiros que superaram as restrições burocráticas do Instituto Nacional de Indústria (INI) durante o governo de Francisco Franco no pós-guerra, ao ponto do motor EB6 ter sido reocnhecido por muitos espanhóis como mais importante para a Espanha que os da estatal ENASA usados nos caminhões Pegaso. E da importação de caminhões poloneses Star que recebiam o motor Barreiros até a fabricação de caminhões Barreiros efetivamente espanhóis, foram desenvolvidos outros tantos motores para aplicações mais leves como automóveis e caminhonetes, mas também com um amplo uso em maquinário especializado e na propulsão de pequenas embarcações, contrariando as crenças que a Espanha seria incapaz de ter produção própria de motores que representavam a excelência da engenharia numa época que a tecnologia era menos avançada que hoje mas o sangue espanhol fervia com o ímpeto de abrir caminhos para o progresso. Embora a transição da organização Barreiros Diesel para Chrysler España entre 1962 e 1969 tenha sido um tanto complicada, pela falta de entendimento dos dirigentes americanos da Chrysler acerca das condições da Espanha daquela época, o duradouro legado de Eduardo Barreiros na história da industrialização espanhola de um modo geral já estava consolidado, embora poucos hoje se dêem conta que aqueles motores "de trator" foram o embrião da enorme fábrica que hoje pertence à Stellantis em Madrid.
Naturalmente as dificuldades técnicas da época, somadas à incidência de impostos sobre os veículos na Europa já ter sido atrelada à cilindrada, podia dificultar a implementação de um motor Diesel a modelos compactos como o Simca 1000, enquanto para um modelo americano que só era compacto para padrões dos Estados Unidos mas era grande em outras regiões como o Dodge Dart acabava caindo como uma luva para diminuir os custos operacionais e atrair a um público para quem a lembrança das dificuldades de um passado conflituoso ainda parecia tão próxima. Mas da austeridade dos compactos europeus para a opulência dos carrões americanos, o esforço de Eduardo Barreiros pavimentou caminhos para abrir o mercado espanhol a uma competitividade que contrastava com os entraves burocráticos impostos pelo INI para proteger a então estatal SEAT que tinha convênios com a Fiat antes da privatização que levou à venda da SEAT para a Volkswagen. E a bem da verdade, a busca pela economia do Diesel promovida por Eduardo Barreiros como uma ferramenta para melhorar a vida em uma Espanha isolada do mundo em meio a conflitos que iam da Guerra Civil Espanhola e passando pela II Guerra Mundial até chegar à Guerra Fria serviu para demonstrar em condições reais de uso as vantagens que o grande público na Europa Ocidental só daria o merecido valor depois das crises do petróleo deflagradas pela derrota de uma coalizão àrabe que desencadeou a Guerra do Yom Kippur contra Israel em 1973.
Um acordo pactuado com a Chrysler enquanto Eduardo Barreiros e os irmãos Valeriano, Graciliano e Celso deixavam a empresa os impediu de trabalhar no setor de mecânica e fabricação de veículos e motores até 1978, quando dedicaram-se a atividades tão diversas quanto a produção de vinhos e o melhoramento genético de gado, passando pela mineração de estanho e pirita e atividades financeiras que causaram prejuízos honrados por Eduardo Barreiros às custas de patrimônio pessoal empenhado para saldar dívidas. Mas assim como aquelas experiências da conversão dos motores de caminhões ZIS para Diesel, reputadas como impossíveis antes que Eduardo Barreiros provasse que os céticos estavam errados, a implementação de uma empresa de consultoria técnica denominada DIMISA (Diésel Motores Industrias S.A.) viria a fazer os caminhos de Eduardo Barreiros se cruzarem com os soviéticos outra vez, com a participação em um concurso internacional para a instalação de uma fábrica de motores em Cuba, auditada pela instituição inglesa Lloyd's Register na qual uma linha de motores modulares entre 6 e 12 cilindros em V de projeto original da então novata DIMISA superou concorrentes da Nissan Diesel e até da Perkins, honrando o legado dos antigos motores Barreiros e motivando a mudança de Eduardo Barreiros para Cuba com o objetivo de supervisionar a implementação da fábrica e a produção dos motores tal qual a Ford fazia com a GAZ na Rússia antes da Guerra Fria e o que a Fiat fez com relação à Avtovaz (Lada). Motores russos então modernos da ZIL, denominação que a ZIS recebeu após a morte de Stalin, também chegaram a ser convertidos durante a estadia de Eduardo Barreiros em Cuba.
Daquele aprendizado empírico dos fundamentos da mecânica automotiva até atrair o interessa da então gigante Chrysler para a Espanha que ainda lutava para se reerguer das beligerâncias da primeira metade do século passado, até falecer no dia 19 de fevereiro de 1992 em Havana já trabalhando no projeto de um motor que seria produzido em Angola, e cujo primeiro protótipo funcional que foi finalizado por seus auxiliares ficou conhecido como El Póstumo, Eduardo Barreiros contribuiu de forma inestimável para apresentar os motores Diesel como uma solução viável para veículos dos mais diversos segmentos. Uma história pouco recordada em meio à demonização que vem sendo promovida contra os motores de combustão interna na atualidade, até mesmo na Espanha que certamente só se reergueu dos escombros da Guerra Civil por iniciativa de Eduardo Barreiros e outros tantos que honraram o sangue espanhol ao apresentarem soluções de excelência mesmo com a precariedade técnica que a engenharia vivenciava em uma época sem tantos recursos tecnológicos à disposição. Enfim, tendo conciliado a parte técnica com uma verdadeira passionalidade que o motivou até o fim da vida, talvez não seja um erro reputar Eduardo Barreiros como o primeiro dieselhead espanhol.

quarta-feira, 16 de outubro de 2024

Ainda haveria espaço para um motor turbodiesel de 3 cilindros entre 2.7L e 3.6L para o mercado de reposição nas pick-ups?

Certamente haverá quem diga que uma "tratorização" das pick-ups ficou para trás, tanto no âmbito das carrocerias de madeira que ainda são adaptadas frequentemente a modelos mais antigos como uma Ford Ranger anterior a 2012 quanto no âmbito dos motores agora que a geração mais recente do modelo usa até um motor com a polêmica correia dentada banhada a óleo nas versões turbodiesel com 4 cilindros, e a presença cada vez mais maciça da eletrônica embarcada em todas as categorias de veículos pode fazer a integração de outros motores aos controles de outros componentes mais difícil para substituir motores originais por outro com um projeto básico radicalmente distinto em alguns aspectos. A regulamentação de emissões em vigor, e eventuais progressões para estágios mais severos, também pode soar como um empecilho para a disponibilização de soluções mais específicas que poderiam atender bem ao mercado de reposição, especialmente à medida que motores mais austeros destinados essencialmente ao trabalho deram lugar a outros que buscavam aproximar-se do desempenho das congêneres movidas a gasolina. E a bem da verdade, assim como havia quem acreditasse que tão somente substituir um motor Diesel com 4 cilindros por alguma versão de 3 cilindros da mesma linha seria útil pela economia de combustível, é oportuno fazer uma analogia com eventuais benefícios que a simplicidade inerente a motores rústicos e mais próximos daquelas premissas que nortearam a preferência de um público estritamente profissional seria capaz de oferecer de médio a longo prazo em comparação ao que vem sendo oferecido.

Naturalmente os públicos de alguns fabricantes possam ser mais refratários quanto à substituição de um motor original por outro, tanto no caso de operadores estritamente profissionais que talvez ainda fossem bem atendidos por um motor "de trator" quanto de particulares que alçaram por exemplo a Toyota Hilux à condição de objeto de desejo, e realmente uma fama de robustez da Toyota somada à grande presença global torna difícil supor que alguém fora de algumas partes da África ou do Oriente Médio onde ainda é especificado o antigo motor 5L-E tenha medo de sofrer com a falta de peças de reposição e assistência técnica para o motor 1GD-FTV atualmente oferecido no Brasil. E entre o projeto do motor 5L-E que até mantém a injeção indireta além da aspiração natural com 3.0L e 4 cilindros ou algum motor "genérico" de 3 cilindros já com injeção direta numa faixa de cilindrada próxima que possa dispor do turbo e até de alguma modalidade de gerenciamento eletrônico, bem como uma integração aos sistemas de controle de emissões aplicados a motores modernos modernos como o EGR e o filtro de material particulado (DPF) ou mesmo o SCR de acordo com as regulamentações de emissões nas diferentes regiões, possivelmente ainda fosse coerente alguns operadores preferirem alguns motores de 3 cilindros nos quais a utilização de materiais menos sofisticados e o comando de válvulas no bloco com acionamento por engrenagens possa amortizar ao menos em parte o custo e a complexidade inererntes a um gerenciamento eletrônico que vá além do governador eletrônico em uma bomba injetora mecânica quanto do DPF ou do SCR. O desempenho que um motor essencialmente agrícola cujos regimes de rotação mais modestos oferece em comparação aos motores que equipam regularmente as caminhonetes modernas pareça um impedimento aos olhos de gestores de grandes frotas que considerem mais vantajoso substituir os veículos à medida que acumulem quilometragem ou tempo de serviço, e destoe das pretensões luxuosas que uma parte do público generalista atribui a uma pick-up de cabine dupla, mas ainda é uma questão de perspectiva.

É possível até fazer uma analogia com os programas de modernização que foram feitos com as viaturas militares antigas entre os anos '70 e '80, como as caminhonetes Dodge Power Wagon que originalmente usavam motores Chrysler Flathead-Six a gasolina e receberam motores Perkins 4-236 com 4 cilindros e aspiração natural, e uma hipotética possibilidade de substituir futuramente o motor 2.0 TDI original de uma Volkswagen Amarok de polícia caso uma ruptura precoce da correia dentada decorrente do uso em condições ambientais severas como excesso de poeira durante operaçoes especiais, embora a princípio a regulamentação de emissões da qual uma viatura operacional militar costuma ser isenta e a necessidade de uma correta integração aos demais sistemas eletrônicos originais acarretem um grau de dificuldade e mais burocracia para homologação das modificações junto aos órgãos de trânsito. Se por um lado o uso de câmbios manuais ainda ser frequente em veículos de frotas no Brasil também nos segmentos militar e de polícia facilitar adaptações de motores diferentes do original, mesmo que a depender da capacidade do câmbio original suportar diferentes calibrações de potência e torque ou ter relações de marcha mais adequadas para cobrir a discrepância nas faixas de rotação entre os motores a serem comparados. Vale considerar também como a diferença entre a cilindrada e os regimes de rotação de um motor Chrysler Flathead-Six e os Diesel usados nos repotenciamentos seria proporcionalmente menor em comparação a um motor Volkswagen 2.0 TDI de Amarok e por exemplo algumas versões do Perkins 1103 de 3.3L e 3 cilindros, que acabaria sendo especialmente tentador para adaptar a uma Amarok quando forem a leilão durante uma renovação de frota caso seja possível comprovar a aptidão para atendimento às normas de emissões para veículos, à medida que também já são usados até em máquinas agrícolas e equipamentos estacionários/industriais alguns dispositivos de controle de emissões como catalisadores, DPF e SCR.

Foi-se o tempo que parecia "normal" alguém substituir um motor MWM da série 229 que em versões de 3.9L e 4 cilindros chegou a equipar as Ford F-1000 das gerações Bumpside e Bricknose no Brasil por uma versão de 3 cilindros e 2.9L crendo que tal medida já fosse suficiente na expectativa de reduzir o consumo de combustível em qualquer condição operacional, embora a simplicidade de uma época que gerenciamento eletrônico em motores Diesel veiculares parecia ficção científica e a presença do turbo ainda era menor destoe dos atuais cenários regulatórios que incluem a necessidade de integrar o sistema de controle do motor a dispositivos de segurança como controles de tração e estabilidade. A rusticidade de motores modulares provenientes de um único projeto básico poderia parecer invalidar propostas para substituir motores modernos com 4 cilindros e desenvolvidos seguindo as premissas do downsizing por um essencialmente mais rústico com 3 cilindros e eventualmente a cilindrada 55% mais alta visando um desempenho equivalente em condições de uso comuns, mas com fabricantes especializados em motores Diesel como a própria MWM ainda oferecendo motores de concepção modular e essencialmente rústica já incorporando características imprescindíveis aos motores modernos como o gerenciamento eletrônico e compatibilidade a sistemas de controle de emissões pode ser tentadora aos olhos de quem alega que "só caminhonete antiga que presta". Enfim, mesmo que a integração entre os sistemas eletrônicos de um motor substitutivo e os de alguns componentes e sistemas originais de um veículo moderno proporcione um desafio inexistente à época da F-1000, certamente ainda haveria espaço para um motor turbodiesel de 3 cilindros numa faixa entre 2.7L e 3.6L especificamente voltado ao mercado de reposição.

sexta-feira, 11 de outubro de 2024

5 aplicações para as quais a proposta de um motor baseado nos desenvolvimentos do LiquidPiston XTS-210 poderia cair como uma luva

Com um conceito que une a alta densidade de potência dos motores Wankel a melhorias no tocante à durabilidade dos componentes mais críticos que são os retentores apicais (apex seals), de função até comparável aos anéis de segmento aplicados aos pistões de motores convencionais, a LiquidPiston tem uma proposta que parece muito "milagrosa" à primeira vista mas faz bastante sentido ao ser analisada com atenção. Com a validação de provas de conceito no âmbito de motores 4-tempos com ignição por faísca e também no ciclo Diesel tanto 4-tempos quanto mais recentemente 2-tempos, e tendo atraído um interesse do Departamento de Defesa dos Estados Unidos para aplicações militares, em especial o projeto voltado aos motores Diesel 2-tempos que pode ser particularmente útil para a propulsão de aeronaves controladas remotamente (VANTs - veículos aéreos não tripulados/UAVs - unmanned aerial vehicles) conhecidas popularmente como drones, no fim das contas poderiam atender bem ainda a outras utilizações muito mais próximas da realidade cotidiana da maioria do público generalista tanto no exterior quanto até no Brasil. Ao menos 5 bons exemplos podem ser elencados nesse âmbito, e pelas razões mais diversas desde a grande adaptabilidade ao uso de combustíveis alternativos passando por especificidades operacionais... 

1 - viaturas de polícia: tomando a Toyota como referência pelo uso de modelos como o Yaris em versão flex e a Hilux que apesar da proporção considerável de exemplares com motor turbodiesel no uso da Brigada Militar do Rio Grande do Sul também aparecem de vez em quando algumas flex, cabe fazer uma comparação tanto pelos níveis de ruído dos motores quanto na agilidade para a partida a frio que pode ser especialmente crucial em algumas condições ambientais severas. Com o desenvolvimento dos motores LiquidPiston sendo aperfeiçoado para uma aplicação com sistemas de propulsão híbridos nos drones, a facilidade para arranque imediato do motor de combustão interna logo após uma parte mais crítica da missão que requeira o uso da propulsão auxiliar elétrica visando diminuir a assinatura térmica e o risco de detecção por radares inimigos acabaria favorecendo a proposta também em viaturas de polícia. No caso de um carro normal que é impactado pelas arbitrárias restrições contra o uso de motores Diesel no Brasil, é possível que um ceticismo quanto a mudanças tão radicais na concepção do motor sejam assimiladas com facilidade, embora para uma caminhonete a leveza inerente ao conceito da LiquidPiston e vantagens como uma operação mais suave e silenciosa tendem a equiparar um eventual motor Diesel a ser baseado na tecnologia da LiquidPiston aos flex convencionais. E pela partida a frio mais fácil, se fosse o caso de persistir com os flex, uma escalabilidade que permite a motores desenvolvidos de acordo com a proposta da LiquidPiston viabilizaria até dar um maior destaque ao álcool/etanol em função de ser possível implementar uma taxa de compressão tão conservadora como 8:1 mais apropriada à ignição por faísca até outras um tanto extremas como 26:1 que foi usada em alguns motores Scania movidos a etanol com aditivo promotor de ignição no ciclo Diesel;

2 - câmaras frigoríficas: o uso de um motor estacionário em regime de rotação constante para acionamento do compressor mesmo em situações que o motor principal do veículo esteja desligado é especialmente convidativo à maior leveza e ao volume físico reduzido de um motor LiquidPiston, considerando até um eventual incremento ainda que discreto à capacidade de carga ou a possibilidade de aproveitar o espaço adicional para instalar um tanque suplementar de combustível para atender ao equipamento de refrigeração. O nível de ruído dos motores estacionários às vezes é alvo de críticas e pode estar sujeito a regulamentações mais estritas em diferentes regiões, de modo que tanto uma vantagem inerente ao projeto da LiquidPiston quanto o espaço mais livre para promover supressão de ruídos com eficiência superior também se revelam promissoras. E apesar de parecer mais improvável que um motor baseado no conceito da LiquidPiston permanecendo com a configuração de rotor único alcançasse o sucesso comercial na propulsão veicular, tomando como um precedente histórico os únicos motores Wankel de ignição por faísca a alcançar certa relevância terem 2 rotores, aplicações como o acionamento de câmaras frigoríficas podem ser mais receptivos a essa configuração;

3 - ambulâncias: deixando um pouco de lado o absurdo que é alguns modelos usados nesse serviço serem impedidos de usar um motor Diesel no Brasil, e certamente o custo e a complexidade inerentes a gerações mais recentes de sistemas de controle de emissões pudessem desencorajar qualquer tentativa de derrubar os entraves burocráticos que impedem uma Fiat Strada ter motor Diesel, a suavidade que costuma caracterizar motores rotativos já poderia soar muito desejável em ambulâncias. E assim como motores Wankel se destacam pela elevada potência específica e o tamanho compacto, como o Mazda 13B que dentro da mesma faixa de cilindrada dos motores 1.4 Fire e 1.3 FireFly usados na atual geração da Fiat Strada costuma ser tratado como equivalente a motores convencionais do dobro ou triplo da cilindrada para fins de homologação em categorias de competições de automobilismo, a LiquidPiston declarou em diversas circunstâncias que as provas de conceito apresentadas pela empresa podem equivaler a motores de cilindrada entre 3 e 5 vezes mais alta, podendo servir de pretexto para instalar um motor com desempenho mais vigoroso ou, caso sejam derrubadas as restrições ao uso de motores Diesel baseadas nas capacidades de carga e passageiros ou tração, liberar espaço a sistemas de controle de emissões como um filtro de material particulado (DPF) e até mesmo o tanque de AdBlue/ARLA-32 sem interferências com a acomodação de equipamentos médicos ou outros suprimentos especiais para a função;

4 - embarcações: tanto um bote semi-rígido com motor fora de bordo (mais conhecidos no Brasil como motores de popa) destinado a operações do glorioso GBS (Grupamento de Busca e Salvamento) do Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catarina quanto para uma lancha de lazer, ou indo mais além visando a eventual escalabilidade inerente ao conceito dos motores LiquidPiston que possa atender até mesmo a navios de grande porte, já fica mais fácil justificar tanto pela densidade de potência que seria especialmente útil em um barco para transpor correntezas com maior facilidade e segurança quanto por conta da adaptabilidade a diferentes combustíveis. Vale destacar que, por uma questão de segurança, o uso de combustíveis pesados como o óleo diesel convencional e até o querosene tende a ser mais desejável em embarcações que os combustíveis voláteis como a gasolina, tendo em vista o risco de incêndio;

5 - ônibus: uma menor intrusão do motor no habitáculo, tanto no salão de passageiros em modelos de motor traseiro quanto no cockpit dos de motor dianteiro, em função do porte mais compacto em proporção à potência, já seria muito útil para melhorar o conforto de usuários e operadores. Também facilitaria a acomodação do compressor de um sistema de ar condicionado mais próximo ao motor.

terça-feira, 1 de outubro de 2024

Uma rápida observação sobre sistemas híbridos sendo apontados como "oposição" ao Diesel

Em meio à ascensão que os veículos híbridos tiveram a nível mundial, também em segmentos aos quais é permitido o uso de motores Diesel no Brasil como é o caso de alguns SUVs 4X4, a exemplo do que já ocorre mesmo em regiões historicamente mais receptivas ao Diesel em veículos leves antes de algumas regulamentações passarem a desfavorecê-los. Restrições absurdas que afetaram mais pesadamente aos motores Diesel que os a gasolina para acesso às regiões centrais de algumas grandes metrópoles como Madrid ou Roma, bem como a histeria da União Européia em promover a eletrificação mais impositiva que por uma eventual demanda do público consumidor, acabaram fomentando o surgimento de versões híbridas para modelos como o Jeep Compass, que mesmo com as versões tanto turbodiesel quanto flex movidas a gasolina e etanol sendo produzidas no Brasil também passou a ser importado da Itália o 4xe híbrido plug-in a partir de 2022, enquanto na produção italiana o uso de motores de combustão interna sem qualquer assistência motriz elétrica foi descontinuado para o ano-modelo 2024 com a ascensão dos híbridos, e tanto versões só a gasolina quanto turbodiesel deixaram de ser produzidas para a Europa. As politicagens falsamente ecológicas ou "sustentáveis", que em alguns casos praticamente relegam alguns veículos ainda em plenas condições operacionais ao descarte, ou na melhor das hipóteses à exportação a alguns países da África e da América Latina onde a importação de carros usados é permitida, ignoram a evolução tecnológica já alcançada no âmbito dos motores de combustão interna de modo geral, além do mais à medida que motores a gasolina ou flex mais modernos têm passado a ser equipados também com o filtro de material particulado, à medida que incorporam massivamente a injeção direta e o turbo, mais difundidos anteriormente em motores Diesel, pondo em xeque portanto suposições que o Diesel estaria muito mais inapto a uma integração com qualquer método de assistência motriz elétrica...

A bem da verdade os sistemas híbridos priorizarem a tração elétrica em condições de baixa velocidade e o desligamento do motor de combustão interna sempre que o veículo esteja parado em meio ao trânsito urbano pode ser um inconveniente com relação ao filtro de material particulado, que passaria a requerer uma maior frequência dos ciclos de autolimpeza/regeneração cujas melhores condições para ocorrer são em percursos a velocidade constante e mais habituais no tráfego rodoviário, tendo em vista também que o óleo diesel convencional e substitutivos renováveis como o biodiesel ou o HVO são mais difíceis para vaporizar rapidamente em comparação aos combustíveis voláteis como a gasolina e o etanol ou ainda o gás natural e o gás liquefeito de petróleo (GLP - "gás de cozinha"). Mas assim como há o Jeep Compass 4xe com o motor GSE de 1.3L dotado de turbo e injeção direta associado a um conjunto motor-gerador incorporando as funções do alternador e do motor-de-arranque das versões não-híbridas e também outro motor elétrico junto ao eixo traseiro, de modo que a tração nas 4 rodas funciona somente com o auxílio elétrico, outra abordagem mais modesta com um conjunto motor-gerador acoplado ao virabrequim do motor de combustão interna por correia na mesma posição que se instalaria um alternador convencional e operando a tensões menores também é oferecida para versões de tração somente dianteira na Europa. A possibilidade de dispensar o fluido-padrão AdBlue/ARLA-32/ARNOx-32/DEF usado para reduzir os óxidos de nitrogênio (NOx) pode parecer uma vantagem prática de híbridos em oposição às gerações mais recentes de motores turbodiesel, embora seja equivocado supor que as baterias e outros elementos inerentes aos sistemas híbridos sejam "à próva de burro" quanto à manutenção como alguns motores a gasolina de concepção mais modesta acabam sendo tratados desde quando os motores turbodiesel foram agregando sofisticação, mas apontar os híbridos como "oposição" ao Diesel às vezes é um tiro no pé...

sexta-feira, 27 de setembro de 2024

Como a cultura do motor V8 a gasolina nos Estados Unidos dificultou uma "dieselização" à brasileira no mercado de utilitários?

Já é bastante conhecida a adoração que o público dos Estados Unidos desenvolveu pelas pick-ups, que representam juntamente com os SUVs a maior parte do mercado de veículos novos por lá há gerações, e a Ford se destaca com a F-150 liderando rankings tanto de utilitários quanto de automóveis "normais". Em que pese o maior grau de exigência do consumidor americano com relação a opções, que iam desde a tração 4X4 inicialmente para fins estritamente utilitários antes de ser alçada à condição de essencial a usos recreativos até o câmbio automático e diferentes versões de cabine para proporcionar facilidade na acomodação dos passageiros ao ser usada como um carro comum, bem como diferenças nos custos dos combustíveis por lá, chega a soar curioso como uma inserção de motores turbodiesel em caminhonetes destinadas ao mercado americano distanciou-se daquele viés regionalizado que fomentou experiências um tanto extremas quanto ao downsizing como quando a Ford do Brasil aplicou em '97 um motor de só 2.5L na F-1000 HSD. Naturalmente a urgência em atender à efetiva necessidade por motores Diesel nas caminhonetes brasileiras ainda em épocas de mercado mais restrito fomentaram anteriormente o uso de motores destinados inicialmente a maquinário agrícola, mais abrutalhados e eventualmente ao gosto de um auténtico redneck, mesmo que versões com 4 cilindros pareçam menos "prestigiosas" que um V8.
E assim como a F-1000 que até a geração Aeronose era basicamente uma mistura da aparência da F-150 que ainda dispunha de carroceria curta em versões de cabine simples mas com capacidades de carga que a aproximavam da F-250 americana acabava tendo motores mais modestos em comparação à congênere americana já considerando as versões a gasolina, bem como a prevalência do câmbio manual no Brasil e na Argentina possibilitando um desempenho razoável mesmo com motores mais austeros, permaneceu com uma estratégia muito semelhante durante a transição da geração de caminhonetes full-size da Ford do Brasil que na linha Super Duty a partir do final de '98 usava motor Cummins de 3.9L e 4 cilindros e o manteve até o ano-modelo 2011 na F-350. E enquanto versões americanas daquela geração inicial da F-350 Super Duty usaram motores V8 International de 7.3L como o que chegou a ser produzido até no Brasil e usado em modelos destinados à exportação para a Austrália, seguido pelo problemático 6.0 que por sua vez deu lugar ao 6.4 antes da Ford passar a usar um motor 6.7 também V8 de projeto próprio, é previsível que a economia de escala favorecesse o uso de um motor "de trator" no Brasil considerando o volume total de vendas da categoria sendo menor em comparação aos Estados Unidos especialmente no varejo, além de um motor de fabricação brasileira ter sido exigido em utilitários comerciais para acesso a linhas de crédito do Finame. Chega a ser curioso a Ford do Brasil aparentemente nunca ter cogitado o uso de versões de 6 cilindros do motor Cummins na F-350 para o desempenho ficar mais parelho com a congênere americana, embora o viés mais estritamente profissional em contraste com usos recreativos nos Estados Unidos tenham levado o motor mais austero a ser considerado satisfatório por uma parcela mais conservadora do público brasileiro, que talvez por ter ficado tão condicionado ao mercado fechado entre '76 e '90 assimilava mais facilmente uma estratégia que remontava à época dos calhambeques...
Naturalmente a preferência por motores Diesel no Brasil consolidada no rescaldo das crises do petróleo da década de '70, associada a uma desconfiança quanto ao etanol após o sucateamento do ProÁlcool e a disponibilidade restrita do gás natural, ainda favorecia uma abordagem austera com relação aos motores para a F-350, de certa forma replicando uma aposta antiga da Ford que hoje pode ser vista como erro ao ter priorizado o motor V8 Y-Block a gasolina no começo da fabricação nacional de veículos no governo JK, e a geração inicial da F-100 que foi a primeira das pick-ups Ford brasileiras ainda teve no exterior a opção pelo motor Mileage Maker de 6 cilindros em linha também a gasolina. Possivelmente o "trauma" de ter ido com muita sede ao pote, quando os choques do petróleo acabavam sendo imprevisíveis antes das beligerâncias no Oriente Médio recrudescerem durante a década de '70, favorecia uma reversão tão radical da estratégia de usar o "melhor" motor a gasolina, e embora o motor Cummins B3.9 ainda seja constantemente apontado por americanos como bom substituto para motores V8 small-block a gasolina em caminhonetes, em parte graças à massificação do turbo, acabava sendo mais fácil assimilar como os antigos motores Diesel atmosféricos que passaram a tomar o lugar dos V8 no Brasil a partir da década de '70 até em adaptações a modelos já antigos como seria uma F-100 de meados da década de '50 até o início da década de '60 ficavam com um desempenho comparável com mais proximidade aos motores de 6 cilindros. E mesmo que a F-350 tenha sido sempre oferecida com um direcionamento explícito aos usos profissionais, em contraste com a F-100 cujos exemplares remanescentes hoje são mais procurados por entusiastas em aplicações recreativas até no âmbito dos street-rods e hot-rods para os quais o motor V8 a gasolina como ícone cultural é favorecido tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, já fica claro provável motivo para americanos preferirem um V8 à medida que pick-ups lá são como carros normais.

E até no segmento de vans, que passou a receber uma maior influência européia a partir de 2014 com a chegada da Transit nos Estados Unidos e o fim da produção de versões de passageiros e furgão de carga da Econoline/E-Series, chega a ser mais evidente a preferência americana por uma alegada simplicidade dos motores de ignição por faísca tanto só a gasolina quanto flexfuel aptos a usar também o etanol, ou o mercado de conversões para combustíveis gasosos que vão além do gás natural para abranger também o gás liquefeito de petróleo (GLP - "gás de cozinha") cujo uso veicular é vetado no Brasil mas chega a ser mais fácil de adequar às novas gerações de motores com injeção direta. Como um modelo mundial, vale lembrar que a Transit teve na atual 4ª geração diferentes motores de acordo com condições regionais, tal qual ocorria com as versões brasileiras das pick-ups full-size, tendo chegado nos Estados Unidos com o motor 3.2 de 5 cilindros como única opção turbodiesel porque seria mais fácil para enquadrar às normas de emissões mesmo que em outras regiões tenha contado com opções turbodiesel mais austeras como os Puma de 2.2 e 2.4L com 4 cilindros, antes de todos os turbodiesel serem substituídos pelo atual Ecoblue de 2.0L e 4 cilindros. Vale destacar que especificamente para os Estados Unidos e Canadá, e também a Bolívia onde a importação de veículos com motor Diesel de cilindrada inferior a 4.0L segue proibida, o uso de motores V6 a gasolina acabou sendo priorizado, com o turbodiesel de 5 cilindros saindo de linha logo em 2019 e sem substituto de especificação americana mesmo com o Ecoblue ganhando espaço em outras regiões. E mesmo que um motor EcoBoost 3.5 V6 twin-turbo seja opcional desde a chegada nos Estados Unidos, comparável aos V8 que tinham mais destaque que motores de 6 cilindros na E-Series, o V6 atmosférico inicialmente de 3.7L e depois 3.5L prevalece na Transit americana atualmente com a injeção dupla (direta e sequencial no coletor de admissão) enquanto a E-Series permaneceu recorrendo à injeção sequencial até no motor Godzilla de 7.3L que só passou a ser usado em 2021 quando versões van já haviam sido descontinuadas.
Apesar da E-Series ter perdido a opção por um motor turbodiesel em 2009 quando o 6.0 deixou de ser oferecido, e tinha uma calibração mais modesta que o usado nas pick-ups devido ao menor espaço para refrigeração no compartimento do motor, teve opções V8 flexfuel entre 2009 e 2021 além da conversão para combustíveis gasosos que tanto agrada aos operadores comerciais nos Estados Unidos por poder usar um pós-tratamento dos gases de escape mais simples que para os turbodiesel modernos que além do filtro de material particulado (DPF) já requerem também o SCR com a necessidade do fluido-padrão AdBlue/ARLA-32/ARNOx-32/DEF (Diesel Exhaust Fluid) e impressões de simplicidade e resiliência a variações na qualidade do combustível nos motores a gasolina agradem também a usuários recreativos como turistas mesmo com o maior consumo. E assim pode ser fácil explicar como a Ford, lembrando da economia de escala e eventuais dificuldades de acomodar um motor turbodiesel moderno e os sistemas de refrigeração e pós-tratamento de gases, esteja apenas refletindo essa impressão de motores V8 como um ícone cultural da indústria automobilística americana ao longo dos últimos 92 anos por iniciativa da própria Ford. Logo, por mais que existam recursos técnicos para manter o enquadramento dos motores turbodiesel mesmo a normas de emissões que tem beirado a irracionalidade em uma declarada intenção política de combater o motor de combustão interna de um modo geral, aparentemente a relevância do motor V8 como materialização do American Way Of Life certamente dificultou uma "dieselização" à brasileira no mercado americano de utilitários.