quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Esclarecendo algumas dúvidas sobre os motores Chevrolet "misto-quente"

A montagem de motores "misto-quente", adaptação um tanto precária que teve um surto de popularidade nas décadas de '70 e '80 como reação às crises do petróleo e ao baixo valor de revenda que os utilitários com motor a gasolina passavam a apresentar, vem recentemente despertando curiosidade entre proprietários do Chevrolet Omega brasileiro (equivalente ao Opel Omega A europeu) equipado com o motor de 250 pol³ (4.1L) e 6 cilindros em linha, tendo como principal motivação evitar alterações no documento em referência à numeração original do bloco do motor, bem como não chamar tanto a atenção da fiscalização tendo em vista que o uso de motores Diesel em veículos com capacidade de carga inferior a 1000kg e acomodação para menos de 9 passageiros além do motorista permanece proibido no Brasil, com exceção apenas para veículos 4X4 com caixa de transferência de dupla velocidade (a popular "reduzida").

Surgida originalmente em caminhões Chevrolet C-60 com motor Stovebolt Six a gasolina de 262 pol³ (4.3L) usados para transportar enxofre do porto de Santos para São Paulo, a grosso modo consistia da adaptação do cabeçote de um motor Mercedes-Benz, podendo ser o OM321 do L-1111 ou o OM352 do L-1113, no bloco original do caminhão Chevrolet, com uma bomba injetora montada na posição original do distribuidor por meio de uma flange. Também teve alguma aceitação entre proprietários das caminhonetes C-10/C-14 e Veraneio, ainda que nesses modelos fosse mais comum a substituição de todo o motor pelo Perkins 4-236 originalmente usado nas Chevrolet D-10 e D-20, ou até mesmo do 3-152 oriundo de tratores Massey-Ferguson e do 4-203 (vulgo "8BR") usado no trator Ford 8BR brasileiro e em versões da caminhonete F-100 feitas na Argentina. A favor do "misto-quente" pesava como principal vantagem o custo inicial menor que a adaptação de um motor Perkins ou Mercedes-Benz originalmente Diesel, seguida de uma redline na faixa de 3500 RPM contra a média de 2800 RPM do Perkins 6-354 e dos Mercedes-Benz OM321 e OM352, mas tinha pouca compressão, era acometido por vazamentos de óleo e emitia uma grande quantidade de material particulado, denotando que o processo de combustão não ficava tão eficiente em decorrência da menor compressão, além de apresentar um nível de ruído demasiadamente elevado. Só a fumaceira e o barulho já serviriam para desencorajar quem estaria considerando fazer um "misto-quente" pensando em permanecer clandestino, pois acabaria por chamar muita atenção da polícia ou em fiscalizações de trânsito. A durabilidade era outro ponto crítico, com muitos motores não resistindo por mais de 30000km ou até 50000km. Tais quilometragens chegam a soar cômicas quando muitos motores Diesel chegam a superar a barreira de 1 milhão de quilômetros sem maiores intercorrências...

O formato dos pistões originais do motor Chevrolet não era otimizado para a operação no ciclo Diesel, tendo levado um mecânico independente de São Paulo a buscar ajuda do engenheiro Francisco Satkunas, da General Motors, para que fosse desenvolvido um novo pistão com o intuito de levar a taxa de compressão a 16,5:1, valor mais de acordo com o usual nesse tipo de motor. Entretanto, tais pistões eram usinados artesanalmente em torno, e não são tão fáceis de se obter atualmente. Outro ponto crítico para a adaptação era o virabrequim, que nos primeiros motores de 262 pol³ era feito de aço forjado, material que acabava por apresentar muitas tensões, e apoiado em apenas 4 mancais estava mais sujeito a rupturas, posteriormente substituído por um novo virabrequim fundido em ferro nodular. Os motores de 250 pol³ (usado no Omega, nas caminhonetes C-10/A-10, C-20/A-20 e Veraneio, além do clássico Opala) e 292 pol³ (que no Brasil equipou originalmente apenas caminhões) tem o virabrequim apoiado em 7 mancais, mas ainda é questionável até que ponto vale o risco de sacrificar um motor Chevrolet em boas condições ao invés de adaptar um motor Diesel de fábrica.

Outro fator que acaba por fomentar alguma polêmica seria a possibilidade de incorporar recursos mais modernos para aprimorar o rendimento e a durabilidade do "misto-quente", como por exemplo gerenciamento eletrônico. Pode-se dizer que os avanços nesse campo, sobretudo a injeção do tipo common-rail de alta pressão, tornaram possível o emprego de taxas de compressão mais baixa em motores Diesel sem sacrificar a eficiência, possibilitando que o processo de combustão ocorresse a temperaturas mais baixas visando principalmente a uma redução nas emissões de óxidos de nitrogênio (NOx). Nesse caso, a maior dificuldade seria encontrar um sistema de injeção e gerenciamento facilmente reprogramável para proporcionar uma maior precisão e suavidade de funcionamento e, ao recordarmos que a principal motivação para a montagem de um "misto-quente" seria um menor custo inicial, chega a soar um tanto contraditório que vá se aplicando um grau muito mais elevado de sofisticação quando outras opções mais off-the-shelf já podem apresentar uma relação custo/benefício mais favorável.

6 comentários:

  1. Prezado sr.: o sr. teria foto de um motor deste tipo misto quente Chevrolet + Mercedes?
    Grato, Miltom. miltom_obra@hotmail.com
    03-06-2016.

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    1. Infelizmente não, mas recomendo que procure no Google Images. Pode ser que apareça alguma, mas como é uma adaptação que já caiu em desuso talvez fique mais difícil encontrar imagens.

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  2. legal tenho uma c10 73 gasolina, e ja pensei em fazer isso,nao pelo custo e nem pela economia e mais sim por um diferencial, la na gringa vemos alguns rat rods hot rods diesel, como vi nao e muito recomendado a conversao, mas acredito que hj seria sim possivel ficar 'bom' gostaria muito de ver um video de um motor desse, alguem teria algum sobrevivente pois na net nao se acha nada em motores gm261, se alguem tiver ou ter mais informaçoes e poder estar me mandando wats 66 984402840. abraço

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    1. Sim, de fato tem aparecido mais rat rods com motores Diesel no exterior, principalmente o Cummins B5.9 (vulgo "6BT") pela disponibilidade no mercado americano. Quanto ao "misto quente" baseado no motor Chevrolet, pela dificuldade em achar os motores Mercedes-Benz OM321 e OM352 nos Estados Unidos, eu nunca vi menções a essa aplicação por lá, e os estrangeiros até ficam surpresos quando descobrem que era relativamente comum no Brasil. Mas achar um remanescente em bom estado de funcionamento ao menos para servir de referência para fazer uma adaptação parecida não é tarefa das mais fáceis mesmo.

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  3. Eu quando era garoto estava iniciando na mecânica vi uma caminhonete c-14 com um desses misto quente, lembro dos detalhes o bloco era original GM 261 com uma frango entre o bloco e o cabeçote Mercedes 1111 que é injeção indireta para trabalhar com pistões planos que é o caso do GM 261, a bomba injetora estava posicionada igual no motores Mercedes, tocada pela engrenagem do comando, não no buraco do distribuidor como foi mencionado aqui no blog, em relação ao ronco do motor parecia agradável 6cc diesel também não notei excesso de fumaça em nem dificuldade em ligar ele, bom tudo isso eu vi pessoalmente no ano aproximadamente de 1995.

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    1. Direto pela engrenagem do comando mesmo, sem nenhuma outra adaptação para tocar a bomba com correia? Chegaram a ser feitos diferentes esquemas para sincronizar a bomba nesse tipo de motor.

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

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