terça-feira, 26 de abril de 2022

Caso para reflexão: Citroën 2CV e a questão dos "utilitários"

Primeiro modelo de proposta declaradamente popular a lançar mão da tração dianteira, o Citroën 2CV é lembrado por uma concepção que contemplava também as necessidades da população rural francesa no período entre-guerras ao invés de se ater às condições de uso estritamente urbanas. Naturalmente, sendo um projeto surgido quando a tecnologia de motores Diesel ainda passava longe de ser competitiva para o uso em veículos leves, prevaleceu a ignição por faísca em motores sempre de 2 cilindros horizontais (boxer ou flat-twin). Inicialmente com cilindrada de 375cc e potência de 9cv ao ser lançado no ano de 1949, progredindo para 425cc e 12,5cv em 1955 e para 435cc e 24cv em 1970, com a opção pelo motor de 602cc e 28cv também a partir de 1970 (potência diminuída para 25cv em 1975 diante de uma revisão nas normas de emissões) alcançando a "potência fiscal" de 3cv ao invés dos 2cv que nortearam o início do projeto, ainda permaneceu atrativo aos olhos de uma parte do público europeu diante da eclosão das crises do petróleo a partir de 1973, permanecendo em linha nos principais mercados europeus até 1988 e com a produção estendida por um breve período até 1990 em Portugal.

Embora hoje até alguns furgões médios e grandes recorram à tração dianteira, e no Brasil a capacidade de carga a partir de 1000kg ou acomodação para 9 ou mais passageiros permita que veículos com tração simples sejam regularizados com motores Diesel, um Citroën 2CV ficaria impossibilitado de recorrer a esse artifício mesmo considerando a possibilidade de adaptar algum motor estacionário portátil, mesmo que outras características de projeto permitam ao modelo superar a aptidão off-road de alguns veículos com tração nas 4 rodas reconhecidos como "utilitário" pela burocracia brasileira. Também é importante destacar o sistema de suspensão independente nas 4 rodas, com amortecedores centrais interligando as rodas de cada lado para manter o contato das rodas com o terreno onde o veículo esteja trafegando e a carroceria mais corretamente nivelada em diversas condições de carga, e até minimizando os riscos de danos a cargas mais sensíveis como um cesto de ovos. O mesmo chassi foi usado no Citroën Méhari, e ainda proporcionava uma aptidão satisfatória a condições de rodagem severas até sem um sistema de tração 4X4 part-time que foi oferecido nesse modelo como opcional em alguns países, mas que esteve ausente na Argentina e no Uruguai onde foi mantida somente a tração dianteira.

Além de fatores mais fáceis de estabelecer um parâmetro para classificações um tanto arbitrárias, como capacidades de carga e passageiros ou tração usadas no Brasil para embasar a homologação de alguns veículos como utilitário, vale ressaltar que um tipo de carroceria diferente também pode influenciar na percepção do público generalista, e nesse caso o 2CV eventualmente seja percebido à primeira vista de um jeito e o Méhari de outro. Tal situação também ocorre quando comparamos algum hatch generalista abrangido pela definição de carro "popular" em vigor no Brasil e uma pick-up compacta derivada do mesmo projeto que vá ser reconhecida mais facilmente como utilitário, ainda que permaneça proibido o uso de um motor Diesel em função da capacidade de carga inferior a 1000kg. E por mais que remonte a uma época na qual os desafios de ordem técnica eram substancialmente diferentes dos atuais, e a bem da verdade parecia improvável o surgimento de restrições ao uso de motores Diesel como a observada no Brasil, o Citroën 2CV e derivados como o Méhari deixam escancaradas algumas incoerências na classificação meramente arbitrária de "utilitários".

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seja bem-vindo e entre na conversa. Por favor, comente apenas em português, espanhol ou inglês.

Welcome, and get into the talk. Please, comment only either in Portuguese, Spanish or English.


- - LEIA ANTES DE COMENTAR / READ BEFORE COMMENT - -

Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
http://dzulnutz.blogspot.com/2016/03/relacao-de-marcha-refletindo-sobre.html