terça-feira, 15 de abril de 2025

Gás natural: pode atender bem a algumas condições operacionais, mas longe de ser um substituto adequado a todas as circunstâncias para o óleo diesel convencional

Após experiências com o etanol tanto no Brasil quanto na Suécia, a Scania parece ter ficado convencida a priorizar o gás natural como eventual substitutivo para o óleo diesel convencional, já podendo até ser vistos caminhões Scania movidos a gás natural pelas estradas brasileiras com relativa facilidade. Porém, vale destacar que essa aposta no gás natural nunca foi encarada como pretexto para ignorar uma aptidão superior dos motores Diesel em algumas aplicações mais específicas, entre as quais viaturas militares e de serviços de emergência para os quais o peso e volume dos reservatórios de gás natural a bordo é um empecilho e uma dificuldade para acessar suprimentos do combustível com a rapidez necessária possa impossibilitar a implementação, lembrando que a Scania também oferece motores compatíveis até com o biodiesel puro (B100) além do óleo diesel convencional e portanto uma transição para combustíveis alternativos permanece tecnicamente viável. Naturalmente, alguns operadores podem ser favoráveis ao gás natural por diferentes fatores, indo desde metas de redução ou neutralização de emissões alinhadas à pauta ESG até um acesso mais fácil ao gás em rotas regionais com itinerários fixos, passando também por considerações quanto à maior simplicidade dos sistemas de pós-tratamento de gases de escape para os motores de ignição por faísca aptos ao uso do gás natural ou do biogás/biometano.

A mais substancial diferença de um motor a gás natural em um caminhão é recorrer ao ciclo Otto, como em veículos leves a gasolina ou os flex também aptos a operar com etanol, embora predomine o uso do gás natural sem provisões para um eventual uso emergencial de gasolina ou etanol, e portanto as rotas a serem atendidas com um caminhão a gás devem ser muito bem planejadas para assegurar o suprimento do combustível, em contraste com os caminhões mais convencionais movidos a óleo diesel que contam tanto com a maior facilidade do manejo de um combustível líquido quanto uma maior disponibilidade nos postos de abastecimento mesmo mais distante dos principais eixos rodoviários. Naturalmente seria rechaçado o uso da gasolina tanto devido à menor densidade energética em comparação ao óleo diesel quanto pela principal motivação para a implementação do gás natural em caminhões ter a ver com uma alegada "sustentabilidade", nesse caso favorecendo especialmente o biogás/biometano que pode ser obtido em aterros sanitários ou em estações de tratamento de efluentes, e até alguns resíduos gerados na atividade agropecuária podem ser úteis como matéria-prima para uma produção integrada de fertilizante agrícola orgânico e gás combustível. Já com relação ao etanol, outro fator a considerar é o gás natural apresentar menos intercorrências para a partida a frio por já ser injetado na fase de vapor, além de ter uma resistência ainda melhor à pré-ignição mesmo com uma mistura ar/combustível mais pobre como é mais comum nos motores Diesel e portanto fomenta uma aceitação mais fácil junto a alguns operadores.

Convém lembrar também que o gás natural ainda é frequentemente usado na síntese de uréia industrial, que pelo grau elevado de pureza é usada na formulação do fluido-padrão AdBlue/ARLA-32/ARNOx-32 aplicado pelo sistema SCR para controle das emissões de óxidos de nitrogênio (NOx) em praticamente todos os motores turbodiesel modernos, de modo que para alguns operadores que possam conciliar uma instalação mais pesada e volumosa do sistema de combustível o uso direto do gás natural pode até fazer mais sentido simplesmente por evitar o gasto de energia para a produção de outro insumo. O controle de emissões de NOx em motores de ignição por faísca estando mais frequentemente associado a métodos como a recirculação de gases de escape (EGR) para reduzir a concentração total de oxigênio na carga de admissão, tal qual ocorreria com uma mistura ar/combustível mais rica, também já chegou a ter alguma aplicação em motores turbodiesel entre as vigências das normas Euro-4 e Euro-5, mas perdeu espaço em motores para veículos pesados a partir da Euro-6 tanto pelo maior impacto sobre a eficiência geral quanto por causar uma saturação mais rápida do filtro de material particulado (DPF), e mesmo que em motores leves do ciclo Otto uma maior massificação da injeção direta ao longo da última década tenha levado à necessidade de também incorporar filtros de material particulado esses tendem a ser ausentes em motores movidos exclusivamente a gás natural. E como motores do ciclo Otto ainda costumam ter taxas de compressão mais conservadoras mesmo ao usar somente o gás natural, e com esse combustível ainda predomine a injeção sequencial no coletor de admissão em vez da injeção direta, uma vaporização sempre mais completa em comparação tanto ao óleo diesel e outros combustíveis pesados que possam ser usados como substitutivos quanto a combustíveis líquidos voláteis como a gasolina e o etanol cuja vaporização tende a ser mais difícil em associação à injeção direta faz com que alguns operadores sejam facilmente convencidos a incorporar o gás natural, e o biogás/biometano caso as condições operacionais proporcionem fácil acesso a esse combustível para atender a metas de neutralização de emissões.

É natural que diferentes condições operacionais possam ser desafiadoras, e historicamente os motores Diesel tenham sido os que melhor demonstraram aptidões para atender às mais variadas necessidades do transporte pesado e também em serviços especializados, de modo que tentar apresentar exclusivamente uma opção como substitutivo possa se revelar insuficiente na prática, e assim uma aplicabilidade do gás natural ou do biogás/biometano facilmente integrável a rotas regionais com itinerários rígidos esteja distante de atender às condições um tanto imprevisíveis para as quais uma viatura de bombeiros precise estar de prontidão. Deixar-se levar por uma histeria travestida de preocupação com o meio-ambiente, e abrir mão de opções mais eficientes para conciliar uma almejada "sustentabilidade" com a capacidade operacional em condições extremas, pode resultar em problemas que seriam facilmente evitáveis usando o bom senso, e para os quais qualquer falsa solução que seja apresentada alcance um custo incalculável. Enfim, por mais que alguma lógica possa dar a entender que o gás natural seja um combustível próximo da perfeição no tocante a aspectos como uma combustão eficiente e uma facilidade no pós-tratamento dos gases de escape, e haja viabilidade técnica para usar também o biogás/biometano e agregar valor a subprodutos da atividade agropecuária, de fato o gás natural pode atender bem a algumas condições operacionais, mas está longe de ser efetivo para substituir totalmente o óleo diesel convencional.

quarta-feira, 9 de abril de 2025

Iveco Daily da Pepsico e a capacidade de carga: uma conta que não fecha?

É natural que o peso de algum implemento seja descontado da capacidade de carga nominal em algum veículo utilitário para a lotação total ser definida, ainda de acordo com o peso bruto total do veículo original, e em alguns casos até pode ficar menor que o mínimo de uma tonelada que ainda serve como parâmetro para um modelo de tração simples e acomodação para menos de 9 passageiros além do motorista poder usar um motor Diesel no Brasil. No caso de um Iveco Daily da atual geração, considerando o peso de uma versão chassi-e-cabine original em torno de duas toneladas a capacidade de carga nominal fica ao redor de uma tonelada e meia em versões que ainda podem ser conduzidas com a carteira de habilitação da categoria B, e portanto já seria descontado o peso da carroceria a ser instalada. Mas chega a ser curioso um exemplar com carroceria tipo baú ficar com só 250kg de lotação máxima para permanecer enquadrado no limite de PBT da CNH categoria B, de modo que o implemento fique demasiado pesado mesmo com o uso de materiais leves como o alumínio para a estrutura ou painéis de plástico reforçado (geralmente com fibra de vidro) nos acabamentos internos e externos.

Embora algumas cargas possam apresentar diferentes proporções entre peso e volume, com pacotes de salgadinhos da Elma Chips tendo uma densidade muito menor que potes de Toddy por exemplo, eventualmente uma lotação máxima tão pequena possa até passar despercebida, por mais absurdo que possa parecer um baú com capacidade para 6 a 8 pallets pesar vazio quase a capacidade de carga nominal toda do utilitário que seja equipado com esse implemento. Também pode ser o caso de observar como o limite de PBT da CNH categoria B talvez seja mais restritivo que o necessário, e mesmo que um limite como o de 26000 libras ou cerca de 11900kg aplicável nos Estados Unidos para detentores de uma carteira de motorista comum seja praticamente impossível de ser implementado no Brasil convém lembrar o caso da Austrália onde o limite de PBT para 4500kg já pode ser mais aproveitável que os 3500kg em vigor no Brasil e na Europa Ocidental. Enfim, sem entrar no mérito de diferentes configurações e especificações técnicas que vão influir nas capacidades e pesos de um veículo, às vezes algumas contas acabam não fechando, e expondo o quão arcaico é restringir o uso de um tipo de motor ou combustível tão somente com base nas capacidades de carga e passageiros ou tração de um veículo utilitário.

sexta-feira, 4 de abril de 2025

Precisamos reconhecer o real valor dos furgões compactos de uso misto

Muito provavelmente pela influência de turistas, principalmente argentinos, que iam veranear nas praias de Florianópolis entre a última metade da década de '90 e pouco depois do ano 2000, furgões compactos como a primeira geração do Citroën Berlingo e Peugeot Partner me chamavam muito a atenção desde o início pela versatilidade, mas também por uma integração estética mais efetiva entre a cabine dianteira e o salão traseiro em comparação a gerações anteriores de utilitários com uma proposta semelhante. Ainda caberia mencionar que o uso de motores Diesel em veículos leves ainda era especialmente comum tanto na Argentina quanto no Uruguai, facilitado pelas normas de emissões menos restritivas daquela época e a maior austeridade que era possível aplicar à concepção dos motores antigos, a ponto de parecerem "de trator" comparados a motores turbodiesel modernos como o DV5 HDi hoje oferecido na 3ª geração de furgões compactos da atual holding Stellantis que administra entre outras marcas a Citroën e a Peugeot. O fator nostalgia certamente pudesse ter algum peso para me fazer preferir um motor mais "arcaico" que requeira menos recursos especializados para fazer a manutenção, embora seja perfeitamente justificável que a evolução técnica capaz de manter uma disputa minimamente equilibrada mesmo à medida que os motores de ignição por faísca passam a incorporar mais maciçamente o turbo e a injeção direta como já tem acontecido com motores Diesel para veículos leves ao longo dos últimos 30 anos.
Tomando como referência a 3ª geração desses furgões, que em versões de passageiros teve a mudança do nome no Peugeot Partner para Rifter, cabem algumas observações acerca de algumas restrições ao uso de motores Diesel em veículos leves, que no Uruguai já faz algum tempo estão mais reservados aos táxis, enquanto no Brasil permanecem vigentes aquelas restrições arbitrárias com base nas capacidades de carga e passageiros ou tração, embora possam ser naturalmente melhores que muito SUV até mesmo no tocante à trafegabilidade em ambientes mais bravios. Se por um lado possa parecer exagero esperar que um carroapreciado por taxistas e passageiros pelo conforto e bom aproveitamento de espaço para acomodar bagagens no Uruguai possa justificar a escolha do motor DV5 turbodiesel no lugar do EB2 PureTech a gasolina mesmo se eventualmente viesse a ser comercializado no Brasil, o que é improvável também pela cultura automotiva brasileira condicionada a pick-ups e SUVs, por outro vale lembrar que versões 4X4 cuja montagem do sistema de tração é feita de forma terceirizada pela Dangel substituíram alguns jipes derivados dos Land Rovers do Ejército de Tierra na Espanha, e portanto seria de se esperar a capacidade de atender também aos parâmetros usados para definir como "utilitário" no Brasil veículos cuja capacidade de carga abaixo de uma tonelada e acomodação para menos de 9 passageiros além do motorista. Enfim, mesmo subestimados por brasileiros, é compreensível a popularidade desses furgões compactos perdurar na Argentina e no Uruguai...

quarta-feira, 26 de março de 2025

Alteração no teor de etanol adicionado à gasolina no Brasil: ainda mais prejudicial ao turismo regional

Numa daquelas medidas politiqueiras sem nenhum embasamento técnico realista, o aumento na mistura obrigatória de etanol anidro à gasolina no Brasil dos atuais 27% (E27) para 30% (E30) tem sido tratado por uma parte chapa-branca da mídia como uma medida que possa ser benéfica, sob uma falsa alegação de "sustentabilidade" pelo etanol ter as emissões de dióxido de carbono (CO²) totalmente neutralizadas durante o crescimento dos cultivares usados na produção desse biocombustível, e também a expectativa por uma redução do preço por litro da gasolina no varejo. Pelo visto, os defensores dessa infeliz medida esquecem que o etanol também acaba sendo cotado em dólar por ser uma commodity, tal qual o açúcar que também é produzido majoritariamente a partir da cana-de-açúcar no caso do Brasil e o milho que é o principal insumo para a produção de etanol nos Estados Unidos mas já usado na produção de etanol no Brasil com destaque para Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e em menor proporção no Paraná e até em São Paulo e Alagoas. Instituições outrora respeitadas como o Instituto Mauá de Tecnologia até anunciaram resultados de testes preliminares com os quais endossam esse incremento na proporção do etanol na gasolina brasileira, o que é questionável tanto pela metodologia confusa quanto pela falta de um maior rigor quanto a efeitos potencialmente nocivos a longo prazo em motores sem preparação para suportar teores de etanol muito além de 5 a 15% que costumam ser mais comuns em outros países.

No caso específico do Brasil, onde a discrepância no conteúdo de etanol na gasolina tem historicamente sido controverso também pelas dificuldades em adaptar carros importados às condições locais, apesar da ascensão da injeção eletrônica ao longo das últimas 3 décadas e que já alcançou até as motocicletas dar a entender que uma capacidade de correção em tempo real da mistura ar/combustível e do avanço da ignição de acordo com a velocidade de propagação de chama de diferentes especificações da gasolina, e causado temor a alguns turistas estrangeiros que viajam rumo ao Brasil com veículos próprios. Além do mais, em testes de homologação que costumam ser conduzidos pela Cetesb para aprovação de veículos novos à venda no Brasil e homologação do consumo de combustível junto ao Inmetro, ainda é utilizada gasolina com somente 22% de etanol (E22) já impossível de encontrar nos postos brasileiros há mais de 20 anos, e portanto sem condizer com a realidade tendo em vista que até a gasolina Podium disponível só em alguns postos de bandeira BR/Petrobras foi a única a permanecer com o também demasiadamente elevado teor de 25% de etanol (E25) e preços estratosféricos. Convém recordar que o etanol tem menor poder calorífico (quantidade de energia por litro) que a gasolina, de modo que um aumento na mistura à gasolina vai naturalmente resultar em aumento do consumo de combustível, e portanto a previsão de um preço menor passe longe de proporcionar uma redução efetiva em despesas com o combustível durante um mesmo trajeto para o qual a gasolina brasileira ainda com 27% de etanol já é problemática.

Sendo também comum a presença de turistas estrangeiros no Brasil, principalmente durante o verão, já é frequente alguns veículos de residentes no exterior apresentarem inconsistências no desempenho em função dos ajustes a serem feitos pela injeção e ignição eletrônicas em motores a gasolina no intuito de proteger o motor contra maiores danos na falta de mapeamentos de injeção e ignição que permitam ao motor reconhecer especificamente alterações no teor de etanol, mesmo que as tecnologias mais recentes da injeção eletrônica com sensores de oxigênio (sonda Lambda) tanto sequencial no coletor de admissão como a injeção direta hoje muito usada em motores turbo a exemplo do Ecoboost da Ford F-150 Raptor seja basicamente a mesma que viabilizou os carros flex hoje à venda principalmente no Brasil. Valendo lembrar que o teor excessivo de etanol adicionado à gasolina brasileira fomenta um descrédito e até uma antipatia ao uso direto do etanol hidratado puro como combustível nos veículos flex, mesmo na safra da cana que é quando o preço por litro do etanol no varejo fica mais convidativo também nas regiões onde falta uma produção mais expressiva desse biocombustível, além da principal temporada turística durante o verão com uma presença mais significativa de turistas estrangeiros rumo ao litoral brasileiro coincidir com a safra da cana que vai de novembro a março, seria até mais lógico que o teor de etanol na gasolina fosse menor, e uma maior parte da produção do etanol direcionada ao hidratado para uso direto nos flex, o que seria vantajoso para todos e poderia ser um primeiro passo para recuperar uma credibilidade que o etanol perdeu a partir da safra '89-'90 quando houve um maior direcionamento da cana para a produção do açúcar devido às cotações mais favoráveis para exportação.

Enquanto motores a gasolina e por extensão os flex vinham sendo apontados como mais simples que os turbodiesel modernos, sobretudo pela maior simplicidade nos sistemas de pós-tratamento dos gases de escape que também podem apresentar incompatibilidades com altos teores de enxofre na gasolina e no óleo diesel convencional, e até especificamente com o biodiesel no caso de motores Diesel com filtro de material particulado (DPF) e o EGR que causaram muitos problemas para alguns brasileiros que foram com veículos modernos de motor Diesel em países vizinhos com uma regulamentação mais leniente de emissões, o Brasil desgovernado corre o risco de ter escancarada a condição de republiqueta de bananas com o teor de etanol de 30% sendo implementado na gasolina. Alguns medíocres que se acomodaram diante da ascensão dos carros flex no Brasil, lembrando que permanecem as restrições ao uso de motor Diesel em veículos leves e até o gás natural está mais difícil de integrar a alguns motores flex modernos por causa da ascensão da injeção direta em meio ao downsizing, e mesmo o Brasil ainda sendo o maior produtor de automóveis e utilitários leves na América do Sul a "diplomacia do etanol" já foi provada um fracasso em outras ocasiões. Enfim, além de ser problemática para quem opta por um carro importado, e em proporção ainda para quem por estrita necessidade usa um carro "velho" sem ser flex ou uma moto, a alteração do teor de etanol à gasolina tem tudo para ser um duro golpe contra o turismo regional.

sexta-feira, 21 de março de 2025

Uma observação sobre o Nissan Patrol Y61 e o downsizing

Com a produção iniciada em '97 no Japão e terminada somente em 2023 na África do Sul, certamente o Nissan Patrol da geração Y61 ainda pode ser creditado como um dos mais importantes veículos 4X4 da história. Pouco conhecido no Brasil, apesar de aparecer frequentemente no litoral brasileiro com turistas estrangeiros no verão, chama a atenção pela linha de motores oferecida em diferentes mercados onde foi comercializado regularmente, priorizando motores de alta cilindrada a gasolina enquanto o downsizing já ganhava relevância no Diesel. Da geração anterior, permaneceu o TB42 a gasolina de 6 cilindros em linha e 4.2L com 12 válvulas e comando no bloco enquanto o RB30 de 3.0L também de 6 cilindros em linha mas com comando de válvulas no cabeçote saía de cena, e inicialmente as opções Diesel foram o RD28 de 6 cilindros em linha e 2.8L com comando de válvulas no cabeçote em uma versão turbo com gerenciamento eletrônico e o TD42 que a grosso modo era praticamente uma versão "misto-quente" do TB42 a gasolina mas apesar do nome TD levar a crer que sempre tivesse turbo também contava com uma versão atmosférica que seguia em regiões onde normas de emissões mais lenientes o permitiam e a simplicidade associada à ausência do turbo era apreciada. Com a consolidação do motor ZD30 de 3.0L e 4 cilindros sempre com turbo e injeção eletrônica e 16 válvuas com comando duplo no cabeçote a partir do ano 2000 com injeção eletrônica por bomba rotativa até passar ao sistema common-rail em 2007 em alguns mercados onde motores turbodiesel predominavam, cabe abordar perspectivas eventualmente divergentes sobre o downsizing.

Por mais bizarro que possa parecer o motor RD28ETi1 que foi usado principalmente na Europa ainda ter usado cabeçote de fluxo simples, enquanto o TD42 e o TD42Ti mesmo sendo "varetados" já tinham cabeçote de fluxo cruzado, a consolidação do turbo numa faixa de cilindrada mais modesta já deixava clara a relevância que o downsizing tinha em algumas regiões onde a incidência de impostos atrelada à cilindrada era especialmente crítica, e possivelmente uma versão atmosférica do motor menor ficasse insuficiente para proporcionar um desempenho aproveitável. Naturalmente, pelos motores Diesel terem a característica de operar com uma maior proporção de ar pelo volume de combustível injetado, o turbo ser mais favorecido em comparação ao que se poderia observar nos motores a gasolina até seria bastante previsível, e tanto o RD28 quanto o TD42 contarem com injeção indireta através de pré-câmaras parecia irrelevante, ao contrário do que se pode considerar quanto a aplicações do turbo em motores de ignição por faísca como o TB42 e o TB45 que passava a 4.5L ou o TB48 que além de crescer para 4.8L recebia comando de válvulas duplo no cabeçote e 24 válvulas para os quais qualquer implementação de indução forçada iria requerer um enriquecimento da mistura ar/combustível numa época que a injeção direta em motores a gasolina era raridade. Já no caso do ZD30, se por um lado a injeção direta pode desfavorecer o uso de óleo diesel com um baixo índice de cetano que é o principal parâmetro usado para mensurar a propagação de chama nas câmaras de combustão em motores Diesel e desencorajar experiências com o uso direto de óleos vegetais brutos como combustível alternativo, por outro podia facilitar as partidas a frio, e a ascensão da injeção direta nos motores turbodiesel leves por volta do ano 2000 costuma ser creditada por melhorias no torque.

Enquanto o enquadramento do motor ZD30 no conceito do downsizing é incontestável em comparação ao TD42 tanto atmosférico quanto turbo, pode ser mais questionável com relação ao RD28 mesmo que a menor quantidade de cilindros nesse caso seja suficiente para proporcionar uma configuração bastante compacta ao ZD30, considerando o aumento de míseros 127cc ou por volta de 4,5% na cilindrada dos 2826cc do RD para os 2953cc do ZD já contrariando a percepção que o downsizing esteja mais atrelado a uma redução da cilindrada em valores absolutos. Naturalmente uma concepção mais moderna levando em consideração o duplo comando de válvulas no cabeçote e especialmente a injeção direta, ainda que o sistema common-rail tenha demorado um pouco a ser consolidado, dá a entender que algumas premissas do downsizing estavam efetivamente presentes no projeto, bem como a menor quantidade de cilindros e a influência que um motor apto a ser instalado em posição mais recuada com relação ao eixo dianteiro influencie na dirigibilidade tanto em trechos pavimentados quanto em terrenos mais bravios nos quais o Nissan Patrol Y61 se destacava, de modo que o aumento na cilindrada do ZD com relação ao RD ainda ser proporcionalmente menor que a diminuição de 1216cc ou aproximadamente 29% com referência aos 4169cc do "arcaico" TD42. Enfim, certamente o Nissan Patrol Y61 proporciona condições equilibradas para analisar diferentes perspectivas sobre o downsizing, considerando tanto uma concepção compacta do motor ZD30 perante o RD28 quanto uma diminuição da cilindrada em valores absolutos diante do TD42, ainda que possam haver interpretações divergentes pelo RD28 ter uma cilindrada menor.

quinta-feira, 13 de março de 2025

Mazda: errou em subestimar possibilidades para o Diesel no mercado americano?

Uma fabricante famosa pela implementação de soluções que às vezes podem parecer pouco ortodoxas, a Mazda gerou uma imensa expectativa nos Estados Unidos quando a 3ª geração do Mazda 6 começou a ser apresentada ainda em 2012 no Salão Internacional do Automóvel de Moscou, e um dos destaques foi o motor SkyActiv-D turbodiesel de 2.2L e 4 cilindros que foi oferecido em algumas regiões como opção aos SkyActiv-G a gasolina entre 2.0L e 2.5L de acordo com as alíquotas de impostos aplicáveis em cada país onde o modelo é ou foi vendido de forma oficial. Sendo a primeira geração do Mazda 6 a deixar de contar com a opção por um motor V6 a gasolina, cabendo a uma versão turbo do SkyActiv-G de 2.5L a função de ser uma opção mais prestigiosa, é impossível deixar de fazer um paralelo com o contexto que fez motores turbodiesel com apenas 4 cilindros serem alçados a tal condição nas caminhonetes médias no Brasil à medida que os V6 a gasolina passavam a ser desfavorecidos, além do mais que já em 2013 a primeira apresentação de uma versão turbodiesel do Mazda 6 de 3ª geração para os Estados Unidos foi com uma participação no campeonato Grand-Am Rolex Sports Car Series, lembrando que naturalmente a questão das normas de emissões aplicáveis a veículos homologados para uso em vias públicas torna-se menos relevante com relação ao uso exclusivo em competições em circuitos fechados ao tráfego geral. A expectativa pela introdução de um motor turbodiesel para o Mazda 6 de especificação americana foi deixada de lado com o cancelamento dos planos em 2014, sob alegação de dificuldades na homologação pelas normas de emissões Tier 2 que estavam em vigor naquela época, embora um SUV da Mazda tenha contado com a opção por esse mesmo motor apenas em 2019 numa versão homologada de acordo com as normas Tier 3 que entraram em vigor em 2017.

Certamente uma desconfiança em torno dos motores Diesel causada pela deflagração do escândalo que ficou conhecido como Dieselgate em 2015, envolvendo procedimentos irregulares na homologação de versões turbodiesel de alguns modelos da Volkswagen e da Audi, também acabaria levando a crer que o mercado americano sofreria com restrições ainda mais críticas à oferta desse tipo de motor em veículos leves, além das próprias regulamentações de emissões nos Estados Unidos historicamente desfavorávels ao Diesel a ponto de terem um desempenho menos vigoroso para um mesmo motor em comparação às versões de especificação européia que acabam sendo oferecidas também em outras regiões. Pela escala de produção e a logística para reposição de peças que se fizesse necessária visando atender à demanda eventualmente reprimida por motores turbodiesel, antes mesmo da Mazda descontinuar o 6 nos Estados Unidos em 2022 a favor de uma linha mais concentrada em SUVs, era até razoável recorrer a uma única opção de motor turbodiesel para oferecer a uma parte do público que ficou muito concentrada nas mãos da Volkswagen/Audi ou da Mercedes-Benz e da BMW, tendo em vista que essa mesma estratégia já era implementada pelas fabricantes premium alemãs considerando tanto o efeito das normas de emissões sobre o desempenho quanto o mercado americano ser livre do uso da cilindrada como parâmetro para as alíquotas de impostos sobre os automóveis. Enfim, mesmo com a expectativa por evitar o uso de alguns dispositivos de controle de emissões como o SCR ao menos durante a vigência das normas EPA Tier 2 tenha sido ofuscada pelo Dieselgate, e a estratégia de recorrer à variação de fase do duplo comando de válvulas para proporcionar efeito análogo ao de um EGR não-refrigerado de baixa pressão também ser pouco aproveitada, a Mazda errou em subestimar oportunidades para o Diesel nos Estados Unidos.

sexta-feira, 7 de março de 2025

Híbridos em série: poderiam eventualmente justificar um uso de turbinas a gás na propulsão automotiva?

Em meio a uma injustificável demonização que vem sendo promovida contra os motores de combustão interna de um modo geral, mas ainda com uma maior intensidade contra o Diesel a ponto de modelos como o Nissan X-Trail ter perdido a opção pelos motores turbodiesel na 4ª geração enquanto a opção híbrida tem um sistema de propulsão mais semelhante ao de algumas locomotivas e navios valendo-se do motor de combustão interna somente para acionar um gerador a bordo enquanto motores elétricos tracionam as rodas, o regime de operação em rotação constante mais característico de equipamentos estacionários e que também é observado em motores aeronáuticos fomenta questionamentos quanto a uma possibilidade de recorrer a turbinas a gás para o acionamento do gerador. Experiências anteriores com o uso de turbinas a gás para tração direta já chegaram a ser testados, tanto em protótipos voltados a um uso mais normal quanto em competições esportivas, embora tenha sido demonstrada uma inaptidão aos regimes de rotação mais intermitentes que os motores convencionais tanto de ignição por faísca quanto Diesel podem operar com mais desenvoltura. Naturalmente algumas condições mais específicas das turbinas a gás podem dificultar a implementação, principalmente o gerenciamento térmico tendo em vista as temperaturas dos gases de escape costumeiramente mais extremas efetivamente inviabilizando o recurso à recirculação de gases de escape através de um sistema EGR para diminuir a formação dos óxidos de nitrogênio (NOx), e também a integração com outros sistemas embarcados substancialmente diferentes entre um automóvel e uma aeronave ou até um tanque de guerra.
Embora uma turbina a gás, apesar do nome sugerir que funcionasse só com combustíveis gasosos, opere com qualquer combustível que possa ser vaporizado abrangendo desde gasolina e etanol até óleo diesel e substitutivos tão diversos quanto o biodiesel ou óleos vegetais, passando obviamente pelo querosene de aviação que também acaba sendo muito utilizado em veículos e equipamentos militares com motor Diesel para simplificação da logística em campos de batalha, o gerenciamento térmico e implementação de métodos para controle de emissões tendem a ficar demasiado complexos no espaço mais restrito que um automóvel vá disponibilizar comparado a um avião ou um grande navio. Proporcionalmente, ficaria mais adequado a aplicações de porte maior que o de um carro ou SUV de proposta generalista, mesmo considerando eventualmente até um uso de ar sangrado do compressor para um sistema de climatização por ciclo de ar como o de grandes aviões comerciais em vez do sistema de ar condicionado por ciclo de vapor normalmente usado em automóveis. Enfim, mesmo que uma aparente simplicidade atribuída às turbinas a gás pudesse as favorecer também no tocante à manutenção devido a uma menor quantidade de peças móveis, especialmente se fossem usados compressores centrífugos por serem mais simples e terem semelhança com o que se vê nos turbocompressores já massificados tanto em motores do ciclo Otto, especificidades de cada tipo de motor podem fazer com que uma percebida vantagem do menor peso e volume de turbinas a gás poderia ser anulado por uma parafernália de controle de emissões ainda mais complexa que a já observada em automóveis e utilitários.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2025

Toyota Innova de 2a geração: teria feito sentido no Brasil?

Um modelo desenvolvido especificamente de acordo com as necessidades e preferências do sudeste asiático, a Toyota Innova desde o início em 2004 até a 2a geração lançada em 2015 acompanhava sempre o ciclo evolutivo da Toyota Hilux, com a qual compartilha um mesmo projeto básico. As regulamentações referentes à incidência de impostos baseada tanto na cilindrada quanto na tração para os veículos novos na Indonésia, justificando a oferta da Toyota Innova exclusivamente com tração simples em contraste com a presença da Hilux no Brasil mais consolidada ao redor das versões 4X4, podem fazer parecer difícil justificar um modelo como a Innova diante das restrições ao uso de motores Diesel com base nas capacidades de carga e passageiros ou tração que permanecem em vigor no mercado brasileiro. No entanto, a concepção mais tradicional entre caminhonetes, ainda com o chassi separado da carroceria e motor dianteiro longitudinal com tração traseira, já facilita cumprir o requisito da capacidade de carga nominal de ao menos uma tonelada para um veículo de tração simples e menos de 10 assentos incluindo o do motorista ser apto ao uso de motores Diesel no Brasil.

O melhor aproveitamento de espaço diante de um SUV com configuração semelhante é uma vantagem aos olhos de qualquer pai de família asiático tradicional, embora também viesse a calhar no Brasil onde as minivans já viveram dias mais gloriosos antes da moda de SUV, e com certeza uma parte do público que por falta de mais opções tem se rendido a SUVs de tração dianteira cujas capacidades de carga e passageiros os descredenciam ao uso de motores Diesel poderia ficar satisfeita com a austeridade da Toyota Innova de 2a geração. Vale destacar que, apesar de ter sido lançado em 2022 o pretenso substituto para a 2a geração da Toyota Innova, e com a substituição da tração traseira pela tração dianteira sob o falso pretexto de facilitar a implementação de um conjunto motriz híbrido, a aparentemente "obsoleta" 2a geração permaneceu em linha exatamente em função da percepção de maior robustez e aptidão a usos mais severos como tracionar reboques e a disponibilidade dos motores turbodiesel também usados na Toyota Hilux. Enfim, talvez por motivos diferentes dos que levaram ao surgimento do modelo visando atender à Indonésia, e mais complexos que a anterior presença na Argentina de onde às vezes aparecem exemplares com turistas em viagem pelo Brasil, a Toyota Innova de 2a geração poderia ser bem recebida por unir robustez e aptidão ao uso de motores Diesel no Brasil mesmo com tração simples.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Caso para reflexão: Fiat Strada e a ascensão do downsizing junto à ignição por faísca como um falso pretexto para ignorar eventuais preferências pelo Diesel

Um modelo que certamente é emblemático quando são abordadas as evoluções das décadas recentes no tocante aos motores Diesel leves, a Fiat Strada da primeira geração produzida entre '98 e 2020 chegou a contar com tal opção para atender a mercados de exportação, desde o 1.9 que ainda dispunha de injeção indireta e aspiração atmosférica e o 1.7 turbodiesel com injeção indireta até os 1.3 e 1.9 turbodiesel que já contavam com injeção direta common-rail gerenciada eletronicamente. No caso do Brasil, em função de regulamentações extremamente restritivas que impediram a venda de versões Diesel tão somente por conta das capacidades de carga e passageiros e da tração simples, prevaleceu a ignição por faísca, tanto em versões só a gasolina e apenas uma rara versão do antigo motor 1.5 Fiasa só a álcool que acabariam dando lugar às versões flex já a partir de 2004, enquanto para exportação a oferta de motores a gasolina variava de acordo com as regiões onde o modelo foi oferecido. No caso da Europa, onde se observava a clara preferência pelo Diesel no mercado de veículos utilitários, a única opção a gasolina costumava ser o menor motor disponível na linha, situação que de certa forma reforçava uma posição de "prestígio" do turbodiesel que estivesse disponível em simultâneo, embora em países como a Argentina ou o Paraguai nunca tenha sido nenhum problema o motor 1.3 Multijet turbodiesel ter cilindrada menor que o e.Torq 1.8 a gasolina quando ambos eram oferecidos em configurações de exportação para a versão Adventure.
Se na geração anterior prevalecia a aspiração atmosférica nos motores de ignição por faísca, enquanto o turbo e a injeção direta ficaram claramente consolidados entre adeptos dos motores Diesel, atualmente a disseminação do downsizing que fez um motor 1.8 como o antigo e.Torq perder espaço para uma versão 1.0 turbo flex do GSE/Firefly introduzida em 2023 para o ano-modelo 2024 pode ser equivocadamente apontada como um pretexto para ignorar eventuais preferências de uma parte até bastante conservadora do público por um turbodiesel, que o 1.3 Multijet ainda poderia atender confortavelmente caso estivesse ainda em produção. Naturalmente um comodismo em torno da aparente simplicidade que hoje tem sido atribuída com maior frequência à ignição por faísca, somada à maior facilidade para partida a frio com o álcool/etanol tanto no Firefly 1.3 atmosférico em função de um pré-aquecimento do combustível nas versões flex à venda no Brasil quanto no 1.0 turbo flex por conta da injeção direta, até poderiam levar a crer que uma disponibilidade do motor turbodiesel ficasse redundante, e também o uso do sistema SCR para controle dos óxidos de nitrogênio (NOx) que tem sido inevitável nos motores turbodiesel diante do recrudescimento das normas de emissões acabaria sendo outro aspecto difícil para uma parte do público assimilar tão facilmente. Tendo em vista ainda haver operadores profissionais, para os quais ainda possa haver o apelo de padronizar um único combustível em veículos de diferentes categorias ou maquinário especializado mesmo necessitando do fluido-padrão AdBlue/ARLA-32/ARNOx-32 para o sistema SCR funcionar satisfatoriamente, o motor 1.0 turbo flex ter um pouco mais de potência e um torque próximo ao da última especificação do 1.3 Multijet passa longe de ser um motivo totalmente coerente para tratar o downsizing associado à ignição por faísca como única opção viável, além do mais que a injeção direta em motores de ignição por faísca mais recentes vem sendo apontada como empecilho para um eventual sucesso de conversões para o gás natural que já é frequentemente tratado como alternativa para reduzir uma dependência pelo óleo diesel convencional e também pelo biodiesel em utilitários pesados como caminhões e ônibus.
Em diferentes momentos históricos, a aparente "desvantagem" dos motores Diesel no tocante à potência e torque específicos (proporcionalmente à cilindrada) era solenemente ignorada por aqueles operadores com um perfil mais tradicional, mais apegados à economia de combustível esperada dos motores Diesel na comparação aos concorrentes de ignição por faísca, e portanto a maior aceitação do downsizing entre os motores de ignição por faísca na atualidade acaba basicamente replicando aquele contexto quando os motores Diesel atmosféricos terem cilindrada maior que os de ignição por faísca também atmosféricos e em faixas de potência ou torque o mais diretamente comparáveis possível era absolutamente normal. As diferentes regulamentações quanto à incidência de impostos atrelada à cilindrada talvez desfavoreçam o Diesel até mais que a percepção de inconvenientes práticos como a necessidade de repor o AdBlue para o SCR funcionar, ou ainda o maior custo inicial que ainda tende a ser mais frequente nos veículos leves onde o uso em veículos sem distinção por capacidades de carga e passageiros ou tração é permitido, e a obsessão de uma parte dos gestores dos principais fabricantes de veículos pelos sistemas híbridos como a própria Fiat já oferece em outros modelos equipados com o mesmo motor Firefly 1.0 turbo flex usado na Strada. Enfim, apesar de circunstâncias mais políticas que estritamente técnicas darem mais destaque ao downsizing associado à ignição por faísca, permanece incoerente tratar como pretexto válido para a eventual preferência de uma parte do público pelo Diesel passar a ser solenemente ignorada.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

Caso para reflexão: Chevrolet Silverado 1500 de 4ª geração e percepções acerca da quantidade de cilindros

Embora o uso do nome Chevrolet Silverado na geração GMT400 das pick-ups full-size Chevrolet C/K em versões argentinas e posteriormente brasileiras possa causar confusão, tendo em vista que só deixou de designar um pacote de acabamento para ser o nome do modelo a partir da geração seguinte, de modo que a atual é somente a 4ª geração da Silverado nos Estados Unidos, é um dos exemplos mais oportunos de como a quantidade de cilindros pode exercer uma influência psicológica que chega a se sobrepor aos aspectos estritamente técnicos no momento de pontuar qual seria o melhor motor. A volta da Silverado ao Brasil em 2023 através de importação oficial, vinda do México somente na versão top de linha High Country com o motor 5.3 V8 small-block a gasolina, sem ao menos a opção pelo 6.2 também V8 nem pelo 3.0 turbodiesel de 6 cilindros em linha que é o principal motor oferecido em países vizinhos como o Paraguai e o Uruguai, ganha contornos ainda mais emblemáticos quando recordamos que substituiu o motor 4.3 V6 a gasolina em versões básicas pelo atual 2.7 turbo também a gasolina mas com apenas 4 cilindros em linha. Chega a ser curioso observar como o motor menor é capaz de superar o 5.3 na maior parte das condições normais de uso, para só então começar a engolir um caroço próximo das 4300 RPM e talvez ser mais desfavorecido por manter o câmbio automático de 8 marchas, enquanto outros motores já são oferecidos com o câmbio automático de 10 marchas.

Assim como a mística em torno do motor V8 a gasolina como expoente máximo de americanidade ecoa forte junto a um público mais estritamente recreativo, e um motor de 6 cilindros ao menos no âmbito da ignição por faísca fosse considerado basicamente um "prêmio de consolação" ou então apontado como uma modesta concessão à economia de combustível, é natural que pela proposta do motor turbodiesel declaradamente como uma opção econômica tenha sido imbuída de uma maior "credibilidade" tendo 6 cilindros, e em linha como é comum em caminhões pesados até mesmo nos Estados Unidos, e no caso do motor a gasolina desenvolvido de acordo com premissas do downsizing a configuração ainda mais radical com apenas 4 cilindros suscite dúvidas quanto à efetiva aptidão a um uso mais severo. Poderia ficar talvez mais fácil apaziguar uma parte do público mais refratária ao downsizing recorrendo no 2.7 a uma configuração de 6 cilindros como a do antigo 4.3 V6 substituído, mesmo às custas de maior atrito interno e inércia que entrariam em confronto com a proposta de eficiência, e ignorando também como a tecnologia do turbo evoluiu desde a época que Nélson Piquet chegou a ser campeão usando um motor BMW turbo com só 4 cilindros que apresentava um turbo-lag mais acentuado que os V6 twin-turbo de concorrentes. E mesmo considerando que o turbodiesel permanece como o motor mais interessante da atual geração da Chevrolet Silverado 1500, só começando a engolir algum caroço tanto para o 2.7 turbo quanto para o 6.2 V8 quando se aproxima do corte, e portanto fora de um regime de rotações que possa ser considerado normal em velocidades de cruzeiro, é inegável que em alguns pontos um aspecto mais psicológico que técnico pode alterar a percepção sobre um motor com base na quantidade de cilindros.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025

Triciclos: mesmo que pudessem ser favorecidos pela restrição ao Diesel em automóveis, seguem desfavorecidos culturalmente no Brasil

Um país como o Brasil às vezes apresenta situações difíceis de explicar para muitos estrangeiros, ou até mesmo entre brasileiros podem surgir observações quanto a peculiaridades relacionadas aos temas mais variados, e o mercado de veículos motorizados proporciona perspectivas inusitadas para avaliar os mais diferentes cenários e como eventualmente uma solução técnica específica pareça ser pouca aproveitada frente aos benefícios que seja capaz de oferecer. O caso dos pequenos triciclos utilitários, desde antigos modelos configurados de fábrica como tal e baseados em projetos italianos como o Lambrecar derivado da Lambretta até adaptações feitas a partir da Honda CG, é um daqueles que poderiam ser considerados até uma eventual reação diante das arbitrárias e obsoletas restrições ao uso de motores Diesel tanto em carros quanto em caminhonetes e outros utilitários compactos. Percepções um tanto equivocadas acerca do tamanho do motor como se fosse o aspecto mais determinante para alcançar a economia operacional, especialmente destacados pela proporção entre motores de carros "populares" e os que equipam alguma motocicleta ou assemelhado com proposta declaradamente utilitária, certamente poderiam exercer uma influência até junto a uma parcela do público generalista, bem como uma manobrabilidade em espaços exíguos que possa ser atribuída à maioria dos modelos dessa categoria.
Talvez a indústria motociclística ter sido considerada menos prioritária no âmbito político quando ainda começava a ganhar espaço a fabricação brasileira de automóveis e principalmente de caminhões durante o governo JK, sendo inegável uma grande influência técnica dos então maiores fabricantes de veículos a nível mundial sediados nos Estados Unidos antes da meteórica ascensão da Volkswagen beneficiada pelas condições geográficas brasileiras muito mais desafiadoras e um contraste cultural que emergia em meio ao último grande fluxo de imigrantes europeus e japoneses buscando reconstruir no Brasil as vidas duramente afetadas pela II Guerra Mundial, ainda ecoe hoje entre quem vê triciclos como um improviso típico de países menos desenvolvidos que deva ser repelido em vez de incentivado. E mesmo agora com a injeção eletrônica acabado com a hegemonia do carburador até em motos de proposta popular, além de proporcionar aptidão para reabilitar o álcool/etanol com os motores flex e eventualmente ainda poder ter bons resultados com o gás natural caso o Ibama liberasse o uso em motos e assemelhados, continua mais fácil ver triciclos de pequena cilindrada em aplicações estritamente utilitárias/profissionais que em uso como um veículo privado, tendo em vista como ficam distantes daquela imagem de ascensão social que ainda se atribui com frequência à propriedade de veículos motorizados no Brasil. Enfim, mesmo com condições técnicas e econômicas que os pudessem favorecer, especialmente à medida que o custo de um carro "popular" os distancia daquela premissa consolidada entre os governos Collor e Itamar, os triciclos só permanecem relevantes no Brasil em aplicações essencialmente comerciais, menos afetadas por aspectos desfavoráveis de uma cultura automobilística um tanto confusa e favorecidos em parte pela restrição ao uso de motores Diesel em utilitários que ainda possam ser visto como mais "nobres".

segunda-feira, 27 de janeiro de 2025

Caso para reflexão: Ford F-250 e diferentes parâmetros para conceituar o downsizing

A história da fabricação brasileira da Ford F-250 foi marcada por algumas peculiaridades, em especial no tocante às configurações dos conjuntos motrizes disponíveis para o mercado local e poucos destinos de exportação regional no âmbito do Mercosul, contrastando tanto com versões produzidas nos Estados Unidos quanto algumas que chegaram a ser feitas no Brasil exclusivamente para exportação a países de mão inglesa como a Austrália e a África do Sul. Francamente seria até perda de tempo abordar o uso do motor Essex V6 canadense que com 4.2L foi o único a gasolina que chegou a ter uma pequena presença entre o lançamento em '98 até 2003, em contraste com os motores Triton V8 de 5.4L e V10 de 6.8L que foram oferecidos no modelo americano, embora no âmbito dos motores turbodiesel a diferença também tenha sido significativa. Num primeiro momento a Ford deu continuidade no Brasil à estratégia de usar um motor turbodiesel de concepção bastante modesta e concepção essencialmente destinada a máquinas agrícolas, no caso o Cummins B3.9 ou 4BTAA em calibração com uma potência de 145cv a 3000 RPM e torque de 47 kgfm a 1500 RPM numa configuração bastante conservadora com comando de válvulas no bloco e somente duas válvulas por cilindro, que permaneceu até 2001 quando uma substituição pelo MWM Sprint 6.07 TCA de 6 cilindros em linha e 4.2L com 180cv a 3400 RPM e 51 kgfm a 1600 RPM iniciada já em '99 foi consolidada, até um surpreendente retorno do motor Cummins em 2006 em versão atualizada com injeção eletrônica common-rail e 4 válvulas por cilindro que desenvolvia 203cv a 2900 RPM e 56 kgfm a 1500 RPM.

Na comparação com os motores Power Stroke V8 de 7.3L oferecido até 2003 nos modelos americanos e 6.0L de 2003 a 2007, a abordagem da operação brasileira da Ford com relação às primeiras versões com motor Cummins podiam ser facilmente percebidas como um downgrade motivado essencialmente pelo custo e disponibilidade regional imediata, atendendo especificamente a um público que ainda priorizava o uso profissional e já havia assimilado em gerações anteriores de pick-ups full-size essa solução mais austera que remontava à época das primeiras crises do petróleo da década de '70 e as severas restrições à importação de veículos no Brasil que vigoraram entre '76 e '90. Já o motor MWM, que incorporava o conceito de motor de alta rotação com comando de válvulas no cabeçote e uma curiosa configuração de 3 válvulas por cilindro, podia ser efetivamente enquadrado na definição de downsizing mesmo com um desempenho perceptivelmente mais modesto frente aos 238cv a 2600 RPM e 69,2 kgfm a 1600 RPM do Power Stroke 7.3 de '99 a 2000 ou depois 253cv com câmbio manual e 279cv com câmbio automático a 2700 RPM e 72,6 kgfm a 1600 RPM, além das dimensões mais compactas e o peso menor do MWM apesar da cilindrada maior comparado ao Cummins. E apesar de tanto o Power Stroke de 6.0L e 330cv a 3300 RPM e 77,4 kgfm até 2004 ou 78,8 kgfm até 2007 às mesmas 2000 RPM oferecido no modelo americano de 2003 a 2007 quanto a versão atualizada do Cummins que equipou o modelo brasileiro de 2006 a 2011 terem passado a contar com 4 válvulas por cilindro mesmo mantendo comando de válvulas no bloco, e o Power Stroke recebendo o turbocompressor de geometria variável, a inusitada substituição do MWM de concepção essencialmente mais moderna pelo Cummins modernizado ter sido apresentada como exemplo claro do downsizing por alguns setores da mídia à época ainda suscita uma reflexão.

Mesmo que passar de um motor de 6 cilindros para outro com 4 cilindros pudesse ser interpretado como uma medida bastante óbvia rumo ao downsizing, bem como uma efetiva diminuição de cilindrada que na Ford F-250 brasileira foi de somente 278cc entre os 4198cc do MWM para os 3920cc do Cummins e portanto representando valores aproximados entre 6,6% da cilindrada do MWM e 7,1% do Cummins, a diferença entre o peso de 260kg do MWM para os 367kg do Cummins acaba indo contra uma premissa que também está entre as principais do downsizing. Um menor peso do conjunto motriz, especialmente quando acompanhada de dimensões externas mais compactas que permitam uma maior centralização da distribuição de peso entre os eixos para favorecer o balanceamento em diferentes condições de carga, pode fazer com que o motor MWM ainda permanecesse como um exemplo mais claro de downsizing, mesmo diante de características que permitem intuir que uma comparação nesse âmbito fosse mais justa diante de versões com 6 cilindros da mesma linha dos motores Cummins Série B, lembrando ainda que eventuais diferenças nas faixas de rotação onde são atingidos os picos de potência e torque podem levar a diferentes percepções quando associadas a relações de marcha (tanto de câmbio quanto de diferencial) otimizadas conforme as curvas de potência e torque de cada motor para um desempenho final que possa ser equiparável. Enfim, mesmo que duas premissas básicas do downsizing estivessem claras quando o motor Cummins voltou a ser oferecido na F-250 brasileira, é até certo ponto questionável o quanto tal medida seguiu preceitos mais ortodoxos para conceituar o que seria um downsizing.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2025

Teria a pauta da liberação do Diesel em veículos leves enfraquecido diante da popularidade do motor Fiat Fire junto a um público mais conservador?

Um motor cuja chegada ao Brasil em '99 pode ser considerada meio tardia tendo em vista o lançamento mundial em '85, mas certamente foi de suma importância para a Fiat romper em 2001 a longa sequência de liderança da Volkswagen no mercado brasileiro, o motor Fire tornou-se favorito tanto de uma parte do público generalista pela simplicidade e facilidade de manutenção quanto de operadores profissionais como taxistas também pela adaptabilidade a combustíveis alternativos que foi do álcool/etanol no Brasil ao gás natural também em outros países. Apesar da produção européia ter iniciado ainda valendo-se até de carburadores e da injeção eletrônica monoponto, bem como do comando de válvulas simples e duas válvulas por cilindro como ficaria bem sucedido também junto à clientela brasileira mais conservadora, a chegada ao Brasil no final de '99 com comando duplo e 4 válvulas por cilindro e a injeção eletrônica multiponto foi apresentada em peças publicitárias da época como grande progresso tecnológico devido à presença do acelerador eletrônico com primazia entre automóveis de fabricação nacional, enfatizado em propagandas como tecnologia oriunda da Fórmula 1. Com o encerramento da produção do motor Fire no Brasil em meio à transição da linha 2024-2025, tendo como substituto o motor GSE/FireFly que teve lançamento mundial em 2017 precisamente no Brasil e também agradando desde então ao público consevador, é possível apontar o Fire entre daqueles motores mais influentes na história automobilística recente, e em alguns momentos a popularidade desse motor até possa ter inibido avanços para a pauta da liberação do uso de motores Diesel em veículos leves no Brasil, até pela circunstância política que ainda favorece os motores de 1.0L com tributação menos desfavorável no âmbito dos carros populares.
A percepção de simplicidade, consolidada à medida que versões com comando simples e duas válvulas por cilindro cobrindo as faixas de cilindrada de 1.0L e 1.4L acabaram fazendo que já em 2003 saísse de cena a configuração com 4 válvulas por cilindro, tendo em vista que ficava mais econômico produzir os motores acima de 1.0L com só duas válvulas por cilindro em detrimento da versão 1.0 de 16 válvulas, e assim superando aquele estigma que o brasileiro médio tinha acerca dos motores de 16 válvulas como letárgicos em baixas rotações e de manutenção mais complexa. Com a chegada das versões flex ainda em 2003 inicialmente com o motor 1.3 de 8 válvulas que passou a 1.4 no ano seguinte, e em 2006 o 1.0 também incorporava a capacidade de operar com gasolina e álcool/etanol, o motor Fire já estava bem aceito pelo público conservador, e alguns daqueles breves momentos de euforia nacionalista em torno do álcool como combustível do futuro certamente pesaram para fazer com que propostas pela liberação do Diesel em veículos leves ficassem em segundo plano, além de ter sido apresentada ainda em 2006 a versão 1.4 Tetrafuel apta a operar tanto com gasolina e álcool quanto gás natural que era exclusiva para o Siena mas tornou-se muito apreciada pelos taxistas. Enfim, após ter servido tanto a inúmeras famílias brasileiras que associavam pequena cilindrada a uma expectativa de economia de combustível quanto a usuários profissionais que em determinadas circunstâncias podiam apostar no gás natural ou no álcool como paliativos diante de restrições ao uso de motores Diesel em veículos leves, é inegável que o motor Fire pode ter sido tão decisivo quanto a antiga hegemonia da Volkswagen desde a época áurea do Fusca até como pretexto para desacreditar eventuais propostas e iniciativas pela liberação do Diesel.

quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

Integração mais eficiente a retardadores de frenagem: uma vantagem do câmbio automático em associação aos motores Diesel

Com o Brasil sendo um dos maiores produtores de ônibus a nível mundial, o mercado interno ainda tem espaço tanto para modelos de concepção moderna incorporando todos os avanços tecnológicos quanto para chassis com motor dianteiro, frequentemente referidos como sendo uma mera adaptação de chassis de caminhões. Uma característica que ainda é alvo de controvérsias é o câmbio automático, de presença mais restrita a ônibus urbanos de motor traseiro e já sendo obrigatório nos articulados, e principalmente o custo inicial dita a preferência de gestores de frotas por tal opção, mesmo com alguns dos fabricantes de chassis em operação no Brasil como a Mercedes-Benz disponibilizando esse recurso como opcional até em alguns chassis de motor dianteiro, enquanto outros como a Iveco e a Volkswagen apostaram nos automatizados para os chassis destinados a ônibus urbanos tão somente pela percepção de simplicidade e facilidade de manutenção a serem proporcionadas pela maior similaridade com os câmbios manuais. Mas há ao menos um aspecto que torna o câmbio automático ainda mais desejável até pela segurança, que é uma integração mais eficiente aos mais diversos dispositivos retardadores de frenagem, apesar de ser possível associar um Retarder hidráulico ou eletromagnético com os câmbios manuais, e a imensa maioria dos utilitários pesados modernos com motor turbodiesel tenha algum sistema de freio-motor. 
Até pela maior similaridade técnica com caminhões, frequentemente atribuída aos chassis para ônibus de motor dianteiro e que tanto agrada a gestores de frotas com um perfil mais conservador, era natural a aposta de alguns fabricantes pelo câmbio automatizado de embreagem única como uma alternativa mais fácil de ser assimilada no tocante a custos de aquisição e manutenção comparada ao câmbio automático, embora em algumas condições o acoplamento entre motor e câmbio ser por fricção (lembrando até que embreagem em italiano é frizione) vá invariavelmente exigir uma interrupção do acoplamento do motor ao câmbio para evitar que o motor "morra" com todos os inconvenientes que tal situação pode acarretar. Como o câmbio automático permanece constantemente acoplado ao motor, tanto o uso de retardadores de frenagem incorporados ao câmbio quanto de um freio-motor quando aplicados simultaneamente fica mais efetivo, o que é especialmente útil quando a topografia apresente mais variações ao longo da rota, o que contribui ainda mais para prolongar a vida útil do material de atrito dos freios de serviço, portanto favorecendo a economia operacional mesmo diante de alegações que um câmbio automático sempre vá ser somente uma fonte de despesas em função do aumento no consumo de combustível que era comum nas gerações anteriores de câmbios automáticos e eventuais manutenções corretivas realmente exigirem um maior grau de especialização comparando aos câmbios manuais. A evolução exponencial observada no gerenciamento eletrônico tanto dos motores quanto dos câmbios automáticos hoje proporciona uma integração mais efetiva dos conjuntos motrizes otimizando desempenho e eficiência, além de ter ficado mais comum os câmbios automáticos terem a mesma quantidade de marchas ou até mais marchas que um manual, de modo que um maior espaçamento entre a primeira e a última marcha (gear-spread) e o bloqueio do conversor de torque já permitem equiparar ou até superar a economia de combustível mais constantemente associada aos câmbios manuais, além de alguns procedimentos como a troca de fluido hidráulico ATF e filtros em um câmbio automático ainda poder levar menos tempo e em intervalos mais longos comparada a substituições de conjuntos de embreagem em um veículo com câmbio manual, o que se reflete em uma maior disponibilidade do veículo para efetiva operação.
O contraste da permanência do câmbio manual em chassis de ônibus com motor dianteiro, que acabam tendo uma diferenciação menor para aplicações urbanas e rodoviárias, enquanto para os chassis com motor traseiro nos quais o câmbio automático é prevalente nos urbanos enquanto entre os rodoviários o automatizado foi mais difundido tal qual acontece nos caminhões, pode suscitar dúvidas junto a alguns operadores de perfil mais conservador acerca das vantagens que o câmbio automático proporcione, bem como o público brasileiro ainda seja predominantemente leigo quanto a retardadores de frenagem até em parte pela relativa demora para motores Diesel ficarem mais difundidos em veículos leves em meio à ascensão de pick-ups e SUVs. Até a presença de algum sistema de freio-motor, geralmente atuando no escapamento para forçar uma redução das rotações do motor, costuma passar despercebida pelo público generalista exatamente por ser algo mais específico dos motores Diesel, ainda que também seja viável a aplicação em veículos leves e ocupe muito menos espaço que um retardador de frenagem hidráulico ou eletromagnético incorporado ao câmbio, e portanto uma melhor integração entre o quase onipresente freio-motor e os câmbios automáticos torna-se ainda mais relevante. Naturalmente um freio-motor ou os retardadores de frenagem são apenas dispositivos suplementares, embora atenuem uma desvantagem inerente à menor restritividade ao fluxo de ar de admissão que historicamente favorecia motores Diesel no tocante à eficiência geral, de modo que os freios de serviço devem ser usados normalmente durante a parada completa do veículo.
Além dos câmbios automáticos modernos frequentemente poderem ser acoplados a motores com mais torque dentro de uma mesma faixa de potência comparados a um câmbio manual, que também poderia atender melhor tanto a deslocamentos de tropas militares por trechos mais longos e com maior variação da topografia e condições de terreno quanto em linhas de ônibus em regiões periféricas para as quais era implementada até uma precária adaptação de chassis com motor dianteiro e câmbio manual ao uso em ônibus articulados cujo peso excessivo impunha desafios mais intensos à durabilidade da embreagem e dos freios, é inegável que o conforto e a redução de fadiga do motorista contribuem para a segurança no transporte de passageiros. Mesmo que o câmbio automatizado tenha conquistado um maior destaque em caminhões, até por uma similaridade no princípio de funcionamento com os câmbios manuais favorecer a assimilação de procedimentos de manutenção preventiva e corretiva junto a operadores de perfil mais conservador, nos ônibus urbanos é possível encontrar um cenário operacional que oferece perspectivas para avaliar vantagens que o câmbio automático vem oferecendo. E novamente, considerando desde um efeito multiplicador do conversor de torque até um espaçamento mais amplo entre a primeira e a última marcha em gerações mais recentes de câmbios automáticos, uma possibilidade de manter as rotações do motor mais constantes e dentro da faixa de máxima eficiência mesmo diante de variações nas condições de topografia e terreno tem sido outra vantagem tanto no tocante à economia de combustível quanto para uma desaceleração mais ágil mediante o uso de um freio-motor ou um Retarder incorporado ao câmbio.
No caso dos ônibus articulados, para os quais uma prevalência do câmbio manual em chassis de motor dianteiro fomentou à suposição que tenha passado a ser obrigatório o uso de motor central ou traseiro, a melhor adequação do câmbio automático tem sido indiscutível, mesmo que ao menos teoricamente um maior conforto para o motorista e um acoplamento mais eficiente entre motor e câmbio já pudessem ser proporcionados pelos câmbios automatizados. O acoplamento hidrodinâmico e sem interrupções entre o motor e o câmbio automático, capaz de proporcionar uma maior suavidade em mudanças de marcha até sob condições de carga intensas e variações na topografia ao longo do trajeto, também tende a favorecer a segurança nessas mesmas circunstâncias, e usuários/operadores até em veículos leves também podem vir a disfrutar dessas mesmas vantagens desde aquelas aplicações estritamente profissionais ainda vistas por uma parte do público generalista como as principais para um motor Diesel até usos particulares ou recreativos com a ascensão de pick-ups e SUVs. Enfim, por mais que melhorias na integração com os dispositivos retardadores de frenagem fiquem mais evidentes observando veículos pesados, um câmbio automático moderno também apresenta uma vantagem incontestável nesse aspecto quando associado a motores Diesel.