quinta-feira, 1 de março de 2018

Alemanha e a autorização para restrições à circulação de veículos com motor Diesel: uma forma equivocada de lidar com a questão das emissões

Em meio a toda a histeria causada após o "Dieselgate", que inegavelmente causou danos à reputação de uma das principais indústrias automobilísticas não só da própria Alemanha mas também a nível mundial que é a Volkswagen, algumas medidas um tanto insensatas vem sendo tomadas. A mais nova manifestação da histeria anti-Diesel foi a autorização conferida pela justiça alemã na última terça-feira (27/02) para que cidades possam restringir a circulação de veículos equipados com motor Diesel homologados em normas de emissões já defasadas diante da atual Euro-6, atingindo também modelos relativamente recentes ainda enquadrados na Euro-5. Naturalmente, veículos mais antigos tendem a apresentar sistemas de controle de emissões menos eficazes, ainda mais no caso dos óxidos de nitrogênio (NOx) que tem sido cada vez mais relevantes. Mas até que ponto a pura e simples proibição à circulação seria de fato eficiente?

A decisão do Tribunal Superior Administrativo de Leipzig dá respaldo à restrição ao tráfego dos veículos que vem sendo implementada em algumas áreas de Stuttgart e Dusseldorf por influência da organização Deutsche Umwelthilfe (DUH), mas vinha sendo contestada por governos regionais. É inevitável traçar um paralelo com o projeto semelhante apresentado por um vereador petista visando uma proibição à circulação de veículos com motor Diesel em São Paulo, que no fim das contas teria um impacto sobre a integração econômica tanto a nível metropolitano quanto estadual e nacional, o que já poderia evidenciar uma inadequação da medida. Naturalmente, no caso da Alemanha é possível alegar que a implementação dos "corredores azuis" com disponibilidade do gás natural nos principais eixos rodoviários da União Européia o domínio alemão da tecnologia do biogás/biometano poderiam minimizar o impacto da medida sobre o transporte comercial, mas o custo torna-se alto demais para o cidadão comum que tenha aderido ao Diesel numa época em que o atual cenário de caça às bruxas parecia mais distante. E a bem da verdade, considerando que alguns veículos dotados de motor Diesel com tecnologias mais antigas apresentam uma melhor adaptabilidade a combustíveis alternativos como biodiesel e óleos vegetais brutos, chega a soar contraditório que tal condição seja sumariamente ignorada. Vale lembrar o caso da Elsbett, empresa alemã que apresentou na década de '80 um motor "semi-adiabático" otimizado para uso direto de óleos vegetais como combustível, e ainda detém a tecnologia para conversão de motores Diesel mais convencionais para operar com óleos vegetais.

Num momento em que estariam livres da restrição apenas 2,6 milhões, que representam apenas 8,6% de um total de 15 milhões de veículos com motor Diesel hoje em circulação na Alemanha, o impacto financeiro de uma readequação da frota já seria absurdo, bem como o gasto de energia envolvido não só na fabricação de veículos que venham a substituir os que seriam retirados de circulação mas até no sucateamento e reciclagem dos modelos antigos. Na pior das hipóteses, ainda faria mais sentido sob o ponto de vista da "sustentabilidade" um incentivo ao repotenciamento com motores mais "limpos" em veículos enquadrados nas normas de emissões hoje defasadas visando um prolongamento da vida útil operacional dos mesmos mas, de qualquer forma, uma pura e simples proibição à circulação sem ao menos considerar outras medidas eventualmente mais eficazes e de custo mais contido não deixa de ser contraditória. E até mesmo algumas estratégias hoje mais direcionadas a aplicações de alto desempenho, como a injeção suplementar de água com algum álcool (normalmente metanol, embora o etanol também possa servir satisfatoriamente), já podem oferecer bons resultados também no tocante ao controle de emissões, visto que proporcionam tanto uma queima mais completa do óleo diesel (ou de substitutivos como o biodiesel ou óleos vegetais brutos) quanto uma diminuição na formação dos óxidos de nitrogênio.

Apesar de tanto as emissões de material particulado (a fuligem negra visível em suspensão na fumaça como consequência de uma combustão incompleta) quanto de óxidos de nitrogênio serem de fato um calcanhar-de-Aquiles do ciclo Diesel, fica evidente que uma restrição meramente arbitrária a esse tipo de motor é rodeada de incoerências. Afinal, mesmo que os transtornos fossem ainda mais intensos se a medida fosse extensiva a veículos equipados com motor de ignição por faísca, convém salientar que alguns motores a gasolina enquadrados no conceito do downsizing fazendo uso do turbo e da injeção direta já começam a se aproximar do Diesel nessa deficiência em virtude da proporção mais pobre de combustível com relação ao fluxo de ar de admissão e as taxas de compressão mais altas levarem a um aumento nas temperaturas propício à formação de óxidos de nitrogênio, e a vaporização menos efetiva da gasolina em comparação a motores com injeção eletrônica convencional no coletor de admissão fazer com que até os teores de material particulado estejam se aproximando do que se observa nas novas gerações de motores Diesel em função das discrepâncias entre os sistemas de controle de emissões, que permanecem menos complexos nos motores de ignição por faísca. Também é conveniente observar que existe uma defasagem na certificação das normas de emissões em vigor para motos, sendo que atualmente na Europa estas seguem hoje as normas Euro-4, mas aparentemente ninguém faz o mesmo esforço para equiparar a certificação ambiental das motos aos carros...

Tendo em vista uma eventual queda no valor de revenda dos "paus véios" movidos a óleo diesel que não fossem desovados em alguns países da África, Oriente Médio e outras regiões onde se permita a importação de carros usados, ou que a depreciação também se torne acentuada nesses mercados num primeiro momento após a efetiva implementação das restrições à circulação na Alemanha, há de se avaliar quais seriam as opções para proprietários de alguns automóveis que viessem a ser atingidos pela medida cujo valor de revenda não seja mais tão significativo como é o caso daqueles que já estejam próximos aos 20 anos de idade. Vamos supor que o proprietário de um Alfa Romeo 146 com motor 1.9 JTD ainda certificado nas normas Euro-3 não desejasse abrir mão do Diesel, e até não visse problema em partir para um modelo atual de um segmento imediatamente inferior e já certificado nas normas Euro-6 como por exemplo um Peugeot 208, acabaria tendo que gastar um valor bastante alto. A preços de hoje no site da Peugeot na Alemanha, o 208 BlueHDi FAP mais barato não sai por menos de €20.450, além de ter o inconveniente de requerer o fluido AdBlue (o mesmo conhecido no Brasil como ARLA-32). Restaria ter que se conformar em abrir mão do Diesel e recorrer a uma moto com side-car como se fazia na Alemanha antes do lançamento do Fusca???

Considerando também aspectos culturais, como a preferência de agricultores por veículos com motor Diesel, fica mais difícil o escoamento da produção de pequenas propriedades agrícolas sem depender dos atravessadores. Também não seria conveniente subestimar o impacto sobre o turismo tanto entre diferentes regiões da Alemanha quanto de países vizinhos. Por mais que a poluição atmosférica seja de fato um problema a ser encarado com seriedade, uma simplória demonização do Diesel impede estratégias mais eficazes para integrar diversas soluções técnicas sem que isso signifique abrir mão da segurança energética. Enfim, por mais que a restrição à circulação possa soar conveniente para alguns grupos com interesses obscuros em âmbito político que usam um pretexto supostamente ecológico, na prática essa é uma forma equivocada de lidar com a questão das emissões...

12 comentários:

  1. Enquanto isso fico eu aqui querendo um carro desses que o europeu está sendo obrigado a tratar como "lixo", e não podendo importar nem como peça de colecionador por não terem chegado aos 30 anos.

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  2. O mundo está andando para trás mesmo. Coisa séria é varrida para baixo do tapete, mas os políticos não perdem a chance de fazer alguma palhaçada só para se mostrar como o salvador da pátria.

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  3. Esses autoproclamados "ecologistas" vão foder a Alemanha de vez com essa presepada.

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  4. Sigo esperando que no lo chatarrizen a todo el parque automotriz que se va sacar de circulación en Alemania, quizás lo vendan en Paraguay. Yo me compraria un Alfa Romeo como ese para reemplazar a mi Corolla 2.0D ahora que no llegan más Corollas Diesel desde Japón.

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  5. De partir para uma moto eu até não acredito que seja para tanto, mas com certeza uma medida nesse sentido dá uma desanimada mesmo.

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  6. Os alemães vão pagar um preço caro demais se não pularem fora dessa canoa furada que se tornou a UE.

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  7. Seria injusto tirar de circulação carros em estado decente de conservação apenas para os que se dizem ecologistas demonstrarem poder. E a manutenção de modelos anteriores a 2000, quando ainda era fácil encontrar motores que não tinham turbo, permanecia mais fácil.

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  8. Sou neto de imigrante alemão, e o opa tinha pavor de "seitenwagen" por ter sido muito usado na guerra. Considerando que não é só no Brasil que aposentado sofre, e que ainda tem toda uma geração que vivenciou esse período tão macabro durante a infância, parece até maldade querer que se conformem em andar pendurados num side-car por não terem como trocar um Golf a diesel dos antigos por um mais novo sem que falte para bancar os remédios...

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  9. Na minha perspectiva cristã, não duvido que essa guerra contra o diesel faça mesmo parte de um conluio do inimigo para afastar a Europa das suas raízes. A vaidade ilude alguns que passam a acreditar na histeria coletiva em torno de falsas profecias apocalípticas e veem nisso um pretexto para tentar passar um ar de pretensa superioridade moral ao fazer algo para "ajudar" a resolver um "problema" que não existe e ao mesmo tempo criar um problema verdadeiro e até mais grave.

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    1. Infelizmente isso está cada vez mais evidente, mas os europeus estão fraquejando na fé por medo e negando a Deus para não ofender aos descrentes.

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    2. São tempos sombrios mesmo, mas Deus haverá de prover a vitória para os justos entre as nações. Os ímpios que tem atentado contra a fé não serão glorificados, e aqueles que hoje estão sendo humilhados serão exaltados.

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
http://dzulnutz.blogspot.com/2016/03/relacao-de-marcha-refletindo-sobre.html