domingo, 3 de junho de 2018

Flexibilização da venda de biocombustíveis: uma pauta imprescindível

A recente greve dos caminhoneiros, que teve dentre os principais motivos o preço abusivo do óleo diesel convencional, expôs não apenas a fragilidade da logística brasileira que tem uma relação de dependência pelo modal rodoviário, mas também evidencia a falência do monopólio estatal dos hidrocarbonetos que vem sufocando o Brasil desde a última passagem de Getúlio Vargas pelo Palácio do Catete. E os biocombustíveis que poderiam reverter essa situação, com destaque para o etanol que tanto iludiu os militares como uma tábua de salvação diante dos choques do petróleo na década de 70 até ser desacreditado nos últimos 12 anos mesmo com a ascensão dos carros "flex", estão sufocados por regulamentações da ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) que vão contra os reais interesses do consumidor final e do livre mercado. Deixando de lado a demagogia dos ecofascistas de plantão, o Brasil tem condições de promover uma efetiva renovação da matriz energética do transporte rodoviário a custos competitivos diante do petróleo e do gás natural, mas não avança nessa área por conta de um modelo de comercialização de combustíveis que na prática impede a implementação de soluções realistas e a preços mais coerentes.

Se por um lado a euforia em torno dos campos petrolíferos do "pré-sal" e o alinhamento da ditadura lulopetista com o chavismo e seus petrodólares levaram à ilusão de que o etanol estaria com os dias contados, por outro a falta de liberdade para as usinas sucroalcooleiras o comercializarem diretamente aos postos sem passar pelas distribuidoras hoje se revela mais crítico no tocante à perda de competitividade desse que foi uma referência a nível mundial de sucesso na substituição em escala comercial de um combustível fóssil por um renovável. O artigo 6º da Resolução nº 43 de 2009 da ANP acabou portanto entrando na mira do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e também de alguns deputados federais que classificam o referido instrumento regulatório como ilegal e acusam a concentração de mercado em menos fornecedores como a principal causa da perda de competitividade em preços diante da gasolina. Ainda que o Cade tenha apresentado uma flexibilização da venda de etanol junto a um pacote com outras 8 medidas para reduzir os preços dos combustíveis no varejo que incluía uma liberdade para as distribuidoras importarem combustível por conta própria, o que possivelmente iria fomentar algum desinteresse quanto ao etanol caso algum país exportador de derivados de petróleo estivesse apostando no dumping para inibir um aumento da participação dos biocombustíveis na matriz energética e que já ocorreu algumas vezes por ação da Arábia Saudita, uma maior liberdade de comercialização do etanol se tornaria convidativa para projetos visando o uso de matérias-primas mais diversificadas como o milho que já está ganhando espaço no Centro-Oeste ou até mesmo o bagaço de uva que poderia ser aproveitado em regiões com tradição na produção de uva e vinho como o Vale dos Vinhedos no Rio Grande do Sul ou no município pernambucano de Petrolina que se tornou destaque a nível nacional e até na exportação.

E apesar do etanol não ser de todo ruim, além do mais com uma maior presença da injeção direta em motores de ignição por faísca não apenas minimizando a desvantagem na eficiência em comparação à gasolina nos motores "flex" mas também facilitando a partida a frio, é natural que não deve ser visto como uma solução única que pudesse atender a todos os cenários operacionais. De fato, a relativa simplicidade dos dispositivos de controle de emissões aplicados aos motores do ciclo Otto contrasta com os sistemas mais complexos incorporados aos motores turbodiesel veiculares mais recentes e pode fazer com que uma pick-up ou sport-utility "flex" e eventualmente convertida para gás natural soe mais convidativo para usuários particulares e com um perfil mais urbano, mas não parece muito realista supor que tomasse tão facilmente o espaço do Diesel em veículos comerciais pesados de curto a médio prazo. Nesse caso, não seria inoportuno incluir também o biodiesel e eventualmente o uso direto de óleos vegetais como combustível veicular na pauta de uma flexibilização da venda dos biocombustíveis, embora haja a necessidade de liberar a venda varejista de biodiesel puro (B100) para que se torne viável por exemplo para caminhoneiros autônomos que não contam com a facilidade de um local próprio para abastecimento e armazenamento de combustível fornecido pelos chamados "transportadores revendedores retalhistas" a grandes consumidores como transportadoras e produtores rurais.

A concentração das refinarias de petróleo nas garras da Petrobras, bem como a presença das mesmas quase sempre estar numa faixa mais próxima do litoral como é o caso das refinarias de Cubatão e de Manguinhos, também expõe uma certa fragilidade em comparação a uma eventual regionalização da produção de biocombustíveis em unidades menores e mais próximas das áreas consumidoras. Na pior das hipóteses, além de ser mais difícil que forças hostis ataquem com sucesso uma maior quantidade de instalações estratégicas como são as refinarias de petróleo e também podem ser consideradas as usinas de etanol ou biodiesel, também se tornaria mais fácil estabelecer planos de contingência entre diferentes unidades produtivas visando manter mais próximo da normalidade o fornecimento de combustível a uma região afetada por algum problema de ordem técnica ou uma quebra de safra da matéria-prima predominante em uma delas. Mas deixando um pouco de lado o risco de ocorrências inoportunas em âmbito operacional, também não é de se desconsiderar o menor custo das operações de transporte tanto da matéria-prima quanto de um biocombustível que pudesse ser comercializado diretamente da usina até o posto sem passar pelas distribuidoras, e portanto o impacto na composição de preços ao consumidor final também poderia ser reduzido.

Embora o biodiesel e principalmente o uso direto de óleos vegetais tenham caído em descrédito não só pela disponibilidade mais limitada mas também por eventuais incompatibilidades com dispositivos de controle de emissões como o filtro de material particulado (DPF - Diesel Particulate Filter) e numa menor proporção o EGR (Exhaust Gas Recirculation - recirculação de gases de escape), e que o biogás/biometano seja mais suscetível aos monopólios por ser mais barato de se transportar através de gasodutos, é imprescindível uma flexibilização nas regulamentações da venda de biocombustíveis. O cidadão de bem já paga um preço alto demais pela incompetência que tomou conta da Petrobras e não pode aceitar essa "venezuelização" às avessas que tem se imposto com a extorsão assegurada pelo monopólio estatal dos hidrocarbonetos e o sufocamento da competição a ser representada pelos biocombustíveis. Enfim, mesmo sendo tratada com alguma desconfiança por uma parcela cada vez mais alienada da população que recentemente só lançou um novo olhar sobre o "álcool de farmácia" quando faltou gasolina nos postos, esta ainda é uma pauta que ainda pode ser decisiva para evitar um colapso da economia nacional.

6 comentários:

  1. É verdade que o etanol já vinha sendo desacreditado mesmo antes do PT ser alçado ao poder, a ponto de se precisar do carro flex para voltar a ter alguma relevância, mas depois de criar tanta expectativa andaram para trás e a experiência de sucesso que remonta à época dos generais foi sepultada nas vaidades do Chávez e no comodismo para deixar as portas abertas e infestar a Petrobras com corruptos.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Eliminando a concorrência, ficou mesmo muito fácil meter a mão na Petrobras.

      Excluir
  2. Usar o álcool no carro vale a pena em São Paulo. Já faz muito tempo que eu não vejo familiares meus ou de amigos abastecerem com gasolina no carro, só encher aquele tanquinho de partida fria, ou uns que andam de moto e dizem que álcool não fica bom em moto por causa da refrigeração do motor.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Realmente, com a refrigeração a ar fica mais demorada a estabilização da marcha lenta logo após a partida, principalmente no inverno.

      Excluir
  3. Tem que liberar logo duma vez vender o álcool para os postos. Se pode vender pinga de alambique nas biroscas de beira de estrada que caminhoneiro gosta de parar antes de ir na casa da luz vermelha, tinha que liberar a venda do álcool até da usina direto para o cliente final. Eu lembro que a uns 20 anos atrás tinha usina que vendia o álcool direto na bomba, apesar de que na teoria aquelas bombas só podiam ser usadas para abastecer frota própria das usinas e das fazendas de cana.

    ResponderExcluir

Seja bem-vindo e entre na conversa. Por favor, comente apenas em português, espanhol ou inglês.

Welcome, and get into the talk. Please, comment only either in Portuguese, Spanish or English.


- - LEIA ANTES DE COMENTAR / READ BEFORE COMMENT - -

Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
http://dzulnutz.blogspot.com/2016/03/relacao-de-marcha-refletindo-sobre.html