segunda-feira, 26 de maio de 2014

Clássico: Isuzu Trooper II

Pode parecer estranho a menção a um veículo apto ao uso do Diesel, mas o Isuzu Trooper II levanta questionamentos acerca de uma antiga resistência do público brasileiro aos motores Diesel de alta rotação. A bem da verdade, o modelo produzido entre '88 e '91 (já com os faróis quadrados, diferente do Trooper lançado em '81 com faróis redondos) é um tanto raro no Brasil, em função de restrições à importação de veículos entre '76 e '90 e onde chegou apenas em pequenas quantidades por importação independente, mas foi um sucesso em outros países onde foi comercializado oficialmente. Cabe salientar que a Isuzu é uma das fabricantes de motores Diesel mais respeitadas no cenário mundial.
Dentre as opções de motor, que incluíam um 2.6L de 4 cilindros e comando de válvulas no cabeçote e um 2.8L V6 de comando no bloco, ambos a gasolina, destacava-se o 2.8L 4JB1 de comando no bloco e com opção por turbo (4JB1-T) que podia ser complementado com intercooler (4JB1-TC) para quem não abria mão do Diesel, respectivamente com potências de 87cv, 100cv e 115cv. Até hoje é um dos motores mais copiados por fabricantes chineses para aplicação tanto em pick-ups e utilitários-esportivos quanto em caminhões leves (geralmente cópias do Isuzu série N).
Em versões turbodiesel com intercooler, o scoop é maior do que o adaptado no capô desse exemplar, que eu vi passando pela Avenida Assis Brasil na altura do IAPI enquanto voltava para casa depois do almoço de Dia das Mães com uma tia minha. Posteriormente, já perto do Bourbon São João, vi o mesmo Trooper já em marcha, mas o som do motor parecia mais com o do V6 a gasolina do que com qualquer Diesel...

sábado, 24 de maio de 2014

Diesel e híbridos: públicos-alvo mais diferentes do que possa parecer

Não é incomum que, num país onde a cultura automobilística recebe pouca atenção das grandes mídias, os defensores da liberação do uso de motores Diesel em veículos leves sejam jogados no mesmo balaio-de-gato dos que se acomodam e aceitam passivamente os híbridos baseados num motor de ignição por faísca. Porém, motivos muito distintos além da simples economia de combustível levam à preferência por cada configuração, a ponto de alguns reputarem até utilitários antigos como o furgão Mercedes-Benz MB180-D mais "eco-eficientes" que um híbrido moderno como o Toyota Prius, considerando a vida útil operacional e um eventual sucateamento. Cabe salientar, ainda, que alguns estereótipos pejorativos acabam sendo perpetuados e dificultando o diálogo e uma interação saudável entre esses grupos.

Uma das raras exceções é a Peugeot: alguns modelos como o 508 tem versões híbridas integrando um motor turbodiesel de 2.0L e um elétrico através do sistema Hybrid4, em que o turbodiesel é responsável por tracionar o eixo dianteiro através de um câmbio manual-automatizado e atuar como gerador para o elétrico, montado junto ao eixo traseiro. Há também versões e-HDi equipadas apenas com um turbodiesel de 1.6L conectado ao câmbio manual-automatizado mas com o sistema start-stop de arranque e parada automáticos em marcha-lenta e desacelerações, eventualmente citado como "micro-híbrido" embora não ofereça nenhuma forma de tração auxiliar elétrica para ser efetivamente considerado um híbrido. Nenhuma delas é homologada para venda no mercado brasileiro, devido às já conhecidas restrições ao uso do Diesel em veículos com capacidade de carga inferior a 1000kg, acomodações para menos de 9 passageiros além do motorista e não sejam dotados de tração 4X4 com caixa de transferência de múltiplas velocidades (a popular "reduzida").
O sistema de tração elétrica adotado pela Peugeot tem até algumas vantagens em comparação com o layout predominante nos híbridos a gasolina: mesmo usando um câmbio, que acaba tendo alguns atritos internos, ainda permite uma condução segura do veículo em caráter emergencial no caso de alguma avaria no sistema auxiliar de tração elétrica, ao contrário de modelos como o Toyota Prius onde o veículo pode ser totalmente imobilizado em condições semelhantes ao considerar que o motor elétrico acoplado a um conjunto de engrenagens monomarcha acaba por substituir a função de um câmbio propriamente dito ao modular a aceleração e complementar o torque do motor a gasolina, cujo pico é deslocado a faixas de rotação mais elevadas e tem o sentido de giro inversível para prover marcha à ré. Tal sistema é citado constantemente como eCVT, mas não tem nenhuma semelhança conceitual com uma transmissão continuamente variável verdadeira (que usa polias cônicas variáveis e correias para estabelecer infinitas relações de marcha dentro de um intervalo predeterminado).

Cabe lembrar que o Grupo PSA, detentor das marcas Peugeot e Citroën, chegou a trazer ao Brasil alguns exemplares do Peugeot 3008 e do Citroën DS5 Hybrid4 para testes e, apesar de ter um bom potencial de marketing tanto com parte do público que considere o 3008 mais próximo conceitualmente a um utilitário-esportivo "crossover" do que a uma minivan ou no segmento de luxo disputado pelo DS5 onde o maior custo inicial (tanto pela motorização Diesel quanto pelo sistema híbrido) seria facilmente assimilado, a homologação dos modelos não foi adiante.

Outro caso interessante é o do Volkswagen Jetta, que na atual geração conta no mercado americano tanto com versões tradicionais a gasolina quanto opções turbodiesel ou híbrida a gasolina. No caso do turbodiesel, tradicionalmente conhecido como TDI, são oferecidos um câmbio manual ou um DSG manual-automatizado de dupla embreagem, ambos de 6 marchas, enquanto o híbrido conta apenas com um DSG de 7 marchas. Os europeus podem contar ainda com o 1.6TDI além do 2.0TDI disponibilizado para os americanos, e outra diferença é na oferta do motor 1.4TSI a gasolina: embora pudesse substituir satisfatoriamente o 2.0L naturalmente aspirado a gasolina (ou TotalFlex no mercado brasileiro) como ocorreu na Europa, os americanos só o encontram na versão híbrida.
Poderia parecer um tanto óbvio juntar o TDI ao sistema híbrido, e a facilidade em implementar tração permanente nas 4 rodas na plataforma usada no Jetta poderia até servir de argumento para o uso de um layout semelhante ao dos Peugeot e Citroën com o sistema Hybrid4, mas pesquisas conduzidas pela Volkswagen nos Estados Unidos revelaram uma rejeição mútua entre os públicos-alvo do Diesel e dos híbridos, possivelmente acirrada pela disputa entre o Jetta TDI e o Prius no segmento de veículos "eco-conscientes".
Outro ponto polêmico é referente à percepção do quão poluente pode ser um veículo desde a produção até o descarte, passando pela vida útil operacional e reposição de peças. Os híbridos agregam, de fato, uma maior complexidade nos processos de manufatura e na manutenção preventiva, além de questionamentos sobre o impacto ambiental dos compostos químicos presentes nas baterias, que não só intensificam a extração mineral como também provocam um maior gasto de energia para serem beneficiados ou posteriormente reciclados. A cadeia logística também é afetada, contribuindo para o maior custo final e aumentando o footprint da produção, que passa a depender de um tempo mais longo para ser totalmente rebatido ao decorrer da vida útil operacional do veículo Se por um lado as emissões de escape de um motor Diesel são um constante alvo de críticas pelos partidários dos híbridos, por outro eles também tem um calcanhar-de-Aquiles bem problemático...

A maior adaptabilidade de motores Diesel ao uso de combustíveis alternativos, que pode ir desde o biodiesel e o etanol até óleos vegetais puros (inclusive óleo de cozinha saturado) também contribui para neutralizar as emissões de um motor Diesel, absorvidas durante o metabolismo vegetal de modo a manter o ciclo fechado. Algumas espécies cultivadas para fins energéticos, como a mamona, também tem um bom desempenho até na fixação do nitrogênio no solo, sendo uma boa opção para rotação de cultura na entressafra de alguns gêneros alimentícios.

Por último, mas não menos importante, cabe salientar o impacto nos custos do veículo: um híbrido vai ser sempre invariavelmente mais caro quando não houver algum subsídio governamental, e normalmente acima de 20% do preço total em se tratando de um sedan médio enquanto a opção pelo Diesel costuma acrescentar entre 10 e 20%. Um caso curioso é o do Toyota Corolla, que na África do Sul tem opção por motores a gasolina de 1.3L, 1.6L e 1.8L além do 1.4L turbodiesel. Tomando por referência o 1.8L, oferecido como flexfuel a gasolina e etanol no Corolla brasileiro, para nossa surpresa o turbodiesel chega a ser pouco menos de 1% mais barato...

domingo, 18 de maio de 2014

Rebatendo mais um fã do gás natural

Não é tão incomum se deparar com alegações incoerentes por parte de usuários do gás natural veicular (GNV), que parecem fazer questão de ignorar vantagens práticas do Diesel. Em alguns momentos podem até se tornar tão inconvenientes quanto fãs dos híbridos, como no caso de um comentário feito numa postagem que já rebatia um outro comentário mal-formulado emitido por um usuário do gás natural...
Dessa vez, quem comentou alega ter um carro com o kit GNV como equipamento de fábrica, fazendo rodando 17km/m³ em trânsito urbano e 23km/m³ na estrada, e está satisfeito com a economia. No entanto, não deixou claro qual seria o veículo, embora o mais provável é que seja um Fiat Siena Tetrafuel, o único a ter saído de fábrica oficialmente com a instalação para o uso do gás natural (considerando que o Chevrolet Astra Multipower era adaptado fora da fábrica, pela Rodagás). Terminou dizendo que "o resto é conversa fiada", como se fosse o detentor da verdade absoluta...

Pode ser que para esse usuário específico a diminuição do volume do porta-malas não tenha um impacto prático tão significativo, e que a suspensão e freios traseiros redimensionados para o peso acrescentado pelos cilindros onde o GNV é armazenado de fato compensem o maior desgaste a ser provocado nesses sistemas, mas não é por isso que deixa de haver uma desvantagem que possa ser percebida por outros usuários, além da incoerência em se apontar o gás como um pretexto para o comodismo frente à incoerência que é manter o consumidor brasileiro refém da incompetência institucional por trás de uma política energética que chega a ser um crime de lesa-pátria...

Eu até tenho alguma experiência com o gás natural, em função de veículos que pertenceram a familiares meus, e de fato a economia proporcionada acabava compensando, mas não se pode ignorar alguns inconvenientes. Um tio meu teve um Corolla "baby Camry" com motor 7A-GE e kit monoponto não-gerenciado (popularmente conhecido como "kit aspirado" ou "torneirinha") e, além do espaço sacrificado no bagageiro e do desgaste mais acentuado de componentes da suspensão traseira e material de atrito dos freios, de vez em quando o coletor de admissão acabava congelando como nos carros a álcool mais antigos, deixando a marcha-lenta muito irregular a ponto do motor apagar subitamente em alguns momentos.

O uso de kits gerenciados eletronicamente é obrigatório em veículos feitos a partir de '97, e o controle eletrônico de fato proporciona uma maior estabilidade da marcha-lenta mesmo nos sistemas monoponto (injetado de pressão negativa), além dos sistemas multiponto (injetado de pressão positiva) agregarem uma maior eficiência geral, minimizarem o impacto sobre o desempenho do motor e praticamente eliminarem o congelamento do coletor, mas muitos instaladores ainda oferecem o kit não-gerenciado mesmo para modelos fabricados posteriormente a '97. Não é incomum constatar essa situação em alguns táxis de Porto Alegre...

Caberia salientar ainda que com a atual geração de motores Diesel, lançando mão de recursos como o turbocompressor e a injeção common-rail com gerenciamento eletrônico, tem sido possível alcançar médias superiores a 20km/l em trânsito urbano e acima dos 30km/l em rodovia, não apenas em modelos compactos como o Fiat Siena mas até em médios como a atual geração do Opel Astra europeu.

Embora o gás natural tenha seus méritos, como a menor incidência de contaminações do óleo lubrificante em comparação com a gasolina e o etanol (embora também possa acontecer com o óleo diesel, é menos frequente), a atual rede de distribuição desse combustível é muito concentrada ao redor de grandes centros, com oferta mais restrita no interior, apesar do potencial relativamente inexplorado do biometano proveniente de fossas sépticas, estações de tratamento de esgoto e biodigestores instalados em granjas de criação de animais e abatedouros.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Como lidar com o condutor de um Prius numa disputa por uma vaga [humor controverso]



Mais uma daquelas pérolas do YouTube, dessa vez apresentada pelo Diesel Dave, uma figura bastante popular no cenário dieselhead norte-americano, satirizando uma situação até bastante comum, mas com um desfecho inusitado e um tanto "politicamente-incorreto".



Nota: a equipe DieselNutz não incentiva a prática de sequestro nem qualquer tipo de discriminação baseada na preferência por determinado tipo de veículo motorizado.

Nenhum eco-fascista teve a integridade física ameaçada durante a realização desse vídeo.

terça-feira, 6 de maio de 2014

Breve reflexão: Uruguai, injeção indireta, normas de emissões e adaptabilidade a combustíveis alternativos

Em países com padrões de qualidade menos rigorosos para os combustíveis, como ainda é comum na América do Sul, a injeção indireta acaba ganhando uma sobrevida nas aplicações veiculares leves. Além da maior resiliência frente a baixos índices de cetano (velocidade de propagação da centelha) e teores de enxofre mais elevados, também cabe considerar a defasagem nas normas de emissões e o custo inicial reduzido em comparação a sistemas mais sofisticados como um dos fatores que os asseguraram alguma popularidade à injeção indireta. Um caso a se observar é o Uruguai, onde a popularidade do Diesel foi tanta que por lá é praticamente impossível achar um Fiat Fiorino da década de '90 que não seja equipado com o motor 1.7D de 60cv, e antes da infeliz proibição ao licenciamento de veículos leves novos movidos a óleo diesel até o Fiat Uno manteve essa opção paralelamente ao Fire 1.3L a gasolina. Os cisplatinos nem contavam com o Fire 1.0L "flex" que do lado de cá da fronteira consolidou-se como o único motor disponível para o antigo Uno Mille...

Considerando que o Uruguai ainda tem normas de emissões no padrão Euro-2, a ponto dos caminhões de fabricação chinesa atualmente muito populares por lá ainda manterem até mesmo a injeção mecânica e não serem sufocados por dispositivos como o EGR, SCR e DPF que tem aterrorizado caminhoneiros brasileiros, até faria mais sentido aproveitar o cenário favorável à implantação do uso em larga escala do biodiesel, ou mesmo de óleos vegetais brutos que pode ser aplicado com mais facilidade em motores Diesel de injeção indireta. Para quem tema um impacto no custo dos alimentos, vale lembrar que o Uruguai é o país com o maior consumo de carne per capita, e a quantidade de sebo bovino que também poderia ser usada como matéria-prima para o biodiesel não deve ser desconsiderada...

A frota uruguaia ainda conta com muitos veículos antigos, como o Citroën Visa 17RD, e a predominância da injeção indireta é um dos fatores que tornaria até mais fácil substituir o óleo diesel convencional em larga escala sem a exigência de modificações mecânicas que viriam a ser muito onerosas, mas já trazendo uma grande vantagem não apenas no aspecto ambiental tão discutido atualmente mas também no tocante à segurança energética, visto que uma maior proporção de combustíveis produzidos localmente poderia vir a ser usada.

Pode-se atribuir à crescente presença chinesa no mercado automobilístico uruguaio, não apenas com as microvans e pick-ups mas também com subcompactos como o Chana Mini Benni, uma eventual diminuição no interesse pela ignição por compressão. Coincidência ou não, o apelo do baixo custo de aquisição que os favorece acabaria por dificultar para alguns consumidores uma assimilação do acréscimo ao preço caso um motor Diesel fosse disponibilizado, além dos fabricantes chineses apostarem mais no uso de combustíveis gasosos associados à ignição por faísca.
Ainda assim, não seria impossível valer-se justamente da injeção indireta para reduzir os custos de um motor Diesel, e as menores pressões internas inerentes a esse sistema permitem até uma maior intercambialidade de componentes entre um motor de ignição por faísca e um Diesel. Caso a insensata proibição ao registro de veículos novos movidos a óleo diesel no Uruguai seja derrubada, a defasagem nas normas de emissões em vigor até daria uma boa janela para os fabricantes chineses ganharem mais familiaridade com o ciclo Diesel, e compreender melhor algumas características do processo de combustão ao usar biodiesel e óleos vegetais de modo a eventualmente conseguirem implementar alguma solução para atender a controles de emissões mais rigorosos não apenas com um impacto menor no custo mas também uma interferência menos prejudicial à utilização de combustíveis alternativos...

De tanto que a indústria automobilística chinesa vem requentando projetos japoneses antigos, chega até a ser estranho que não tenham arriscado seguir o exemplo da Daihatsu que, a partir do motor CB de 3 cilindros e 993cc usado no Charade, chegou a oferecer o CL Diesel mantendo a mesma estrutura básica e assim diminuindo consideravelmente o custo de desenvolvimento de produto. Embora esse mesmo motor atualmente não seja oferecido no mercado automotivo mundial, ainda serve de base para alguns motores estacionários/industriais da Briggs & Stratton...

Para quem supõe que a injeção indireta não teria mais viabilidade comercial, convém recordar o caso do Citroën C15 com o motor DW8 que, mesmo com injeção indireta e aspiração natural, era enquadrado nas normas Euro-3 que vigoraram no Brasil até o final de 2011. Esse motor, diga-se de passagem, é basicamente uma versão modificada do XUD9, reconhecido até hoje como um dos mais adequados ao uso de óleos vegetais como combustível.

Considerando os notáveis avanços que a massificação do turbocompressor e do intercooler trouxeram para os motores Diesel não apenas no tocante ao desempenho mas também na eficiência do processo de combustão e por conseguinte até controle de emissões, poderia-se arriscar que a injeção indireta teria espaço até mesmo na atual geração das minivans Citroën Berlingo e Peugeot Partner mesmo frente às normas Euro-5, considerando que o custo de produção, aquisição e eventuais reparos ainda ficaria mais contido que nos motores HDi equipados com injeção direta do tipo common-rail com gerenciamento eletrônico, além de preservar a maior adaptabilidade a combustíveis alternativos...

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Breve reflexão sobre a sabotagem política ao etanol

Não é de hoje que o cenário político brasileiro está tomado pela imoralidade, mas ainda assim é evidente como as intervenções de cunho populista na economia tem não apenas corroído a Petrobras mas também inviabilizando o setor sucroenergético que, além do etanol e do diesel de cana, ainda tem importante participação no sistema elétrico nacional por meio dos processos de cogeração que usam o bagaço de cana para alimentar caldeiras em centrais termo-elétricas instaladas nas usinas. Se o ex-presidente Lula era visto com alguma simpatia pelos usineiros, empolgados com um nacionalismo exacerbado com o qual ele apontava o etanol como a melhor solução para atender à busca por uma renovação da matriz energética do transporte, não se pode dizer o mesmo da atual presidente Dilma Roussef, que a bem da verdade não é muito bem quista pelos ruralistas de um modo geral...

A presidente da Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar), Elizabeth Farina, declarou em recente entrevista ao jornal Folha de São Paulo que os picos da cotação do etanol logo após a eleição de Dilma em 2010, num momento pós-crise e com quebra de safra devido a condições climáticas desfavoráveis, seria um dos pivôs da relação conturbada entre o setor sucroenergético e Dilma. O ex-ministro da agricultura Roberto Rodrigues já é mais direto ao declarar abertamente que o problema é a ação governamental baseada em preconceitos e viés ideológico contra os produtores de açúcar e etanol, impedindo a tomada de decisões conscientes. O que parece não causar muita divergência entre as opiniões de especialistas é a incoerência no uso político dos preços da gasolina e do óleo diesel, para mascarar a inflação a curto prazo, com intenções meramente eleitoreiras e tripudiando sobre o bom-senso que deveria nortear as políticas energéticas.

Entre 2003 e 2009, a popularização do sistema bicombustível (flex) em automóveis com motor de ignição por faísca deu um impulso ao uso do etanol, que vinha um tanto desacreditado desde os últimos anos do governo Sarney, e houve um grande volume de investimentos na produção do biocombustível, embalado também com o objetivo dos Estados Unidos em reduzir a dependência ao petróleo, e da União Européia com metas ambiciosas de redução das emissões de dióxido de carbono. A crise de 2008 tornou-se um empecilho aos programas de exportação, e a descoberta das reservas de petróleo do "pré-sal" passou a ter mais atenção por parte do governo. Desde então tem prevalecido um desprezo institucional contra o setor sucroalcooleiro, uma incoerência meramente populista, eleitoreira e terceiromundista, enquanto os biocombustíveis são cada vez mais levados a sério em mercados mais livres e desenvolvidos.

O revanchismo histórico pode ser apontado como uma das motivações para sabotar o etanol, por ser um dos mais importantes legados do Regime Militar, além da aversão ao livre-mercado e ao agribusiness demonstrada pelo pesado intervencionismo econômico e apoio institucional a grupos que promovem a violência no campo, mas ao considerar que já foram perdidos cerca de 130.000 postos de trabalho tanto no setor canavieiro quanto na indústria de base chega a ser irônico que isso ocorra sob um governo que alega defender o trabalhador...