quarta-feira, 27 de junho de 2018

Venda direta de etanol das usinas para os postos: uma alternativa com potencial para proporcionar mais estabilidade nos custos de combustíveis

Pode não parecer muito relevante para o transporte pesado uma venda direta de etanol das usinas para os postos sem passar pelas distribuidoras, e provavelmente também não vá despertar muita esperança junto ao agribusiness, mas não deixa de ser uma pauta relevante. Consolidar pelo interior do país um combustível hoje desacreditado não apenas pelas deficiências logísticas, mas principalmente por uma burocracia asfixiante, faz algum sentido com o objetivo de integrar diferentes soluções que possam se mostrar adequadas a operadores com preferências ou necessidades distintas, bem como favorecer a independência energética do produtor rural e iniciar uma oposição ao monopólio da Petrobras. Apesar da eficácia dessa medida na contenção dos preços do etanol no varejo permanecer desconhecida, e da previsível oposição tanto das distribuidoras quanto de algumas usinas sucroalcooleiras, o consumidor teria mais a ganhar do que a perder.

Considerando regiões onde o uso do milho como matéria-prima para o etanol tem crescido, tomando por exemplo o Mato Grosso, a venda direta das usinas para os postos já se justifica simplesmente com a possibilidade de dispensar a complexa operação logística de enviar o combustível produzido localmente para bases operacionais das distribuidoras em outras localidades e depois ter que fazer a viagem de volta. Naturalmente, a integração com a pecuária também seria um bom incentivo para que o etanol de milho encontrasse um mercado promissor na própria região produtora, salientando que o "grão de destilaria" tem bom valor nutricional para a alimentação animal e a digestibilidade superior à do grão de milho ao natural proporciona um ganho de peso mais rápido ao gado de corte. Mas como nem tudo são flores, um motivo que acaba levando alguns compradores a optar por uma pick-up com motor "flex" em detrimento do Diesel seria a proximidade com a Bolívia e o Paraguai onde ainda é uma prática bastante comum "esquentar" veículos roubados no Brasil, e no fim das contas até aquela proibição à importação de veículos com motor Diesel de cilindrada igual ou inferior a 4.000cc na Bolívia acaba fomentando a procura pelo mercado negro.

Dentre motivos de ordem técnica que poderiam reacender um interesse pelo etanol junto a uma parte considerável de consumidores que hoje depositam esperanças no Diesel ou se veem obrigados a usar o gás natural e assim sacrificar parte da capacidade de carga, há de se considerar sobretudo a atual discrepância na complexidade dos sistemas de controle de emissões que hoje tem beneficiado aos motores de ignição por faísca. A recente implementação das normas MAR-I, que estabelecem limites de emissões para máquinas agrícolas, poderia até influenciar alguns operadores a aderir ao etanol para tratores como uma opção tanto ao óleo diesel e/ou biodiesel quanto ao gás liquefeito de petróleo (GLP - "gás de cozinha") que já é usado em algumas atividades onde as emissões de ruído e fuligem sejam mais críticas. Apesar de já estar em implementação no exterior o uso de filtros de material particulado em veículos com motor de ignição por faísca com injeção direta, tomando como principal exemplo o Volkswagen Tiguan Allspace que foi o primeiro a recorrer a esse expediente, e justamente a injeção direta apesar das dificuldades que acarretou no controle de emissões proporcionar uma partida a frio mais fácil com o etanol, ainda não chegou ao mesmo nível de inconveniência observado em alguns motores Diesel modernos que já dependem do pós-tratamento dos gases de escape com o sistema SCR de redução catalítica seletiva com o fluido-padrão ARLA-32/ARNOx-32/AdBlue para manter os óxidos de nitrogênio (NOx) sob controle. A bem da verdade, considerando uma eventual integração com o óleo diesel convencional e/ou o biodiesel, ainda convém recordar benefícios de uma injeção suplementar de água com algum álcool (geralmente metanol) em aplicações de alto desempenho e que pode proporcionar não só um melhor desempenho e economia de combustível mas também reduzir tanto a formação dos NOx quanto de material particulado.

No tocante à integração regional e ao turismo, uma oferta do etanol a preços mais estáveis por todo o país também não deixa de ser benéfica tanto para o consumidor que deseje usar esse combustível em viagens quanto para produtores rurais e indústrias alimentícias agregarem valor a resíduos agrícolas com algum teor de açúcares e/ou celulose, minimizando a dependência pela cana de açúcar e de certa forma evitando que venha a ocorrer um problema parecido com o milho. A exemplo da Itália que usa a uva como principal matéria-prima para o etanol, ou da Finlândia que recorre a resíduos da produção de pães e de cerveja para a mesma finalidade, com uma liberação da venda direta do etanol das usinas para os postos a princípio nada mais deveria impedir ocorrências semelhantes em regiões tão distintas quanto o Vale dos Vinhedos no Rio Grande do Sul ou algumas localidades no Nordeste onde o cultivo irrigado de frutas tem se fortalecido em função da logística para exportar para a Europa por via áerea como Mossoró-RN e Petrolina-PE, servindo também como pretexto para fomentar o beneficiamento de alguns cultivares e agregando mais valor às exportações brasileiras. Mesmo considerando o mercado interno, uma possibilidade a mais os produtores rurais alcançarem uma independência energética também viria a contribuir para a redução nos custos de escoamento da produção.

Por mais que possa parecer perigoso devido a que tal medida possa ser apontada em âmbito político como um eventual pretexto para manter as restrições ao Diesel em veículos leves hoje em vigor, ou para medidas mais estúpidas como o projeto de um petista visando uma proibição mais estrita à circulação de veículos com motor Diesel na cidade de São Paulo, a venda direta do etanol das usinas para os postos teria benefícios para o cidadão hoje espoliado por um oligopólio que só beneficiou aos corruptos que dilapidaram a Petrobras. Há um enorme potencial energético atualmente inexplorado no Brasil, que não é melhor aproveitado justamente por conta da excessiva burocratização do mercado de biocombustíveis. Enfim, é necessário que se dê um primeiro passo rumo à renovação da matriz energética do transporte, e o nosso país tem condições de retomar o protagonismo tecnológico nessa área, e que foi conquistado justamente com o etanol...

5 comentários:

  1. No puedo decir que no tengas razón, pero creo que el etanol va a ser más relevante como sustrato para la industria química que como combustible vehicular. Pero de hecho, por más que el etanol tenga sus limitaciones, no es ni de lejos de todo mal proponiendo una sustitución de la gasolina por algo que pueda ser producido localmente incluso por pequeños granjeros.

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  2. Pode ver que as usinas grandes da região de São Paulo já estão botando as manguinhas de fora e mostrando que não estão dispostas a largar o osso e dividir mercado com novos players de outras regiões que eventualmente desafiam não só a hegemonia das usinas paulistas mas também desafiar o modelo da monocultura canavieira.

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  3. Não sou muito fã de usar álcool no carro, mas sou a favor de uma diminuição no preço. Eu até me animaria a tentar se o preço fosse mais justo mesmo.

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  4. Pelo menos aqui em São Paulo eu acho que não vai mudar nada, mas nesses lugares onde se planta muito grão como Mato Grosso, Goiás e Paraná deve ter vantagem se fizerem como nos Estados Unidos e usarem o milho para fazer álcool. Quanto ao uso da proteína que sobra do milho para alimentar bicho, já vi em algumas embalagens de ração de cachorro uma propaganda do governo de Goiás.

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    1. Também já vi aquela propaganda em embalagens de ração, mesmo sendo fabricada no Rio Grande do Sul. A fabricante instalou uma filial lá em Goiás por causa de incentivos fiscais.

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
http://dzulnutz.blogspot.com/2016/03/relacao-de-marcha-refletindo-sobre.html