sexta-feira, 5 de junho de 2020

Uma reflexão sobre station-wagons e o aspecto utilitário

Uma das configurações de carroceria que mais perderam participação de mercado nos últimos anos, as station-wagons se destacavam pela origem essencialmente utilitária, destacando-se sobretudo pela capacidade volumétrica superior e acessibilidade melhorada do compartimento de carga comparadas a um sedan da mesma série e a relativa facilidade para uma reconfiguração rápida do interior visando atender tanto ao transporte de passageiros quanto de alguma carga, tomando como exemplo a geração dos Ford full-size de '49 a '51 para a qual a station wagon tinha partes da carroceria de madeira, o que se conhece por "woody-wagon" também no Brasil pela influência americana e na Espanha se conhece por "rubia" (loira) em alusão à cor predominantemente clara dos painéis de madeira.

Também vale observar o caso da Volkswagen com a Parati e a Saveiro na época da linha quadrada, e quando um motor Diesel de 1.6L e injeção indireta chegou a ser disponibilizado com mais ênfase nas exportações que não estavam tão afetadas por restrições quanto às capacidades de carga e passageiros ou tração. Embora por um breve período tenha sido aberta uma exceção para regularizar a conversão de station-wagons, foi mais frequente a regularização de conversões na Saveiro, e algumas chegaram a ser vendidas oficialmente pela própria Volkswagen já com o motor Diesel. O fato de station-wagons já terem sido tratadas em outros momentos como "camionetas" de uso misto no Brasil certamente tem alguma relevância para que até '93 também fosse possível enquadrá-las numa definição de "utilitário" mais associada às pick-ups no tocante à aplicabilidade do Diesel em veículos com uma capacidade de carga abaixo de uma tonelada e tração simples.
Digna de nota também foi a relativa popularidade das conversões para cabine dupla, cujo resultado da adaptação podia ser facilmente comparável à configuração do Voyage quando a porção remanescente do compartimento de carga original recebia um "tampão marítimo". Naturalmente que os ângulos de abertura mais generosos e a maior facilidade de remoção do tampão marítimo ainda ofereciam uma facilidade na acomodação de objetos mais volumosos, além da tampa traseira original cuja abertura alcançava o assoalho e diminuía a altura de embarque de materiais mais pesados. Apesar de ao menos na teoria parecer mais simples ceder à burocracia e aderir ao modismo das pick-ups, o compartimento de carga com mais barreiras físicas limitando a reconfiguração que se observava tanto nas adaptações de cabine dupla quanto num sedan ainda podiam ser consideradas inconvenientes maiores diante da contiguidade entre o espaço de passageiros e o compartimento de bagagens e a maior flexibilidade associada a essa característica.

Algumas denominações tradicionais para o tipo de carroceria em diferentes países também refletem o viés utilitário que normalmente se atribui às wagons de um modo geral, não importando se o modelo é mais generalista como a Fiat Palio Weekend ou rodeado por uma aura de prestígio e esportividade como a Subaru Impreza SW. Desde o costume de alguns gaúchos que ainda se referem às wagons por "caminhonete" até os argentinos que as classificam como "rural", passando pelos venezuelanos que usam nomenclaturas como "camioneta ranchera" ou simplesmente "ranchera" tal qual os espanhóis, é evidenciada a imagem dessa configuração junto ao grande público como sendo apta a usos laborais com uma maior comodidade e segurança no transporte de ferramentas e insumos, ao mesmo tempo que atendem bem ao uso familiar.

No tocante às nomenclaturas, um exemplo bastante didático é o da Willys Jeep Station Wagon, mais conhecida no Brasil como Rural Willys ou simplesmente Rural e que também chegou a ser fabricada pela Ford após a fusão com a Willys-Overland do Brasil. Quando o conceito de sport-utility que se vê na atualidade ainda não havia sido estabelecido, a boa e velha Rural era tida nos Estados Unidos pura e simplesmente como mais uma station-wagon. Por mais que hoje suscite discussões acaloradas sobre até que ponto deveria ser reconhecida ao pé da letra como uma wagon ou ser enquadrada no balaio de gato que hoje leva até um hatch enfeitado como o Chery Tiggo 2 a ser anunciado como SUV, não é de todo errado atentar tanto para a nomenclatura oficial adotada pelo fabricante original quanto para as eventuais semelhanças da configuração de carroceria com a definição mais ortodoxa do que constitui uma station-wagon.

A moda dos SUVs, que já se afastou significativamente do público rural a ponto de modelos como o atual Chevrolet Tracker nem sequer contarem com a opção por tração 4X4, de certa forma vale-se de uma ênfase na configuração utilitária ainda que tenha algumas diferenças em comparação ao que era priorizado na época da Chevrolet Ipanema, de modo que hoje a forma se sobrepõe à função. Convém lembrar que em alguns países, mesmo que na prática a utilização possa ser a mesma, a classificação de "caminhão leve" tem beneficiado os SUVs com menos incidência de impostos, ainda que o perfil mais aerodinâmico e a relativa leveza inerentes a uma station-wagon tradicional merecessem algum tratamento igualmente privilegiado em função do potencial que teriam a oferecer no tocante a um incremento na eficiência energética.

Mesmo diante de perspectivas sombrias quanto à persistência de restrições ao Diesel em veículos de capacidade de carga inferior a uma tonelada e acomodação para menos de 9 passageiros com tração simples, também é interessante observar como as pick-ups de um modo geral tornaram-se aceitas por um público essencialmente urbano, e em modelos como a Fiat Strada a opção de cabine dupla quando combinada a uma capota suplementar na carroceria possa acabar servindo a usuários generalistas tal qual uma Fiat Palio Weekend que ainda contava com um público cativo em alguns segmentos como o dos táxis, ainda é válido considerar como as station-wagons são eventualmente a categoria que mais sofre diante do cerceamento ao direito de se usar motores mais eficientes.

6 comentários:

  1. Essa questão dos nomes sempre causa alguma confusão. Paulista costuma chamar de perua mesmo, igual fazem com a Kombi até hoje. E essa de rural e ranchera me lembra uma vez que eu vi um gaúcho se atrapalhar e achar que usavam ranchera na Argentina também.

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    1. Eu confundi uma vez uma sucata de Ford Falcon Rural argentina, mas o fato das pick-ups Ford baseadas em carros nos Estados Unidos serem conhecidas como Ranchero só aumenta a confusão.

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  2. Ah, tive um Subaru Impreza SW GX, idêntico a esse da foto. Que saudades desse carro!

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    1. É um carro que eu sempre achei interessante, até mais do que os hatches da geração seguinte.

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  3. Será que, se alguém lançasse um SUV-perua, ou um SUW, de Sport Utility Wagon, não resolveria uma parte do problema?

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

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