sexta-feira, 26 de junho de 2020

5 desafios para o Diesel em automóveis mais simples a nível de Brasil e Mercosul

Foi-se o tempo em que a disponibilidade de motores Diesel era uma das diferenças mais notáveis das versões de exportação de automóveis brasileiros, desde alguns projetos regionais com um foco mais direcionado a mercados periféricos como o Fiat Palio até os modelos "mundiais" como o Volkswagen Polo de 4ª geração. Antes indispensáveis para atender à grande maioria dos mercados de exportação regional independentemente de tamanho e faixas de preço, em menos de 20 anos uma reviravolta que não se resume a políticas e também abrange questões de cunho técnico que levaram o Diesel a deixar de ser tão relevante ao menos entre os veículos compactos. Sem dúvidas, uma série de fatores levou a essa situação, com ao menos 5 aspectos especialmente relevantes se destacando:
1 - massificação do turbo: no caso específico do Polo, cuja mudança de geração no exterior não teve um acompanhamento na produção brasileira e portanto prejudicou até mesmo exportações regionais, a geração que inaugurou a versão hatch no Brasil foi a última a dispor de motores Diesel aspirados. É de se destacar que argentinos e uruguaios eram especialmente receptivos a motores mais pé-duro, em função tanto do custo inicial quanto da percepção de uma maior facilidade para manutenções a serem feitas de forma até um tanto precária, em que pese a forte tradição agropecuária fazendo o Diesel ser visto como uma opção essencialmente utilitária que eventualmente não justificasse um incremento de custo inerente a melhorias tecnológicas por mais relativamente simples que fossem como era o caso do turbo. Aquela rusticidade "de trator" que afugentava uma parte do público generalista sucumbiu às normas de emissões cada vez mais rigorosas e a princípio inatingíveis sem o auxílio do turbo, e assim um rigor na observância das especificações de insumos como o óleo lubrificante tornou-se ainda mais crítica para o bom funcionamento do motor;
2 - relativa defasagem dos motores a gasolina: enquanto nos motores Diesel para veículos leves há uma semelhança nos principais componentes independentemente do mercado aos quais se ofereçam, e as principais diferenças estejam hoje concentradas na incorporação ou não de alguns dispositivos de controle de emissões como o filtro de material particulado (DPF) que por sua vez é muito vulnerável a discrepâncias nas especificações do combustível e até do óleo lubrificante utilizados, ao tratar-se de motores a gasolina e por extensão dos "flex" aptos a operar também com etanol no Brasil era comum uma estratégia mais conservadora como a rejeição a motores com mais de duas válvulas por cilindro. Tanto num modelo que almejava valer-se de uma imagem mais prestigiosa de "carro mundial" como o Polo quanto no Gol, versões com motor de 16 válvulas são muito difíceis de se encontrar enquanto as de 8 válvulas podem ser vistas literalmente em qualquer esquina. Vale destacar que especialmente na Argentina ainda é muito comum tão logo a injeção eletrônica apresente algum defeito adaptar um carburador no lugar devido à percepção de um menor custo dessa abordagem. O fato de não haver em países vizinhos um benefício a motores de até 1.0L como no Brasil também acaba constituindo um desincentivo ao downsizing, de modo que mesmo gerações mais recentes venham incorporando características como cabeçotes de 16 válvulas o restante ainda é basicamente o mesmo que se via no motor dum Gol de 20 anos atrás;
3 - etanol e gás natural: mesmo que em grande parte do território brasileiro persistam desconfianças com relação a esses combustíveis alternativos, tanto em função da dependência excessiva por uma matéria-prima principal para o etanol quanto pela disponibilidade geográfica limitada do gás natural e do peso e volume excessivos ocupados por um kit de conversão para GNV, não há como negar algum impacto persistente de equívocos associados à mal-formulada "diplomacia do etanol" na diminuição da oferta de motores Diesel em veículos leves brasileiros para exportação, bem como da presença do gás natural consolidada especialmente na Argentina. E mesmo que atualmente só o Paraguai importe regularmente automóveis "flex" de fabricação brasileira, não convém desconsiderar a influência da Argentina como líder regional no desenvolvimento de sistemas de gás natural veicular especialmente como uma alternativa para a crise que se aprofunda no país vizinho com o retorno do socialismo à Casa Rosada;

4 - alinhamento técnico com a China: tomando por referência a atual geração do Chevrolet Onix, que teve a estréia mundial na China onde é vendido somente com carroceria sedan, observa-se hoje uma maior proximidade das linhas de alguns fabricantes na América do Sul com o que as respectivas joint-ventures chinesas oferecem. E como a ditadura comunista da China é muito refratária ao Diesel em veículos leves, tal fator somado aos desafios do controle de emissões e como justificar o eventual incremento nos custos de produção e comercialização de uma mula-de-cigano direcionada ao terceiro mundo acaba sendo uma forma até bastante previsível para que o investimento para desenvolver uma versão turbodiesel nem seja cogitado. E a bem da verdade, considerando que tanto a massificação do turbo já atinge motores a gasolina e "flex" levando a um incremento no custo e complexidade quanto a possibilidade do outsourcing permitindo conciliar a liberdade de escolha e a viabilidade econômica, a influência chinesa é um problema mais político do que técnico;

5 - custo e inconveniências práticas de alguns dispositivos de controle de emissões: tomando por referência a 5ª geração do Volkswagen Polo, cuja versão sedan denominada Vento na Índia de onde é exportada para alguns países vizinhos e pode até ser vista nas mãos de turistas argentinos durante o verão no litoral sul brasileiro, salta aos olhos o recente fim das versões 1.5 TDI na Índia em resposta às normas de emissões Bharat Stage VI equivalentes à Euro-6 e que foram introduzidas no mercado indiano recentemente. Naturalmente foi uma medida questionável, mas a exigência pelo filtro de material particulado (DPF) para atender ao novo padrão vem sendo apontada como um dos principais motivos para a eliminação dos motores turbodiesel na linha indiana da Volkswagen, bem como o fato de predominar o recurso ao SCR mesmo em veículos leves à medida que se avança rumo à Euro-6 e as dificuldades logísticas para assegurar a distribuição de óleo diesel com baixo teor de enxofre e do fluido-padrão AdBlue/ARLA-32/ARNOx-32 não apenas nas principais rotas rodoviárias e grandes centros. Portanto, não deixa de ser previsível que numa região onde o custo sempre foi um fator crítico e eventuais negligências no tocante à manutenção possam ter efeitos ainda mais nefastos em motores e sistemas de pós-tratamento de escape mais sofisticados também possa ser mais desafiador manter a opção pelo Diesel a exemplo do que se observa na Índia. E mesmo que um eventual fomento ao biodiesel para aproveitar a vocação agropecuária de países como Argentina, Uruguai e até mesmo o Brasil caso seja liberado o Diesel, não se pode negar que uma parte do público permanecerá refratária a mais um procedimento na rotina de manutenção que seria completar o nível de AdBlue.

Um comentário:

  1. Já que a influência de São Paulo no que acontece na América Latina pode ser comparada com poucas outras metrópoles, e aqui também tem um clima que não é dos mais suaves por causa da altitude, até não seria tão bizarro que outros países dessem um jeito de imitar o uso do álcool, até países onde se tem mais carros parecidos com os americanos podiam dar um jeito já que americano não é muito fã de motor a diesel.

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
http://dzulnutz.blogspot.com/2016/03/relacao-de-marcha-refletindo-sobre.html