quinta-feira, 23 de julho de 2020

Refletindo sobre como o risco de um aumento na degradação ambiental em decorrência de uma eventual liberação do Diesel em veículos leves seria menos provável do que pudesse parecer

É muito comum que discrepâncias em algumas emissões entre os motores de ignição por faísca e os Diesel comparáveis levem a crer num eventual aumento da poluição caso ocorra uma liberação ampla do uso desse tipo de motor sem distinções baseadas nas capacidades de carga e passageiros ou tração. Especialmente os óxidos de nitrogênio (NOx) e o material particulado causam maiores preocupações, bem como a possibilidade de modelos mais antigos como o Chevrolet Kadett poderem em função da idade usarem motores homologados em normas de emissões já defasadas. A bem da verdade, convém lembrar que uma demora para o downsizing ganhar força no Brasil já dificulta encontrar um motor de tamanho menor para adaptação num automóvel compacto que permaneça enquadrado numa norma de emissões mais permissiva sem que o desempenho se torne decepcionante.

Em se tratando de veículos novos, um caso que merece observação é do Renault Duster, atualmente oferecido no Brasil somente com o motor 1.6 SCe flex com opção por câmbio manual ou automático. No mercado europeu, atualmente é oferecido com motores a gasolina de 1.0L com 3 cilindros e 1.3L com 4 cilindros, ambos com turbo e injeção direta, sendo o menor também disponível em versão com a capacidade de operar com gás liquefeito de petróleo (GLP - "gás de cozinha"), além do turbodiesel de 1.5L com as atualizações necessárias para ser homologado nas normas Euro 6d-TEMP em vigor. É de se destacar também que, apesar dos motores de ignição por faísca poderem simplesmente valer-se de um enriquecimento da proporção de combustível pela carga de ar de admissão de modo a diminuir a temperatura do processo de combustão enquanto o turbodiesel recorre ao sistema SCR e depende do fluido-padrão AdBlue/ARLA-32 para fazer um pós-tratamento dos gases de escape visando o mesmo efeito que é reduzir a emissão dos NOx, a injeção direta em motores a gasolina tem o efeito colateral de intensificar a antes negligenciável formação de material particulado, de modo que o motor 1.3 hoje necessita de filtro de material particulado para manter-se homologado tal qual ocorria com os Diesel em outras fases de controle de emissões.

Naturalmente, soa tentador abrir mão da injeção direta para motores flex turbo, a exemplo do que foi feito pela General Motors do Brasil com as versões brasileiras da 2ª geração do Chevrolet Onix, em contraponto ao ocorrido no congênere chinês movido somente a gasolina que não dispensou a injeção direta. De fato, mantém-se uma vantagem no tocante ao custo inicial comparado a um turbodiesel nas mesmas faixas de cilindrada, não só pelo motor propriamente dito mas também do pós-tratamento de escape que tornou-se tão crítico especialmente para os Diesel que já não tem algumas peculiaridades de ordem técnica levadas em consideração ao se estabelecerem as normas de emissões mais recentes, e ainda há um comodismo em torno do etanol como combustível veicular alternativo induzindo uma parte considerável do público generalista a considerar injustificável algum eventual interesse pelos motores turbodiesel e pelo biodiesel. Considerando o potencial agroenergético e de biorremediação de áreas degradadas desperdiçado pela falta de um fomento ao biodiesel, bem como críticas em torno da monocultura canavieira e do milho como matéria-prima alternativa para o etanol, na prática seria possível apontar uma maior presença do Diesel também em veículos leves como benéfica no tocante às questões de "sustentabilidade" hoje tão discutidas.

A princípio, poderia soar tentador recorrer a adaptações com motores de trator ou de embarcações de pequeno porte num veículo mais antigo, o que a bem da verdade poderia não ser tão má idéia levando em conta que alguns tratores já cumprem com as normas de emissões MAR-I que até podem chegar a ser mais rigorosas em comparação ao que hoje poderia soar como uma excessiva permissividade para o segmento veicular em outras épocas. Tendo em vista que alguns tratores ainda usam motores com o mesmo projeto básico desde quando uma certificação de emissões para maquinário agrícola no Brasil parecia um devaneio de ficção científica, a exemplo do Agrale 4230 que permanece usando o motor Agrale M-790 de 1.3L com 2 cilindros e refrigeração a ar ou do Yanmar 1055 equipado com o motor Yanmar 4TNV88 de 2.2L com 4 cilindros e refrigeração líquida, não há impedimento para que sejam eventualmente tão "limpos" quanto o motor a gasolina a ser substituído mesmo que a disponibilidade ainda seja maior no mercado de usados para os motores de especificação anterior. No entanto, outro aspecto a considerar é o valor de revenda relativamente alto que equipamentos e motores para usos especiais mantém, e assim quem teme que qualquer "pau véio" cujo preço praticamente não justifique nem a correta manutenção do motor original seja alvo duma gambiarra sem o cuidado para manter as emissões dentro de um limite regulamentado não tem motivo para se desesperar com a possibilidade de se adaptar motor auxiliar de veleiro num carro "popular" mais antigo...

O descrédito do etanol após o desmonte do ProÁlcool entre os governos Sarney e Collor, bem como o alinhamento ao chavismo na "era Lula" fazendo a euforia inicial dos motores "flex" ser fogo de palha, cobram seu preço tanto quanto uma maior sofisticação técnica de novos motores turbodiesel às vezes usada como desculpa para não tê-los oferecido em modelos como o Fiat Palio de 2ª geração nem para exportação. A disponibilidade limitada do gás natural também se torna outro empecilho, prejudicando especialmente operadores comerciais como taxistas e motoristas de aplicativo que dependam do carro para desempenhar uma atividade produtiva. Enfim, tendo em vista não apenas a questão de emissões e oportunidades perdidas para fomentar a cadeia produtiva do biodiesel, não é tão absurdo crer que o Brasil perde mais tanto no tocante à preservação ambiental quanto ao desenvolvimento econômico com a persistência de restrições ao uso de motores Diesel em veículos leves.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seja bem-vindo e entre na conversa. Por favor, comente apenas em português, espanhol ou inglês.

Welcome, and get into the talk. Please, comment only either in Portuguese, Spanish or English.


- - LEIA ANTES DE COMENTAR / READ BEFORE COMMENT - -

Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
http://dzulnutz.blogspot.com/2016/03/relacao-de-marcha-refletindo-sobre.html