quarta-feira, 23 de março de 2022

Kia Stonic: um retrato de algumas contradições do mercado brasileiro

Lançado no Brasil somente em novembro do ano passado, e apresentado como o híbrido mais barato do país, o Kia Stonic é classificado como um SUV compacto em que pese a aparência mais próxima de um hatch. O perfil mais direcionado a um público essencialmente urbano já demonstra uma contradição que também se observa em outras regiões, onde uma categoria de veículos "utilitários" deixou a austeridade para trás, sendo alçada à condição de um símbolo de status para a classe média, de modo que inserir até um modelo mais generalista numa classificação hoje considerada mais prestigiosa aos olhos do público tende a atrair alguns consumidores. E a forma como a hibridização leve foi inserida, em alguns países já apresentada de forma antagônica ao uso anterior de motores turbodiesel, também chama atenção diante de algumas peculiaridades do mercado brasileiro.

O mesmo motor Kappa II T-GDi de 1.0L e 3 cilindros, que em alguns modelos de fabricação nacional da Hyundai é flex e portanto apto a operar tanto com gasolina quanto etanol, ainda é especificado como movido somente a gasolina no Kia Stonic, em que pese exatamente uma ascensão do turbo e da injeção direta ao menos teoricamente favorecer o etanol no tocante à partida a frio. E considerando também os eventuais benefícios práticos que podem favorecer os híbridos em algumas localidades como isenção do rodízio em São Paulo, que além de ser um dos principais mercados automobilísticos brasileiros ainda é mais receptivo ao etanol, torna-se mais conveniente apresentar uma integração de diferentes alternativas ao invés de apostar em uma única solução "milagrosa". Tratar de como o turbo e a injeção direta foram essenciais para dissociar essa faixa de cilindrada daquele estigma de pobreza, remontando ao programa do "carro popular" instituído durante o governo Collor, seria chover no molhado, embora certamente a incidência de impostos escalonada de acordo com a cilindrada também seja aplicada a outros mercados onde seja mais aceita também em segmentos efetivamente mais prestigiosos.

O sistema "híbrido leve" de 48 volts, que não permite ao veículo trafegar somente com o motor elétrico, é outra estratégia de custo relativamente comedido e fácil de aplicar a veículos mais compactos, para os quais a complexidade e o tamanho tanto de alguns sistemas híbridos aplicados a veículos só a gasolina ou flex quanto de alguns dispositivos de controle de emissões destinados aos motores turbodiesel mais modernos são frequentemente apontados como um problema. Naturalmente o favorecimento no âmbito político/burocrático tanto à hibridização mesmo com um caráter estritamente auxiliar quanto a motores de 1.0L é outro fator a ser levado em consideração, mas chama a atenção como a proposta de economia de combustível e redução de emissões ainda é apresentada como algo mais pretensioso mesmo que seja facilmente aplicável a modelos mais austeros tendo em vista exatamente que esse sistema tem no custo e na instalação simplificada alguma vantagem prática para consumidores generalistas e possa atender até a modelos com câmbio manual, que em alguns países ainda é oferecido no Kia Stonic como opção ao automatizado de dupla embreagem usado no Brasil.

Na prática, o mercado brasileiro tem contradições, da obsolescência do programa do "carro popular" à obsessão da classe média urbana por SUVs em detrimento de outras categorias, passando pela desconfiança com o etanol e a tentativa de atribuir prestígio a uma solução que seria facilmente implementada até em carros "populares". Pode-se argumentar que essa estratégia bem sucedida em outros países ao invés de ser exclusiva do Brasil, mas em outros mercados apresentar híbridos de forma antagônica ao Diesel torna incoerente atribuir a esse sistema mais discreto uma condição mais prestigiosa, visto que a regulação de emissões de material particulado em motores a gasolina ou flex com injeção direta leve à exigência do filtro de material particulado antes considerado um calcanhar-de-Aquiles específico do Diesel o custo é um dos motivos para os fabricantes aderirem à hibridização em modelos mais compactos e generalistas. Enfim, contrariando definições mais ortodoxas de SUV, sem oferecer todas as funcionalidades de um híbrido e contando com os benefícios fiscais dos "populares", o Kia Stonic é um retrato interessante dessas contradições.

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

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Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
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