terça-feira, 1 de dezembro de 2020

Caso para reflexão: Fiat Strada e oportunidades para motores Hesselman num contexto latino-americano

O recente lançamento da 2ª geração da Fiat Strada, atual líder entre as pick-ups derivadas de carros no Brasil e na América Latina sendo oferecida em alguns mercados de exportação regional como RAM 700, já seria algo a se destacar apenas por tratar-se de um modelo bastante reconhecido e bem adequado a algumas especificidades regionais. No entanto, ao usar somente motores de ignição por faísca até em países onde a geração anterior mantinha a opção pelo turbodiesel ao menos em uma versão leva a crer que seja oportuno considerar como agora pode ser um exemplo de como seria oportuno no contexto da América Latina algumas oportunidades para a aplicação de motores Hesselman não apenas em função de custos mas também diante de restrições arbitrárias que impedem ou no mínimo dificultam oferecer motores Diesel. A pesada tributação que passou a incidir no Uruguai a ponto de dizimar a participação de veículos leves com motor Diesel no mercado local, ou a exigência de cilindrada acima de 4000cc na Bolívia inviabilizando a importação de versões turbodiesel de alguns modelos não apenas com um porte mais compacto como a Strada/RAM 700 mas também pick-ups médias e algumas grandes à medida que o downsizing avança, são desafios tão complexos quanto uma já comprovadamente infundada proibição relacionada às capacidades de carga e passageiros ou tração que segue em vigor no Brasil.

Falar sobre a modularidade da atual geração de motores GSE (Global Small Engine)/Firefly é chover no molhado, considerando também a inclusão da injeção direta no programa de desenvolvimento ao invés de se restringir à injeção sequencial nos pórticos de válvula ainda em uso no motor 1.4 FIRE que equipa a Fiat Strada Endurance. Ainda que o FIRE tolere melhor até algumas improvisações como adaptações de carburador, prática que permanece relativamente comum na Argentina favorecido especialmente em função do etanol não ser tão amplamente usado por lá e portanto fazer frente à gasolina fique a cargo do gás natural, não se pode esquecer que a injeção direta é imprescindível para fazer um motor de ignição por faísca poder operar também com óleo diesel convencional mesmo dotados de taxas de compressão menos elevadas em comparação a um motor Diesel propriamente dito e que se mantivessem a injeção nos pórticos de válvula poderiam na melhor das hipóteses ser adaptados para conseguir funcionar com querosene se ainda fosse um combustível tão fácil de encontrar a preços razoáveis no varejo. Melhorias em algumas especificações do óleo diesel convencional na atualidade, destacando-se o índice de cetano que quantifica a intensidade de propagação da chama nas câmaras de combustão, somando-se a maior precisão que o gerenciamento eletrônico de injeção e ignição pode proporcionar, pode-se arriscar que as condições estejam menos desafiadoras em comparação às que Jonas Hesselman enfrentou em 1925 para apresentar o que foi a primeira aplicação da injeção direta em motores veiculares de ignição por faísca.

É necessário lembrar que a atual especificação do motor 1.3 Firefly já em uso na Fiat Strada permanece com a injeção nos pórticos de válvula bem como o cabeçote com duas válvulas por cilindro e comando por eixo único, contrastando com a configuração de injeção direta e 4 válvulas por cilindro com duplo eixo de comando aplicada às versões 1.0 e 1.3 turbo já usadas no exterior e também no 1.0 mild-hybrid com aspiração natural desenvolvido para a Europa. Outro ponto a se destacar é que a injeção direta tem dentre as vantagens possibilitar o recurso a uma taxa de compressão mais elevada, que aproveita melhor as propriedades do etanol num mesmo motor que de outra forma inviabilizaria manter a capacidade de operar com gasolina sem inconvenientes que pudessem até comprometer a eficiência geral, mesmo não chegando aos patamares significativamente mais altos tradicionalmente observados em motores Diesel. E apesar de soar cada vez mais difícil prescindir de alguns dispositivos de controle de emissões como o filtro de material particulado já exigido também entre os motores a gasolina de injeção direta em países desenvolvidos, e que a menor volatilidade do óleo diesel convencional e eventuais substitutivos como o biodiesel não deixe de ser mais problemática em comparação à gasolina e ao etanol, a maior facilidade que ainda se observa com a ignição por faísca para enquadrar-se nas normas de emissões cada vez mais rigorosas sem lançar mão do turbo que é inegavelmente algo oneroso tem potencial para minimizar o impacto que um motor Diesel propriamente dito acarretaria sobre o custo inicial.

Em meio a fatores que vão desde atos burocráticos com pouco ou nenhum embasamento técnico até um cenário de incertezas econômicas desencorajando investimentos mais vultuosos, não sendo equivocado apontar também o desconhecimento do público generalista com relação aos motores Hesselman, ainda é oportuno considerar como permanece um conceito válido e que tem mais a oferecer do que vê o público generalista ao longo da América Latina. Desconfianças em torno do etanol após o desmantelamento do ProÁlcool, bem como os eventuais impactos de uma conversão para gás natural sobre a capacidade de carga tanto em peso quanto volume, tornam ainda mais desejável conciliar a percepção do custo inicial menor dos motores de ignição por faísca à capacidade de compartilhar um combustível comum a outros veículos e equipamentos tão valorizada por operadores militares a ponto de ter feito do Diesel o padrão nas frotas militares operacionais de países-membros da OTAN. Enfim, tratando-se de uma região mais complexa do que um europeu ou um americano poderiam imaginar após assistir filmes ambientados no México ou no Rio de Janeiro ou até na Amazônia, algumas condições até certo ponto inesperadas soam convidativas a reviver num utilitário compacto e destinado a alguns mercados emergentes uma solução técnica mais reconhecida em função da aplicação em caminhões suecos até por volta de 70 anos atrás...

2 comentários:

  1. Tenho lá minhas dúvidas de que pudesse dar certo motor Hesselman num carro novo, mas do jeito que a turma gosta duma gambiarra não seria de se duvidar que algum Professor Pardal tentasse a sorte.

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
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