terça-feira, 11 de agosto de 2020

Algumas observações sobre a importância da Índia numa cena dieselhead pós-coronavírus

Em meio à maior crise sanitária deflagrada com a propagação do coronavírus chinês a nível mundial, uma questão até mais estratégica do que comercial torna necessário rever até que ponto o mundo está disposto a insistir na desumanidade de um equivalente moderno ao antigo "coolie trade" e abrir mão de propriedade intelectual para beneficiar uma ditadura comunista em nome de uma economia porca. A baixa qualidade historicamente associada aos produtos chineses, para a qual muitas vezes se faz vista grossa em nome do uso de mão-de-obra praticamente escrava a exemplo do que ocorria na época em que trabalhadores braçais de origem asiática eram escravizados por endividamento visando substituir o negro nas "plantations" das colônias inglesas e holandesas no Caribe e, mais especificamente no caso de chineses, ser como jumentos de garimpeiro durante a Corrida do Ouro e na abertura de ferrovias na costa oeste dos Estados Unidos, não é benéfica nem para quem se ilude pelo preço de alguma bugiganga como uma central multimídia ou até de alguma peça de reposição para um motor que vá comprometer a segurança e a eficiência e nem para os funcionários de fábricas nas quais o partido comunista chinês viola sistematicamente os mesmos direitos trabalhistas que os sindicatos alinhados à esquerda alegam defender no Ocidente. Mas numa reação contra o bioterrorismo chinês que paralisou as principais economias mundiais, e que foi pretexto para violações de direitos básicos até mesmo no Brasil onde prefeitos e governadores cercearam a liberdade de ir e vir em nome de um suposto "achatamento da curva de contágio" que se mostrou mais próximo de matar o povo de fome do que prevenir uma doença, é importante observar como a Índia pode se tornar um parceiro mais interessante sob o ponto de vista comercial e também técnico.

A colaboração entre o presidente brasileiro Jair Bolsonaro e o primeiro-ministro indiano Narendra Modi para o suprimento de insumos necessários à produção do antimalárico hidroxicloroquina, que tem sido uma das principais alternativas de baixo custo para o tratamento do novo coronavírus chinês, tem uma importância em aproximar Brasil e Índia sem aquele viés esquerdista de tornar os ditos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) um bloco de oposição a outros que contam com a participação de países desenvolvidos, e naturalmente uma cooperação que vem a servir para efetivamente buscar por soluções para alguns problemas comuns tanto ao Brasil quanto à Índia pode ainda revelar-se proveitosa para outras finalidades. É interessante observar que a Índia após a descolonização teve algum progresso em importantes áreas da engenharia, a ponto de já ter conseguido exportar viaturas militares até mesmo para Israel e atualmente ser um hub de desenvolvimento de motos de pequena cilindrada com um alto grau de sofisticação, ao invés de se limitar a fazer cópias não-autorizadas de motores Honda CG 125 e fazer algumas gambiarras em cima dessa mesma plataforma como a maioria das fabricantes de motos chinesas se habituaram a fazer. Naturalmente também ocorre na Índia o aproveitamento de alguns projetos de motores já considerados obsoletos na Inglaterra e no Japão que no entanto se mantenham adequados às condições ambientais severas e à economia indiana que também se enquadra no conceito de "emergente" aplicável ao Brasil, mas nesse caso prevalecendo o respeito à propriedade intelectual de uma forma que não encontra similaridade na China, e pode-se atribuir ao fato da Índia contar com uma população de mais de 1 bilhão de pessoas a possibilidade de desenvolver-se um mercado consumidor tão amplo como o chinês ainda que com demandas mais conservadoras.

Não se pode negar que a colonização inglesa deixou marcas profundas no desenvolvimento industrial indiano, com empresas tão britânicas como a fabricante de motos Royal Enfield passando a ser indianas enquanto a marca Leyland permanece viva na fabricante de utilitários e motores Ashok Leyland ou no fato da Jaguar e da Land Rover terem se tornado uma divisão da Tata Motors que é uma das principais fabricantes de veículos indiana, ou ainda observando-se a sobrevida que alguns motores mais antigos da Perkins serem atualmente produzidos pela Simpson e serem usados pela Massey-Ferguson em tratores fabricados "logo ali do lado" na Argentina. E por mais que seja vendida no Ocidente a imagem da Índia como um destino turístico exótico com toda sorte de incensos e comida exageradamente condimentada, e fomentando a ilusão de que seria basicamente uma espécie de zoológico humano repleto de miséria, é importante destacar que alguns aspectos culturais ingleses permanecem ainda refletidos nas indústrias indianas onde a qualificação da mão-de-obra não deixa tanto a desejar em comparação a outros países periféricos e sendo claramente superior à chinesa. No caso específico de motores Diesel, cabe destacar não apenas a Simpson mas também outros fornecedores independentes de origem local como a Greaves Cotton que já equipa versões modernas do triciclo utilitário Piaggio Ape vendidas na Europa onde são homologados nas normas de emissões Euro-4 aplicadas às motocicletas enquanto na Índia já se aplicam as normas Bharat Stage VI equivalentes à Euro-6 que exigiram o desenvolvimento de uma solução para conciliar custo moderado e fácil manutenção que são essenciais nesse tipo de aplicação. E por mais que no segmento automobilístico a BS-VI esteja superada pela Euro-6d TEMP em vigor na Europa, talvez a procura de fabricantes ocidentais por fornecedores de componentes e sistemas fora da China torne-se uma boa oportunidade para a Índia como um mercado com larga margem para expansão dos volumes de vendas destacar-se também no desenvolvimento de motores veiculares com tecnologia autóctone em meio à reticência que vem sendo generalizada na Europa quanto à viabilidade futura de novos projetos voltados ao Diesel.

Mesmo que a recente entrada em vigor da BS-VI tenha levado a uma maior procura por veículos com motor de ignição por faísca em função da menor complexidade dos sistemas de pós-tratamento, bem como do custo de aquisição inicial menor e da possibilidade de mantê-los licenciados na capital Nova Délhi por até 15 anos enquanto um veículo com motor Diesel já enfrenta restrições por lá após 10 anos, não deixa de se manter relevante o potencial dos biocombustíveis como o biodiesel e também o etanol para conciliar o desenvolvimento das regiões rurais, além da aplicabilidade não se restringir a veículos e a amortização de investimentos em novos projetos ter espaço em tratores e embarcações por exemplo. E por mais que a rusticidade ainda observada em motores agrícolas e marítimos de trabalho pareça um retrocesso ao considerar uma eventual intercambialidade com automóveis e utilitários comerciais, não se pode negar tanto uma similaridade entre alguns métodos de controle de emissões como os filtros de material particulado (DPF) e catalisadores tanto em veículos quanto equipamentos especiais, enquanto a melhor relação peso/potência que já se observa em alguns motores turbodiesel veiculares desenvolvidos localmente na Índia como os Greaves da série Leap em versões de 2 a 4 cilindros que vão de 1.0L até 2.0L contando também com opções de 3 cilindros e 1.5L pode servir satisfatoriamente também como uma alternativa aos motores de projeto ocidental como o Renault K9K e o Fiat 1.3 Multijet II que foram tirados de linha na Índia em resposta à Bharat Stage VI ao invés de seguir adiante com dispositivos para controle de emissões já conhecidos na Europa quando da implementação da Euro-6. Poderia-se traçar um paralelo com a antiga hegemonia da MWM no Brasil como fornecedora de motores para pick-ups e caminhões antes da reabertura das importações na década de '90 ter favorecido a aceitação de motores de alta rotação à medida que as pick-ups médias de origem japonesa ganharam espaço, mas no caso de empresas como a Greaves Cotton ou até a Ashok Leyland que dispõe de um motor turbodiesel próprio de 1.5L não seriam de se descartar novas oportunidades à medida que o outsourcing possa reaver uma importância como alternativa para favorecer a economia de escala em novos desenvolvimentos no âmbito do controle de emissões e proporcionar um retorno mais rápido dos investimentos.

Ainda que a mão-de-obra barata em comparação a países ocidentais possa fazer a Índia parecer com um imenso complexo prisional a exemplo do que ocorre na China, e estereótipos associados ao hinduísmo e ao sistema de "castas" fomentarem uma ignorância quanto à diversidade religiosa indiana na qual estão inseridas também o sikhismo, o jainismo e o budismo, o desenvolvimento industrial que levou algumas empresas indianas a promoverem um "colonialismo às avessas" e manter a tradição de antigas potências industriais britânicas leva a crer não só na busca por um aperfeiçoamento técnico mas também por uma melhor compreensão das características culturais dos mercados de exportação ao invés de simplesmente fazer como a China adepta do dumping e da venda de falsas soluções para problemas que ela mesma propaga. Com uma longa história de cooperações técnicas não só com empresas inglesas e japonesas no campo do Diesel mas também com a Navistar/International e a Peugeot no caso da Mahindra. e uma confiabilidade que se fez presente até em operações militares israelenses nas quais um mínimo detalhe pode ser decisivo, a Índia está longe de ser um ovo de serpente como a China tem se revelado à medida que o dumping sustentado por mão-de-obra análoga à escravidão sufoca o desenvolvimento industrial de outros países periféricos e já ameaça também mercados mais desenvolvidos em segmentos com um maior valor agregado como na eletrônica de precisão. Enfim, por mais que não seja possível negar que algumas peculiaridades culturais causem alguma controvérsia, e no âmbito político o fato da Índia ser um dos maiores mercados para o gás natural parecerem gerar um fogo amigo, seria precipitado negar que a Índia possa destacar-se numa cena dieselhead pós-coronavírus em que o aspecto essencialmente utilitário permaneça relevante em mercados emergentes e seja revigorado na Europa diante de uma falta de interesse de fabricantes locais em atender a uma demanda que vem sendo reprimida mais por política que por dificuldades estritamente técnicas.

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
http://dzulnutz.blogspot.com/2016/03/relacao-de-marcha-refletindo-sobre.html