domingo, 21 de fevereiro de 2016

Caso para reflexão: Jeep caracterizado no padrão do LRDG

Que o Jeep foi de suma importância para a vitória aliada na 2ª Guerra não restam dúvidas, mas o veículo estava longe de ser tecnicamente perfeito. Em que pesem as limitações do desenvolvimento de motores Diesel suficientemente compactos e leves à época do conflito, bem como os custos que estariam envolvidos no caso de uma reconfiguração de fábricas de veículos civis para que passassem a produzir motores Diesel com os quais a maioria dos recrutas de certa forma era pouco familiarizada em comparação com os flatheads a gasolina que ainda reinavam absolutos no mercado americano, restavam poucas opções. Um caso a se observar era o de viaturas usadas pelo Long Range Desert Group (Grupo de Longo Alcance do Deserto), unidade do Exército Britânico também conhecida pela alcunha "escorpiões do deserto" e responsável pelas operações que combatiam os Afrika Korps da Alemanha nazista no norte da África. Além da maior abertura na grade de refrigeração, expondo mais o radiador a possíveis danos, é conveniente observar o quanto da capacidade de carga do veículo era comprometida pelos galões de gasolina. Também vale destacar que a maior volatilidade da gasolina em comparação ao óleo diesel ou ao querosene, que favorecia o risco de explosões e incêndios, além do mais sob o sol escaldante do Saara. No tocante à refrigeração e outros parâmetros inerentes ao funcionamento do motor, cabe salientar que o ciclo Diesel tem uma maior conservação de energia térmica em comparação aos ciclos termodinâmicos que recorrem à ignição por faísca como o Otto (4-tempos) e o 2-tempos, e portanto além do menor consumo de combustível e por extensão viabilizando um menor comprometimento da capacidade de carga do veículo, até a refrigeração tornaria-se mais eficiente com o Diesel, sem demandar tanta exposição do radiador a elementos possivelmente danosos (mesmo a areia, capaz de provocar abrasão).

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Rebatendo mais um gaseiro fanático

Não é incomum que anônimos apareçam para tentar rebater uma crítica ao gás natural, embora nem sempre tenham o comentário aprovado para exibição devido ao teor ou a um excesso de erros ortográficos. O comentário abaixo é um dos que não foram aprovados.

"Aqui so tem babaca ostentando q o diesel é melhor do q qualquer coisa, colocando justificativas sem sentido. Se o GNV for usado de forma correta ele é um excelente combustivel. E se for tanto assim q o diesel é o melhor, entao porque as fabricas de carros nao oferecem esse luxo e satisfacao aos compradores ? Porque nao é o melhor ! Ele é so mais um dos tantos combustiveis com seus pros e contras. Na hora q vc comecar a fazer as contas e calcular a economia do GNV em comparacao ao resto dos combustiveis, a final de contas se vc ficar com o carro mais de 2 anos, conseguiría comprar outro zerado ( se for o caso q o motor esteja sem condicoes de rodar, o qual nao é). Poderia ficar o dia todo aqui esclarecendo pra vcs o errado q aprenderam e estao demonstrando aqui mas nao vale a pena. Da vergonha aleia de ler esses comentarios falando besteira. Bom dia pra vcs"
 
 
Além da arrogância, o anônimo não oferece nenhum argumento válido em defesa do gás natural, preferindo começar partindo para o ataque.
"Aqui so tem babaca ostentando q o diesel é melhor do q qualquer coisa, colocando justificativas sem sentido."
O gás natural exige sistemas de armazenamento um tanto complexos, pesados e volumosos, que de fato comprometem a capacidade de carga do veículo, logo torna-se um estorvo para usuários que priorizem a área útil do compartimento de carga ou bagagens pelas mais diferentes razões. E mesmo em condições de pouca carga, o peso extra agregado pelo sistema de gás natural provoca esforços mais intensos sobre a suspensão e os freios, principalmente os traseiros, tanto que em veículos preparados direto de fábrica para rodar com o gás, tanto no Brasil como no exterior, é usual que as molas e os freios traseiros sejam redimensionados para contrabalançar esses esforços.

"Se o GNV for usado de forma correta ele é um excelente combustivel."
Pode até ser. Porém, mesmo quando usado de forma "correta", definição um tanto vaga, o gás natural veicular não é uma alternativa perfeita para todos os usuários. E a bem da verdade, ainda é muito comum que seja usado de formas que podem ser consideradas incorretas, como recorrendo a kits de conversão não-gerenciados em veículos de fabricação posterior a '97, em desacordo com as normas de emissões em vigor, aumentando o consumo ao usar o gás e comprometendo o desempenho do veículo. Além do mais, como o mais usual ainda é montar os cilindros de armazenamento de GNV dentro do habitáculo, qualquer vazamento já traz riscos mais acentuados não só de incêndios e explosões mas até mesmo de asfixia por deslocamento do oxigênio em casos extremos associados a uma menor renovação do ar no interior do veículo.

"E se for tanto assim q o diesel é o melhor, entao porque as fabricas de carros nao oferecem esse luxo e satisfacao aos compradores ? Porque nao é o melhor !"
Em mercados mais livres, o Diesel não é tratado como "luxo", enquanto por aqui as restrições governamentais ao uso em veículos leves são o problema. Muitos veículos que são fabricados no Brasil contam com versões Diesel exclusivas para exportação. Logo, afirmar que o Diesel não seja oferecido por aqui porque "não é o melhor" é um argumento pobre e insustentável.

"Ele é so mais um dos tantos combustiveis com seus pros e contras."
De fato, o óleo diesel convencional é só mais um entre tantos combustíveis, e tem seus prós e contras. Mas o ciclo Diesel tem na adaptabilidade a um amplo espectro de combustíveis alternativos uma grande vantagem. Desde o biodiesel até o uso direto de óleos vegetais, passando também pelo etanol, há soluções para minimizar o impacto ambiental sem comprometer em demasia o desempenho ou a capacidade de carga. A simplicidade e a resiliência diante de combustíveis com especificações que por vezes podem ser muito diferentes das recomendadas pelo fabricante do motor ou do veículo também fazem com que sejam o padrão para as frotas militares dos países-membros da OTAN.

"Na hora q vc comecar a fazer as contas e calcular a economia do GNV em comparacao ao resto dos combustiveis, a final de contas se vc ficar com o carro mais de 2 anos, conseguiría comprar outro zerado ( se for o caso q o motor esteja sem condicoes de rodar, o qual nao é)."
O gás pode ser financeiramente vantajoso em comparação à gasolina e ao etanol em motores de ignição por faísca, mas não chega a ser melhor que o Diesel e ainda sofre com disponibilidade mais restrita. E mesmo com a alegada economia, chega a soar exagerado a alegação de que seria possível comprar outro veículo 0km apenas com o valor que deixa de ser gasto com combustível de curto a médio prazo.

"Poderia ficar o dia todo aqui esclarecendo pra vcs o errado q aprenderam e estao demonstrando aqui mas nao vale a pena. Da vergonha aleia de ler esses comentarios falando besteira."
Dá vergonha ALHEIA de alguns prováveis analfabetos funcionais que não sabem interpretar um texto e contra-argumentar de maneira coerente, tampouco escrever.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Motor transversal em utilitários: longe de ser um demérito

Uma característica cada vez mais presente nas atuais gerações de utilitários esportivos, embora não escape a críticas, é a disposição transversal do motor. Dentre as principais motivações, destacam-se a economia de escala ao proporcionar um maior compartilhamento de componentes mecânicos e estruturais com automóveis comuns, melhor aproveitamento de espaço interno em função do layout mais compacto do trem de força, menores perdas por atritos na transmissão e, até certo ponto, um perfil de utilização cada vez mais urbano. O uso dessa configuração em modelos como o Renault Duster e o Jeep Renegade, por exemplo, é um dos fatores que os leva a ter a capacidade de incursão off-road vista com alguma desconfiança por consumidores com um perfil mais conservador.
As limitações de espaço para a acomodação da transmissão se refletem na preferência por um diferencial central, mais compacto e leve que uma caixa de transferência. Também é freqüente que seja eliminada a relação de marcha "reduzida", que deveria definir se um veículo com tração nas 4 rodas e capacidade de carga inferior a 1000kg poderia ser classificado como "utilitário" e legalmente apto ao uso de motor Diesel no mercado brasileiro, embora uma relação mais curta da 1ª marcha seja considerado análogo à "reduzida" de acordo com os Requisitos Operacionais Básicos (ROBs) definidos pelo Exército Brasileiro para a homologação das viaturas. No caso do Jeep Renegade, o câmbio automático de 9 marchas usado nas versões 4X4 Diesel segue essa estratégia, que está longe de ser novidade. Na década de 80 o clássico Engesa 4, que seguia uma concepção tradicional com motor longitudinal, valia-se da 1ª marcha crawler no câmbio manual de 5 marchas para compensar a velocidade única da caixa de transferência.

Se por um lado a maior facilidade para fazer modificações nas suspensões e relação de marcha ainda favorece o motor longitudinal devido à separação mais clara entre câmbio, caixa de transferência e diferenciais em comparação a um transeixo (conjunto único formado entre transmissão e um eixo motriz, normalmente o dianteiro) transversal, além do espaço disponível para adaptações de outro motor no lugar do original, por outro o peso e o custo de produção mais elevados, bem como as pressões por metas mais rigorosas de diminuição de emissões e consumo também entram na equação. Até mesmo grandes sucessos do mercado mundial tem recorrido a essa configuração. Digno de nota é o caso do Jeep Cherokee, que nas gerações anteriores só era oferecido com motor longitudinal e tração traseira ou 4X4 com "reduzida", hoje contando com motor transversal e tração dianteira ou 4X4, com ou sem "reduzida" de acordo com a versão.

Não deve ser ignorada a contribuição das assistências eletrônicas para compensar eventuais desvantagens inerentes a um sistema de transmissão simplificado. Quando foi introduzida a 1ª geração do Land Rover Freelander em '97, não só a ausência da "reduzida" mas também de um bloqueio de diferencial provocaram alguma desconfiança inicial, que logo ficava para trás. O controle de tração e a calibração do sistema ABS dos freios assumiam posição de destaque entre os recursos que o credenciavam frente a outros "crossovers" que começavam a surgir, e até certo ponto honrando a tradição da marca Land Rover. Caso fossem incorporado o bloqueio dos diferenciais, por exemplo, poderia ser apontada uma redundância com o controle de tração, que também acaretaria num maior custo de produção devido à maior complexidade mecânica. Diante da massificação dos sistemas de freios ABS acompanhados dos controles de tração e estabilidade em mercados mais desenvolvidos sob o pretexto da segurança veicular também em outros segmentos, fica difícil ignorar as vantagens da economia de escala.

Em utilitários de outras categorias, como furgões, também há vantagens inerentes ao motor transversal, e até mesmo à tração dianteira embora esta permaneça alvo de polêmicas quando aplicada a veículos mais pesados. Tomando por referência o Fiat Ducato de motor transversal e tração dianteira e o Iveco Daily de motor longitudinal e tração traseira, ambos com uma configuração de cabine semi-avançada, é justo levar em conta não apenas a menor intrusão do conjunto mecânico na cabine do Ducato proporcionando condições mais favoráveis à otimização da ergonomia do posto do condutor mas também a maior facilidade para a aplicação de um tratamento termoacústico eficiente no compartimento do motor, favorecendo o conforto. No tocante à tração, o Ducato também leva vantagem devido à plataforma de embarque mais baixa, tendo em vista que ocorre uma menor interferência da ação dos componentes da suspensão traseira em comparação ao Daily.

Um caso muito peculiar é o da geração anterior da Ford Transit, que no Brasil foi oferecida com motor longitudinal e tração traseira enquanto no México recorria ao motor transversal com tração dianteira, e dispunha de ambas as opções na Europa. Por mais que nas versões de chassi e cabine a vantagem da menor altura do assoalho na seção traseira não fosse tão fácil de aproveitar devido ao formato das longarinas mesmo que tivesse vindo com tração dianteira, no furgão de carroceria integral ainda seria viável valer-se desse recurso. Outra vantagem a se considerar estaria na menor tendência ao sobresterço ("saída de traseira") em curvas, bem como a maior capacidade volumétrica entre veículos nas distintas configurações de tração dotados da mesma altura externa, além da concentração de peso mais para baixo com o veículo carregado rebaixar o centro de gravidade, favorecendo a estabilidade mesmo em velocidades mais altas, particularmente útil em ambulâncias.

Deixando um pouco de lado as distinções entre aplicações particulares ou profissionais, a configuração de motor transversal tem vantagens que não podem mais ser simplesmente ignoradas sob o pretexto de um alegado conservadorismo do público consumidor. Com menos peso, inércia e atritos parasitas, é um recurso que vem contribuindo de forma significativa para uma melhoria considerável na eficiência energética de utilitários esportivos, bem como de alguns veículos comerciais. Também é conveniente salientar a contribuição para o conforto, sem no entanto esquecer da segurança. É justo afirmar que o motor transversal em utilitários, portanto, está longe de ser um demérito.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Caso para reflexão: food-trucks

A popularidade dos food-trucks no Brasil ganhou um impulso relativamente recente, indo muito além do cachorro-quente. Embora alguns cardápios sigam uma proposta mais "saudável" e sem frituras, outros tantos contam com esse método de preparo dos alimentos devido à relativa rapidez. Desde um simples pastel de carne até alguns pratos mais elaborados, não pode faltar óleo vegetal ou mesmo gorduras animais como banha de porco dependendo da receita.

Mas o que fazer com o óleo de frituras saturado? O mais comum é que seja encaminhado a fábricas de produtos de limpeza, e permutado por uma parte do sabão produzido a partir de óleos reciclados que é usada na higienização do mobiliário e dos utensílios de cozinha como acontece em restaurantes e lanchonetes instalados em pontos fixos. O que pode passar despercebido num primeiro momento é que os food-trucks oferecem uma condição ideal para experiências com o uso do óleo vegetal como combustível alternativo. O calor residual ainda presente logo após ser retirado da fritadeira já é suficiente para manter a fluidez do óleo devido à redução da viscosidade enquanto aquecido, reduzindo os riscos de polimerização da glicerina por combustão incompleta e deposição de sedimentos ao redor dos anéis de pistão ou contaminação do óleo lubrificante, podendo inclusive ser dada a partida usando o combustível alternativo ao invés de usar o óleo diesel convencional e esperar até que o sistema de arrefecimento atinja uma temperatura suficiente para que um trocador de calor a ser montado no tanque de combustível mantenha o óleo vegetal suficientemente quente (entre 70 e 90º C) para manter uma baixa viscosidade, boa fluidez e fácil atomização

Para evitar danos ao motor, entretanto, ainda é recomendado que o óleo de cozinha saturado passe ao menos por uma filtragem simples para evitar que partículas sólidas em suspensão possam danificar as linhas de combustível ou até mesmo a bomba e os bicos injetores. Com os preços do óleo diesel S-500 já superando R$3,00 por litro em algumas regiões, e o valor entre R$0,05 e R$0,25 do litro de óleo vegetal pós-consumo ao ser encaminhado para reciclagem, é algo importante a se considerar...

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Caso para reflexão: Fiat Punto importado pelo consulado italiano


Mesmo que esse Fiat Punto SX 1.1ie importado em '95 pelo consulado-geral da Itália em Porto Alegre seja movido a gasolina, não deixa de ser um bom pretexto para se refletir sobre a liberdade que as missões diplomáticas e algumas organizações não-governamentais estrangeiras tem para importar sem incidência de impostos qualquer veículo automotor para uso oficial, mesmo que não estejam de acordo com alguma norma brasileira como é o caso das restrições ao uso do óleo diesel convencional como combustível em modelos com capacidade de carga inferior a 1000kg, acomodação para menos de 9 passageiros além do condutor ou tração 4X4 com caixa de transferência de dupla velocidade (a popular "reduzida").

Logo num país como o Brasil, no qual a volatilidade dos preços dos combustíveis é um problema a ser levado em consideração, não me parece muito sensato quando uma representação diplomática dispensa tal privilégio. Cabe lembrar que o motor Diesel oferecido como opção no Fiat Punto na época que esse exemplar foi produzido, de 1.7L com 58cv na versão naturalmente aspirada ou 70cv com turbo, era feito também no Brasil para atender a mercados de exportação, e portanto a reposição de peças poderia ficar até mais simples em comparação ao FIRE de 1.1L e 8 válvulas a gasolina, e essa linha de motores só começou a ser produzida no Brasil a partir de '99. Embora não seja tão difícil providenciar outro transporte com alguma antecedência para uso em atividades administrativas ou representativas, seria um tanto mais complicado ficar sem condições de atender a uma emergência consular com a rapidez necessária enquanto esperasse a chegada de peças de reposição.

A qualidade inferior do óleo diesel brasileiro, e também sujeita a maiores variações de acordo com a região, já chegou a ser apontada durante uma conversa informal com um funcionário do consulado-geral da Alemanha em Porto Alegre para justificar o temor em trazer veículos com motores Diesel mais modernos e sofisticados. Tal argumento cairia por terra ao observarmos a possibilidade de recorrer ao adido militar da embaixada para homologar os veículos de acordo com as normas de emissões em vigor para as frotas militares do país estrangeiro, normalmente menos restritivas que as impostas sobre veículos de uso civil. Além da maior resiliência de motores "militarizados" ao operar com óleo diesel de baixa qualidade, tomando teores elevados de enxofre e baixo índice de cetano (velocidade de propagação de chama nas câmaras de combustão) como os principais parâmetros, convém recordar a maior adaptabilidade do ciclo Diesel a combustíveis alternativos em caso de extrema necessidade, desde o biodiesel até óleos vegetais puros passando até pelo querosene que já foi muito usado como aditivo para o óleo diesel convencional com intuito de melhorar a fluidez durante o inverno e facilitar a partida a frio mas pode prejudicar a lubrificação das bombas injetoras, principalmente as do tipo distributivas (também chamadas de rotativas).

Diante de tantas vantagens inerentes ao uso irrestrito do Diesel por representações diplomáticas, também é conveniente lembrar que após um certo prazo os veículos podem ser revendidos para brasileiros durante as renovações de frota das embaixadas e consulados e regularizados para rodar livremente como aconteceu com esse Punto, sendo um dos poucos recursos acessíveis a um brasileiro que deseje ter um automóvel movido a óleo diesel. Mas deixando de lado a questão da imunidade diplomática, é no mínimo contraditório que continue sendo negado aos brasileiros o direito de adquirir um veículo leve com motor Diesel, reservando um privilégio a organizações estrangeiras em detrimento dos próprios cidadãos do país.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Uma reflexão sobre motores Diesel de 1 cilindro

A viabilidade da adaptação de motores estacionários/industriais e agrícolas de 1 cilindro entre 0.9L e 1.5L em veículos leves é vista com ceticismo até entre defensores fervorosos de uma liberação do Diesel sem restrições por capacidades de carga, passageiros e tração. Diante das tentativas de afastar do imaginário popular os estereótipos de rusticidade, peso excessivo e desempenho modesto, a possibilidade do vetusto "motor de Tobatta" tornar-se uma opção atrativa para pequenos comerciantes, prestadores de serviço e outros profissionais chega a soar contraditória. Porém, frente à escassa oferta de motores Diesel automotivos com cilindrada abaixo de 2.0L no mercado brasileiro, ao menos num primeiro momento não se deve descartar totalmente essa hipótese.
É uma questão de prioridades. Ficaria difícil justificar um investimento muito elevado para converter um veículo mais simples, como por exemplo um Gol Furgão, e nesse contexto chega a ser compreensível que um motor monocilíndrico não seja imediatamente descartado e apontado como uma insanidade. Na ponta do lápis até a desvantagem do peso, em alguns casos por volta de 50% superior ao do motor de 4 cilindros em linha e ignição por faísca que se cogite substituir, merece ser avaliada mais a fundo antes de tomar uma decisão precipitada. É muito comum que estejam incluídos no peso de um motor monocilíndrico estacionário/industrial o tanque de combustível e periféricos como o radiador, ou um reservatório de água para refrigeração por evaporação quando aplicável. A redistribuição de tais componentes sob o capô, bem como a eliminação do tanque de combustível acoplado ao motor para usar apenas o tanque original do veículo, já abrem espaço para minimizar efeitos indesejáveis de uma alteração drástica na distribuição de peso entre os eixos. Mesmo com um motor Volkswagen AE-1600 (basicamente outro nome para o Ford CHT) pesando menos de 130kg com todos os acessórios, é possível deduzir que os 185kg de um Diesel monocilíndrico entre 1.2L e 1.5L não se tornariam necessariamente um estorvo ao observar algumas variáveis.
Pouca potência, que chega a ser inferior à de motores 1.0L usados em carros "populares", pode soar como um empecilho, bem como as faixas de rotação mais estreitas, mas os motores Diesel monocilíndricos estão longe de ser completamente indesejáveis. Um aspecto favorável é a menor superfície disponível para que o calor gerado durante a combustão seja desperdiçado, melhorando a conservação de energia no sistema. A menor quantidade de peças móveis, e por conseguinte de atritos internos, já seria um atrativo a mais. Outros bons argumentos estão relacionados à disponibilidade não apenas desses motores, tanto novos quanto usados, mas também das peças de reposição que venham a ser necessárias, refletindo a ampla participação de mercado em aplicações diversas desde grupos geradores e bombas de poço até pequenas embarcações.

É muito fácil julgar e estabelecer dogmas sem levar em consideração a disponibilidade de recursos ou as prioridades definidas por cada operador, e o eventual desprezo por motores Diesel monocilíndricos é um daqueles equívocos sustentados por uma dose de arrogância. Enquanto ainda se revelarem capazes de proporcionar desempenho aceitável em um veículo de trabalho como uma Chevy 500 ou uma Ford Pampa, a um custo menor e mais facilmente assimilável comparado a motores de concepção mais sofisticada, a meu ver não há justificativas tão plausíveis para simplesmente descartar essa opção tão polêmica e renegada. Afinal, mesmo que lhes seja atribuído um certo grau de precariedade, ainda acabariam tornando-se a porta de entrada ao Diesel para boa parte do público brasileiro.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Breve reflexão sobre veículos elétricos

Carros elétricos são muitas vezes apontados como a grande promessa para conciliar mobilidade e sustentabilidade, e recebem uma considerável atenção por parte do poder público. No entanto, ainda há uma série de desafios que põe em xeque a funcionalidade dos mesmos. Deixando de lado alguns modelos mais sofisticados, vamos lançar um olhar sobre opções mais em conta. Nessa faixa do mercado predomina o que se conhece nos Estados Unidos como NEV, veículos elétricos de vizinhança (neighborhood electric vehicle), numa referência à baixa velocidade e autonomia mais limitada.
Mais restritos ao uso em serviços públicos ou em vias internas em áreas particulares como indústrias, universidades e hospitais, também são encarados com algum ceticismo diante da propensão do sistema elétrico brasileiro a falhas que venham a prejudicar a recarga das baterias. Some-se a infra-estrutura sucateada a uma política energética confusa, o cidadão se vê desencorajado a encarar o carro elétrico como uma realidade. Tomando por referência o temporal ocorrido recentemente na noite da sexta-feira 29 de janeiro em Porto Alegre, e o blecaute que ainda atingia alguns bairros durante a segunda-feira, é difícil levar a sério a pretensão "ecológica". Diga-se de passagem, a Secretaria Municipal de Meio-Ambiente de Porto Alegre (SMAM) ainda cria dificuldades à manutenção da rede elétrica na cidade ao impor uma abusiva multa contra a Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) quando a empresa promove a poda de árvores em logradouro público para que os galhos não atinjam os fios.
As diferentes composições químicas das baterias tracionárias, desde as mais simples de chumbo ácidas até as de íons de lítio-ferro-fosfato passando pelo grafeno, sempre vão envolver algum compromisso entre custo, peso, volume e densidade energética, além de uma redução na capacidade de armazenamento de energia ao longo da vida útil. Tais limitações acabam se refletindo, naturalmente, sobre o desempenho e a capacidade de carga, tendo em vista que a adequação a uma maior variedade de cenários operacionais, velocidades médias mais elevadas e autonomia prolongada vão acarretar invariavelmente num acréscimo de peso e complexidade. Não se pode ignorar, também, a necessidade de refrigeração das baterias, sob pena de aumentar a propensão a incêndios.
Por mais que existam alguns nichos de mercado que possam ser atendidos por veículos elétricos que ofereçam uma funcionalidade mais próxima à de modelos com motor a combustão interna, como é o caso do chinês BYD e6 que está sendo testado pela Prefeitura Municipal de Canoas, ainda são uma realidade distante do consumidor comum. Os altos custos de aquisição, além da complexidade por trás da reciclagem de componentes das baterias e da incompetência generalizada a nível administrativo, fazem de um carro elétrico ainda uma excentricidade. O recurso à geração térmica de energia elétrica (a gás natural, carvão e/ou óleos combustíveis) em épocas com um volume reduzido de chuvas, bem como as perdas durante a transmissão da usina até as unidades consumidoras e que também ocorrem com as fontes ditas "renováveis" como as hidrelétricas e eólicas, acabam por colocar em xeque a alegada eficiência de um sistema de tração elétrico.
Se formos levar em conta o teor de enxofre presente em óleos combustíveis para caldeira e como impureza no carvão mineral brasileiro, fica bem mais difícil sustentar o argumento "ecológico". De boas intenções o inferno está cheio e, por mais que ainda estejam rodeados de algum otimismo e embalados pela cobertura midiática das discrepâncias entre níveis de emissões aferidas em veículos com motor a combustão interna (não apenas Diesel mas também alguns modelos de ignição por faísca), é improvável que a tração elétrica venha a ser influente no mercado automobilístico nacional num futuro próximo.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Alguns estereótipos em imagens

Essa imagem retrata um dos estereótipos mais associados ao Diesel pelo público brasileiro, referente às emissões. O caminhão FNM D-11.000 fabricado em 1961 que aparece expelindo uma fumaça que varia entre o preto e o cinza-azulado, no entanto, não deveria servir de parâmetro para desacreditar o ciclo Diesel. Além do problema das emissões de material particulado, cujo controle dependeria mais de uma manutenção adequada do sistema de injeção, abrangendo não apenas a bomba mas também os bicos injetores, a porção mais clara da fumaça é resultante não do combustível mas do óleo lubrificante passando por folgas entre os pistões e as camisas de cilindro, problema que pode afetar até motores de ignição por faísca.

Peso excessivo, vibração, ruídos e baixa potência específica são, de fato, inconvenientes, mas nem todas as aplicações requerem uma solução idêntica. No caso desse motor Yanmar NSB12, de modestos 631cc e 12hp a 2400RPM, os 141kg não chegam a representar um inconveniente muito extremo quando aplicado a embarcações de pesca artesanal, e a simplicidade tem seu valor diante das condições severas do ambiente marinho. No entanto, entre mal-informados e mal-intencionados, ainda há aqueles que insistem em tentar agrupar os motores Diesel automotivos modernos dentro dos mesmos estereótipos tidos como negativos com relação a um "boat anchor" como esse...

Tratores a gás: alternativa controversa

Procurando no meu acervo fotográfico, encontrei imagens de 2009 nas quais aparecem esses tratores Agrale, o modelo acima um 4100 Industrial a serviço da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre e o modelo abaixo um 4230 Industrial exibido numa feira agropecuária na cidade de Capivari do Sul-RS, ambos movidos a gás liquefeito de petróleo (GLP - "gás de cozinha"). Vários fatores devem ser considerados ao se avaliar a possibilidade de usar tratores movidos a gás, que vão desde o nível de ruídos até as emissões de gases e material particulado, passando pelas inconveniências associadas ao armazenamento do combustível no local. Nesse aspecto, a baixa volatilidade do óleo diesel convencional e outros substitutivos há de ser reconhecida, enquanto o GLP não é exatamente um combustível seguro. Para que os tratores a gás não permaneçam restritos aos galpões industriais, complexos hospitalares e outras instalações urbanas, até poderia ser usado o gás natural, e eventualmente o biogás/biometano com o objetivo de proporcionar uma maior autonomia energética ao produtor rural, mas ainda é cedo para afirmar que os combustíveis gasosos em associação à ignição por faísca viriam a provocar um impacto muito significativo sobre a hegemonia do Diesel nas máquinas agrícolas. Diga-se de passagem, o regime de operação de um trator, que envolve horas quase ininterruptas em faixas de rotação constante, tanto para movimentar o mesmo quanto para acionar implementos através das tomadas de força (PTO - power take-off) que podem ser tanto mecânicas quanto hidráulicas, até se mostra favorável ao uso de óleos vegetais brutos como combustível alternativo devido ao calor residual que pode ser recuperado para promover o aquecimento do óleo. E o gás? Pode ficar para o fogão mesmo...