Evidentemente, há de se considerar diferenças entre perfis de utilização e quais soluções podem soar mais adequadas às efetivas necessidades e também às preferências mais subjetivas, já salientando que nem sempre uma motorização que atenda bem a expectativas por um alto desempenho em estrada vá ser vista da mesma forma por quem priorize uma maior resiliência a condições ambientais e viárias severas e facilidade de manutenção com recursos técnicos rudimentares. Ainda no âmbito de motores de ignição por faísca, permanece relevante esse aspecto no tocante às diferenças de ordem técnica que já fazem com que um motor de concepção mais moderna possa ser rejeitado como uma complexidade desnecessária enquanto persista a maior familiaridade do usuário com procedimentos de manutenção do motor original mais rústico. Da mesma forma, não seria inoportuno traçar um paralelo entre essa situação e a rejeição que os motores Diesel de gerenciamento eletrônico ainda sofrem por uma parte do público em aplicações para os quais já sejam permitidos em função das capacidades de carga e passageiros ou tração.
Até mesmo em função das restrições hoje em vigor no Brasil para que o óleo diesel tivesse garantida a disponibilidade para uso em veículos de serviço, a própria oferta de motores Diesel suficientemente leves e compactos só vem começando a se fazer presente no dia-a-dia brasileiro à medida que ocorre a nível internacional uma maior concentração da oferta em uma quantidade mais restrita de faixas de cilindrada, como por exemplo o 2.0TDI que a Volkswagen oferece na Amarok que a princípio não seria tão difícil de adaptar numa Saveiro "bola" '98-'99 em função do tamanho e do projeto modular que permite alguma intercambialidade de componentes com o tradicional EA827 "AP" que teve versões de 1.6L, 1.8L e 2.0L oferecidas na Saveiro. No entanto, a oferta de motores Diesel aptos à adaptação em veículos compactos ainda estando um tanto restrita e a consolidação do gerenciamento eletrônico podem não agradar tanto a consumidores que considerem um retorno mais imediato do investimento, que está longe de ser troco de pinga... Para quem eventualmente ainda veja o Diesel como "um molho mais caro que o peixe", especialmente num modelo que já possa ser considerado antigo e cujo custo de uma conversão bem-feita supere o valor de revenda, a princípio o gás natural vá permanecer relevante em aplicações utilitárias leves mesmo que ocupe espaço da área de carga.
Deixando um pouco de lado as discussões em torno da evolução no controle de emissões em motores Diesel nos últimos 20 anos, que também contribuiu para fazê-los mais atrativos aos olhos do público generalista ao invés de permanecerem relegados à condição de mera ferramenta, convém destacar que o gás natural mesmo sendo às vezes apontado como uma das melhores soluções para atender às metas de redução de emissões mantendo a viabilidade técnica dos motores de ignição por faísca também é uma faca de dois gumes. Embora já seja armazenado a bordo na fase de vapor com os sistemas de gás natural comprimido (GNC) que costumam ser o padrão para aplicações leves, já inibindo a formação de material particulado tendo em vista a vaporização completa do combustível antes de ser queimado, é importante destacar que nem sempre se instalam os kits de conversão homologados de acordo com o ano de fabricação do veículo e tecnologias de controle de emissões aplicáveis. Por exemplo, mesmo que para veículos produzidos posteriormente a '96 seja exigido o kit gerenciado eletronicamente, não é impossível instalar em alguns modelos um sistema mais rudimentar e totalmente mecânico, que não garante um controle mais preciso do fluxo do gás, além de eventualmente mesmo um kit eletrônico ser defasado e proporcionar uma maior perda de mistura ar/combustível crua durante o inevitável cruzamento de válvulas entre a fase de escape e a admissão do ciclo subsequente. A maior resistência do gás natural à pré-ignição, que poderia tornar mais propício o uso em motores dotados de uma taxa de compressão mais alta, também costuma servir de pretexto para um empobrecimento excessivo da mistura ar/combustível, levando o processo de combustão a manter-se em temperaturas mais altas e propícias a um incremento nas emissões de óxidos de nitrogênio (NOx) que vem sendo o calcanhar de Aquiles do ciclo Diesel e fomentando o atual cenário de caça às bruxas, sendo portanto um ponto controverso no tocante ao impacto ambiental imediato que uma liberação irrestrita do Diesel causaria.
Mesmo não dando tanta atenção à evolução do gerenciamento eletrônico e às vantagens que agregou ao controle de emissões, é importante considerar as diferenças entre as regulamentações ambientais e como balizaram a evolução dos motores em épocas distintas. Tomando por referência a linha do Ford Fairlane de 1ª geração lançada em '55, que precedia a implementação das primeiras regulamentações de emissão de poluentes por veículos automotores por parte da EPA americana em '67, não é surpresa que motores como o "Mileage Maker" de 6 cilindros em linha e os V8 Y-Block sejam desfavorecidos diante de alguns motores Diesel hoje considerados obsoletos até no Brasil como o Kia J2 que equipou a Besta e se enquadrava nas normas Euro-2. Naturalmente, há de se considerar também a imagem de motores a gasolina de alta cilindrada como mais desejáveis que um Diesel aos olhos de grande parte dos entusiastas de automóveis clássicos no Brasil, ao passo que em países vizinhos como o Uruguai onde ainda há quem os use no dia-a-dia torne apreciável a combinação de um motor entre 60 e 75% da cilindrada original associado a um câmbio com maior quantidade de marchas e espaçamento entre as mesmas, como seria o caso comparando o "Mileage Maker" de 3.7L e um câmbio de 3 marchas ao J2 de 2.7L com câmbio manual de 5 marchas ou automático de 4 marchas.
A dificuldade em encontrar no Brasil motores Diesel que conciliem preço competitivo à capacidade de atender às expectativas no âmbito do desempenho em condições de uso gerais pode fazer com que a adaptação em modelos como os Chevrolet Corsa e Classic soem mais improváveis do que em outra categoria mais prestigiosa ou quando o valor residual de revenda se mantenha mais alto. Pode até ser que operadores com diferentes prioridades possam tornar questionável essa alegação, de modo que o público generalista eventualmente não desperte o mesmo interesse imediato por uma "dieselização" que as forças militares para as quais uma simplificação na logística de combustíveis seria desejável mas, considerando diferentes tecnologias aplicáveis a motores Diesel tanto veiculares quanto equivalências entre normas de emissões aplicáveis, o temor de um aumento da poluição não faria tanto sentido. Enfim, por mais que se tema um efeito adverso, ainda há a possibilidade de que uma liberação do Diesel para todas as classes de veículos leves na verdade possa ser até benéfica ao meio-ambiente.
Parece estranho que um tipo de motor que sempre foi considerado poluidor possa ser na verdade mais limpo, mas assim faz sentido.
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