quarta-feira, 29 de abril de 2020

Reflexão: microtratores tipo tobata, Volkswagen Variant, Fiat 147, e como uma liberação do Diesel teria impacto sobre a agricultura

É impossível ignorar a hegemonia dos motores Diesel na mecanização agrícola a nível mundial, sem ignorar também os microtratores de duas rodas que ficaram conhecidos genericamente no Brasil por "tobata" em referência aos antigos Tobatta produzidos pela Kubota, e uma das principais alegações da época em que foram implementadas as restrições ao uso do óleo diesel em veículos leves no país foi a disponibilidade de combustível para aplicações utilitárias que acabam naturalmente incluindo tratores e outras máquinas agrícolas. De fato, tratava-se de uma precaução que poderia parecer coerente num primeiro momento, mas que viria a se revelar uma faca de dois gumes em meio a algumas mudanças de paradigma que tornam oportuno questionar a eficácia de tal medida na atualidade. Naturalmente, o cenário mudou não apenas para melhor, com desafios de ordem técnica se sobrepondo por exemplo a um uso mais expressivo de biodiesel ou de óleos vegetais brutos como combustível alternativo, o que a bem da verdade poderia ser até mais favorável à agricultura do que insistir em usar como parâmetro somente o óleo diesel convencional.
A versatilidade de motores Diesel monocilíndricos horizontais normalmente usados em microtratores tipo tobata, com a principal referência no tocante a modelos mais recentes sendo modelos produzidos pela Yanmar, também os credenciaria como um bom quebra-galho para atendimento mais imediato da eventual demanda por conversões de automóveis caso venham a ser finalmente abolidas as restrições baseadas nas capacidades de carga e passageiros ou tração. Naturalmente que o uso de um motor tão rústico poderia não ser necessariamente a melhor opção para todo tipo de automóvel, mas já poderia de fato ser suficiente em alguns carros de concepção antiga como uma Volkswagen Variant da década de '70 que permaneça enfrentando condições de uso severas ao invés de ter sido alçada à condição de uma peça de colecionador tratada a pão-de-ló. Provavelmente despertaria a ira dos puristas de plantão que repudiam alterações tão drásticas como uma troca de motor, mas eventualmente para sitiantes que tenham como produzir o próprio óleo combustível seria mais uma opção razoável além do etanol com o intuito de fomentar a autonomia energética do pequeno produtor rural, cabendo salientar também as vantagens logísticas em poder compartilhar um mesmo estoque de peças de reposição e combustível ou outros insumos como óleo lubrificante para um trator e um automóvel.
No caso específico da Variant, o fato de recorrer à concepção mecânica tradicional derivada do Fusca abre espaço a observações no tocante à não-necessidade da tração 4X4 para as enfrentar condições de rodagem que se costuma encontrar em regiões rurais, e até não seria de se duvidar que algum usuário tentasse se valer da maior aptidão off-road para atender simultaneamente as funções do automóvel e dum microtrator. O fato de ter tração somente traseira e acomodação para o motorista e 5 passageiros, bem como a capacidade de carga inferior ao mínimo de uma tonelada que serviria para credenciar um modelo de tração simples com acomodação para menos de 9 passageiros além do condutor, já levam a crer que a norma hoje em vigor para que um veículo seja reconhecido como "utilitário" e garantir o direito ao uso de motor Diesel também seria desfavorável ao produtor rural, mesmo que se tome por referência um carro mais moderno e menos versátil que uma Variant. A simples exigência burocrática por uma configuração inerentemente mais ineficiente, que abrangeria desde os maiores atritos que um sistema de tração 4X4 tem até um tamanho eventualmente excessivo para um veículo que na maioria das vezes acabe não tendo as capacidades de carga ou passageiros plenamente aproveitadas passando pelo impacto sobre o peso e eventualmente a aerodinâmica, já faz com que se favoreça a ineficiência para quem não abra mão do Diesel

O destaque da experiência brasileira com o etanol desde a época do regime militar, e que no rescaldo dos choques do petróleo na década de '70 serviu não apenas para o público generalista mas também foi uma alternativa para manter o automobilismo brasileiro em plena atividade, ainda é tratado como antagônico ao Diesel, ignorando as possibilidades de inserir na cadeia produtiva dos biocombustíveis outras matérias-primas mais adequadas às vocações agropecuárias de cada região do país. Claro que o cenário na época do Fiat 147 "cachacinha" que ainda recorria ao carburador e à ignição com platinado e condensador era muito mais crítico, comparado à atualidade em que a injeção eletrônica e a ignição mapeada proporcionam adaptabilidade no mesmo motor tanto para o combustível alternativo quanto para a gasolina que é a verdadeira antagonista do etanol. Enquanto nos motores Diesel a ignição por compressão já favorece a capacidade de operar com combustíveis distintos, sendo um dos principais motivos para uma massificação nas frotas militares operacionais, nos de ignição por faísca como os Fiasa de 1.05L e 1.3L originalmente oferecidos no Fiat 147 e também em análogos mais recentes há uma maior dependência por fatores como o ponto de ignição para que o motor funcione corretamente com combustíveis diferentes que podem não ser tão favorecidos por uma taxa de compressão que seja mais próxima ao ideal para apenas um destes, e costuma ser priorizada a gasolina.
Por mais que num primeiro momento parecesse que restringir o Diesel a aplicações "utilitárias" seria a salvação da lavoura, e com o etanol parecendo um quebra-galho promissor para uso automotivo no Brasil, houve uma série de transições tanto em âmbito cultural quanto técnico que favoreceriam uma busca por alternativas ao óleo diesel convencional de forma análoga ao ProÁlcool dos militares. Não se justifica ignorar a evolução tecnológica no tocante a motores de um modo geral, embora o caso do Brasil devido à concentração do Diesel em outros segmentos levasse o consumidor generalista a vê-lo como "coisa de trator" com um desdém que não condiz com a importância para levar comida à mesa. Enfim, tendo em vista como as restrições baseadas nas capacidades de carga e passageiros ou tração se tornaram um convite à ineficiência em aplicações que se desviam da premissa de "utilitários", bem como o atual cenário de desconfiança quanto aos biocombustíveis depois que o ProÁlcool sucumbiu à má gestão após o fim do regime militar desincentivando uma maior presença do biodiesel, pode-se deduzir que uma liberação do Diesel viria a ser na verdade até benéfica à agricultura devido a novas oportunidades que se abririam para o biodiesel e também para o uso direto de óleos vegetais como combustível.

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
http://dzulnutz.blogspot.com/2016/03/relacao-de-marcha-refletindo-sobre.html