sábado, 15 de fevereiro de 2020

Caso para reflexão: Chevrolet Onix e a suscetibilidade a problemas relacionados à qualidade do combustível

A supressão da injeção direta usada no Chevrolet Onix chinês quando o mesmo modelo teve iniciada a produção também no Brasil, que pode ter atribuídos diferentes motivos desde a redução de custos pura e simples até uma intenção de evitar maiores dificuldades na conversão para gás natural, muito comum em aplicações como táxis, é um bom parâmetro para rebater eventuais alegações de que uma discrepância na qualidade dos combustíveis hoje seria mais crítica em relação a motores turbodiesel modernos do que aos de ignição por faísca tanto em versões somente a gasolina quanto os flex aptos a operar também com etanol. Salientando ainda que a injeção direta tem sido fundamental para que a atual geração de motores a gasolina ou flex enquadrados no conceito do downsizing tenham chegado a disputar mercado com o Diesel em países onde não há restrições arbitrárias com base na capacidade de carga e passageiros ou tração, torna-se ainda mais questionável que as versões turbo do novo Onix e do sedan Onix Plus não lancem mão desse recurso que já se faz presente em concorrentes diretos.
Mas o que parecia ser a "salvação" para manter uma parte do público profissional que ainda costuma recorrer ao gás, e não seria um grande problema ao se usar o etanol em função da maior resistência à pré-ignição, tornou-se um problema para o público generalista ainda bastante apegado à gasolina. Foi uma decisão que se revelou um tiro no pé devido à ocorrência de alguns incêndios envolvendo o Onix Plus pouco tempo após o lançamento no ano passado, inicialmente só com o motor turbo e cuja falta da injeção direta exigiria um enriquecimento da mistura ar/combustível através da injeção sequencial nos pórticos de válvula em algumas condições de alta temperatura e pressão atmosférica associadas a uma baixa umidade relativa do ar ao se usar uma gasolina de baixa octanagem. A idéia de oferecer a nova geração do Onix somente com motores de 3 cilindros e 1.0L tanto com aspiração natural quanto com turbo já pode ser questionada não apenas no aspecto técnico, além do mais sem a injeção direta que os concorrentes diretos invariavelmente usam nas versões 1.0 turbo possibilitando conciliar uma maior economia de combustível com a segurança para funcionar com proporção ar/combustível mais pobre, mas também no aspecto fiscal tendo em vista que alguns segmentos do público se beneficiam mais com um motor de aspiração natural e cilindrada acima de 1.0L que permanece mais barato de se produzir que um 1.0 turbo e resultam num desconto proporcionalmente maior do IPI ao comprar com isenções de impostos para taxistas ou deficientes.
Ainda que a maior presença do turbo e da injeção direta em motores de baixa cilindrada desafie uma antiga percepção do público generalista de que o turbo iria invariavelmente sacrificar a economia de combustível, não se pode esquecer que esse dispositivo implica na necessidade de manutenção mais criteriosa e até já chegou a ser apontado como um dentre diversos motivos de insatisfação de alguns consumidores em países onde qualquer carro pode contar com uma versão turbodiesel. O fato de ser uma linha destinada ao público generalista, e implica em atender a usuários que dão diferentes graus de prioridade à observância de especificações mínimas de combustível e lubrificantes e dos planos de manutenção preventiva, faz com que se torne ainda menos convidativa essa estratégia em mercados de exportação regional onde o favorecimento tributário a motores de até 1.0L aplicado no Brasil não encontra um paralelo que justifique oferecer tal opção. A disponibilidade limitada do etanol também se torna um problema, e por exemplo na Argentina não há opção a não ser utilizar gasolina Premium.
Ainda que motores de ignição por faísca permaneçam contando com a possibilidade de recorrer a um sistema de pós-tratamento de gases de escapamento muito mais simples, em que pese alguns motores a gasolina de injeção direta já necessitarem de um filtro de material particulado análogo ao DPF que se usa nos turbodiesel, uma grande diferença em relação à suscetibilidade a problemas relacionados à qualidade dos combustíveis pode ser observada. Enquanto num motor a gasolina ou flex com injeção nos pórticos de válvula o problema está no processo de combustão propriamente dito, com o Diesel o cenário muda de figura e há uma maior propensão a danos aos dispositivos de controle de emissões e que por sua vez podem interferir no correto funcionamento do motor. Entre perder um motor logo de cara por usar uma gasolina de baixa octanagem, ou suprimir ainda que ilegalmente algum dispositivo como um filtro de material particulado ou bloquear uma válvula EGR para que um motor turbodiesel possa suportar um índice de cetano menor e um teor mais alto de enxofre no óleo diesel numa região com infraestrutura precária, é pouco provável que permaneça espaço para maiores dúvidas quanto à opção que melhor se adaptaria a condições tão adversas. Não é de se estranhar que as frotas militares operacionais atualmente costumem recorrer mais aos motores Diesel do que aos de ignição por faísca.
Em meio a um cenário de desconfianças quanto à viabilidade futura dos motores Diesel, cujo custo de sistemas de controle de emissões mais sofisticados tem sido um problema especialmente em modelos de proposta "popular" como o Onix e de certa forma desincentiva a adoção dessa opção para atender a outros mercados, atribuir exclusivamente ao ciclo termodinâmico a maior suscetibilidade a danos é um equívoco. A necessidade de rever a programação do gerenciamento eletrônico do motor, ocorrida antes do lançamento do Onix hatch que não esteve envolvido no caso dos incêndios, acabou servindo para reforçar a percepção de que a aparente simplicidade hoje mais atribuída à ignição por faísca e à injeção nos pórticos de válvula passa longe de ser um postulado incontestável. Enfim, por mais que o problema da oscilação da qualidade dos combustíveis tenha se tornado alvo de maior questionamento a partir de 2012 quando a entrada em vigor das normas Euro-5 realçou discrepâncias no controle de emissões entre diferentes tipos de motor, a ignição por faísca não é imune a esse problema.

4 comentários:

  1. Já fiquei sabendo de gente que teve prejuízo usando até óleo diesel para barco que tem mais enxofre em caminhonete moderna com motor eletrônico, mas com gasolina eu até não vi tanto motor dando problema porque a turma quando quer fuçar o motor já vai muito mais com a idéia de botar para andar no álcool.

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  2. Pelo menos em São Paulo, como só deu problema na gasolina, parece mais um bom motivo para usar etanol.

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    1. Não que isso seja uma justificativa muito coerente para negligenciar os riscos causados pela supressão da injeção direta.

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  3. Es imposible no estar de acuerdo. A los ignorantes lo parece más sencillo quedarse con el encendido por chispa, pero eso no imposibilita que el motor se va a estropear. Tampoco si lo ponen gas licuado de petroleo.

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
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