Se por um lado a economia de combustível inicialmente é beneficiada à medida que a injeção direta é mais difundida nos motores a gasolina e/ou "flex", por outro também já se observam efeitos colaterais antes tidos como um calcanhar-de-Aquiles mais específico dos motores Diesel, destacando aumentos nos índices de emissão de óxidos de nitrogênio (NOx) por conta do menor resfriamento da carga de admissão que estaria associado à formação de mistura ar/combustível por uma injeção nos pórticos de válvula e de material particulado fino em função da vaporização incompleta do combustível antes que a ignição ocorra. A própria Volkswagen, entre as medidas que tomou durante o rescaldo do escândalo de manipulação de resultados de testes de emissões "Dieselgate" deflagrado em 2015, passaria a usar filtro de material particulado não só em versões equipadas com motor Diesel em modelos como a 2ª geração do SUV Tiguan, lançada em 2016 e inaugurando o uso do dispositivo nos motores do ciclo Otto. Mas assim como a própria injeção direta a princípio tem um custo inicial mais alto, também se torna dispendioso incorporar elementos que venham a contornar alguma desvantagem desse sistema...
Ainda observando a linha Volkswagen, considerando o atual motor EA211 de 1.0L e 3 cilindros que é oferecido simultaneamente em versões de aspiração natural ou com turbo em modelos como o Polo, a diferença entre os sistemas de injeção em função da presença ou não da indução forçada é um aspecto relevante. Tendo em vista as maiores pressões internas em decorrência da maior carga de admissão no motor TSI devido à presença do turbo, a injeção direta proporciona uma maior economia do que seria possível esperar caso alguém se dispusesse a turbinar por conta própria o motor MSI e mantivesse a injeção nos pórticos de válvula. Antes que a injeção direta se fizesse mais presente em motores turbo de ignição por faísca, uma experiência anterior da Volkswagen com o turbo no motor EA111 não fez tanto sucesso comercial em parte pela necessidade de um enriquecimento da mistura ar/combustível, além de um maior conservadorismo do público tradicional de modelos como a Parati que chegou a ser oferecida entre 2000 e 2004 com a versão turbo do EA111 fazendo com que se tornasse difícil de justificar diante do EA827 "AP" cuja versão de 1.6L a gasolina foi cotada para ser substituída por essa primeira tentativa de levar à frente o downsizing no mercado brasileiro.
Mas se a injeção nos pórticos de válvula parece ser um empecilho ao downsizing, por outro lado hoje é um pretexto para que motores de concepção mais simples permaneçam competitivos em algumas circunstâncias. Uma vantagem ainda muito clara é a maior facilidade para converter para gás natural, opção frequente nos táxis mas que também ganhou um novo impulso em veículos particulares devido à possibilidade de serem usados como uma fonte de renda extra na operação com aplicativos como o Uber e o Cabify. A exposição dos bicos injetores originais à frente de propagação de chama quando o motor recorre à injeção direta torna imprescindível que se mantenha algum volume do combustível original para mantê-los adequadamente refrigerados quando se usa o gás natural, inconveniente que não se repete nos motores com injeção convencional como o 1.6 MSI oferecido como alternativa ao 1.0 TSI no Volkswagen Virtus. E além do motor de cilindrada mais alta com aspiração natural ter um custo de produção menor, vale destacar uma vantagem para taxistas e deficientes que é o abatimento do IPI proporcionalmente maior em comparação ao das versões equipadas com o motor menor que se enquadram na alíquota mais baixa originalmente destinada aos carros "populares".
A presença da injeção direta em motores de ignição por faísca não tem sido restrita aos turbo, com os motores Ecotec 2.5 SIDI atualmente oferecido pela Chevrolet nas versões "flex" da S10 e o Duratec Direct da Ford que hoje no Brasil só equipa o EcoSport Storm servindo de exemplos de motores com aspiração natural recorrendo a esse método de injeção. Ainda que sejam proporcionadas melhorias no desempenho diante dos motores anteriores com injeção no pórtico de válvulas, na S10 isso se deve à configuração de 16 válvulas com duplo comando variável e ao ligeiro aumento de cilindrada frente ao antigo Família II de 2.4L com comando simples e 8 válvulas, e até causa alguma surpresa que a taxa de compressão de 11,2:1 do motor atual seja um pouco menor comparada à de 11,5:1 do anterior. Já no EcoSport, a especificação anterior do Duratec de 2.0L tinha taxa de compressão 10% inferior à do Direct. A princípio, para versões 4X4 que seria de se pressupor terem uma maior procura por parte de usuários que venham a efetivamente explorar esse recurso em condições de rodagem mais severas em trechos distantes de um fornecimento regular de gás natural, seria de se esperar que a injeção direta parecesse não ser tão indesejável, e até eventualmente inspirasse a fazer uma reinterpretação moderna dos motores Hesselman que apesar da ignição por faísca podiam operar até com óleo diesel devido à utilização de injeção direta. Diga-se de passagem, a primeira aplicação da injeção direta em motores de ignição por faísca deu-se justamente nos motores Hesselman com o intuito de fazê-los funcionar com óleo diesel. Se tal estratégia hoje poderia soar estúpida de se tentar numa S10, que já conta com versões turbodiesel no mercado brasileiro, não deixaria de parecer até certo ponto tentadora num modelo como o EcoSport que nunca teve uma única versão Diesel homologada para venda no Brasil apesar de serem feitas para exportação...
Uma possível esperança para o ressurgimento da injeção nos pórticos de válvula em motores turbo de ignição por faísca poderia partir da China. A participação de uma subsidiária da Chery em projetos de sistemas de comando de válvulas hidropneumáticos sem eixos de comando, que além de melhorias no desempenho e consumo de combustível ainda prometem com a injeção nos pórticos de válvula alguns benefícios hoje associados à injeção direta no tocante à mitigação do risco de pré-ignição com taxas de compressão elevadas e facilidade de partida a frio com o etanol, poderia cair como uma luva em modelos como o Tiggo 5x já oferecido no Brasil pela joint-venture CAOA-Chery com um motor de 1.5L turbo de injeção direta. Tendo em vista que os fabricantes chineses tentam se distanciar daquela imagem de copiadores com qualidade duvidosa de tecnologias obsoletas da Toyota, Isuzu ou Mitsubishi, bem como o uso de combustíveis gasosos na China ser historicamente bastante difundido e com perspectivas bastante favoráveis que o biometano pode encontrar diante da necessidade de reduzir a dependência chinesa por combustíveis importados para atender à crescente frota, é ainda mais promissora a oportunidade.
Suponhamos que um sistema de comando de válvulas revolucionário pudesse não apenas reduzir as emissões dos motores de ignição por faísca e recuperar a competitividade da injeção nos pórticos de válvula, mas também eliminar os custos de componentes que iriam desde o corpo de admissão até o pré-catalisador e ainda dispensar a eventual inclusão de um filtro de material particulado que poderia se tornar necessário para atender a regulamentações de emissões cada vez mais rigorosas. Seria até um tanto previsível que uma parte considerável do público generalista com um perfil mais urbano e com facilidade para encontrar combustíveis sem tanta variação nas especificações se dê por satisfeita, mas está longe de ser uma unanimidade. Eventualmente a combinação entre a simplicidade da injeção nos pórticos de válvula e a variabilidade praticamente ilimitada na abertura das válvulas que pode ser proporcionada por um comando de válvulas sem eixo viabilizasse o uso de querosene para atender às eventuais restrições que o transporte de gasolina e outros combustíveis mais voláteis em operações militares devido ao maior risco de explosão, o que também seria um motivo para nem considerar uma utilização tanto do gás natural quanto do gás liquefeito de petróleo (GLP - "gás de cozinha") cujo manejo é muito mais complexo em comparação aos combustíveis líquidos em geral. Portanto, ao menos nas aplicações militares, fica mais difícil crer que o Diesel viesse a perder totalmente a relevância caso a injeção nos pórticos de válvula efetivamente favoreça a competitividade da ignição por faísca.
Atendo-se tão somente à maior adaptabilidade de motores Diesel ao uso de uma grande variedade de combustíveis líquidos, tendo como um dos expoentes máximos o clássico caminhão militar REO M35 "Deuce and a Half" americano, mesmo tendo um projeto que remonta a épocas em que normas de controle de emissões poderiam soar como um devaneio de ficção científica, é justificável esboçar uma dúvida quanto à viabilidade de propostas para que a ignição por faísca volte a ser hegemônica em todas as aplicações automotivas. Guardadas as devidas proporções e considerando que o princípio básico de cada ciclo termodinâmico aplicado a motores automotivos permaneça inalterado diante das evoluções dos sistemas de combustível, comando de válvulas e ignição, não faz sentido descartar de antemão vantagens nem da ignição por faísca com os combustíveis gasosos e voláteis nem do Diesel com combustíveis pesados. Enfim, as especificidades de diferentes aplicações se sobrepõem à ilusão de uma solução única e incontestável para todos os desafios...
O carro atual da minha mãe tem injeção direta, e para usar etanol em São Paulo é uma maravilha, mas para quem prioriza o gás independentemente da gasolina ou do etanol realmente fica mais difícil. O pai de um colega meu de escola tem um Virtus desses MSI e escolheu esse motor exatamente para usar gás.
ResponderExcluirEtanol é praticamente carta fora do baralho no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, e muito pode ser creditado não só ao preço mas também à lembrança das dificuldades de partida a frio em modelos antigos tanto movidos só a etanol quanto da primeira geração dos flex. No caso do Virtus MSI, com exceção dos táxis, vi poucos particulares e a imensa maioria estava sendo usada por motoristas do Uber.
ExcluirTenho um pouco de medo de trocar meu carro atual por um de injeção direta exatamente por não ser tão fácil a conversão para gás natural. Eu até uso álcool de vez em quando, mas como tenho o kit GNV de 5ª geração instalado desde uma época que a diferença de preço do gás estava mais favorável eu peguei o costume de usar mais frequentemente. Até em viagens para fora de São Paulo, se tiver gás no caminho eu praticamente não uso gasolina.
ResponderExcluir