Embora os mercados europeus ocidentais estejam menos receptivos ao Diesel em veículos leves nos últimos anos, uma categoria na qual essa motorização ainda se sobressai é a dos SUV, a ponto de até ser oferecida mais de uma opção em modelos como o Land Rover Discovery 5 que conta lá com uma versão twin-turbo do motor Ingenium de 2.0L e 4 cilindros além do mesmo V6 de 3.0L que também recorre à configuração twin-turbo e é o único motor Diesel oferecido para o modelo no Brasil. Não é difícil chegar à conclusão de que o fato de veículos 4X4 que contem ou com caixa de transferência de dupla velocidade (a popular "reduzida") ou cuja 1ª marcha do câmbio tenha uma relação "crawler" no Brasil sejam homologados como "utilitário", acaba sendo um estímulo para que venha só o motor de cilindrada mais alta, tendo em vista que nessa classificação não se aplica no Brasil um escalonamento das alíquotas de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) de acordo com a cilindrada. Enquanto isso nos países-membros da União Européia, motores Diesel acima de 1600cc já são penalizados com sobretaxas específicas que não são extensivas aos concorrentes de ignição por faísca, e ultrapassando a barreira de 2400cc acentua-se ainda mais a incidência do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) que é uma das principais tarifas sobre veículos 0km na Europa.
A disponibilidade de uma versão do mesmo motor Ingenium dotada de apenas um turbocompressor no Range Rover Velar, com valores mais modestos de potência e torque, leva a crer que há espaço no mercado europeu para motores turbodiesel com concepção mais modesta e que poderiam até ser mais competitivos frente aos similares a gasolina caso não fosse levada tão à risca a tributação com base na cilindrada, e assim ao que tudo indica acabam esbarrando tão somente na burocracia para que possam ser oferecidos regularmente ao público europeu. Naturalmente, embora ainda seja comum supor que a cilindrada reduzida associada a um maior grau de sofisticação torne um motor efetivamente "melhor" em comparação a outro de cilindrada mais alta e desempenho semelhante, é necessário observar ainda fatores como o custo de manutenção que tem se tornado alvo de críticas em gerações mais recentes de motores turbodiesel para veículos leves que acabam sendo aplicadas também a modelos mais pesados em função da politicagem da União Européia. Também é conveniente observar as tentativas de fazer com que os motores turbodiesel tivessem um desempenho comparável ao de similares a gasolina nas últimas duas décadas, ficando cada vez mais distantes da rusticidade que os caracterizava mesmo em faixas de cilindrada relativamente altas que ainda podiam ser aplicadas com folga até nos automóveis de porte compacto mas pareciam improváveis de ser aplicadas num SUV por volta de 20 anos atrás.
É conveniente comparar a especificação mais modesta do moderno motor turbodiesel Jaguar-Land Rover Ingenium AJ200D oferecido no exterior no Range Rover Velar e o Cummins ISF2.8 usado no Brasil entre outras aplicações um tanto pesadas no caminhão Volkswagen 6.160 Delivery, enfatizando num primeiro momento características básicas de cada um que interferem principalmente no custo de produção. Enquanto ambos tem 4 cilindros em linha e 16 válvulas e um único turbo, há diferenças um tanto mais substanciais do que a cilindrada de 2.0L para o Ingenium e 2.8L para o Cummins. O fato do motor menor e mais sofisticado ter 2 eixos de comando de válvulas sincronizados por corrente e variador de fase na admissão e no escape é notavelmente mais complexo que o comando de válvulas por eixo único sem variação de fase e com sincronização por corrente selada que dispõe o Cummins, e isso acaba se refletindo tanto em custo inicial quanto de manutenção. Outro aspecto a se destacar é o motor Ingenium contar com bloco e cabeçote de alumínio que pode soar vantajoso num primeiro momento durante a comparação ao bloco e cabeçote de ferro que o ISF2.8 usa, mas esse aspecto já é questionável ao considerarmos não apenas o custo dos materiais mas também diferentes propriedades termodinâmicas. Enquanto o alumínio além de mais leve proporciona uma dissipação mais rápida de calor, que pode parecer essencialmente benéfica, não dá para dizer que é uma solução "perfeita" em todos os aspectos à medida que uma maior retenção de calor em função do bloco e cabeçote de ferro no Cummins facilita diminuir a "fase fria" que se segue à partida e também favorece a concentração de alta temperatura nos gases de escape durante a autolimpeza ou "regeneração" do filtro de material particulado (DPF). Vale destacar também a questão da compatibilidade com proporções mais altas de biodiesel que pode ser associada à maior retenção de calor, tendo em vista que um dos pontos mais críticos tem sido exatamente a vaporização quando o combustível a ser consumido durante a redução do material particulado retido no filtro tem uma concentração de biodiesel superior a 20% (B20).
Pode ser que ainda pareçam pouco os 156cv a 3200 RPM do ISF2.8 diante dos 180cv a 4000 RPM do Ingenium AJ200D, ainda que o pico de torque de 430Nm possa ser observado em ambos os motores, entre 1500 a 2400 RPM no ISF2.8 que é essencialmente um motor pé-duro projetado com o objetivo de atender especificamente a veículos comerciais com peso bruto total de até 7 toneladas ao redor do terceiro mundo e a 1500 RPM no Ingenium destinado a ser uma referência em sofisticação. Portanto, considerando condições de uso normais que seriam habituais tanto a um caminhão com um peso em ordem de marcha que quase chega ao mesmo peso bruto total de um SUV com a carga máxima, não se pode dizer que o motor de concepção mais abrutalhada seria incapaz de proporcionar desempenho satisfatório para segmentos do público que só passaram a considerar o Diesel em categorias de maior prestígio à medida que ganharam participação de mercado motores com um alto grau de refinamento que até pode ser considerado exagerado por dieselheads mais tradicionalistas. À medida que sistemas de controle de emissões tão diversos quanto o DPF e o SCR começam a causar desconfianças quanto ao futuro da opção Diesel devido à maior complexidade em comparação a catalisadores mais simples que se usam em motores de ignição por faísca, a possibilidade de amortizar ao menos uma parte dos custos de implementação de tais tecnologias mediante uma maior simplicidade das características construtivas não deixa de ser desejável e praticamente essencial para manter a competitividade, em que pese a incidência de impostos atrelada à cilindrada se tornar um empecilho caso permaneça o foco da indústria automobilística em tentar provar a todo instante a capacidade de oferecer um desempenho comparável ao de similares a gasolina.
Considerando fatores que vão desde o custo de matérias-primas e peças de reposição ao longo de uma vida útil operacional prevista para um veículo e eventuais extensões, passando pela adaptabilidade ao uso de combustíveis alternativos como o biodiesel cuja produção mais regionalizada poderia ser útil à redução do abuso de poder econômico levado a cabo pelos sheiks do petróleo, motivos são o que não faltam para questionar a real eficácia de se atrelar a incidência de impostos à cilindrada dos veículos. A tecnologia constitui de fato uma importante aliada para vencer alguns desafios impostos tanto pelos burocratas quanto pela histeria dos ecoterroristas que ignoram soluções mais práticas de implementar, mas há momentos em que não convém se distanciar daquelas alternativas que permaneceriam mais acessíveis se não fosse por algumas regulamentações com uma fundamentação técnica questionável. Enfim, além de eventualmente afastar uma parte do público tradicional do Diesel e não ter a mesma facilidade que se esperava para alcançar novos adeptos, formular uma tributação que penaliza pura e simplesmente a cilindrada acaba sendo um erro grave e que pode custar especialmente caro à Europa.
Já achei isso estranho na época que a Volkswagen lançou a Amarok usando o motor 2.0 próprio em vez de usar o MWM Sprint do caminhão 5-140 VUC.
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