quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

Injeção de combustível por difusão: tecnologia simples porém revolucionária que pode "salvar" o Diesel

Não é novidade que o controle de emissões tem constituído um desafio especialmente árduo para o desenvolvimento de motores Diesel, tendo em vista as particularidades desse ciclo termodinâmico e o uso de combustíveis pesados que tendem a apresentar uma vaporização naturalmente mais difícil, que por sua vez pode resultar numa combustão às vezes mais irregular em algumas condições. Ainda que a eficiência térmica superior à de motores com ignição por faísca tenha tornado o Diesel essencial para diversas atividades econômicas, além de ter servido bem ao público generalista em países onde o uso não é limitado em função de capacidades de carga e passageiros ou tração, a histeria ecoterrorista que trata os motores de combustão interna em geral como "vilões" tem sido especialmente enviesada contra essa solução. E enquanto a indústria se vê obrigada a incorporar sistemas com elevado grau de complexidade que acabam se tornando impopulares junto ao consumidor comum, e apenas tolerados por operadores comerciais por ainda serem mais viáveis do que recorrer à ignição por faísca e aos combustíveis voláteis, surge uma alternativa com a inspiração mais improvável mas que oferece uma perspectiva revolucionária tanto para redução de emissões quanto de uma retomada da simplicidade que historicamente tem caracterizado os motores Diesel.

Pesquisadores da instituição estatal americana Sandia National Laboratories, mais especificamente da unidade de pesquisa de combustão localizada na cidade californiana de Livermore, na busca por um método mais preciso para injeção de combustível se inspiraram num equipamento bastante comum em laboratórios até mesmo em escolas de ensino médio e que parecia ser uma inspiração improvável para aplicação com óleos combustíveis pesados. O bico de Bunsen não deixa de ser uma espécie de fogareiro a gás mas, ao invés de um difusor como o dos fogões domésticos, usa um único bico com orifícios na base por onde o ar se mistura com o gás a ser utilizado (geralmente se usa o gás liquefeito de petróleo/GLP/"gás de cozinha"). Sabe-se lá por qual motivo o cientista Charles "Chuck" Mueller fez um teste removendo o bico do dispositivo, mas observou que formava uma chama alaranjada e com mais formação de fuligem ao tentar queimar o gás somente através da válvula reguladora, e foi a partir daí que surgiu a idéia por trás de recorrer a uma quantidade entre 4 e 6 pequenos difusores logo após a saída do injetor, que não apenas facilitam uma distribuição mais homogênea do combustível por um volume maior da câmara de combustão mas também promove uma atomização mais fina que aumenta a superfície de contato entre o combustível e o ar previamente aquecido durante a fase de compressão.

Dentre as vantagens apontadas por Chuck Mueller e os também pesquisadores Christopher Nilsen, Drummond Biles e Nathan Harry, a eliminação entre 50 e 100% da emissão de material particulado viabiliza uma maior diluição de gases de escape recirculados na carga de ar de admissão para reduzir as emissões de óxidos de nitrogênio (NOx), tendo em vista que historicamente quaisquer tentativas de controlar um desses parâmetros resultava em dificuldades para o outro. Portanto, considerando que há uma insatisfação geral tanto entre usuários particulares quanto operadores comerciais com relação ao sistema SCR e a necessidade de recorrer ao fluido-padrão conhecido nos Estados Unidos como DEF (Diesel Exhaust Fluid), na Europa e Ásia como AdBlue e no Brasil como ARLA-32, a possibilidade de dispensar tal equipamento e o insumo químico necessário para que promova o pós-tratamento dos gases de escape visando neutralizar uma parte dos NOx torna-se bastante atraente tanto no tocante à redução de custos de aquisição e operação quanto pela simplificação da manutenção a longo prazo. Vale destacar que os NOx foram o pivô do caso conhecido como "Dieselgate" envolvendo emissões acima do permitido observadas inicialmente em motores Volkswagen TDI "Clean Diesel" a partir de 2015, além de mais recentemente ter causado problemas à Volvo em função da baixa durabilidade e perda de eficiência do sistema SCR a longo prazo em caminhões e ônibus.

Outra observação especialmente importante feita por Chuck Miller se refere à adaptabilidade ao uso de combustíveis alternativos, especialmente os "oxigenados" como o biodiesel e até o etanol, tendo em vista que alguns dispositivos de controle de emissões dimensionados em função do óleo diesel convencional derivado de petróleo podem apresentar incompatibilidades com o biodiesel e também com um eventual uso direto de óleos vegetais brutos como combustível. Nesse aspecto, é importante ressaltar também como uma vantagem em âmbito militar, tendo em vista as diferenças entre normas de emissões aplicáveis a veículos e equipamentos civis visando assegurar a capacidade de funcionar com combustíveis não tão facilmente encontráveis num posto de beira de estrada como querosene de aviação JP8 ou JET-A1 que costumam ser usados por forças militares americanas até nas viaturas terrestres devido ao custo da logística até os campos de batalha torná-lo competitivo diante do óleo diesel convencional. Considerando ainda a presença de motores Diesel nos grandes navios cargueiros, nos quais o custo inicial extremamente elevado de um motor novo que seja enquadrado em normas de emissões mais restritivas torna-se um empecilho, a viabilidade de um retrofit do sistema de injeção por difusão DFI (Ducted Fuel Injection) torna-se uma opção mais econômica, bem como eliminar os inconvenientes associados ao sistema SCR que também já é aplicado a grandes motores navais.

Num momento em que se tem focado mais em aperfeiçoamentos visando assegurar competitividade à ignição por faísca, como a massificação do turbo e da injeção direta ou a maior presença de híbridos no mercado generalista, chama ainda mais a atenção o fato de um desenvolvimento direcionado aos motores Diesel partir dos Estados Unidos onde historicamente se considera uma maior importância de sedentos V8 a gasolina como um ícone da cultura automobilística. Apesar do fato do Diesel ser o padrão de frotas militares dos países-membros ou aliados da OTAN certamente pesar a favor de um investimento do governo americano na melhoria desse tipo de motor, o potencial para aplicações civis oferece perspectivas para uma verdadeira revolução técnica e proporcionar melhorias tanto práticas quanto na qualidade de vida de operadores e outros usuários de veículos e equipamentos diversos. Enfim, desafiando a complexidade que tem sido a tônica do controle de emissões e ainda leva a uma insatisfação de uma parte considerável do público generalista principalmente em segmentos de menor valor agregado, o sistema DFI é mais um daqueles casos em que uma solução aparentemente simples revela vantagens que chegam a surpreender demorarem tanto para serem implementadas...

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Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.

It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.

Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
http://dzulnutz.blogspot.com/2016/03/relacao-de-marcha-refletindo-sobre.html