Não é de hoje que a preferência do consumidor no segmento das pick-ups tem sido maior pelo Diesel, a ponto de modelos como a atual geração da Nissan Frontier nem oferecerem opção de motor que não seja o turbodiesel no Brasil mesmo que em países vizinhos como o Uruguai ainda disponha também de um motor a gasolina. De fato, o custo inicial menor que em versões mais básicas chega a constituir uma diferença acima de 50% em desfavor do motor turbodiesel pode até soar justificável de curto a médio prazo, sem levar em conta ainda a percepção de uma maior facilidade para se fazer gambiarras num motor a gasolina que preserve características construtivas mais modestas, enquanto nas versões mais caras essa diferença acaba soando mais facilmente assimilável. No entanto, ainda seria relevante considerar até que ponto o mesmo refinamento que hoje atrai uma parte do público que antes tratava os motores Diesel como uma mera ferramenta de trabalho indesejável num veículo particular se torna possivelmente problemática para quem efetivamente prioriza o aspecto utilitário desse tipo de motor.
No caso específico da Nissan Frontier Attack equipada com uma versão biturbo do motor YS23 no mercado brasileiro, por mais que a presença de ao menos um turbo tenha se tornado de certa forma indispensável em motores Diesel veiculares até em função de uma maior facilidade para atender às mais restritivas normas de emissões em comparação a um similar naturalmente aspirado, é inevitável que uma parte do público ainda seja mais temerosa quanto ao recurso a mais de um turbo, enquanto outros tantos simplesmente alegam por motivos meramente saudosistas que os motores modernos desenvolvidos de acordo com os conceitos do downsizing jamais chegarão aos pés dos motores "de trator" que alavancaram a participação de mercado do Diesel em utilitários no Brasil como uma reação meio às pressas diante das crises do petróleo na década de '70. Cabe destacar que a transição de um mercado mais consolidado em torno das full-size de projeto americano para hoje ser dominado pelas mid-size e uma participação mais expressiva de fabricantes japoneses também teve o downsizing como uma consequência natural, tendo em vista até questões operacionais. Vale lembrar que em outros mercados a Frontier ainda usa o motor YD25, que até compartilha alguns detalhes do projeto com o QR25 a gasolina, e assim a própria escala de produção favorece essa sofisticação que tem até aproximado mais os motores Diesel modernos da suavidade ainda apreciada por defensores mais ferrenhos da ignição por faísca...
Naturalmente surgem algumas insatisfações com relação ao afastamento dos princípios estritamente utilitários e da economia operacional que fizeram o Diesel se consolidar entre as pick-ups médias e grandes no Brasil, mesmo que alguns dieselheads convictos acabem aceitando essa situação tendo em vista que a tecnologia se torna aparentemente mais assimilável para alguns consumidores generalistas que antes não fariam tanta questão de pelo menos considerar a possibilidade de recorrer a um veículo com motor turbodiesel. E se por um lado o maior refinamento trazido pelo comando de válvula duplo no cabeçote, turbocompressão de duplo estágio e as faixas de rotação mais altas viabilizaram motores em faixas de cilindrada que pareciam improváveis de oferecer um desempenho nos parâmetros atuais entre 10 e 15 anos atrás, por outro o custo inicial da massificação dessas tecnologias acaba causando questionamentos em torno de eventuais vantagens competitivas que motores Diesel mais brutos ainda poderiam ter em mercados onde o preço de um veículo 0km faz uma diferença considerável a ponto de eventualmente fomentar um conformismo em torno de motores a gasolina que nessa categoria tem mantido espaço para uma concepção mais tradicional dos sistemas de injeção nos pórticos de válvula e para a aspiração natural.
Também é previsível que uma parte do público que foi atraída mais recentemente para o Diesel tenha mais dificuldade para abrir mão dos atuais padrões de desempenho, muito por influência da obsessão desmedida pela potência e do exagero na sofisticação ter levado ao atual estágio de desenvolvimento em que se parece buscar provar definitivamente a superioridade do Diesel frente à ignição por faísca ao invés de atender às prioridades de operadores mais tradicionais. Como a princípio fatores diversos que vão desde a eliminação de versões a gasolina ou flex em alguns modelos que poderiam oferecer um parâmetro de desempenho mais modesto para comparação até a rejeição do público generalista a algumas opções menos ortodoxas que ainda poderiam servir bem a aplicações estritamente utilitárias, restam relativamente poucas opções que poderiam até ser consideradas para tentar conciliar o melhor para atender aos anseios de perfis de consumidores tão divergentes. Apesar de que a menor relevância do outsourcing de motores Diesel para pick-ups mid-size nos últimos anos pudesse ser um empecilho ao retorno dessa prática, é algo que não deveria ser descartado totalmente...
Naturalmente levando em consideração as diferentes faixas de rotação dos picos de potência e torque, bem como a importância das relações de marcha para proporcionar um desempenho comparável entre motores de concepções tão distintas quanto o YS23 da Nissan Frontier e o Cummins ISF3.8 usado no chassi de microônibus Volkswagen 8.160 ODR, alguns aspectos se tornam particularmente dignos de nota. Na prática, com a rusticidade de um comando de válvulas simples no bloco sincronizado apenas por engrenagens e sempre um turbo único do tipo wastegate, o motor Cummins ISF3.8 com 3759cc e cujo projeto desenvolvido especificamente com foco em mercados emergentes favorece a redução do custo inicial ainda pode proporcionar desempenho comparável à versão do YS23 com somente um turbo de geometria variável e que com 2298cc torna indispensável não apenas pico de potência numa faixa de rotação por volta de 44% mais alta mas também o comando de válvulas duplo no cabeçote e sincronização por corrente. Os picos de torque, que no YS23 é de 41kgfm entre 1500 e 2500 RPM ao passo que no ISF3.8 é de 61kgfm entre 1300 e 1700 RPM, também proporcionariam uma diferença muito pequena na dirigibilidade mesmo considerando que uma relação de diferencial bem mais longa poderia ser usada com o motor de maior cilindrada para que o torque efetivo nas rodas ficasse mais parelho numa mesma velocidade de referência.
Seria equivocado tentar considerar uma concepção de motor como insuperável diante de outras, mas a atual dinâmica de alguns mercados levaria a crer que as proporções de sofisticação da atual geração de motores turbodiesel se revela uma faca de dois gumes à medida que motores a gasolina que ainda se mantém um tanto pé-duro seguem oferecidos em alguns mercados como uma opção mais modesta. Portanto, em algumas circunstâncias a rusticidade de um motor "de trator" ainda pode ser uma aliada decisiva a favor de uma presença de mercado mais expressiva para o Diesel, mesmo abdicando duma busca por superioridade absoluta em termos de desempenho para concentrar esforços em frentes que tradicionalmente mais são vistas como pontos fortes do Diesel como a durabilidade e a economia de combustível. Enfim, por mais que não se possa negar os méritos duma maior sofisticação no tocante à atração de um público mais amplo, não convém ignorar o impacto do custo inicial para consumidores com um perfil mais tradicional que poderiam até ser melhor servidos com soluções mais modestas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seja bem-vindo e entre na conversa. Por favor, comente apenas em português, espanhol ou inglês.
Welcome, and get into the talk. Please, comment only either in Portuguese, Spanish or English.
- - LEIA ANTES DE COMENTAR / READ BEFORE COMMENT - -
Nem sempre é viável manter as relações de marcha originais após converter um veículo para Diesel, em função dos regimes de rotação diferenciados. Portanto, uma alteração das relações de diferencial ou até a substituição do câmbio podem ser essenciais para manter um desempenho adequado a todas as condições de uso e a economia de combustível.
It's not always viable to retain the stock gear ratios after converting a vehicle to Diesel power, due to different revving patterns. Therefore, some differential ratio or even an entire transmission swap might eventually be essential to enjoy a suitable performance in all driving conditions and the fuel savings.
Mais informação sobre relações de marcha / more info about gear ratios
http://dzulnutz.blogspot.com/2016/03/relacao-de-marcha-refletindo-sobre.html